DEMOROU CERCA DE vinte minutos até que Janete estive reestabelecida com a maquiagem retocada, os cabelos arrumados e calçando agora um sapato mais confortável. Ela desceu as escadas e se juntou às amigas. Pediu que o controlador do som liberasse as músicas dançantes mais uma vez e voltou a beber doses cada vez mais altas de vodca pura, sem pausas. — Isso aqui é um aniversário ou um velório? Vamos dançar! Por ora, a garota tinha decidido que ia esquecer os seus problemas e se permitiu curtir a bebida e a dança. As amigas de escola, as colegas do trabalho, as primas e a irmã a acompanharam e todas elas começaram a pular, dançar e cantar juntas na sala comunal, como se não fosse haver um amanhã. Os seus pais acompanharam tudo agora de longe, da sacada e conversavam sobre negócios, bolsa de valores, preço do dólar, eleições e toda sorte de assuntos que os fazia parecer mais importantes que o resto da humanidade. Marco Túlio e Jefferson estavam se divertindo conversando com o casal Manto
NA SEGUNDA-FEIRA após a festa de arromba na mansão dos Castilho no Campo Belo, Janete foi até o escritório da tia na torre noroeste do complexo da construtora da família e informou que estava quebrando o seu contrato de estágio, pedindo demissão do seu cargo de assistente. Elisa foi pega completamente de surpresa com aquela notícia e ligou na mesma hora para a sala do irmão Renato na torre sudoeste para saber o que estava acontecendo, enquanto a sua sobrinha largava o seu crachá em sua mesa. A menina estava decidida e informou à mulher que não voltaria a trabalhar ali. — Obrigada pela oportunidade, Elisa, mas não posso continuar trabalhando aqui. Mariana, a assistente pessoal e secretária de Elisa, nem conseguia esconder a sua satisfação com o pedido de demissão de Janete e olhou a garota deixar a sala com um tremendo sorriso de deboche no rosto. Após se despedir da tia, Janete caminhou lentamente até à sala de TI ao fundo do mesmo corredor e respirou fundo antes de aparecer à por
EM UMA VIAGEM QUE levou cerca de vinte minutos, Beto conduziu o seu sedan até Pinheiros, onde estacionou em frente a um elegante hotel da região. Soprava uma brisa mais gelada e ele apanhou uma jaqueta de couro no banco de trás, que ele vestiu pouco antes de abrir a porta para Janete. Ele indicou a entrada do WZ Hotel e ela caminhou com ele até lá. — Vou te levar para conhecer o Tetto Rooftop Lounge que fica no topo do hotel. Um amigo meu é o bartender de lá. Você vai adorar. Janete estava sentindo um frio na barriga ao lado de Beto e, quando chegou ao restaurante-bar, ficou deslumbrada. O lugar tinha dois ambientes e era construído com um pé-direito duplo e janelas generosas que permitiam a vista impressionante dali de cima das avenidas Rebouças e Paulista. Ela não estava com fome, por isso, o seu acompanhante pediu um lugar entre as áreas com sofás e poltronas, onde eles podiam degustar alguma bebida. Ele sugeriu um vinho tinto, ela aceitou. Sentaram-se de frente para a janela. As
AQUELA SEMANA PASSOU lentamente para Janete e, depois de tantos problemas em sua vida profissional refletidas em sua vida pessoal, ela se permitiu andar nas nuvens com o relacionamento que parecia estar começando com Beto. Seu humor mudou radicalmente e todos à sua volta perceberam, vendo-a mais sorridente e alegre do que há algumas semanas. Priscila matou a charada na hora e quando a viu de sorrisinhos para a tela do celular, trocando mensagens, deduziu: — A Jane tá de romance novo! Certeza! A prima jogou-lhe uma almofada e preferiu continuar em zona neutra, dizendo que não podia confirmar ou negar nada ainda. — Com o tempo, quem sabe eu diga o que está rolando? Na escola foi a mesma coisa com Rarissa e Rafaela que notaram o clima mais leve com a amiga. — Tem a ver com o bonitão que veio te buscar na escola segunda-feira? — perguntou a herdeira dos Albuquerque, curiosa. — Tem. Nós vamos nos encontrar no fim de semana de novo. — Ela admitiu, abrindo um sorriso largo e fechando a
NO FINAL DO MÊS DE AGOSTO, Janete se matriculou na autoescola e passou a ter aulas teóricas de direção para aprender a conduzir veículos motorizados. Frequentava o curso de segunda à sexta na parte da manhã e ajudava a tia Solange à tarde com a organização dos seus arquivos no escritório que ela dividia com o marido em casa. — Você ficou boa nessa coisa de organizar arquivos, Jane! O elogio da tia surgiu numa tarde em que as duas passaram horas em frente ao computador do escritório organizando o espaço que Solange tinha ali para salvar os seus projetos de design. Mauro tinha pouca coisa do seu trabalho como gestor da Suares & Castilho em casa e mais da metade do HD era ocupado por plantas 3D, plantas baixas e desenhos esquemáticos do trabalho da tia como designer de interiores. — Organizar arquivos era o que basicamente eu fazia o dia inteiro na S&C, tia. — Aqui em casa nem o Pedro e nem a Priscila se interessam pelo que eu e o pai deles fazemos em nosso trabalho. Quem bom que você
NAS DUAS PRIMEIRAS semanas de novembro, Janete fez a prova de direção da autoescola e foi aprovada com todos os méritos. A sua CNH provisória estaria pronta em alguns dias e ela, enfim, poderia dirigir o Mini Cooper que tinha ganhado de aniversário em agosto. Para comemorar, Beto a levou para um novo passeio de iate, mas desta vez, eles teriam companhia. — Pessoal, essa é a Janete Castilho. Ela vai com a gente para Ilhabela. Janete estava surpresa por ele a estar apresentando para os seus amigos mais próximos, mas sentiu uma ponta de incômodo por não ser como a sua namorada. No iate também estava Miguel Olivett, o seu parceiro de Miami quando eles conheceram a Rihanna; João Carlos Gomes, amigo dos tempos de escola; Roberta Mancini, a melhor amiga de Beatriz Suares e a própria Beatriz, que ainda não parecia simpatizar com a herdeira dos Castilho, a olhando sempre com certo desprezo. Aquele fim de semana foi cercado de muitos altos e baixos e Janete só foi se sentir melhor quando eles
EDUARDO ACORDOU NO hospital no dia seguinte. Estava com o ombro esquerdo imobilizado e sentia um curativo espesso em seu nariz, além de um cheiro forte de medicação. Os seus olhos demoraram a focalizar algo, mas quando o fez, ele viu uma enfermeira ajustando um novo volume de soro em um pedestal ao seu lado. — O… Onde eu estou? Ele estava zonzo e viu um cateter preso ao seu braço direito quando a mulher respondeu: — Você está no hospital. Você levou um tiro e foi feita uma cirurgia de reconstrução em seu ombro ontem. Você está bem agora. Ele olhou em volta com a pouca mobilidade que tinha e quis saber de Janete. — A moça que te trouxe até aqui está lá fora. Ela não quis arredar o pé do hospital mesmo quando soube que você já estava bem. — Me deixa falar com ela, por favor. Não era horário de visitas, mas a enfermeira permitiu que Janete entrasse por alguns minutos, deixando-os a sós. Eduardo sorriu quando a viu entrar, mas sentiu dor no nariz e desfez o sorriso imediatamente.
GABRIEL TENTOU O QUE estava ao seu alcance para ajudar Janete e tudo que conseguiu foi e-mails trocados da sala de Renato na torre sudoeste com um tal de “Mercur”, pedindo mais informações sobre invasão cibernética a servidores. Em sigilo, o assistente levou o que tinha descoberto ao seu chefe e amigo Michael, que aconselhou que ele fizesse aquilo em mais perfeito segredo. — Não conte a mais ninguém sobre isso, Gabriel. Os caras com quem o pai da Janete está metido são barra pesadíssima. Michael tinha trabalhado por anos com hacktivismo e possuía uma gama elevada de subterfúgios informáticos para driblar certas barreiras que a internet convencional proporcionava. Naqueles dois dias, eles deixaram o trabalho no setor de finanças da S&C um pouco de lado e os dois se dedicaram a mergulhar fundo na Deep Web para achar provas da existência do cartel de informação que era liderado pelo tal “Mercur”. Ninguém da sua bolha conhecia a verdadeira identidade da pessoa por trás daquele nick, mas