Dois meses se passaram e faltavam alguns dias para o casamento. A cerimônia ocorreria ali mesmo no Castelo Real de Gora. Os empregados já estavam organizando tudo. Todos estavam empenhados nesse grande evento que marcaria não somente a família Krkić, como todo o reino da Dalmácia.
Larissa não estava nada contente com o casamento. Mostrou-se calada nos dias seguintes. Queria encontrar uma saída para dizer não. Pensou e arquitetou mais um plano – O que a princesa aprontaria dessa vez?
Aos arredores de Zagreb, estava André II e suas tropas, com seu sobrinho László, nada contentes com o casamento de Kádár com a princesa de Gora. Queriam dominar os dálmatas, mas não poderia ser num acordo de paz. Teriam que fazer algo pra parar o casamento, ainda que fossem capturar o noivo a caminho de Gora.
Pensaram em arquitetar um plano. Mas decidiram nada interferir por agora. Eles poderiam se casar. Era só anunciar a guerra, matar Kádár e toda a sua família, reconquistar o trono e dominar a Dalmácia. Essas eram as intenções do tio de László.
Enquanto isso no Castelo Real de Budapeste, Kádár aguardava ansioso para o dia do casamento. Estaria agora com o reino da Hungria e de Gora em suas mãos. Não podia esconder a sua satisfação em seu olhar. Américo, seu irmão, também estava contente, pois assim governaria na Hungria, enquanto seu irmão em Gora.
Os mensageiros de Larissa já sabiam do plano, bastava agora avisar Luki de todas as coisas, como fariam pra parar o casamento. Seria um absurdo, mas não tinha outro jeito. A princesa não queria ser infeliz casada com Kádár. Não poderia aceitar um acordo político como matrimônio. Ela queria se casar com Luki.
O vestido de Larissa estava pronto. A seu gosto, conforme ela costumava opinar sobre seus vestidos, ela mandou fazer seu vestido de noiva. Ficou lindo! Um branco trabalhado com pedras brilhantes dava uma sensação de que a lua e as estrelas tivessem vestido a princesa. Era o mais lindo vestido de noiva que já se vira em toda a Dalmácia! Em seu coração, a princesa desejava usá-lo com Luki.
Ela estava feliz pelo vestido. Não porque se casaria com ele. Mas porque com ele seria vista por Luki. Era pra ele que ela se vestiria no dia do seu casamento. Estava ansiosa pelo momento. Mal podia imaginar ver Luki chegando e executando o plano. Não se importava com o que seu pai poderia falar de tudo isso. O importante era o amor que sentia pelo camponês.
Chegou o dia do casamento! As cerimônias tradicionais da Dalmácia são singulares. Não há nada semelhante ao redor do mundo. O noivo Kádár e sua família celebraram uma cerimônia a parte, às margens do Castelo Real de Gora. Depois saíram todos para beber com amigos e familiares a tradicional Rakija. Ao tempo todo, os músicos cantam tradicionais canções da Dalmácia.
Kádár e todos que o acompanhavam estavam com a bandeira da Dalmácia e de Gora nas costas, uma forma de simpatizar com os novos reinos “aliados”. Seguiram caminhada rumo ao Castelo, onde seria realizada a cerimônia. Lá estava Larissa, vestida de noiva. Tudo estava pronto para o casamento. Os convidados estavam às mesas, dentre eles os de Moscou – parentes de Larissa.
E onde estava Luki Planinć agora? Será que estava trabalhando na aldeia?
Os mensageiros já haviam levado Luki para o alto do Castelo em um lugar privilegiado. Teriam conseguido isso, graças ao disfarce de guarda real. Sim, Luki já estava no traje certo e com a sua espada pronta. De lá poderia ter a visão do altar e da chegada do noivo. Diferente das celebrações que costumamos ver, na Dalmácia é o noivo que entra enquanto a noiva o espera no altar.
Larissa estava linda, com um sorriso brilhante estampado no rosto. Estava imóvel ao altar, à espera de Kádár. Agora era só espera-lo entrar pra ter seu plano executado. Se seu pai e o rei da Hungria tinham negócios políticos com esse casamento, Larissa tinha seus planos de por fim à cerimônia. Seu coração batia por outra pessoa, o jovem camponês.
Kádár se aproximava ao som das músicas tradicionais. Todo o público ficou de pé, aplaudindo sua entrada. Enquanto caía uma garoa bem fina, quase imperceptível. Os convidados estavam animados. A cada passo que o príncipe húngaro dava, Larissa via seu plano se concretizando. Nada poderia falhar. As coisas precisavam ser executadas no momento certo. Luki sabia disso e estava aguardando o sinal pra agir.
Os pais de Kádár estavam contentes. Tudo estava saindo muito bem. Em breve, o Reino de Gora seria um pedacinho da Hungria na Dalmácia. Os povos estariam unidos e o governo seria dos húngaros. Tudo conforme fora planejado, bastava um sim no altar e tudo seria entregue nas mãos dos Kádár.
Kádár ao se aproximar do altar, Larissa ergue a cabeça e olha pra Luki. O plano é executado!
Mas o que é isso?! – Exclama a multidão. Um balde de tinta azul e penas brancas são despejados sobre Kádár. Alguns não se contêm e riem. Outros se mostram atônitos, boquiabertos.
– Jävla! Vociferou Kádár. Não acreditava no que estava acontecendo. Enquanto se abaixava pra limpar seu rosto foi surpreendido por um golpe nas costas. Parece que a pancada foi sentida por toda a multidão uníssona em um ai! – Era Luki que descera por uma corda e acertara o príncipe húngaro por trás. Com o impacto, Kádár caiu de cara no bolo. Parte dos convidados caiu nas gargalhadas.
Enfurecido, Kádár limpa o rosto e parte pra cima de Luki. – Bijednik! – esbravejou ele. Os dois começaram a brigar. Nesse instante começa um tumulto generalizado no Castelo. Os convidados começam a brigar, lançar cadeiras, trocar socos. Larissa pega um vaso de barro e acerta Kádár na cabeça, esse cai desacordado. Larissa e Luki fogem.
O rei Joachim fica inconformado com a cena, não sabe o que fazer, seu reino está arruinado e a imagem da família manchada pra sempre. Ninguém está contente com o ocorrido. A festa de casamento vira baderna e o Castelo uma zorra.
Enquanto isso, Luki e Larissa fogem rumo ao sul, com a ajuda de seus mensageiros. As tropas de Kádár os avistam saindo. As intenções são de fugirem para o Lago Vermelho. Estavam se arriscando muito se opondo a todos. Agora Luki conseguiu comprar briga com Kádár.
Sem aceitar os pedidos de desculpa do rei Joachim, o pai de Kádár reúne seu povo pra voltar pra Budapeste. Estão todos envergonhados. Já recuperado da pancada na cabeça, o príncipe Kádár é informado da fuga dos dois, rumo ao sul, e decide ir atrás deles.
Chegaram ao lago vermelho. Já estava de noite e sentaram juntos, abraçados vendo a paisagem. Dois corações apaixonados batendo juntos. Estavam ali realizados por acabar com aquilo que os separaria. Poderiam agora viver juntos esse amor.
Enquanto isso, a notícia do fracasso em Gora corria por toda a Dalmácia e todo o território croata. Não demorou muito pra chegar ao ouvido de László sobre o fim do casamento ainda no altar. Eles comemoraram bastante. Agora nada os impediria de dominar a Dalmácia. Bastava anunciar a guerra e derrotar a potência croata, começando por Zagreb.
Kádár e seus mensageiros foram atrás em busca de Luki e da princesa Larissa. Queria o cadáver dos dois. Estava movido de raiva e possuído por um ódio incurável. Tudo o que queria era enterra-los vivos.
Passariam muitas horas para serem alcançados. Afinal, todo o território croata era rico em vegetação, o que impedia de serem descobertos. Seria um grande desafio descobrir o paradeiro dos dois. Mas não seria impossível.
Os homens de Kádár saíram perguntando a todos os populares sobre a passagem de Luki e da princesa por ali. Algumas informações importantes o levaram para a região do Lago Vermelho.
Às margens do Lago Vermelho estavam Luki e Larissa, despreocupados, contentes pelo feito e realizados pela aventura. Kádár correu na direção dos dois, enfurecido.
– Bijednik! – Gritou Kádár. – Eu vou matar os dois, seus desgraçados!
Luki e Larissa olharam assustados. Kádár queria afoga-los no lago. Desembainhou a espada e apontou-a para o peito de Luki que deu dois passos atrás, já com os pés na água. Luki olhou pra Larissa e disse: “Moj anđeo” – meu anjo vá com os seus mensageiros pra um lugar seguro, preciso mostrar pra ele quem é o mais forte.
Larissa não queria deixa-lo ali. Sabia que ele não passava de um camponês, não tinha muita habilidade com a espada. Temia que o pior acontecesse. Mesmo relutante teve que ir. Luki puxou sua espada e a luta começou. Começaram a lutar dentro do lago. Kádár parecia melhor, era mais rápido pra executar os movimentos. Depois de muita luta, um golpe no braço direito de Kádár o fez largar sua espada no chão por um momento, sua respiração era ofegante.
Mas a briga não terminava ali. Levantando-se bruscamente, por poucos milímetros Kádár não acerta Luki em cheio no rosto. Marki Luki sem muita habilidade com a espada conseguiu se defender até que, com câimbras, Zádár recuou.
Larissa não poderia voltar para o Castelo, pelo menos por agora. Os mensageiros precisavam achar lugar seguro para ela. Foram para o alto do monte Kamešnica. Do alto era possível ver tudo, tanto a Croácia como a Bósnia, estavam seguros.
Luki não continuaria lutando, mesmo que em leve vantagem contra seu oponente. Kádár resolveu voltar com seus homens, olhando fixamente para o rosto de Luki.
– Você me paga, seu inútil!
O príncipe Kádár descendia de uma das famílias reais húngaras, ramificada da família de Estevão I (rei que governou na era de 1000-1038). Kádár e seu pai Franz Kádár tinham toda a soberania no reino. Um reino marcado por grandes batalhas e conquistas. Estavam acostumados a vencer. – Caso uma guerra eclodisse, estariam dispostos a ganhar. Apesar de o pensamento ser de paz. Afinal, o príncipe se casaria com Larissa. À espera de um acordo com os dálmatas, Franz Kádár ansioso em seu Castelo sonhava com possessão de novas terras. A cultura, língua e o povo magiar estariam agora prestes a se fundirem com os eslavos. Seria preciso arquitetar todo o plano. Seu filho, Zoltán, estava contente com o casamento. Uma moça duas vezes mais nova que ele, sim era um motivo para estar contente. Bem distante dali, no Castelo Real de Gora, a princesa Larissa não parava de chorar. Não era ele quem ela queria como esposo. Mas não são as princesas que escolhem os príncipes. Os casamentos sã
Na manhã seguinte, Larissa despertara muito cedo. Antes mesmo da primeira refeição, havia levantado e se reunido com seus mensageiros particulares. O plano era o seguinte: Buscar Luki Planinć para um arriscado encontro nas limitações do Castelo Real. Não! Isso seria um absurdo! – Logo pensou. – Não podemos fazer tal coisa! – Redarguiu um deles. – Não estão vocês debaixo de minha ordem? Portanto, saiam agora sem serem vistos e tragam-no aqui para mim. Vocês no final da noite, enquanto todos dormem, o passarão pela janela de meu quarto. Quero ver esse jovem camponês. Sem hesitar, os mensageiros reais saíram em direção ao extremo sul da Dalmácia. A viagem demoraria algumas horas e se esforçavam o máximo possível para ganhar tempo. Chegando à aldeia dos Planinć, avistaram, de longe, Marki Luki. Ele estava brincando com seu cachorro dálmata. – O cachorro era um ótimo guarda e bom de caça. Luki não os reconheceu à primeira vista, mas quando eles se aproxima
O território croata de pacato vira um grande cenário de guerra. As tropas de László chegam a Zagreb. O Castelo Real é atacado, mas o Rei e toda a família real se escondem e conseguem ficar sãos e salvos. Enquanto isso, em Budapeste, os Kádár seguem tranquilos no Castelo Real, apesar do vexame do casamento do príncipe. O príncipe Kádár volta pro Castelo com um ferimento no braço. Não contou detalhes sobre o ocorrido com Luki às margens do Lago Vermelho. Rapidamente os mensageiros de Zagreb descem com dois terços da pequena tropa croata pra se reunirem em Zadar. O objetivo é proteger o território dálmata dos húngaros que estão chegando em maior número. Não demoram muito e chegam a Zadar, capital da Dalmácia. Logo, o rei convoca a todos os jovens com idade superior a dezoito anos pra se alistarem para a guerra; todos sem exceção. Na aldeia de Luki chega o aviso. Era de madrugada quando foi acordado pelos mensageiros de Zadar. Ele e seus vizinhos jovens tiveram q
Ali no salão real, cheio de fumaça e cinzas, o fogo já havia consumido todos, poupado apenas os dois. Luki correu em direção a Kádár erguendo a sua espada. Em defesa, Kádár levantou o braço e impediu o golpe. Deu um belo giro e quase surpreendeu Luki à altura da cintura. Este defendeu com sua espada. Agora a guerra entre clãs magiares contra o exército da defesa croata dava lugar pra disputa pessoal entre Luki Planinć e Zoltán Kádár. O salão ainda com marcas das chamas liberava fumaça e o teto estava bastante danificado. Um cenário de ruína abrigava todo o sentimento de ódio de Zoltán por Marki Luki. Kádár dominava bem a espada. Fora treinado desde os sete anos de idade. Sabia manejar bem o instrumento de prata em suas mãos. Segurava-o com bastante firmeza e cada movimento era executado com delicadeza. Tinha uma grande precisão e seus golpes eram rápidos. Exigia bastante habilidade de seu defensor. Não era de se movimentar muito pelo salão, dava passos curtos. Perman
Foram dias de incansáveis buscas pelo jovem. Os mensageiros, depois de uma semana, retornam ao Castelo, frustrando as expectativas de Larissa. Mas ainda existe esperança. Ela não desiste. Foram buscas e mais buscas que perduraram por mais um mês. O ano já estava mudando no calendário. Entravam no ano de 1205. “Já estamos há um mês procurando por ele e nada. Não prefere desistir?” – Um dos mensageiros pergunta à princesa. “Lógico que não. Enquanto eu não souber do seu paradeiro, não vou desistir.” – Larissa responde com um olhar um pouco desfalecido. Apesar de tudo, se mostrava vivaz sobre o assunto. Queria de todas as formas ter Luki ali. Mais um mês de buscas intensas até que os mensageiros chegam à região do lago Vransko Jezero – seu nome vem da palavra croata Vrana, que quer dizer corvo. – na região de Vrana. Havia uma vasta vegetação que separava o lago do vilarejo de Vrana. Era uma região muito conhecida como uma reserva ornit
Gora é um reino pequeno, muito ligado à agricultura. Seu nome, em croata significa Reino da Terra. Seu comércio tem mostrado força nos últimos tempos com eslovenos e eslovacos. Luki e Larissa estão preparando os detalhes do casamento, aguardam o grande dia ansiosamente. Larissa está animada. Manda convidar todos os seus parentes. Por seu pai ser descendente de sérvios, tem muitos parentes na outra nação. Sua prima da Bósnia, Louise, também virá. Luki se resume em convidar sua família e vizinhos de seu antigo aldeão. Agora teria uma vida no Castelo Real, lugar em que ele já disfruta em um quarto especial. Seu quarto vai servir pra seus pais que também vão morar ali. Estamos no começo do ano de 1205. As mudanças nos países vizinhos estão acontecendo. O Império Latino tenta expandir seu território e exibir suas forças. Enquanto isso, em Gora havia paz e clima de festa. Mas antes dela acontecer a grande cerimônia, muito trabalho. Os preparativos para o ca
Chega o mês de março e ainda nenhuma mudança fora votada. As notícias são da Turquia. Em Adramício, uma batalha é travada pelo Império Latino. O rei Joachim teme que em algum momento os latinos invadam Gora e toda a Dalmácia. A única divisão entre os reinos era o Mar Adriático. Mas os latinos pleiteavam outras terras. Já haviam demonstrado força com o apoio franco contra os gregos do Peloponeso, agora estavam em solo turco. De um lado, o Império de Niceia sob o comando de Constantino e Teodoro, de outro, o Império Latino sob o comando de Henrique de Flandres. Os latinos estavam embalados sob a conquista de Constantinopla e a queda do Império Bizantino no ano anterior. Queriam mais uma conquista, dessa vez contra o Império de Niceia. A batalha teve o apoio dos armênios que deram gás a Henrique. O desfecho disso fez com que todos temessem o Império Latino, graças à sua vitória. O feudalismo dava as suas caras e na primeira reunião geral em Zagreb, Luki viaja s
Nos primeiros dias do ano de 1206, o Rei Joachim morre no Castelo de Frankopan, na ilha de Krk. A família Krkić e a família Planinć, bem como todo o Reino e reinos aliados estavam enlutados pela grande perda. Foi um mês inteiro de luto. Larissa estava inconsolável. Com o conforto do abraço de Luki e da rainha Irina, estava aos prantos no Castelo de Krk. Seu pai foi enterrado ali mesmo. A cerimônia fúnebre lotou a ilha com a presença dos reis da Dalmácia e da Croácia (Zagreb-Eslavônia). O Rei da Dalmácia sabia muito bem o que era ver a morte. Com a invasão magiar na Batalha de Gora, ele e sua família correram grande perigo. Mas a perda de um grande rei como Joachim era inestimável. No final de janeiro eclode a Batalha de Rusião. De um lado Kaloyan, de outro Thierry de Termonde. Travaram uma batalha e todos os homens de Termonde foram mortos, inclusive ele. Mais uma vitória decisiva para os búlgaros. O Reino da Hungri