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Capítulo 2

LARISSA

— Eu acho que não gostei dessa cor de esmalte. — Teodora Fonseca estende a mão com unhas pintadas de marrom-café e enruga o nariz pontudo. — Não combina comigo.

— É o mesmo que usei na semana passada.

— Deve ser por isso, então. Enjoei dele. Pinte de novo.

Eu respiro fundo umas três vezes, tentando me controlar enquanto broto um sorriso em meu rosto e pego acetona e algodão.

Aos 26 anos, eu me considero uma faz tudo muito competente. Sou manicure, cabeleireira, maquiadora e até depilo nas horas vagas. Minha mãe, a dona do salão em que trabalho, diz que eu deveria me aprimorar mais no meu trabalho, já que não tenho talento para mais nada além disso, mas ela não é exatamente a pessoa que você procura quando quer receber elogios, principalmente se for eu, então vamos apenas fingir que sua opinião não vale de nada. Atualmente, estou fazendo serviço em domicílio. Meus serviços são tão requisitados que as senhoras ricas de todos os lados do Rio de Janeiro fazem questão de ter os meus serviços em casa. É uma rotina cansativa, mas como preciso do dinheiro, não estou reclamando.

Ela se recosta em sua cadeira confortável e cantarola enquanto digita algo em seu celular conforme dou atenção à sua mão esquerda.

— Ai... — ela diz quando acabo segurando seu dedo de maneira desajeitada. — Cuidado, querida. Preciso estar linda hoje à noite.

— Certo. Me desculpe.

Seu sorriso se amplia, e mesmo que eu não tenha perguntado ou não esteja interessada em saber sobre sua vida, ela continua:

— Eu tenho um encontro esta noite. Com um cara gato que conheci em um coquetel outro dia.  Não foi difícil conseguir o telefone dele.

Forço um sorriso.

— Voce é uma mulher muito bonita e elegante. Não me admira não ter tido dificuldade.

Seus olhos brilham e ela ronrona em falsa modéstia. Eu sei que essa puxada de saco vai me render alguma gorjeta no fim de tudo, então não me arrependo de nada.

— Ah, nem é para tanto. Ele conhecia um amigo de um amigo e, você sabe, decidimos nos conhecer melhor.

— Entendo.

— Veja. — Ela parece não satisfeita com a chuva de informações que me dá do homem. O próximo passo é o seu celular bem na minha cara. Paro o que estou fazendo e ajeito meus óculos para analisar a foto. Um cara alto de uns vinte e tantos anos, cabelo escuro e curto, olhos castanho-escuros. Poderia facilmente ser um modelo de marca de cueca se ele quisesse. — Ele não é magnífico?

— Realmente muito bonito.

— Tire o olho — ela brinca, puxando o celular do meu campo de visão. — Este homem vai ser o meu marido um dia, não se esqueça.

Sorrio.

— Vocês vão formar um lindo casal.

Ela parece satisfeita com o elogio.

— E quanto a você? Tem namorado?

Eu encolho os ombros.

— Terminei com meu último namorado faz mais de um ano — digo. — Ele... não estava na mesma página que eu.

— O que quer dizer?

— Eu queria estabilidade e um futuro casamento. Ele não.

— Deve ser difícil para pessoas como você conseguir um amor verdadeiro, mas pelo menos, veja pelo lado bom, querida. Nenhum cara vai se aproximar de você pelo seu dinheiro.

Eu realmente tive vontade de perguntar a ela se isso era para ser um consolo ou uma ofensa, mas não estendo o assunto.

Depois de testar mais duas cores diferentes de esmalte, Teodora finalmente fica satisfeita com a boa e brega francesinha. Ela leu em alguma revista que o estilo voltou à moda. Eu não a contradigo.

Chego em casa mais tarde do que gostaria. Perdi o último trem e tive que vir de ônibus. Minha mãe entra na cozinha.

— Shh, não faz barulho — ela repreende enquanto eu boto uma panela com água no fogo para preparar macarrão instantâneo. Tenho comido somente isso no almoço e jantar faz duas semanas porque geralmente não tenho tempo para cozinhar, e dificilmente sobra algo para mim quando chego em casa. — Seu irmão está dormindo.

— Foi mal. Eu tô cansada.

— Como foi o dia de hoje?

Eu suspiro, morrendo de vontade de desabafar com alguém.

— Eu rodei a zona oeste quase inteira, ainda tive um trabalho em Laranjeiras. Teodora Fonseca foi a mais irritante de todas, como sempre. Você acredita que ela insinuou que...

— Puxa, querida, que chato — diz minha mãe, me cortando. — Mas ela te pagou, certo? Todas elas pagaram você?

Eu assinto.

— Ótimo — ela diz. — A conta de luz vai vencer na segunda. Tente pagar até lá, ok?

Eu poderia me segurar. Poderia, sim, mas estou tão cansada.

— Acabei de falar o quanto meu dia foi uma merda e tudo o que a senhora pensa é no dinheiro que recebi?

Ela dá de ombros.

— Voce não estaria aguentando tudo isso se não fosse pelo dinheiro, não é? Por que está tão chateada com isso agora?

— Só estou cansada — digo. — Eu trabalho tanto e nunca sou reconhecida. Isso é meio cansativo.

— Trabalha muito porque nunca foi inteligente igual a sua irmã. Talvez as coisas fossem mais fáceis se você fosse igual a Juliana.

Então lá vamos nós. Ela sempre me compara à minha irmã, Juliana, que mora atualmente em Londres com o marido rico. Ela tem um filho agora e não liga pra gente já faz uns seis meses.

— Eu não sou a juliana, mãe.

— Mas deveria ser — rebate. — Nós teríamos mais sorte se você tivesse um marido rico.

Jesus Cristo, ela não vai superar isso nunca.

— Por que você não fala pro Alexandre arrumar uma mulher rica também? Não existe somente eu de filha.

— Porque o Alexandre, pelo menos, consegue não afastar toda e qualquer namorada que ele tenha — diz. — Voce vive pulando de namorado em namorado, minha filha, e todos eles terminaram com você.

Isso machuca. Machuca porque é algo com o qual eu estou tentando lidar no momento. Não sou uma namoradeira, como ela faz parecer. Na verdade, eu nunca estive em um relacionamento por menos de um ano, porque sempre que eu namorei eu me apaixonei de verdade e considerava um futuro com essas pessoas. Com filhos, cachorros e toda a coisa clichê da qual temos direito, mas parece que meus namorados nunca estavam na mesma página que eu. Quando percebiam que nosso relacionamento estava ficando sério demais, eles terminavam. Foi assim em um ciclo intermitente de decepções amorosas até eu decidir não ter mais nada com ninguém. E agora, minha mãe, sem noção como é, está jogando esta realidade na minha cara sem cuidado algum.

— Estou bem do jeito que estou. Não preciso de um homem.

— Larissa, você nem é tão bonita quanto eu era quando tinha sua idade, mas é decente, até — diz. — Poderia conseguir um homem com dinheiro, basta se esforçar para isso.

Ela me irrita. É sempre a mesma coisa. Sou a errada por não ter me casado com um homem rico, como a minha irmã, que atualmente mora na Inglaterra com a família que formou. Tenho para mim que ela só fez isso para se ver livre da nossa mãe, e não posso julgá-la por isso. Eu trocaria a minha vida pela de Juliana, não para ter o que ela tem, mas para me ver livre de dona Gilmara.

Mesmo irritada, não a contradigo. Não quero crescer essa história e bater boca só vai alimentar suas divagações.

— Mãe, desculpe encerrar este assunto, mas eu realmente gostaria de comer e me preparar para ir pra cama. Estou exausta.

Ela b**e com a mão no meu ombro.

— Não fique com a luz muito tempo acesa. Seu irmão é sensível a luz.

E com isso, ela volta pro quarto.

Desabo na cadeira da cozinha, sentindo-me como um lixo.

Bem, essa é a minha vida. Não posso reclamar dela.

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