— Eu acho que não gostei dessa cor de esmalte. — Teodora Fonseca estende a mão com unhas pintadas de marrom-café e enruga o nariz pontudo. — Não combina comigo.
— É o mesmo que usei na semana passada.
— Deve ser por isso, então. Enjoei dele. Pinte de novo.
Eu respiro fundo umas três vezes, tentando me controlar enquanto broto um sorriso em meu rosto e pego acetona e algodão.
Aos 26 anos, eu me considero uma faz tudo muito competente. Sou manicure, cabeleireira, maquiadora e até depilo nas horas vagas. Minha mãe, a dona do salão em que trabalho, diz que eu deveria me aprimorar mais no meu trabalho, já que não tenho talento para mais nada além disso, mas ela não é exatamente a pessoa que você procura quando quer receber elogios, principalmente se for eu, então vamos apenas fingir que sua opinião não vale de nada. Atualmente, estou fazendo serviço em domicílio. Meus serviços são tão requisitados que as senhoras ricas de todos os lados do Rio de Janeiro fazem questão de ter os meus serviços em casa. É uma rotina cansativa, mas como preciso do dinheiro, não estou reclamando.
Ela se recosta em sua cadeira confortável e cantarola enquanto digita algo em seu celular conforme dou atenção à sua mão esquerda.
— Ai... — ela diz quando acabo segurando seu dedo de maneira desajeitada. — Cuidado, querida. Preciso estar linda hoje à noite.
— Certo. Me desculpe.
Seu sorriso se amplia, e mesmo que eu não tenha perguntado ou não esteja interessada em saber sobre sua vida, ela continua:
— Eu tenho um encontro esta noite. Com um cara gato que conheci em um coquetel outro dia. Não foi difícil conseguir o telefone dele.
Forço um sorriso.
— Voce é uma mulher muito bonita e elegante. Não me admira não ter tido dificuldade.
Seus olhos brilham e ela ronrona em falsa modéstia. Eu sei que essa puxada de saco vai me render alguma gorjeta no fim de tudo, então não me arrependo de nada.
— Ah, nem é para tanto. Ele conhecia um amigo de um amigo e, você sabe, decidimos nos conhecer melhor.
— Entendo.
— Veja. — Ela parece não satisfeita com a chuva de informações que me dá do homem. O próximo passo é o seu celular bem na minha cara. Paro o que estou fazendo e ajeito meus óculos para analisar a foto. Um cara alto de uns vinte e tantos anos, cabelo escuro e curto, olhos castanho-escuros. Poderia facilmente ser um modelo de marca de cueca se ele quisesse. — Ele não é magnífico?
— Realmente muito bonito.
— Tire o olho — ela brinca, puxando o celular do meu campo de visão. — Este homem vai ser o meu marido um dia, não se esqueça.
Sorrio.
— Vocês vão formar um lindo casal.
Ela parece satisfeita com o elogio.
— E quanto a você? Tem namorado?
Eu encolho os ombros.
— Terminei com meu último namorado faz mais de um ano — digo. — Ele... não estava na mesma página que eu.
— O que quer dizer?
— Eu queria estabilidade e um futuro casamento. Ele não.
— Deve ser difícil para pessoas como você conseguir um amor verdadeiro, mas pelo menos, veja pelo lado bom, querida. Nenhum cara vai se aproximar de você pelo seu dinheiro.
Eu realmente tive vontade de perguntar a ela se isso era para ser um consolo ou uma ofensa, mas não estendo o assunto.
Depois de testar mais duas cores diferentes de esmalte, Teodora finalmente fica satisfeita com a boa e brega francesinha. Ela leu em alguma revista que o estilo voltou à moda. Eu não a contradigo.
Chego em casa mais tarde do que gostaria. Perdi o último trem e tive que vir de ônibus. Minha mãe entra na cozinha.
— Shh, não faz barulho — ela repreende enquanto eu boto uma panela com água no fogo para preparar macarrão instantâneo. Tenho comido somente isso no almoço e jantar faz duas semanas porque geralmente não tenho tempo para cozinhar, e dificilmente sobra algo para mim quando chego em casa. — Seu irmão está dormindo.
— Foi mal. Eu tô cansada.
— Como foi o dia de hoje?
Eu suspiro, morrendo de vontade de desabafar com alguém.
— Eu rodei a zona oeste quase inteira, ainda tive um trabalho em Laranjeiras. Teodora Fonseca foi a mais irritante de todas, como sempre. Você acredita que ela insinuou que...
— Puxa, querida, que chato — diz minha mãe, me cortando. — Mas ela te pagou, certo? Todas elas pagaram você?
Eu assinto.
— Ótimo — ela diz. — A conta de luz vai vencer na segunda. Tente pagar até lá, ok?
Eu poderia me segurar. Poderia, sim, mas estou tão cansada.
— Acabei de falar o quanto meu dia foi uma merda e tudo o que a senhora pensa é no dinheiro que recebi?
Ela dá de ombros.
— Voce não estaria aguentando tudo isso se não fosse pelo dinheiro, não é? Por que está tão chateada com isso agora?
— Só estou cansada — digo. — Eu trabalho tanto e nunca sou reconhecida. Isso é meio cansativo.
— Trabalha muito porque nunca foi inteligente igual a sua irmã. Talvez as coisas fossem mais fáceis se você fosse igual a Juliana.
Então lá vamos nós. Ela sempre me compara à minha irmã, Juliana, que mora atualmente em Londres com o marido rico. Ela tem um filho agora e não liga pra gente já faz uns seis meses.
— Eu não sou a juliana, mãe.
— Mas deveria ser — rebate. — Nós teríamos mais sorte se você tivesse um marido rico.
Jesus Cristo, ela não vai superar isso nunca.
— Por que você não fala pro Alexandre arrumar uma mulher rica também? Não existe somente eu de filha.
— Porque o Alexandre, pelo menos, consegue não afastar toda e qualquer namorada que ele tenha — diz. — Voce vive pulando de namorado em namorado, minha filha, e todos eles terminaram com você.
Isso machuca. Machuca porque é algo com o qual eu estou tentando lidar no momento. Não sou uma namoradeira, como ela faz parecer. Na verdade, eu nunca estive em um relacionamento por menos de um ano, porque sempre que eu namorei eu me apaixonei de verdade e considerava um futuro com essas pessoas. Com filhos, cachorros e toda a coisa clichê da qual temos direito, mas parece que meus namorados nunca estavam na mesma página que eu. Quando percebiam que nosso relacionamento estava ficando sério demais, eles terminavam. Foi assim em um ciclo intermitente de decepções amorosas até eu decidir não ter mais nada com ninguém. E agora, minha mãe, sem noção como é, está jogando esta realidade na minha cara sem cuidado algum.
— Estou bem do jeito que estou. Não preciso de um homem.
— Larissa, você nem é tão bonita quanto eu era quando tinha sua idade, mas é decente, até — diz. — Poderia conseguir um homem com dinheiro, basta se esforçar para isso.
Ela me irrita. É sempre a mesma coisa. Sou a errada por não ter me casado com um homem rico, como a minha irmã, que atualmente mora na Inglaterra com a família que formou. Tenho para mim que ela só fez isso para se ver livre da nossa mãe, e não posso julgá-la por isso. Eu trocaria a minha vida pela de Juliana, não para ter o que ela tem, mas para me ver livre de dona Gilmara.
Mesmo irritada, não a contradigo. Não quero crescer essa história e bater boca só vai alimentar suas divagações.
— Mãe, desculpe encerrar este assunto, mas eu realmente gostaria de comer e me preparar para ir pra cama. Estou exausta.
Ela b**e com a mão no meu ombro.
— Não fique com a luz muito tempo acesa. Seu irmão é sensível a luz.
E com isso, ela volta pro quarto.
Desabo na cadeira da cozinha, sentindo-me como um lixo.
Bem, essa é a minha vida. Não posso reclamar dela.
LARISSANo sábado, acordo cedo. Mesmo que eu tenha alguns trabalhos pela parte da tarde, tiro a manhã para lavar roupas e resolver as pendências, como pagar a conta de luz atrasada que minha mãe tanto fez questão que eu pagasse ao longo da semana.Perto do horário de almoço, vou até a casa de Vivi. Ela mora a alguns quarteirões de onde eu vivo. Sempre almocei em sua casa aos sábados, e como descobri que hoje o almoço vai ser lasanha não vou perder a oportunidade.Dou um abraço em Pedrinho, meu afilhado. Quando sigo em direção a cozinha, encontro minha amiga mexendo algum molho na panela.— Quer ajuda com isso? — pergunto, sentindo o cheiro delicioso de seu tempero.Ela balança a mão e descarta a ajuda.— Apenas sente-se aí e vamos conversar um pouco. Preciso de alguém pra desabafar.Ela está tomando cerveja direto de uma garrafa. Pego um copo e me sirvo enquanto me sento.— Seu ex-marido decidiu voltar?Ela rola os olhos.— Quem dera fosse o Paulo enchendo meu saco dessa vez.— O que
DIOGONa segunda feira, Gonçalo e toda a equipe de Design finalmente me apresenta um projeto decente, que eu logo preparo para ser enviado aos nossos clientes para análise. Não é muito depois das dez da manhã quando Viviane irrompe porta adentro do meu escritório, os olhos arregalados como pratos.— Desculpe — ela diz. — Houve um problema na estação de metrô. Todos os trens atrasaram. Eu estava sem sinal lá embaixo, então não consegui ligar nem mandar uma mensagem.— Tudo bem. Só tivemos uma reunião até agora — eu digo, analisando sua expressão de nervosismo, o rosto suado. Eu não vou dar uma bronca nela, digo a mim mesmo, recordando de que preciso da minha secretária e não poderei irritá-la se quiser receber sua ajuda. — Viviane, você conseguiu o que te pedi?Ela congela um sorriso vacilante, os ombros retos de tensão.— Sim, senhor, eu consegui — responde. A situação como um todo me faz ter vontade de rir. Eu riria se não estivesse tão nervoso quanto ela. Poderíamos muito bem estar
LARISSAIsso não é algo que eu vá admitir em voz alta, mas ele fica engraçado quando está carrancudo. Não de um jeito vergonhoso, mas talvez de um jeito fofo? É meio estranho eu estar chamando Diogo Castelo de fofo. Se há algo que esse homem consegue ser, adorável não está, nem de longe, entre uma delas, mas posso admitir que a maneira como sua testa se vinca ou como ele parece tão rígido, por mais que disfarce é, no mínimo, interessante.— Não acreditei que você fosse realmente vir — eu digo quando me aproximo.— Você queria conversar enquanto almoçávamos, não é? — Ele diz, já se levantando para puxar a cadeira para mim. — Aqui estamos.Faço um aceno de mão, para que ele não se preocupe e eu mesma puxo a cadeira e me sento. Um garçom vem nos atender, e Diogo pergunta:— O que vai querer?— Um suco está bom.Franze a testa.— Não está com fome?— Sempre pulo os almoços — respondo dando de ombros. — Já se tornou um hábito. Como qualquer coisa mais tarde.Ele se vira para o garçom.— Ok
Capítulo 6DIOGO— O projeto foi um sucesso. Meus parabéns a todos os envolvidos — elogio minha equipe.Depois que todos saem, Gonçalo ainda fica na sala. Ele me dá um aperto de mão, e eu o cumprimento.— Confesso que ainda estou chateado por não termos conseguido dar continuidade à minha ideia, mas não posso dizer que não gostei em todo. O projeto foi um sucesso e é isso o que importa.— Ainda teremos tempo para trabalhar sua ideia. Acho que você vai fazer um bom trabalho quando assumir o comando enquanto eu estiver fora.Ele sorri.— E então... como está a sua família com toda essa coisa do casamento?Dou de ombros.— Minha mãe está eufórica, é claro. É o sonho dela ver seus filhos casados.— E mesmo assim o irmão mais novo está se casando primeiro.Rolo os olhos.— Por favor, Gonçalo. Você também não.Ele ri.— Só estou brincando. Com certeza é algo que uma mãe casamenteira diria. — Ele faz uma pausa. — Mas você, no entanto, talvez não demore muito para seguir os passos do seu irmã
LARISSA — Esse vestido rosa me faz parecer um pouco... estranha. — Eu digo enquanto aliso o vestido de verão de caimento solto de frente para o espelho de Vivi. Me arrumei na casa dela para evitar questionamentos da minha mãe, e agora não sei por que estou nervosa apenas em me imaginar indo a um encontro com Diogo Castelo. Nem é um encontro de verdade, e ele claramente não tem nem um pouco de vontade sair comigo. De repente, me ocorre que ter inventado esse programa para conhecê-lo melhor pode ter sido uma péssima ideia. — Ei, por que você parece tão nervosa? — Vivi me pergunta, olhando-me desconfiada. — O que? Quem está nervosa aqui? Ela não hesita ao responder: — Você. Tem agido estranho desde a hora de se vestir. Tudo bem que aquele homem é intimidante, mas foi você quem teve essa ideia em primeiro lugar, não adianta tentar mudar o rumo das coisas agora. — Não estou nervosa — descarto suas desconfianças. — Bem, estou indo. Decidi que o encontraria na porta do Shopping e qua
Faltando poucos dias para a viagem, Larissa me manda uma de suas habituais mensagens cheias de emojis.Borboleta: Bom dia! Pronto para mais um programa de casal?Diogo: Eu achei que já tivéssemos feito isso.Borboleta: Ainda não tiramos fotos, lembra? Precisamos de fotos para caso alguém nos questione. Só por precaução.Diogo: sou ótimo com montagens. Posso tentar algo.Borboleta: Bleh. Sem chance. Tem tempo para um encontro essa noite?Eu fico uns bons minutos encarando essa mensagem sem saber como responder. O que diabos tem essa mulher e por que eu sempre acabo concordando com suas maluquices sem sequer questionar?Estou mesmo tão desesperado a ponto de virar refém de Larissa Aurora ou eu realmente gosto de tudo o que ela faz comigo? De qualquer forma, mando uma mensagem de volta:Diogo: Depende do que você tem em mente.Borboleta: Você deveria confiar mais em mim. Somos um casal agora.Diogo: Estamos começando a fazer esse jogo por mensagens também?Borboleta: Não sei. Você quer?
Quando finalmente chego no local do bendito encontro, Larissa já está lá. Ela enfia as mãos nos bolsos dos seus shorts jeans e segue em minha direção. Eu tenho não encarar suas pernas nuas, mas ressalto mentalmente que elas são muito bonitas.Quando ela chega até mim, o sorriso é gigantesco.— Você não se atrasa nunca? — pergunto.Ela dá de ombros.— Por que eu me atrasaria?— Não sei. Eu pensei que fosse uma regra secreta entre garotas em encontros.Ela rola os olhos.— Essa foi a segunda coisa mais absurda que já ouvi essa semana. A primeira foi quando você me disse que não estava comendo direito — comenta. — Além do mais, por que eu me atrasaria em um encontro? Se eu estou gostando de um cara, eu não vejo a hora de vê-lo, certo? Não faz sentido fingir desinteresse.A sua maneira de pensar é interessante, me obrigo a admitir. Poucas pessoas teriam a mesma lógica que Larissa, embora seja a concepção mais simples de se ter.— Você tem um ponto — digo. — Mas então... o que vamos fazer?
ThaísÉ sexta-feira, o dia em que preciso arrumar minhas malas para viajar com Diogo no sábado, amanhã. Não tenho muito o que levar, então escolho o máximo de roupas que eu possa usar em uma casa de praia, além do vestido novo — e o único — que tenho para ir ao casamento. De qualquer forma, mando uma foto para Diogo mostrando minhas roupas, afinal, por mais que ele não tenha exatamente nada a ver com minha vestimenta, é a namorada dele que estou fingindo ser e quero estar apresentável no casamento de seu irmão.“Acha que isso é o suficiente?”Ele me responde de volta:“Talvez para usar como pano de chão. Onde está sua roupa para a cerimônia?”Isso me pega desprevenida porque o vestido que eu iria usar na festa foi justamente o da primeira foto que enviei a ele.“Eu te enviei a foto com o vestido que pretendo usar.” Digo, mandando a foto novamente.“Jogue-o fora.”Mas o que...“Você está me zoando ou o quê?”“Você não vai ao casamento do meu irmão como minha namorada usando isso.”“Não