Volto a olhar para minha secretária. A tão competente Viviane. Eu deveria lhe dar um aumento de salário. A mulher é uma santa, embora eu tenha desconfiança de que ela me odeie. Não me surpreenderia se encontrasse um boneco de magia parecido comigo em suas gavetas.
— Viviane... — eu digo. — Não marque nada para a próxima semana depois desse projeto. Tenho uma viagem importante a fazer e ficarei por duas semanas fora.
— Claro. — Ela está prestes a me virar, quando a chamo outra vez:
— E Viviane?
— Sim?
— Suas férias começam no próximo fim de semana, certo?
— Exatamente.
— E você já tem planos?
Ela me olha de maneira estranha. Por que não olharia? Estou realmente tão desesperado ao ponto de pedir este favor a minha secretária? Ela faz uma pausa, e talvez este seja um sinal dos céus para que eu não continue. Não sou esse tipo de homem. Nunca tive que pedir um favor desse tipo para alguém, muito menos a qualquer funcionário meu, no entanto posso confessar que estou meio que desesperado aqui. Minha mãe é uma força da natureza. Uma mulher doce e adorável, mas firme quando o assunto é a vida pessoal de seus filhos. Se ela já está desconfiada de que não superei Marcela agora, imagina o que ela vai fazer quando finalmente descobrir que menti ou se eu inventar que terminei com minha suposta namorada do nada? Não sei por que isso é tão importante para mim, mas não quero fracassar em suas expectativas de que posso ser capaz de namorar alguém sem pensar na traição da minha ex de dez anos atrás.
— Eu só gostaria de saber se você estava disponível para me acompanhar a um lugar — digo a Viviane, que parece ainda mais confusa e alarmada.
— E o que seria?
— Um casamento.
— Eu não estou entendendo por que o senhor está me convidando para ir a um casamento justo na minha folga.
— Eu preciso que me acompanhe como... — Deus do céu, estou mesmo fazendo isso? Sim, estou fazendo isso. — Como minha namorada.
Ela congela.
Congela como se eu houvesse perguntado a cor da sua calcinha, e eu a entendo. Realmente entendo. Nunca trocamos palavras além de frias informações sobre o trabalho, e agora estou fazendo a ela uma proposta dessas. Me sinto ridículo.
— Desculpe se em algum momento dei a entender o contrário, senhor, mas o que temos é estritamente profissional. E eu gostaria que o senhor continuasse me tratando dessa forma.
— Ah, meu Deus, não — eu solto. — Há um engano aqui. Não estou dando em cima de você.
Ela parece ainda confusa, mas um pouco mais aliviada.
— Então, o que seria?
Suspiro. Passo as mãos pelos cabelos e me levanto. Recosto-me contra a mesa e cruzo os baços. Jesus, como irei explicar isso a ela sem parecer um pervertido?
— Antes de qualquer coisa, Viviane, não estou interessado em você, e a respeito imensamente — reforço. — Não mesmo.
— Certo, eu já entendi.
— Okay, bem... e você é uma das pessoas em quem eu mais confio. É por isso que sugeri a você esse favor.
— O favor de ir ao casamento do seu irmão como sua namorada?
— Mais ou menos isso. — É exatamente isso.
— O senhor não está interessado em mim, mas está me pedindo em namoro?
— Não. Quer dizer, talvez. Não desse jeito. É apenas... um teatro.
Ela não consegue esconder a cara de assustada quando pergunta:
— Por que eu fingiria ser sua namorada? Ou melhor, porque você pediria a qualquer pessoa para fingir ser sua namorada?
— É... complicado — respondo. — Primeiro que é constrangedor pra caramba eu cogitar ter uma namorada falsa. Segundo que... como eu disse, você é a pessoa em quem mais confio aqui e uma das que eu sei que não teria nenhum tipo de interesse amoroso em mim. Preciso de alguém centrada e segura para este serviço.
A maneira como estou falando isso parece que estou tentando recrutá-la para uma missão ultrassecreta, e me fez parecer ainda mais ridículo. A que ponto da minha vida eu tive que chegar para ser obrigado a pedir que minha secretária finja ser minha namorada apenas para provar à minha família que superei a minha ex aos trinta e dois anos?
— Acontece que isso ainda não explica por que o senhor precisa de uma falsa namorada para ir ao casamento do seu irmão. Não é como se as pessoas fossem obrigadas a terem acompanhantes hoje em dia.
— Mas eu quero uma acompanhante — é a única resposta que dou, e ela aceita.
— Entendo... — diz. — E... que tal se encontrássemos algum de seus encontros? Eu me lembro de ter marcado reservas com Teodora Fonseca para um jantar esta noite. Ela daria uma ótima namorada para o senhor.
— Deus me livre.
— E que tal... Rafaela Tenório? — sugere. — Vocês tiveram um encontro na semana passada.
— Sem chance.
— Mônica Diniz? Érica Valdez? Rayssa Ferreira?
— Não, não e não, Viviane. Eu não posso pedir este favor a nenhuma delas.
— E por que não?
— Pelo mesmo motivo que me fez pensar em escolher você. Nós somos dois profissionais que não sentem nada um pelo outro. Agiríamos como duas pessoas trocando favores. A primeira coisa que essas mulheres falam comigo quando as convido para sair é no quanto elas seriam boas mães e esposas. Eu não quero dar falsas esperanças pra alguém que está achando que quero algo sério. Só preciso de uma acompanhante que finja muito bem durante uma semana inteira e evite que os meus familiares encham o meu saco. Você entende?
E é a verdade. Não estou a fim de me comprometer de verdade com alguém e correr o risco de fazer alguma coitada pensar que quero algo além de pura troca de favores. Não estou em busca de um romance, e sei muito bem separar as coisas quando se trata da minha vida pessoal ou qualquer outro âmbito. É melhor do que iludir alguém com falsas esperanças de um relacionamento.
— Entendo sua situação, e sinto muito, mas não sei como ajudar. Eu só estragaria as coisas fazendo esse favor a você. Sou uma péssima atriz e... bem, eu não acho que me sentiria confortável mentindo para sua família.
— Claro, eu entendo. Foi um erro meu cogitar essa possibilidade. Você tem toda razão — digo. — Mas... me diga, talvez você conheça alguém? Uma amiga ou... alguém de sua confiança que esteja disposta a fazer isso por mim?
Balança a cabeça em negativa.
— Desculpe, mas não conheço ninguém.
Não compro sua mentira. Meus olhos se estreitam.
— Que pena. Eu pagaria muito bem.
Eu sei o exato momento em que seu interesse muda, pois seus olhos se arregalam levemente e ela inclina a cabeça.
— O que disse?
— Eu disse que pagaria muito bem, caso você conseguisse alguém de confiança para fingir ser minha namorada — repito lentamente, não conseguindo ser mais claro que isso. — Pra você eu daria até um aumento de salário.
— Sério?
— Já brinquei com você alguma vez? — aponto. — Estou falando sério, mas também tenho pressa, então seria de bom tamanho se você conseguisse alguém rápido. Estou disposto a pagar o quanto ela quiser.
Ela engole em seco, a voz se tornando mais suave.
— E o senhor tem alguma característica física em mente?
Dou de ombros.
— Me atento mais á personalidade. Basta ser elegante, interessante, boa atriz e disposta a fingir ser minha namorada por uma semana e viajar comigo para Búzios no sábado — digo. — Vamos de carro porque é mais fácil.
Ela está dentro nessa. Percebo quando seus lábios se curvam em um sorriso sutil, o interesse genuíno em seus olhos.
— Vou dar o meu melhor para ajudá-lo com isso.
Capítulo 2LARISSA— Eu acho que não gostei dessa cor de esmalte. — Teodora Fonseca estende a mão com unhas pintadas de marrom-café e enruga o nariz pontudo. — Não combina comigo.— É o mesmo que usei na semana passada.— Deve ser por isso, então. Enjoei dele. Pinte de novo.Eu respiro fundo umas três vezes, tentando me controlar enquanto broto um sorriso em meu rosto e pego acetona e algodão.Aos 26 anos, eu me considero uma faz tudo muito competente. Sou manicure, cabeleireira, maquiadora e até depilo nas horas vagas. Minha mãe, a dona do salão em que trabalho, diz que eu deveria me aprimorar mais no meu trabalho, já que não tenho talento para mais nada além disso, mas ela não é exatamente a pessoa que você procura quando quer receber elogios, principalmente se for eu, então vamos apenas fingir que sua opinião não vale de nada. Atualmente, estou fazendo serviço em domicílio. Meus serviços são tão requisitados que as senhoras ricas de todos os lados do Rio de Janeiro fazem questão de
LARISSANo sábado, acordo cedo. Mesmo que eu tenha alguns trabalhos pela parte da tarde, tiro a manhã para lavar roupas e resolver as pendências, como pagar a conta de luz atrasada que minha mãe tanto fez questão que eu pagasse ao longo da semana.Perto do horário de almoço, vou até a casa de Vivi. Ela mora a alguns quarteirões de onde eu vivo. Sempre almocei em sua casa aos sábados, e como descobri que hoje o almoço vai ser lasanha não vou perder a oportunidade.Dou um abraço em Pedrinho, meu afilhado. Quando sigo em direção a cozinha, encontro minha amiga mexendo algum molho na panela.— Quer ajuda com isso? — pergunto, sentindo o cheiro delicioso de seu tempero.Ela balança a mão e descarta a ajuda.— Apenas sente-se aí e vamos conversar um pouco. Preciso de alguém pra desabafar.Ela está tomando cerveja direto de uma garrafa. Pego um copo e me sirvo enquanto me sento.— Seu ex-marido decidiu voltar?Ela rola os olhos.— Quem dera fosse o Paulo enchendo meu saco dessa vez.— O que
DIOGONa segunda feira, Gonçalo e toda a equipe de Design finalmente me apresenta um projeto decente, que eu logo preparo para ser enviado aos nossos clientes para análise. Não é muito depois das dez da manhã quando Viviane irrompe porta adentro do meu escritório, os olhos arregalados como pratos.— Desculpe — ela diz. — Houve um problema na estação de metrô. Todos os trens atrasaram. Eu estava sem sinal lá embaixo, então não consegui ligar nem mandar uma mensagem.— Tudo bem. Só tivemos uma reunião até agora — eu digo, analisando sua expressão de nervosismo, o rosto suado. Eu não vou dar uma bronca nela, digo a mim mesmo, recordando de que preciso da minha secretária e não poderei irritá-la se quiser receber sua ajuda. — Viviane, você conseguiu o que te pedi?Ela congela um sorriso vacilante, os ombros retos de tensão.— Sim, senhor, eu consegui — responde. A situação como um todo me faz ter vontade de rir. Eu riria se não estivesse tão nervoso quanto ela. Poderíamos muito bem estar
LARISSAIsso não é algo que eu vá admitir em voz alta, mas ele fica engraçado quando está carrancudo. Não de um jeito vergonhoso, mas talvez de um jeito fofo? É meio estranho eu estar chamando Diogo Castelo de fofo. Se há algo que esse homem consegue ser, adorável não está, nem de longe, entre uma delas, mas posso admitir que a maneira como sua testa se vinca ou como ele parece tão rígido, por mais que disfarce é, no mínimo, interessante.— Não acreditei que você fosse realmente vir — eu digo quando me aproximo.— Você queria conversar enquanto almoçávamos, não é? — Ele diz, já se levantando para puxar a cadeira para mim. — Aqui estamos.Faço um aceno de mão, para que ele não se preocupe e eu mesma puxo a cadeira e me sento. Um garçom vem nos atender, e Diogo pergunta:— O que vai querer?— Um suco está bom.Franze a testa.— Não está com fome?— Sempre pulo os almoços — respondo dando de ombros. — Já se tornou um hábito. Como qualquer coisa mais tarde.Ele se vira para o garçom.— Ok
Capítulo 6DIOGO— O projeto foi um sucesso. Meus parabéns a todos os envolvidos — elogio minha equipe.Depois que todos saem, Gonçalo ainda fica na sala. Ele me dá um aperto de mão, e eu o cumprimento.— Confesso que ainda estou chateado por não termos conseguido dar continuidade à minha ideia, mas não posso dizer que não gostei em todo. O projeto foi um sucesso e é isso o que importa.— Ainda teremos tempo para trabalhar sua ideia. Acho que você vai fazer um bom trabalho quando assumir o comando enquanto eu estiver fora.Ele sorri.— E então... como está a sua família com toda essa coisa do casamento?Dou de ombros.— Minha mãe está eufórica, é claro. É o sonho dela ver seus filhos casados.— E mesmo assim o irmão mais novo está se casando primeiro.Rolo os olhos.— Por favor, Gonçalo. Você também não.Ele ri.— Só estou brincando. Com certeza é algo que uma mãe casamenteira diria. — Ele faz uma pausa. — Mas você, no entanto, talvez não demore muito para seguir os passos do seu irmã
LARISSA — Esse vestido rosa me faz parecer um pouco... estranha. — Eu digo enquanto aliso o vestido de verão de caimento solto de frente para o espelho de Vivi. Me arrumei na casa dela para evitar questionamentos da minha mãe, e agora não sei por que estou nervosa apenas em me imaginar indo a um encontro com Diogo Castelo. Nem é um encontro de verdade, e ele claramente não tem nem um pouco de vontade sair comigo. De repente, me ocorre que ter inventado esse programa para conhecê-lo melhor pode ter sido uma péssima ideia. — Ei, por que você parece tão nervosa? — Vivi me pergunta, olhando-me desconfiada. — O que? Quem está nervosa aqui? Ela não hesita ao responder: — Você. Tem agido estranho desde a hora de se vestir. Tudo bem que aquele homem é intimidante, mas foi você quem teve essa ideia em primeiro lugar, não adianta tentar mudar o rumo das coisas agora. — Não estou nervosa — descarto suas desconfianças. — Bem, estou indo. Decidi que o encontraria na porta do Shopping e qua
Faltando poucos dias para a viagem, Larissa me manda uma de suas habituais mensagens cheias de emojis.Borboleta: Bom dia! Pronto para mais um programa de casal?Diogo: Eu achei que já tivéssemos feito isso.Borboleta: Ainda não tiramos fotos, lembra? Precisamos de fotos para caso alguém nos questione. Só por precaução.Diogo: sou ótimo com montagens. Posso tentar algo.Borboleta: Bleh. Sem chance. Tem tempo para um encontro essa noite?Eu fico uns bons minutos encarando essa mensagem sem saber como responder. O que diabos tem essa mulher e por que eu sempre acabo concordando com suas maluquices sem sequer questionar?Estou mesmo tão desesperado a ponto de virar refém de Larissa Aurora ou eu realmente gosto de tudo o que ela faz comigo? De qualquer forma, mando uma mensagem de volta:Diogo: Depende do que você tem em mente.Borboleta: Você deveria confiar mais em mim. Somos um casal agora.Diogo: Estamos começando a fazer esse jogo por mensagens também?Borboleta: Não sei. Você quer?
Quando finalmente chego no local do bendito encontro, Larissa já está lá. Ela enfia as mãos nos bolsos dos seus shorts jeans e segue em minha direção. Eu tenho não encarar suas pernas nuas, mas ressalto mentalmente que elas são muito bonitas.Quando ela chega até mim, o sorriso é gigantesco.— Você não se atrasa nunca? — pergunto.Ela dá de ombros.— Por que eu me atrasaria?— Não sei. Eu pensei que fosse uma regra secreta entre garotas em encontros.Ela rola os olhos.— Essa foi a segunda coisa mais absurda que já ouvi essa semana. A primeira foi quando você me disse que não estava comendo direito — comenta. — Além do mais, por que eu me atrasaria em um encontro? Se eu estou gostando de um cara, eu não vejo a hora de vê-lo, certo? Não faz sentido fingir desinteresse.A sua maneira de pensar é interessante, me obrigo a admitir. Poucas pessoas teriam a mesma lógica que Larissa, embora seja a concepção mais simples de se ter.— Você tem um ponto — digo. — Mas então... o que vamos fazer?