Larissa era filha única do casal. Tinha 16 anos, adorava música e mitologia grega. Vivia o tempo todo dentro do Castelo Real. Moça educada, discreta, falava croata, latim, grego e russo. Era apaixonada por flores. Adorava as flores croatas do seu imenso jardim no Castelo – a íris-croata era sua preferida.
Uma moça de estatura média, cabelos e olhos castanhos claros e pele branca. Idealizou em sua mente que se casaria com algum rapaz de fenótipo idêntico ao seu. Amava a sua cor e queria que seus filhos fossem iguais. Diferente da maneira que seus pais e de toda a sociedade na época pensava, queria se casar com um jovem independente se fosse plebeu ou da alta nobreza.
Larissa era teimosa. Não gostava que seus pais nem que seus empregados opinassem sobre suas escolhas. Quanto às suas roupas, ela mesma pedia pra fazer seus vestidos. Era tudo feito segundo o seu agrado. Sua mãe não interferia em nada. Sua cor preferida de vestidos era o azul ciano com detalhes brancos. Era uma princesa elegante e atraente por sua beleza natural, tinha um sorriso impecável e um olhar conquistador.
Sua comida preferida era Orehnjača – um pão enrolado com nozes no aspecto de um rocambole – que a princesa de Gora apreciava muito antes do almoço e do jantar. As empregadas da cozinha real todos os dias preparavam esse pão de café-da-manhã pra princesa.
Larissa gostava muito de ler e passava horas dedicando-se à mitologia grega. Em suas aulas de história, prestava mais atenção quando o assunto era a cultura grega. Seu sonho era um dia conhecer Atenas. Até mesmo já havia passado por sua cabeça um dia conhecer um príncipe grego. – Isso seria impossível. Os dois países não tinham ligação alguma. Talvez em tempos mais remotos com o Império Greco-Macedônico. Atualmente nada os ligava.
Dedicada à música, Larissa tocava flauta todas as tardes em seu quarto no Castelo. Era a alegria real ouvir as notas suavemente emitidas por ela. Todas as emoções eram digitadas e traduzidas por ela na flauta. Era o seu momento de detox da alma. Ali ela conectava seus pensamentos positivos à música e se desligava de seus problemas e preocupações. – Embora não tivesse com o que se preocupar, estava agora diante da fase mais difícil de sua vida.
Larissa iria se casar com o príncipe húngaro Kádár. Ele tinha o dobro de sua idade e uma barriga não pouco saliente denunciava sua falta de cuidados com a alimentação. Larissa era muito cuidadosa quanto a isso. Pra ela, seu par perfeito deveria cuidar-se assim como ela se cuidava. Quando soube de Luki, soube que ele era um rapaz forte, se interessou e desejou um dia vê-lo. – Mas como? Só se ele fosse levado até o Castelo em um encontro escondido. Será? Seria loucura de mais.
Larissa tinha horas de sessão de beleza diariamente. O seu banho real – duas vezes ao dia – era feito com rosas aromáticas e flores cultivadas em seu jardim real. Tudo era bem caprichado pra deixar a princesa magnífica. Ela era mesmo deslumbrante. Sua beleza estava em cada contorno de seu corpo. Nenhuma marca de imperfeição, a sua pele era impecável.
As empregadas ainda cuidavam de sua maquiagem num trabalho minucioso. Cada detalhe era importante pra agradar a princesa que era muito exigente. Eram algumas horas de cuidados diários. Apesar de não precisar de tudo isso, pois a sua beleza natural era exuberante. Uma linda donzela cuidadosa e bem vestida. O desejo de qualquer príncipe europeu. Jamais se passou pela cabeça do jovem camponês Luki Planinć se interessar por uma princesa como Larissa. Ela era de uma beleza invejável.
Antes dos húngaros aparecerem, seu pai rei Joachim havia pensado em prometê-la em casamento a David Handanovič, seu primo da Eslovênia. O jovem era de seu agrado e de toda a família real. Cinco anos mais velho que Larissa, tinha cabelos loiros e olhos azuis, de estatura alta e voz grave. Larissa e David haviam conversado uma única vez numa reunião de família em Ljubljana – capital eslovena, no Castelo Real dos Handanovič.
Larissa tinha um problema incômodo que quinzenalmente se agravava, fortes dores de cabeça – sofria de enxaqueca crônica – e isso a deixava acamada por alguns dias. Mesmo assim não lhe faltava disposição pra desenhar vestidos. Era seu hobby, o que ela mais fazia trancada no quarto do Castelo.
Seu chá preferido das tardes era o chá de melissa. Todos os dias, às três da tarde, pedia a uma de suas empregadas que preparasse o chá de melissa. Passava o tempo todo do chá com suas empregadas e às vezes sua mãe conversando de moda. Era uma estilista por natureza. Amava vestidos e agora teria que começar a pensar em seu vestido de casamento. – O que a princesa não queria que acontecesse. Pelo menos não o queria com o príncipe Kádár.
Além de moda ela amava música – isso sabe por sua dedicação à flauta, mas também amava dança – com a dança Drmes. Poderia a cada fim de semana – quando ela praticava a dança – ser um ensaio para o seu casamento, pois a dança era comum ser executada em casamentos.
Estava agora a princesa com um dilema: O que fazer de sua vida? Não queria de modo algum casar-se com Kádár. Ele não era nem um pouco atraente. Também desconhecia o interesse de seu pai por uma aliança com os húngaros. A vida em Gora estava sossegada, era um reino que não tinha que se preocupar com nada. Viviam felizes sem precisar de ajuda extra de ninguém.
Larissa não entendia a escolha de seu pai e não gostava nem de passar por ele pelos corredores do Castelo. As refeições ela fazia separadamente com as empregadas na sala de jantar dos empregados. Ali ela chorava e desabafava nos braços de suas empregadas. Não queria imaginar casando-se com o húngaro gordo de orelhas gigantes – por isso, ela o apelidara de ušima.
Estava marcada a data para outubro de 1204. Tudo pronto para o casamento de Larissa. Os preparativos já estavam bastante adiantados. Sua mãe – apesar da insatisfação momentânea – mostrou-se contente e já convidara suas primas e irmãos para a festa.
Larissa tinha um sonho: ser feliz em seu casamento. Percebia a falta disso nas famílias reais espalhadas por toda a Europa. Não havia felicidade entre os casais. Ela não queria isso pra ela. Estava pensando no seu futuro, mais importava a sua felicidade que o futuro das relações econômicas do Reino. Apesar da frustração do momento, Larissa estava contente. Ainda tinha esperanças de encontrar-se com o desconhecido camponês do extremo sul da Dalmácia e talvez casar-se com ele. – Seria um sonho utópico de mais pra ser alimentado pela jovem princesa.
A princesa de Gora tinha um belo sorriso. Ao sorrir, era como que o sol recolhe-se para deixar brilhar no céu o esplendor de seu lindo sorriso. Ela era mesmo um anđeo em pessoa. Uma alma tão dócil involucrada em corpo de menina. Ainda um traço pueril em seu olhar marcava seu sutil desejo de crescer. Era ainda jovem, muito jovem. Ainda dormia com bonecas. Despreparada para receber o calor de um homem às noites, não poderia ainda sonhar com um casamento.
A jovem donzela tinha um caminhar delicado diferente de sua mãe que tinha um jeito trôpego de andar. Sua beleza estava estampada por toda a parte do Castelo. Era de fato uma princesa da mais alta realeza. Uma menina de plava krv, sem dúvidas. Com um carisma contagiante, fazia todos rirem por onde passava. Era bastante bem humorada. Apaixonada pela vida, não dava lugar a tempo ruim. Mesmo debaixo de chuva visitava seu jardim todas as manhãs. Gostava de colher uma flor e escrever um verso de romance e juntamente com a flor guardar num envelope. Tudo ia pro seu baú – que funcionava como uma espécie de diário – no canto esquerdo de seu quarto, abaixo da prateleira das bonecas – Larissa tinha muitas bonecas. Sua preferida era de Moscou. Ganhara de uma tia da família real russa.
Em um de seus versos, Larissa escreve sobre o que deseja para o seu futuro amoroso:
Neka bude nježna i istovremeno intenzivna – Que seja suave e, ao mesmo tempo, intenso.
Era uma romancista que amava escrever versos curtos. Talvez sonhasse um dia realizar todos os desejos de seu coração. Ela amava literatura persa. Seu autor preferido era Attar de Nishapur. Amava ler os poemas persas e neles buscava inspiração.
Escreveu um curto poema que revela um desejo intenso, algo inesperado de uma jovem donzela:
Držite me sa svojim poljupcem i pustite me samo nakon što vas zadovolnem - Prenda-me com seu beijo e deixe-me ir somente depois de te satisfazer.
Além de tanto talento, dedicava-se aos cuidados de seus longos cabelos castanhos. Não os cortava. Era tradição jamais cortar um fio de cabelo. Era a beleza da mulher croata e, pra uma princesa, nada mais lindo que um longo cabelo.
Tinha uma intensa paixão por calçados – as sapatilhas brilhantes –, todavia os calçados turcos eram os mais encantadores pra ela. Certa vez, ganhou de presente uma sapatilha vinda de Constantinopla. Ela era apaixonada pelos calçados. E em seu casamento, com qual calçado entraria na cerimônia?
Dificilmente isso passava por sua cabeça. De tudo o que queria ocultar da memória era o fato de que iria infelizmente se casar. Não queria nem pensar em seu casamento, seria um fracasso.
Ao ver a lua cheia do alto do Castelo, Larissa recebia uma brisa em seu rosto e pensava em um plano – um perigoso plano de encontrar-se com Luki. Uma aventura!
Dois meses se passaram e faltavam alguns dias para o casamento. A cerimônia ocorreria ali mesmo no Castelo Real de Gora. Os empregados já estavam organizando tudo. Todos estavam empenhados nesse grande evento que marcaria não somente a família Krkić, como todo o reino da Dalmácia. Larissa não estava nada contente com o casamento. Mostrou-se calada nos dias seguintes. Queria encontrar uma saída para dizer não. Pensou e arquitetou mais um plano – O que a princesa aprontaria dessa vez? Aos arredores de Zagreb, estava André II e suas tropas, com seu sobrinho László, nada contentes com o casamento de Kádár com a princesa de Gora. Queriam dominar os dálmatas, mas não poderia ser num acordo de paz. Teriam que fazer algo pra parar o casamento, ainda que fossem capturar o noivo a caminho de Gora. Pensaram em arquitetar um plano. Mas decidiram nada interferir por agora. Eles poderiam se casar. Era só anunciar a guerra, matar Kádár e toda a sua família, reconquistar o t
O príncipe Kádár descendia de uma das famílias reais húngaras, ramificada da família de Estevão I (rei que governou na era de 1000-1038). Kádár e seu pai Franz Kádár tinham toda a soberania no reino. Um reino marcado por grandes batalhas e conquistas. Estavam acostumados a vencer. – Caso uma guerra eclodisse, estariam dispostos a ganhar. Apesar de o pensamento ser de paz. Afinal, o príncipe se casaria com Larissa. À espera de um acordo com os dálmatas, Franz Kádár ansioso em seu Castelo sonhava com possessão de novas terras. A cultura, língua e o povo magiar estariam agora prestes a se fundirem com os eslavos. Seria preciso arquitetar todo o plano. Seu filho, Zoltán, estava contente com o casamento. Uma moça duas vezes mais nova que ele, sim era um motivo para estar contente. Bem distante dali, no Castelo Real de Gora, a princesa Larissa não parava de chorar. Não era ele quem ela queria como esposo. Mas não são as princesas que escolhem os príncipes. Os casamentos sã
Na manhã seguinte, Larissa despertara muito cedo. Antes mesmo da primeira refeição, havia levantado e se reunido com seus mensageiros particulares. O plano era o seguinte: Buscar Luki Planinć para um arriscado encontro nas limitações do Castelo Real. Não! Isso seria um absurdo! – Logo pensou. – Não podemos fazer tal coisa! – Redarguiu um deles. – Não estão vocês debaixo de minha ordem? Portanto, saiam agora sem serem vistos e tragam-no aqui para mim. Vocês no final da noite, enquanto todos dormem, o passarão pela janela de meu quarto. Quero ver esse jovem camponês. Sem hesitar, os mensageiros reais saíram em direção ao extremo sul da Dalmácia. A viagem demoraria algumas horas e se esforçavam o máximo possível para ganhar tempo. Chegando à aldeia dos Planinć, avistaram, de longe, Marki Luki. Ele estava brincando com seu cachorro dálmata. – O cachorro era um ótimo guarda e bom de caça. Luki não os reconheceu à primeira vista, mas quando eles se aproxima
O território croata de pacato vira um grande cenário de guerra. As tropas de László chegam a Zagreb. O Castelo Real é atacado, mas o Rei e toda a família real se escondem e conseguem ficar sãos e salvos. Enquanto isso, em Budapeste, os Kádár seguem tranquilos no Castelo Real, apesar do vexame do casamento do príncipe. O príncipe Kádár volta pro Castelo com um ferimento no braço. Não contou detalhes sobre o ocorrido com Luki às margens do Lago Vermelho. Rapidamente os mensageiros de Zagreb descem com dois terços da pequena tropa croata pra se reunirem em Zadar. O objetivo é proteger o território dálmata dos húngaros que estão chegando em maior número. Não demoram muito e chegam a Zadar, capital da Dalmácia. Logo, o rei convoca a todos os jovens com idade superior a dezoito anos pra se alistarem para a guerra; todos sem exceção. Na aldeia de Luki chega o aviso. Era de madrugada quando foi acordado pelos mensageiros de Zadar. Ele e seus vizinhos jovens tiveram q
Ali no salão real, cheio de fumaça e cinzas, o fogo já havia consumido todos, poupado apenas os dois. Luki correu em direção a Kádár erguendo a sua espada. Em defesa, Kádár levantou o braço e impediu o golpe. Deu um belo giro e quase surpreendeu Luki à altura da cintura. Este defendeu com sua espada. Agora a guerra entre clãs magiares contra o exército da defesa croata dava lugar pra disputa pessoal entre Luki Planinć e Zoltán Kádár. O salão ainda com marcas das chamas liberava fumaça e o teto estava bastante danificado. Um cenário de ruína abrigava todo o sentimento de ódio de Zoltán por Marki Luki. Kádár dominava bem a espada. Fora treinado desde os sete anos de idade. Sabia manejar bem o instrumento de prata em suas mãos. Segurava-o com bastante firmeza e cada movimento era executado com delicadeza. Tinha uma grande precisão e seus golpes eram rápidos. Exigia bastante habilidade de seu defensor. Não era de se movimentar muito pelo salão, dava passos curtos. Perman
Foram dias de incansáveis buscas pelo jovem. Os mensageiros, depois de uma semana, retornam ao Castelo, frustrando as expectativas de Larissa. Mas ainda existe esperança. Ela não desiste. Foram buscas e mais buscas que perduraram por mais um mês. O ano já estava mudando no calendário. Entravam no ano de 1205. “Já estamos há um mês procurando por ele e nada. Não prefere desistir?” – Um dos mensageiros pergunta à princesa. “Lógico que não. Enquanto eu não souber do seu paradeiro, não vou desistir.” – Larissa responde com um olhar um pouco desfalecido. Apesar de tudo, se mostrava vivaz sobre o assunto. Queria de todas as formas ter Luki ali. Mais um mês de buscas intensas até que os mensageiros chegam à região do lago Vransko Jezero – seu nome vem da palavra croata Vrana, que quer dizer corvo. – na região de Vrana. Havia uma vasta vegetação que separava o lago do vilarejo de Vrana. Era uma região muito conhecida como uma reserva ornit
Gora é um reino pequeno, muito ligado à agricultura. Seu nome, em croata significa Reino da Terra. Seu comércio tem mostrado força nos últimos tempos com eslovenos e eslovacos. Luki e Larissa estão preparando os detalhes do casamento, aguardam o grande dia ansiosamente. Larissa está animada. Manda convidar todos os seus parentes. Por seu pai ser descendente de sérvios, tem muitos parentes na outra nação. Sua prima da Bósnia, Louise, também virá. Luki se resume em convidar sua família e vizinhos de seu antigo aldeão. Agora teria uma vida no Castelo Real, lugar em que ele já disfruta em um quarto especial. Seu quarto vai servir pra seus pais que também vão morar ali. Estamos no começo do ano de 1205. As mudanças nos países vizinhos estão acontecendo. O Império Latino tenta expandir seu território e exibir suas forças. Enquanto isso, em Gora havia paz e clima de festa. Mas antes dela acontecer a grande cerimônia, muito trabalho. Os preparativos para o ca
Chega o mês de março e ainda nenhuma mudança fora votada. As notícias são da Turquia. Em Adramício, uma batalha é travada pelo Império Latino. O rei Joachim teme que em algum momento os latinos invadam Gora e toda a Dalmácia. A única divisão entre os reinos era o Mar Adriático. Mas os latinos pleiteavam outras terras. Já haviam demonstrado força com o apoio franco contra os gregos do Peloponeso, agora estavam em solo turco. De um lado, o Império de Niceia sob o comando de Constantino e Teodoro, de outro, o Império Latino sob o comando de Henrique de Flandres. Os latinos estavam embalados sob a conquista de Constantinopla e a queda do Império Bizantino no ano anterior. Queriam mais uma conquista, dessa vez contra o Império de Niceia. A batalha teve o apoio dos armênios que deram gás a Henrique. O desfecho disso fez com que todos temessem o Império Latino, graças à sua vitória. O feudalismo dava as suas caras e na primeira reunião geral em Zagreb, Luki viaja s