Na segunda feira, Gonçalo e toda a equipe de Design finalmente me apresenta um projeto decente, que eu logo preparo para ser enviado aos nossos clientes para análise. Não é muito depois das dez da manhã quando Viviane irrompe porta adentro do meu escritório, os olhos arregalados como pratos.
— Desculpe — ela diz. — Houve um problema na estação de metrô. Todos os trens atrasaram. Eu estava sem sinal lá embaixo, então não consegui ligar nem mandar uma mensagem.
— Tudo bem. Só tivemos uma reunião até agora — eu digo, analisando sua expressão de nervosismo, o rosto suado. Eu não vou dar uma bronca nela, digo a mim mesmo, recordando de que preciso da minha secretária e não poderei irritá-la se quiser receber sua ajuda. — Viviane, você conseguiu o que te pedi?
Ela congela um sorriso vacilante, os ombros retos de tensão.
— Sim, senhor, eu consegui — responde. A situação como um todo me faz ter vontade de rir. Eu riria se não estivesse tão nervoso quanto ela. Poderíamos muito bem estar falando sobre blocos de droga, mas estamos falando de uma namorada falsa, o que chega a ser quase tão bizarro quanto.
— E onde ela está?
A resposta para isso é minha porta se abrindo e uma borboleta de belas pernas bronzeadas adentra meu escritório como um furacão.
Ela abre um sorriso gigante e ronrona, como uma atriz muito ruim de filme de baixo orçamento:
— Querido!
Eu me engasgo, de primeiro momento, sem reação.
— O... o que é isso?
— Ah, essa é Larissa — diz Viviane, como se isso explicasse o que essa mulher está fazendo aqui.
Bem lá no fundo, eu já sei, mas me recuso a aceitar.
— Larissa Aurora — a borboleta pisca. — Mais conhecida como o amor da sua vida pelas próximas duas semanas.
Eu pisco de volta, mas não de um jeito atraente. Estou é pestanejando, como um tonto, tentando entender o que diabos está acontecendo aqui.
Que diabos?
— Você é a...
— Namorada falsa — ela completa, como se eu tivesse muita dificuldade para entender. — A que você pediu que Vivi encontrasse, lembra?
— Claro — digo, tentando me recompor. — Por favor, sente-se.
Ela se acomoda em uma cadeira diante da minha mesa, a expressão ainda brilhante. Tudo nela parece ser alegre demais, chamativo demais. Um contraste gritante diante da minha personalidade reservada. Isso não vai dar certo. Nem um pouco.
— Bem, eu vou sair agora — diz Viviane. — Me chamem se precisar de mim.
Depois que minha assistente se retira, volto a olhar para a Borboleta.
— Escuta... desculpe, não me lembro seu nome.
— Larissa — ela diz. — Larissa Silva.
— Certo. Eu me chamo Diogo.
— Eu sei quem você é.
Isso me confunde.
— Viviane deve ter falado sobre mim com você.
Dá de ombros.
— Mesmo se não tivesse, eu costumo ler jornal o suficiente, sabe? Trabalho como manicure, então ouço muitas histórias, sobre muita gente. Você é um assunto pertinente entre minhas clientes.
Eu sei que não deveria perguntar. Não estou aqui para ter esse tipo de interação com ela, mas não resisto à curiosidade:
— E o que elas costumam falar sobre mim?
Seus olhos se estreitam de um jeito maroto e o sorriso se expande.
— Quer mesmo saber?
Dou de ombros.
— Eu perguntei, não é?
— Então tá bom... — diz. — Bem, a maioria delas se gaba do quão fácil é conseguir o seu telefone. Já vi uma dizer que você não é tudo isso que ela pensou e ah... a última que atendi, ela meio que deixou escapar que seria a mãe dos seus bebês um dia, mas acho que não vai rolar, né?
É vergonhoso que de todas essas coisas que ela me relatou, a que mais me afetou foi terem dito que eu não era tudo isso. Sério? Nunca deixei uma mulher insatisfeita...
Minha irritação se duplica quando noto a expressão da Borboleta, encarando-me como se estivesse se divertindo muito com a minha reação.
— Ah, qual é. Só estou brincando — confessa. — Não é como se você fosse um ator de novela ou algo assim.
— Era uma piada.
Ela deve ter percebido o quanto fiquei irritado, pois sua expressão muda.
— Ah, qual é. Só estava tentando descontrair — diz. — A gente precisa ter uma ligação divertida se quisermos fazer isso dar certo. É como um casal de atores que precisam de muita química em cena.
— Ah... — gorjeio em compreensão. — Entendo. Bom, eu não sei exatamente como teríamos química. Não sou exatamente muito bom em atuar.
— Imagino — ela diz. — Mas podemos dar um jeito.
Meu telefone toca, e eu suprimo um lamento. É a minha mãe em uma chamada de vídeo. Bem previsível. Eu poderia muito bem ignorar, mas tenho feito isso já faz um bom tempo. Não vai colar com ela agora.
Quando eu atendo a chamada, seu rosto aparece na tela, sorridente como só ela consegue ser. Minha mãe ainda é uma mulher muito bonita. Tenho os olhos escuros dela, mas o cabelo preto herdei do meu pai já falecido. Os dela são loiros, mas já estão ficando brancos a maioria.
— Mamãe.
— Olá, Didi. Veja, eu aprendi a usar a chamada de vídeo.
— Estou vendo.
— Ei, por que você não tem me atendido? Eu gostaria de saber mais sobre a sua namorada.
Eu volto a olhar para a mulher diante de mim, carregando uma expressão de interesse genuíno. Ela sorri e eu acabo esbarrando em um porta canetas derrubando tudo.
— Opa... — ela diz, pegando as canetas que deixei cair. — Eu te ajudo com isso.
Minha mãe logo se empertiga.
— Essa voz. Estou ouvindo a voz de uma mulher.
— É a minha secretária.
— Não, não é — ela rebate com confiança. — Tenho falado com Vivi por vezes suficientes, já que você decidiu recusar todas as minhas chamadas ao longo da semana, para reconhecer a voz dela. Quem está aí com você, Didi? É sua namorada?
Jesus. Eu ainda estou pensando em uma maneira de sair dessa situação, mas antes que possa dizer algo, a Borboleta se levanta da cadeira e se inclina ao meu lado sorrindo para minha mãe na tela.
— Olá, senhora.
Minha mãe se anima.
— Ah, que bonita! Ela é muito bonita, Didi.
— Mamãe, por favor, pare de me chamar assim.
Minha mãe franze o nariz.
— Ele tem vergonha que eu o chame pelo apelido que lhe dei desde que era uma criança, mas não posso fazer nada se é isso mesmo que você é, nosso Didi.
A Borboleta... Larissa — preciso me lembrar do nome dela — sorri.
— Muito obrigada pelo elogio, senhora. E quanto ao apelido, eu adorei. Diogo não tem me falado sobre isso.
— É claro que ele não contaria algo assim para a namorada. Mas eu não tenho problema algum em falar.
Rolo os olhos. Não foi assim como eu imaginei que isso aconteceria.
— Como você se chama, linda?
— Larissa — a outra responde. — É um prazer conhecer a senhora.
— Nada de senhora. Me chame de Marília. Dona Mari se quiser, como todos costumam me chamar.
— Certo.
— Voce vem ao casamento de Murilo, não é?
Larissa me da uma olhada rápida antes de confirmar, incerta.
— Claro que sim. Estamos ansiosos com isso.
Minha mãe faz uma pausa.
— Bem, não vou segurar vocês por muito mais tempo. Vejo vocês no sábado, meus amores.
E com isso, ela finalmente desliga.
Suspiro.
— O que diabos você fez?
— Eu só estava dando um alô para sua mãe. Não era esse o plano? — ela diz parecendo orgulhosa de si mesma. — E eu acho que ela gostou de mim.
Balanço a cabeça, sem sequer saber como lidar com tudo isso. Isso é loucura. Uma loucura total.
Enterro a cabeça em minhas mãos. Deus, o que estou fazendo?
— Isso... vai ser um desastre.
— Do que você está falando? Só vai ser um desastre se nós permitirmos que seja — diz. — E poso garantir a você: não haverá falhas da minha parte.
— Como pode afirmar isso com tanta convicção?
— É preciso ter confiança para que possa dar certo, não é mesmo?
Eu nem sei o que pensar. Nunca conheci alguém desse jeito. É óbvio que somos completamente diferentes, e sequer passamos mais que meia hora juntos.
Ela é... intrigante.
E me irrita.
— Nós precisamos conversar sobre isso melhor.
— Concordo. — Ela se levanta do braço da cadeira e se inclina tranquilamente para ajeitar a gola da minha camisa social. Se afasta, o sorriso ainda presente em seu rosto. — Me leve para almoçar.
E com isso, ela se vira e sai.
Só então que eu percebo, que ela acabou de me dar uma ordem.
Realização cai sobre mim como um soco.
Ela acabou de me dar uma ordem?!
LARISSAIsso não é algo que eu vá admitir em voz alta, mas ele fica engraçado quando está carrancudo. Não de um jeito vergonhoso, mas talvez de um jeito fofo? É meio estranho eu estar chamando Diogo Castelo de fofo. Se há algo que esse homem consegue ser, adorável não está, nem de longe, entre uma delas, mas posso admitir que a maneira como sua testa se vinca ou como ele parece tão rígido, por mais que disfarce é, no mínimo, interessante.— Não acreditei que você fosse realmente vir — eu digo quando me aproximo.— Você queria conversar enquanto almoçávamos, não é? — Ele diz, já se levantando para puxar a cadeira para mim. — Aqui estamos.Faço um aceno de mão, para que ele não se preocupe e eu mesma puxo a cadeira e me sento. Um garçom vem nos atender, e Diogo pergunta:— O que vai querer?— Um suco está bom.Franze a testa.— Não está com fome?— Sempre pulo os almoços — respondo dando de ombros. — Já se tornou um hábito. Como qualquer coisa mais tarde.Ele se vira para o garçom.— Ok
Capítulo 6DIOGO— O projeto foi um sucesso. Meus parabéns a todos os envolvidos — elogio minha equipe.Depois que todos saem, Gonçalo ainda fica na sala. Ele me dá um aperto de mão, e eu o cumprimento.— Confesso que ainda estou chateado por não termos conseguido dar continuidade à minha ideia, mas não posso dizer que não gostei em todo. O projeto foi um sucesso e é isso o que importa.— Ainda teremos tempo para trabalhar sua ideia. Acho que você vai fazer um bom trabalho quando assumir o comando enquanto eu estiver fora.Ele sorri.— E então... como está a sua família com toda essa coisa do casamento?Dou de ombros.— Minha mãe está eufórica, é claro. É o sonho dela ver seus filhos casados.— E mesmo assim o irmão mais novo está se casando primeiro.Rolo os olhos.— Por favor, Gonçalo. Você também não.Ele ri.— Só estou brincando. Com certeza é algo que uma mãe casamenteira diria. — Ele faz uma pausa. — Mas você, no entanto, talvez não demore muito para seguir os passos do seu irmã
LARISSA — Esse vestido rosa me faz parecer um pouco... estranha. — Eu digo enquanto aliso o vestido de verão de caimento solto de frente para o espelho de Vivi. Me arrumei na casa dela para evitar questionamentos da minha mãe, e agora não sei por que estou nervosa apenas em me imaginar indo a um encontro com Diogo Castelo. Nem é um encontro de verdade, e ele claramente não tem nem um pouco de vontade sair comigo. De repente, me ocorre que ter inventado esse programa para conhecê-lo melhor pode ter sido uma péssima ideia. — Ei, por que você parece tão nervosa? — Vivi me pergunta, olhando-me desconfiada. — O que? Quem está nervosa aqui? Ela não hesita ao responder: — Você. Tem agido estranho desde a hora de se vestir. Tudo bem que aquele homem é intimidante, mas foi você quem teve essa ideia em primeiro lugar, não adianta tentar mudar o rumo das coisas agora. — Não estou nervosa — descarto suas desconfianças. — Bem, estou indo. Decidi que o encontraria na porta do Shopping e qua
Faltando poucos dias para a viagem, Larissa me manda uma de suas habituais mensagens cheias de emojis.Borboleta: Bom dia! Pronto para mais um programa de casal?Diogo: Eu achei que já tivéssemos feito isso.Borboleta: Ainda não tiramos fotos, lembra? Precisamos de fotos para caso alguém nos questione. Só por precaução.Diogo: sou ótimo com montagens. Posso tentar algo.Borboleta: Bleh. Sem chance. Tem tempo para um encontro essa noite?Eu fico uns bons minutos encarando essa mensagem sem saber como responder. O que diabos tem essa mulher e por que eu sempre acabo concordando com suas maluquices sem sequer questionar?Estou mesmo tão desesperado a ponto de virar refém de Larissa Aurora ou eu realmente gosto de tudo o que ela faz comigo? De qualquer forma, mando uma mensagem de volta:Diogo: Depende do que você tem em mente.Borboleta: Você deveria confiar mais em mim. Somos um casal agora.Diogo: Estamos começando a fazer esse jogo por mensagens também?Borboleta: Não sei. Você quer?
Quando finalmente chego no local do bendito encontro, Larissa já está lá. Ela enfia as mãos nos bolsos dos seus shorts jeans e segue em minha direção. Eu tenho não encarar suas pernas nuas, mas ressalto mentalmente que elas são muito bonitas.Quando ela chega até mim, o sorriso é gigantesco.— Você não se atrasa nunca? — pergunto.Ela dá de ombros.— Por que eu me atrasaria?— Não sei. Eu pensei que fosse uma regra secreta entre garotas em encontros.Ela rola os olhos.— Essa foi a segunda coisa mais absurda que já ouvi essa semana. A primeira foi quando você me disse que não estava comendo direito — comenta. — Além do mais, por que eu me atrasaria em um encontro? Se eu estou gostando de um cara, eu não vejo a hora de vê-lo, certo? Não faz sentido fingir desinteresse.A sua maneira de pensar é interessante, me obrigo a admitir. Poucas pessoas teriam a mesma lógica que Larissa, embora seja a concepção mais simples de se ter.— Você tem um ponto — digo. — Mas então... o que vamos fazer?
ThaísÉ sexta-feira, o dia em que preciso arrumar minhas malas para viajar com Diogo no sábado, amanhã. Não tenho muito o que levar, então escolho o máximo de roupas que eu possa usar em uma casa de praia, além do vestido novo — e o único — que tenho para ir ao casamento. De qualquer forma, mando uma foto para Diogo mostrando minhas roupas, afinal, por mais que ele não tenha exatamente nada a ver com minha vestimenta, é a namorada dele que estou fingindo ser e quero estar apresentável no casamento de seu irmão.“Acha que isso é o suficiente?”Ele me responde de volta:“Talvez para usar como pano de chão. Onde está sua roupa para a cerimônia?”Isso me pega desprevenida porque o vestido que eu iria usar na festa foi justamente o da primeira foto que enviei a ele.“Eu te enviei a foto com o vestido que pretendo usar.” Digo, mandando a foto novamente.“Jogue-o fora.”Mas o que...“Você está me zoando ou o quê?”“Você não vai ao casamento do meu irmão como minha namorada usando isso.”“Não
Capítulo 1 DIOGO Minha cabeça vai explodir. Sinto como se houvesse algo martelando dentro dela e qualquer som emitido nesta sala de reunião está me deixando estressado. Há um vídeo de poucos segundos rolando no quadro branco onde está sendo refletido nosso último projeto, mas não prende minha atenção. A tela do meu celular se acende, e eu já sei quem é antes mesmo de olhar. Na tela de bloqueio, uma notificação de mensagem da minha mãe: “Me fale mais sobre ela”. Aperto a ponte do meu nariz, voltando a focar no comercial. A modelo está correndo em direção a uma cachoeira, cabelos brilhantes ao vento. A edição está boa, mas falta algo. Um pouco de personalidade, talvez? O celular se acende de novo. “Você não me disse seu nome ainda, mas vou descobrir. Me passe o contato dela se estiver sem tempo. Quero conhecê-la.” A modelo agora está deitada sobre a grama, parecendo encantada com o cheiro de qualquer coisa proveniente da natureza que ela esteja sentindo. Mas que porra é essa? “
Volto a olhar para minha secretária. A tão competente Viviane. Eu deveria lhe dar um aumento de salário. A mulher é uma santa, embora eu tenha desconfiança de que ela me odeie. Não me surpreenderia se encontrasse um boneco de magia parecido comigo em suas gavetas. — Viviane... — eu digo. — Não marque nada para a próxima semana depois desse projeto. Tenho uma viagem importante a fazer e ficarei por duas semanas fora. — Claro. — Ela está prestes a me virar, quando a chamo outra vez: — E Viviane? — Sim? — Suas férias começam no próximo fim de semana, certo? — Exatamente. — E você já tem planos? Ela me olha de maneira estranha. Por que não olharia? Estou realmente tão desesperado ao ponto de pedir este favor a minha secretária? Ela faz uma pausa, e talvez este seja um sinal dos céus para que eu não continue. Não sou esse tipo de homem. Nunca tive que pedir um favor desse tipo para alguém, muito menos a qualquer funcionário meu, no entanto posso confessar que estou meio que desesper