O Reino de Gora fica situado ao norte da Dalmácia, antes do condado de Lika-Senj, ao sul da atual cidade de Mogorić. Gora – em croata significa terra – foi assim batizado o reino por uma antiga disputa do povo dálmata com o povo do outro lado do Mar Adriático, mais precisamente da cidade de Ancona. Com a vitória dálmata, a região foi dada à família real Krkić – da Sérvia.
O Castelo Real se encontra na atual cidade de Rijeka, bem ao norte. Cidade importante por sua rota comercial com a Eslovênia e Itália. Seu porto recebe embarcações de todo o Mar Adriático. Rijeka passou a ser um centro não somente comercial, mas, também, de cultura e ensino.
O governo de Gora era também detentor da ilha de Krk, batizada pela família Krkić. A princípio, seu reino possuía apenas a ilha de Pag, com vista para seu reino pela região de Starigrad. Além da conquista de Rijeka, foi possível conquistar a ilha de Krk, um refúgio importante para a família real.
Assim como Rijeka, a ilha de Krk ganharia um castelo para abrigar a nobreza quando se situasse ali. Estava nascendo o castelo Frankopan, construído em pedra, com uma torre modesta que não passa dos cinco metros de altura, uma forte muralha, situado em uma região tranquila.
Gerações se passaram até chegar o reinado de Joachim – filho único do casal real Mathi e Sarah – se casou com uma jovem da família real polaca, Irina. Dessa união tiveram uma filha, Larissa – a princesa de Gora. Uma linda jovem de longos cabelos lisos castanhos claros e de olhos verdes, carregando em suas veias o sangue azul real – Plava Krv.
Bem distante dali, no extremo sul da Dalmácia, numa pequena aldeia de camponeses, estava Marki Luki Planinć. Um jovem aldeão, de cabelos castanhos claros, pele branca e olhos também castanhos claros. Os padrões de beleza agradavam a princesa de Gora. Contudo, ele não tinha Plava krv em suas veias, senão o crvena krv (sangue vermelho) de um camponês comum.
Ambos não se conheciam. Dificilmente isso ocorreria. Porque o dia a dia da princesa de Gora se limitava à vida no Castelo Real. Ela não precisava sair para nada. Raramente em algum encontro real em outro reino – muitos desses encontros entre famílias reais ocorriam na cidade de Zadar, capital do Reino da Dalmácia.
O Reino da Dalmácia estava tranquilo. Era braço direito do Reino de Gora. Ambos traçavam rotas de comércio na região do sul da atual Croácia até a Eslovênia e alimentavam um nobre acordo de paz. Até que vieram os húngaros. A região de Gora foi a mais dominada. Não foi algo escravizador, mas uma leve influência húngara estava tirando a autonomia do rei Joachim. Uma espécie de sub-reino poderia ser a nova realidade de Gora – reino que era tão próspero.
No entanto, o rei – em uma reunião com o reino magiar – teve a proposta da união dos povos. A ambiciosa estratégia húngara era expandir seu território, ao norte até os germânicos, e ao sul dominando o povo eslavo poderia estar se concretizando com esse acordo.
A conversa foi favorável ao rei Joachim e – sem mesmo a princesa Larissa saber – estava acordado o casamento entre Larissa e Kádár, o príncipe da Hungria. A notícia chegava ao Castelo Real como uma bomba. Agora estava em jogo o futuro da família e do Reino de Gora – Larissa precisava aceitar se casar com um homem duas vezes mais velho que ela.
Não era de sua vontade – sua mãe bem sabia disso – e por mais que manifestasse insatisfação, seu pai não lhe daria ouvidos. Devia se casar em outubro. Restavam apenas quatro meses para que o sim no altar fosse por ela pronunciado.
Larissa descreveu a seus dois mensageiros particulares – da casta dos mensageiros reais de Gora – todas as características de seu pretendente e que não queria se casar com o príncipe da Hungria. Apesar de contestada por eles, não voltou atrás de sua decisão.
Os mensageiros saíram por todo o Reino da Dalmácia em busca de alguém que satisfizesse as características descritas pela princesa. Até que – cansados de tanto percorrer o reino – chegara a uma aldeia de camponeses no extremo-sul da Dalmácia – ao sul de Dubrovnik.
Lá estava Luki Planinć, um jovem aldeão, trabalhador rural, de porte físico forte, cabelos e olhos castanhos claros, pele branca. Era ele! Sem dúvidas. Logo os dois mensageiros reais se aproximaram dele e lhe perguntaram o nome.
Marki Luki era muito educado e de temperamento sereno – isso agradava muito os mensageiros e com certeza agradaria a princesa. – Os convidou para entrar e comer bolo Imotski, que sua mãe Lode acabara de fazer.
Era tradição em sua casa todos os convidados comerem bolo Imotski, que era feito com as amêndoas produzidas nos fundos daquela humilde moradia e cultivada por Luki e seus irmãos.
Conversaram por longas horas – o sol já se punha atrás de Konavoski Dvori – e Marki Luki lhes convida para dormirem ali. Eles aceitam, pois a região era de grande mata fechada até se perder nas campinas altas fronteiriças ao Reino da Sérvia. Passariam a noite naquela aldeia, pois estavam muito distantes do Reino de Gora.
O Reino de Gora tinha uma forte união com o Reino da Dalmácia. Mas, devido a sua posição geográfica, era mais ambicionado entre todos os reinos dos Bálcãs. Agora estava sob ameaça do Reino da Hungria. Diante da proposta de casamento entre a filha do rei de Gora e do filho do rei da Hungria, os reinos poderiam se fundir. O resultado disso influenciaria totalmente o reino de Gora e poria em risco o Reino da Dalmácia e todo o antigo território croata.
O Reino de Gora tinha apenas um rio que o cortava, na sua nova capital Rijeka. Mas era banhado pelo Mar Adriático. Havia regiões arbóreas muito vastas, com grandes bosques. Também possuía vastas campinas.
Larissa gostava dos jardins de Gora. As lindas flores lhe encantavam. Das suas flores preferidas, se destacavam as fritilárias e a íris-croata – flores símbolo da paz e guerra na Croácia. Na verdade, em seu interior havia uma paz e uma guerra. A paz de estar dentro da fortaleza do castelo real e a guerra de ter que aceitar um casamento de negócios.
O Reino era geralmente de paz, mas estava vivendo agora um cenário crítico com rumores de guerra. Bastava a princesa Larissa recusar o acordo e a guerra eclodiria. Se o parecer húngaro mostrou-se favorável ao rei Joachim, desagradou à maioria dálmata que se opunha e se defendia ao sul.
Caso o Reino de Gora se “vendesse” aos magiares, o Reino da Dalmácia poderia quebrar a aliança de paz e guerrear contra o reino irmão. De certo que o faria, caso o novo Reino de Gora viesse a cobiçar as suas terras.
O Reino estava agora cercado de incertezas, distante de um acordo de paz. Em qualquer de uma das escolhas do rei, a guerra sairia. Isso porque se ele fechasse com o restante do reino, o exército húngaro invadiria pelo norte e primeiramente passaria por Gora.
Estava por eclodir uma guerra e o Reino de Gora bem no meio do combate. Se escolhesse por ficar do lado da Dalmácia, teria o exército Dálmata a seu favor – apesar de boa parte do exército ser fraca e necessitar de uma ajuda dos camponeses. – Caso contrário, entraria na guerra sem exército.
O Reino não tinha mais do que uma mera guarda real. Sua maior fonte de renda estava na venda de flores ao redor do castelo e pra todos os Bálcãs. Sua agricultura também era a fonte de sustento de todo o reino. Suas flores eram conhecidas em toda a região do Mar Adriático como as mais belas e mais perfumadas.
O comércio era feito com todos os povos ao redor e até mesmo com os indianos e persas – apesar destes últimos preferirem o comércio com o Reino da Bósnia. O sucesso levou a fama do Reino além das fronteiras, mas com ela também veio a exposição da família real de Gora. Larissa, a jovem princesa, não era mais desejada apenas pelos húngaros, mas também por príncipes de outros reinos. Afinal, a sua beleza se destacava em meio a outras moças de sua idade.
O Reino da Hungria estava logo ali com sua tropa e proposta pronta a entrar nas terras do norte. O acordo precisava sair em pouco tempo. Mesmo assim, com ou sem acordo, havia rumores de que os magiares invadiriam toda a Croácia em seu grande sonho de dominação.
Larissa era filha única do casal. Tinha 16 anos, adorava música e mitologia grega. Vivia o tempo todo dentro do Castelo Real. Moça educada, discreta, falava croata, latim, grego e russo. Era apaixonada por flores. Adorava as flores croatas do seu imenso jardim no Castelo – a íris-croata era sua preferida. Uma moça de estatura média, cabelos e olhos castanhos claros e pele branca. Idealizou em sua mente que se casaria com algum rapaz de fenótipo idêntico ao seu. Amava a sua cor e queria que seus filhos fossem iguais. Diferente da maneira que seus pais e de toda a sociedade na época pensava, queria se casar com um jovem independente se fosse plebeu ou da alta nobreza. Larissa era teimosa. Não gostava que seus pais nem que seus empregados opinassem sobre suas escolhas. Quanto às suas roupas, ela mesma pedia pra fazer seus vestidos. Era tudo feito segundo o seu agrado. Sua mãe não interferia em nada. Sua cor preferida de vestidos era o azul ciano com detalhes brancos. Er
Dois meses se passaram e faltavam alguns dias para o casamento. A cerimônia ocorreria ali mesmo no Castelo Real de Gora. Os empregados já estavam organizando tudo. Todos estavam empenhados nesse grande evento que marcaria não somente a família Krkić, como todo o reino da Dalmácia. Larissa não estava nada contente com o casamento. Mostrou-se calada nos dias seguintes. Queria encontrar uma saída para dizer não. Pensou e arquitetou mais um plano – O que a princesa aprontaria dessa vez? Aos arredores de Zagreb, estava André II e suas tropas, com seu sobrinho László, nada contentes com o casamento de Kádár com a princesa de Gora. Queriam dominar os dálmatas, mas não poderia ser num acordo de paz. Teriam que fazer algo pra parar o casamento, ainda que fossem capturar o noivo a caminho de Gora. Pensaram em arquitetar um plano. Mas decidiram nada interferir por agora. Eles poderiam se casar. Era só anunciar a guerra, matar Kádár e toda a sua família, reconquistar o t
O príncipe Kádár descendia de uma das famílias reais húngaras, ramificada da família de Estevão I (rei que governou na era de 1000-1038). Kádár e seu pai Franz Kádár tinham toda a soberania no reino. Um reino marcado por grandes batalhas e conquistas. Estavam acostumados a vencer. – Caso uma guerra eclodisse, estariam dispostos a ganhar. Apesar de o pensamento ser de paz. Afinal, o príncipe se casaria com Larissa. À espera de um acordo com os dálmatas, Franz Kádár ansioso em seu Castelo sonhava com possessão de novas terras. A cultura, língua e o povo magiar estariam agora prestes a se fundirem com os eslavos. Seria preciso arquitetar todo o plano. Seu filho, Zoltán, estava contente com o casamento. Uma moça duas vezes mais nova que ele, sim era um motivo para estar contente. Bem distante dali, no Castelo Real de Gora, a princesa Larissa não parava de chorar. Não era ele quem ela queria como esposo. Mas não são as princesas que escolhem os príncipes. Os casamentos sã
Na manhã seguinte, Larissa despertara muito cedo. Antes mesmo da primeira refeição, havia levantado e se reunido com seus mensageiros particulares. O plano era o seguinte: Buscar Luki Planinć para um arriscado encontro nas limitações do Castelo Real. Não! Isso seria um absurdo! – Logo pensou. – Não podemos fazer tal coisa! – Redarguiu um deles. – Não estão vocês debaixo de minha ordem? Portanto, saiam agora sem serem vistos e tragam-no aqui para mim. Vocês no final da noite, enquanto todos dormem, o passarão pela janela de meu quarto. Quero ver esse jovem camponês. Sem hesitar, os mensageiros reais saíram em direção ao extremo sul da Dalmácia. A viagem demoraria algumas horas e se esforçavam o máximo possível para ganhar tempo. Chegando à aldeia dos Planinć, avistaram, de longe, Marki Luki. Ele estava brincando com seu cachorro dálmata. – O cachorro era um ótimo guarda e bom de caça. Luki não os reconheceu à primeira vista, mas quando eles se aproxima
O território croata de pacato vira um grande cenário de guerra. As tropas de László chegam a Zagreb. O Castelo Real é atacado, mas o Rei e toda a família real se escondem e conseguem ficar sãos e salvos. Enquanto isso, em Budapeste, os Kádár seguem tranquilos no Castelo Real, apesar do vexame do casamento do príncipe. O príncipe Kádár volta pro Castelo com um ferimento no braço. Não contou detalhes sobre o ocorrido com Luki às margens do Lago Vermelho. Rapidamente os mensageiros de Zagreb descem com dois terços da pequena tropa croata pra se reunirem em Zadar. O objetivo é proteger o território dálmata dos húngaros que estão chegando em maior número. Não demoram muito e chegam a Zadar, capital da Dalmácia. Logo, o rei convoca a todos os jovens com idade superior a dezoito anos pra se alistarem para a guerra; todos sem exceção. Na aldeia de Luki chega o aviso. Era de madrugada quando foi acordado pelos mensageiros de Zadar. Ele e seus vizinhos jovens tiveram q
Ali no salão real, cheio de fumaça e cinzas, o fogo já havia consumido todos, poupado apenas os dois. Luki correu em direção a Kádár erguendo a sua espada. Em defesa, Kádár levantou o braço e impediu o golpe. Deu um belo giro e quase surpreendeu Luki à altura da cintura. Este defendeu com sua espada. Agora a guerra entre clãs magiares contra o exército da defesa croata dava lugar pra disputa pessoal entre Luki Planinć e Zoltán Kádár. O salão ainda com marcas das chamas liberava fumaça e o teto estava bastante danificado. Um cenário de ruína abrigava todo o sentimento de ódio de Zoltán por Marki Luki. Kádár dominava bem a espada. Fora treinado desde os sete anos de idade. Sabia manejar bem o instrumento de prata em suas mãos. Segurava-o com bastante firmeza e cada movimento era executado com delicadeza. Tinha uma grande precisão e seus golpes eram rápidos. Exigia bastante habilidade de seu defensor. Não era de se movimentar muito pelo salão, dava passos curtos. Perman
Foram dias de incansáveis buscas pelo jovem. Os mensageiros, depois de uma semana, retornam ao Castelo, frustrando as expectativas de Larissa. Mas ainda existe esperança. Ela não desiste. Foram buscas e mais buscas que perduraram por mais um mês. O ano já estava mudando no calendário. Entravam no ano de 1205. “Já estamos há um mês procurando por ele e nada. Não prefere desistir?” – Um dos mensageiros pergunta à princesa. “Lógico que não. Enquanto eu não souber do seu paradeiro, não vou desistir.” – Larissa responde com um olhar um pouco desfalecido. Apesar de tudo, se mostrava vivaz sobre o assunto. Queria de todas as formas ter Luki ali. Mais um mês de buscas intensas até que os mensageiros chegam à região do lago Vransko Jezero – seu nome vem da palavra croata Vrana, que quer dizer corvo. – na região de Vrana. Havia uma vasta vegetação que separava o lago do vilarejo de Vrana. Era uma região muito conhecida como uma reserva ornit
Gora é um reino pequeno, muito ligado à agricultura. Seu nome, em croata significa Reino da Terra. Seu comércio tem mostrado força nos últimos tempos com eslovenos e eslovacos. Luki e Larissa estão preparando os detalhes do casamento, aguardam o grande dia ansiosamente. Larissa está animada. Manda convidar todos os seus parentes. Por seu pai ser descendente de sérvios, tem muitos parentes na outra nação. Sua prima da Bósnia, Louise, também virá. Luki se resume em convidar sua família e vizinhos de seu antigo aldeão. Agora teria uma vida no Castelo Real, lugar em que ele já disfruta em um quarto especial. Seu quarto vai servir pra seus pais que também vão morar ali. Estamos no começo do ano de 1205. As mudanças nos países vizinhos estão acontecendo. O Império Latino tenta expandir seu território e exibir suas forças. Enquanto isso, em Gora havia paz e clima de festa. Mas antes dela acontecer a grande cerimônia, muito trabalho. Os preparativos para o ca