Desperto com os primeiros raios de sol penetrando pela janela. Abro os olhos lentamente, lutando contra a sensação de peso em minha cabeça. Com a visão embaçada, levo alguns segundos para que as formas ao meu redor se tornem mais nítidas.
Ao tentar me mexer, sinto as pernas de alguém entrelaçadas às minhas e um braço pesando em minha cintura. Tapo a boca para conter um grito surpreso quando me dou conta da situação em que me encontro. Ao virar o rosto lentamente, encontro um homem nu dormindo serenamente ao meu lado. — Oh, meu Deus! — resmungo, tampando a boca novamente quando ele se mexe, apenas para se virar para o outro lado. Em uma tentativa de não o acordar, me levanto com cuidado e quase corro para o banheiro. Sento-me na privada, prendo os cabelos entre os dedos e apoio a cabeça entre as pernas, tentando me lembrar de como vim parar aqui. — Droga, droga, droga! — murmuro quando alguns flashes da noite passada surgem em minha mente. — Merda de aposta idiota! Respiro fundo, tentando conter a vergonha que me atinge, e levanto-me para lavar o rosto. Ao parar em frente ao enorme espelho na parede, percebo quão intensa a noite foi. Cabelos bagunçados, algumas marcas vermelhas espalhadas pelo corpo e as nádegas marcadas por dedos, evidenciando a intensidade da noite que tivemos. — Não acredito que fiz isso! — sussurro, negando com a cabeça. Ciente de que já é tarde para arrependimentos, termino de lavar o rosto e saio do banheiro. Meu coração b**e acelerado quando chego ao quarto e encontro Sean sentado na cama, esfregando as mãos no rosto. Rapidamente, puxo o lençol para me enrolar e ele arregala os olhos ao me ver. — Buongiorno, bella. Sei ancora qui... — Ele faz uma pausa, notando minha expressão confusa, e repete em inglês para que eu entenda: — Bom dia, linda. Vejo que continua aqui. — Bom dia. Sim, mas… preciso ir — respondo, notando minha voz trêmula enquanto pego meu vestido jogado no chão. — Eu… não queria acordar você. — Fique um pouco mais, posso pedir um café. Acredito que na noite passada, nós dois bebemos mais do que deveríamos. — Não se preocupe, realmente preciso ir — repito e balanço o vestido, sentindo minha bochecha esquentar de vergonha. — Pode se virar, por favor? Prometo que será rápido! — Não me lembro muito, mas após o que fizemos, acho que isso não é necessário. Passo a mão nos cabelos, revirando os olhos antes de ir para o banheiro e trocar de roupa. Ao voltar para o quarto, encontro-o em pé, ainda nu, mexendo em seu celular. Sua fisionomia, antes relaxada, agora transparece estresse e algo que não consigo decifrar. — Estou indo — aviso, pegando minha bolsa. — Tenha um bom dia. Com um último olhar, me despeço do homem que, se Deus quiser, nunca mais verei, e sigo em direção à saída. Ao chegar no saguão do hotel, pego meu celular e, após desbloquear o aparelho, encontro diversas ligações perdidas de Emily, a última há poucos minutos. — Droga, me esqueci dela! — exclamo, indo em direção à saída enquanto retorno à ligação, atendida no primeiro toque. — Oi, Emily! — Zoe, onde você estava? Te liguei milhões de vezes! — diz, evidenciando a urgência. Solto um suspiro. — É uma longa história. O que aconteceu? — Está sentada? Porque tenho uma péssima notícia para te dar. {…} O céu nublado e o clima frio de Manhattan transmitem exatamente o que sinto: tristeza. Alguns dias se passaram desde a péssima notícia que Emily me deu: a morte de Richard Gallagher, nosso chefe, que abalou a todos, principalmente a mim. — Ainda não acredito que isso aconteceu. — sussurro enquanto Emily e eu nos sentamos em um dos bancos vazios da igreja. — Enquanto ele precisava de mim, eu estava me divertindo com um desconhecido. Você tem noção do quanto isso é errado? — Ninguém podia prever isso, Zoe. Por favor, não se culpe. Além disso, ele faleceu em casa, o que significa que sua presença teria sido indiferente. Mesmo com as palavras de conforto, sinto meu coração pesar de tristeza e arrependimento. Com um soluço, observo o caixão à nossa frente e rezo baixinho para que tudo isso seja apenas um pesadelo. À medida que as pessoas ocupam seus lugares na igreja, reconheço rostos conhecidos: colegas de trabalho, amigos de longa data e familiares distantes, todos com semblantes sombrios de luto. Meu olhar percorre a igreja e arqueio as sobrancelhas ao ver um rosto quase familiar na primeira fileira, ao lado de um rapaz mais jovem, recebendo condolências de algumas pessoas da empresa. — O que você está fazendo aqui? — murmuro, passando a mão nos cabelos. Mesmo em meio à tristeza, começo a juntar as peças do quebra-cabeça. — Sean Rossi… Gallagher. Não acredito nisso! — Falou comigo? — Emily pergunta, levantando a sobrancelha. Antes que eu possa responder, ele olha para nós como um ímã. Ao me reconhecer, vejo a fisionomia dele se transformar. A raiva surge em seus olhos, e ele me encara com uma intensidade que quase me faz desviar o olhar. Sem tempo para digerir a situação, a cerimônia fúnebre chega ao fim. Com o coração acelerado pela despedida e pela surpresa, seguimos em direção ao cemitério. Durante o funeral, nossos olhares se encontram várias vezes, aumentando a tensão. Por um momento, esqueço a presença de Sean e mantenho meu olhar focado no caixão que desce lentamente para a terra. As palavras do padre se perdem entre as memórias que surgem em minha mente. Com uma rosa-branca jogada suavemente sobre o caixão, me despeço do homem que foi fundamental para quem sou hoje. — Srta. Adkins, espere. — Sr. Freeman, amigo pessoal e um dos advogados de Richard, me chama assim que Emily e eu nos afastamos para sair. Me viro abruptamente para encará-lo, percebendo Sean se aproximando de nós. — Posso ajudá-lo, Sr. Freeman? — Preciso que nos acompanhe até o escritório de Richard. Leremos o testamento e sua presença é indispensável. — Eu? — pergunto, franzindo as sobrancelhas no mesmo momento em que vejo Sean parar ao lado do advogado. — Mas… — Agora, sim, tudo faz sentido. — Sean me interrompe em um tom alto, visivelmente insatisfeito.Completamente confusa com suas palavras, abro a boca para questionar, mas sou interrompida pelo advogado. Ignorando o olhar acusatório de Sean, concordo com a cabeça e sigo para o meu carro. Por opção minha, Emily me acompanha e em poucos minutos chegamos à sede da Blue Earth Gallagher Co.— Obrigado por vir, Srta. Adkins. — Sr. Freeman diz, apontando para uma das cadeiras.Sean senta-se na cadeira que há anos pertenceu ao seu pai. Com toda a imponência que só um Gallagher parece ter, ele se ajeita no assento, entrelaçando os dedos sobre a mesa.— Prossiga, Sr. Freeman. — ele ordena, num tom autoritário. — Essa… mulher já está aqui, não há motivos para tomar ainda mais o meu tempo.— Talvez você não se importe, mas perdemos uma pessoa especial aqui e ainda estamos nos recuperando, Sr. Rossi. — comento, ressaltando o sobrenome que ele me deu naquela noite.— Imagino que tenha sido uma grande perda. Principalmente para você, não é mesmo?— Sim, porque Richard era…— Richard… Quanta inti
Os primeiros dias na empresa sem a presença de Richard foram os piores em muitos anos. Foi difícil chegar pela manhã trazendo apenas o meu café, e ainda mais difícil não ter ninguém reclamando sobre o clima, independentemente se estivesse frio ou calor.Para o meu alívio, as duas últimas semanas transcorreram sem a presença de Sean, que foi à Itália organizar tudo para se mudar de vez para Manhattan e assumir seu lugar à frente da Blue Earth. Mas, para a minha infelicidade, hoje ele retorna à empresa e tudo o que desejo é que ele pare de me enxergar como inimiga. Ou será difícil cumprir o último desejo de Richard.— Oh, você está aqui. — Ivy, do departamento jurídico, diz, abrindo um sorriso caloroso ao me ver sentada em uma cafeteria em frente à empresa. — Posso me sentar?— Claro! Fique à vontade.— Não sabia que você tomava café aqui. — ela comenta, sinalizando para a garçonete. Esboço um leve sorriso, levando minha xícara de café expresso à boca.— Estou tentando criar novos hábit
Nas últimas duas semanas, enfrentei a intensa pressão e hostilidade de Sean, que fez de tudo para me desestabilizar. Apesar disso, mantive-me focada no trabalho, recusando-me a ceder. Como consequência, trabalhei muito mais nestes últimos dias do que em anos ao lado de Richard.Sean não estava mentindo quando disse que tornaria a minha vida um inferno, mas o que ele não sabe é que vim de um e não estou disposta a ceder tão facilmente.Após essas semanas de intensa batalha, mesmo com a exaustão atingindo seu ápice e os sintomas de uma gripe se aproximando, dar o gostinho a Sean de me ver desistir está fora de cogitação. Afinal, meu futuro depende disso.— A sua cara está péssima. — Emily comenta, assim que nos encontramos na cafeteria em frente à empresa. — Você tem certeza que pode trabalhar assim? Você deveria ir ao médico.— É apenas um resfriado bobo, Emily. Tomei um remédio antes de vir trabalhar, daqui a pouco isso passa. Atchim!— Saúde! — ela deseja, entregando-me um guardanapo
As palavras do médico ecoam em minha mente imediatamente, fazendo uma onda de choque percorrer pelo meu corpo. Grávida? A ideia parece tão surreal, que é como se eu estivesse presa em um sonho estranho do qual não consigo acordar. — Isso é impossível, doutor. — murmuro, balançando a cabeça negativamente. — Este exame deve estar errado, estou apenas gripada, é isso. — Srta. Adkins, eu entendo que receber essa notícia não seja fácil, mas é altamente improvável que o exame de sangue esteja equivocado. A senhorita teve alguma relação sexual sem proteção nas últimas semanas? — Não, eu nem tenho um… — minhas palavras são interrompidas por uma lembrança. Em um dos poucos flashes que me lembro daquela noite, vi Sean colocar a camisinha. Mas do jeito que estávamos e da maneira como meu corpo amanheceu, percebo que um preservativo podia facilmente ter se perdido e nem sequer daríamos conta. Com um leve aceno de cabeça, peço ao médico que continue. Enquanto ele explica os próximos passos e
Com a presença de Ellie, que se mudou para o meu apartamento após conseguir uma excelente oportunidade de emprego em uma das subsidiárias da Blue Earth, parte do meu susto pela notícia se esvaiu. Ter alguém ao meu lado para dividir essa situação fez com que eu me acalmasse.Ainda assim, a notícia sobre a gravidez continua sendo digerida, mas sei que preciso me concentrar no trabalho que me aguarda. Infelizmente, isso inclui voltar à empresa para mais um dia ao lado de Sean.— Você tem certeza de que está bem? — Ellie indaga durante o nosso café da manhã.— Sim, fique tranquila. Além da possível gravidez, apenas os espirros estão me tirando do sério, mas logo passa. Sem dizer que não posso faltar hoje se planejo ir ao médico em breve. — Afirmo, respirando profundamente. — Ainda tenho esperanças de que esse resultado pode estar errado e que não há um bebezinho aqui dentro.— Mas não se esqueça, Zoe. Se tiver um bebê aí dentro, ele já é muito amado por mim e tenho certeza de que assim qu
“Por Sean Gallagher” Ao receber a notícia de que ela me acompanhará durante a viagem, quase posso ouvir as engrenagens de Zoe girando enquanto ela permanece imóvel. Apesar de suas tentativas de disfarce, a expressão de surpresa estampada em seu rosto me traz uma sensação de satisfação. — Comigo? — Ela sussurra para si mesma, mas o silêncio no ambiente permite que eu ouça claramente. — Disse algo, Srta. Adkins? — Não, senhor. Estava apenas… — É parte do seu trabalho. Por que está tão surpresa com a notícia? — pergunto, interrompendo suas palavras. — Afinal, você costumava acompanhar meu pai em viagens de negócios. — Seu pai não me odiava. — ela resmunga, arregalando os olhos ao perceber que seu pensamento escapou por seus lábios. — Olhe, Sr. Gallagher, eu tinha outros planos para a próxima semana e acompanhá-lo não estava entre eles. Mas como disse, faz parte do meu trabalho. — Ótimo. — afirmo, voltando ao meu lugar. — Preciso do relatório que será discutido na próxima reu
“Por Zoe Adkins”Meu corpo inteiro parece congelar enquanto as palavras de Sean ecoam na minha mente. Tento controlar a náusea que ameaça subir novamente, enquanto encaro a expressão indecifrável de Sean, esperando sua resposta.— É isso, certo? — insisto, após ver uma troca de olhares entre os dois. — Você só pode ser louco se pensa que eu conseguiria fazer mal ao Richard.— Meu pai morreu, você se beneficiou. Convenhamos que muitas coincidências envolvem o seu nome, não acha?— Eu nunca faria mal a ele. Richard foi um grande amigo para mim.— Que tal acalmarem os ânimos por aqui? — Stefano tenta amenizar a tensão, mas Sean o ignora, aproximando-se de mim. — Ouça, Srta. Adkins, — Sean começa, encarando-me intensamente —, por enquanto estou apenas tentando entender os fatos, mesmo que seja difícil ignorar as circunstâncias.— Circunstâncias que surgiu na sua cabeça por conta de uma infeliz coincidência. O nosso… encontro, foi um erro mútuo, mas não justifica acusações infundadas. —
“Por Sean Gallagher” A tarde de sábado começa com a mesma monotonia que tem marcado meus dias desde que cheguei a Manhattan. No quarto onde improvisei uma pequena academia, apenas o som da minha respiração corta o silêncio tenso, em contraste com a agitação que sempre esteve presente na minha vida em Milão. A necessidade de mudança me trouxe à cidade que nunca dorme, mas não contava que um encontro despretensioso com Zoe me faria reviver experiências que eu tanto lutava para esquecer. Aprendi da maneira mais difícil que confiar nas pessoas pode ser uma faca de dois gumes. Você se entrega totalmente e, no fim, descobre que o que realmente importa não são os sentimentos, mas quem você é e o que pode oferecer. Seja em Milão ou Nova York, sempre há algo que me lembra das cicatrizes que o passado deixou. — Por que estou com a impressão de que há algo errado novamente? — resmungo, enquanto forço meus músculos em mais uma série de flexões. — Falando sozinho… O auge da solidão. — a v