PERDIDA EM PENSAMENTOS, se sentindo triste como tudo havia terminado com Eduardo, Janete desceu sozinha pelo elevador do décimo quinto andar ao térreo da torre noroeste e nem imaginou que seria surpreendida mais uma vez naquele dia tão especial. — Olha só quem eu vejo! A aniversariante do dia. Janete quase tropeçou ao pisar fora do elevador com o susto e viu a figura altiva e bem-vestida a poucos metros dela, escorada no balcão da recepção. Beto Suares estava à sua espera. — Liguei há pouco no seu ramal e descobri que você já tinha descido. Que bom que fiquei esperando aqui embaixo. O futuro herdeiro dos 30% das ações de João Suares estava bastante asseado com os cabelos castanhos penteados para trás e um terno slim cinza. Sua gravata estava feita com um nó Windsor e os sapatos dele quase podiam refletir o rosto de Janete de tão bem engraxados. — Você… estava me esperando? A voz dela saiu baixa, como se ela não quisesse que mais ninguém ao redor ouvisse o que dizia. A moça da rec
JANETE TERMINOU de se trocar e ficou um tempo em frente ao espelho admirando o vestido novo que tinha comprado especialmente para a sua festa de dezoito anos. Deu várias voltas medindo o quão curta era a saia levemente rodada do tecido floral azul e ajustou as mangas longas costuradas em material transparente. Apertou o sutiã sem alças que usava por baixo do vestido para avolumar mais os seios e puxou levemente a veste abaixo dos ombros descobertos, evidenciando a pedra safira do colar em seu pescoço, presente da tia Elisa. Tinha passado um batom bordô nos lábios e delineou os olhos, apostando também numa sombra esfumada. Os cabelos estavam soltos e ela os tinha cacheado com o seu babyliss. Tinha feito ela mesma, embora a sua mãe tivesse até marcado hora com a cabeleireira e maquiadora. Gostava de fazer tudo sozinha e achava desnecessário gastar dinheiro para uma produção tão simples quanto aquela. Se dependesse de mamãe, ela teria alugado o estádio do Morumbi só para fazer essa fest
ENQUANTO A BEBIDA começava a ser servida à vontade, os mais jovens passaram a se soltar e a playlist musical acelerou o ritmo, transformando a festa numa verdadeira rave. Mesmo Priscila, Pedro, Jéssica e Rarissa, que eram menores de idade, se serviram de vodca e outras bebidas tão fortes quanto, e não houve qualquer reprimenda dos mais velhos que assistiam tudo de perto. O grupo se sacudia ao som da música eletrônica que tocava na sala comunal e os globos de luzes estroboscópicas instalados numa estrutura do teto garantiam os efeitos alucinógenos da dança misturada com bebida alcóolica. Michael e Lúcia não se divertiam daquela maneira há muito tempo e até os dois caíram na dança, relembrando os tempos áureos em que ambos tinham a mesma idade que a molecada ali presente. — Tô me sentindo com quinze anos de novo! — disse a moça, aumentando o tom de voz para ser ouvida por ele, movendo os quadris. — Eu também. Com a diferença que agora me sinto como um garoto de quinze, mas com a coluna
DEMOROU CERCA DE vinte minutos até que Janete estive reestabelecida com a maquiagem retocada, os cabelos arrumados e calçando agora um sapato mais confortável. Ela desceu as escadas e se juntou às amigas. Pediu que o controlador do som liberasse as músicas dançantes mais uma vez e voltou a beber doses cada vez mais altas de vodca pura, sem pausas. — Isso aqui é um aniversário ou um velório? Vamos dançar! Por ora, a garota tinha decidido que ia esquecer os seus problemas e se permitiu curtir a bebida e a dança. As amigas de escola, as colegas do trabalho, as primas e a irmã a acompanharam e todas elas começaram a pular, dançar e cantar juntas na sala comunal, como se não fosse haver um amanhã. Os seus pais acompanharam tudo agora de longe, da sacada e conversavam sobre negócios, bolsa de valores, preço do dólar, eleições e toda sorte de assuntos que os fazia parecer mais importantes que o resto da humanidade. Marco Túlio e Jefferson estavam se divertindo conversando com o casal Manto
NA SEGUNDA-FEIRA após a festa de arromba na mansão dos Castilho no Campo Belo, Janete foi até o escritório da tia na torre noroeste do complexo da construtora da família e informou que estava quebrando o seu contrato de estágio, pedindo demissão do seu cargo de assistente. Elisa foi pega completamente de surpresa com aquela notícia e ligou na mesma hora para a sala do irmão Renato na torre sudoeste para saber o que estava acontecendo, enquanto a sua sobrinha largava o seu crachá em sua mesa. A menina estava decidida e informou à mulher que não voltaria a trabalhar ali. — Obrigada pela oportunidade, Elisa, mas não posso continuar trabalhando aqui. Mariana, a assistente pessoal e secretária de Elisa, nem conseguia esconder a sua satisfação com o pedido de demissão de Janete e olhou a garota deixar a sala com um tremendo sorriso de deboche no rosto. Após se despedir da tia, Janete caminhou lentamente até à sala de TI ao fundo do mesmo corredor e respirou fundo antes de aparecer à por
EM UMA VIAGEM QUE levou cerca de vinte minutos, Beto conduziu o seu sedan até Pinheiros, onde estacionou em frente a um elegante hotel da região. Soprava uma brisa mais gelada e ele apanhou uma jaqueta de couro no banco de trás, que ele vestiu pouco antes de abrir a porta para Janete. Ele indicou a entrada do WZ Hotel e ela caminhou com ele até lá. — Vou te levar para conhecer o Tetto Rooftop Lounge que fica no topo do hotel. Um amigo meu é o bartender de lá. Você vai adorar. Janete estava sentindo um frio na barriga ao lado de Beto e, quando chegou ao restaurante-bar, ficou deslumbrada. O lugar tinha dois ambientes e era construído com um pé-direito duplo e janelas generosas que permitiam a vista impressionante dali de cima das avenidas Rebouças e Paulista. Ela não estava com fome, por isso, o seu acompanhante pediu um lugar entre as áreas com sofás e poltronas, onde eles podiam degustar alguma bebida. Ele sugeriu um vinho tinto, ela aceitou. Sentaram-se de frente para a janela. As
AQUELA SEMANA PASSOU lentamente para Janete e, depois de tantos problemas em sua vida profissional refletidas em sua vida pessoal, ela se permitiu andar nas nuvens com o relacionamento que parecia estar começando com Beto. Seu humor mudou radicalmente e todos à sua volta perceberam, vendo-a mais sorridente e alegre do que há algumas semanas. Priscila matou a charada na hora e quando a viu de sorrisinhos para a tela do celular, trocando mensagens, deduziu: — A Jane tá de romance novo! Certeza! A prima jogou-lhe uma almofada e preferiu continuar em zona neutra, dizendo que não podia confirmar ou negar nada ainda. — Com o tempo, quem sabe eu diga o que está rolando? Na escola foi a mesma coisa com Rarissa e Rafaela que notaram o clima mais leve com a amiga. — Tem a ver com o bonitão que veio te buscar na escola segunda-feira? — perguntou a herdeira dos Albuquerque, curiosa. — Tem. Nós vamos nos encontrar no fim de semana de novo. — Ela admitiu, abrindo um sorriso largo e fechando a
NO FINAL DO MÊS DE AGOSTO, Janete se matriculou na autoescola e passou a ter aulas teóricas de direção para aprender a conduzir veículos motorizados. Frequentava o curso de segunda à sexta na parte da manhã e ajudava a tia Solange à tarde com a organização dos seus arquivos no escritório que ela dividia com o marido em casa. — Você ficou boa nessa coisa de organizar arquivos, Jane! O elogio da tia surgiu numa tarde em que as duas passaram horas em frente ao computador do escritório organizando o espaço que Solange tinha ali para salvar os seus projetos de design. Mauro tinha pouca coisa do seu trabalho como gestor da Suares & Castilho em casa e mais da metade do HD era ocupado por plantas 3D, plantas baixas e desenhos esquemáticos do trabalho da tia como designer de interiores. — Organizar arquivos era o que basicamente eu fazia o dia inteiro na S&C, tia. — Aqui em casa nem o Pedro e nem a Priscila se interessam pelo que eu e o pai deles fazemos em nosso trabalho. Quem bom que você