Ao ouvir o que a ninfa havia nos dito, Karen não hesitou em seguir na direção que ela tinha apontado. Fiz meu cavalo segui-la. Os galhos impossibilitavam o galope, por isso nos mantivemos apenas o trote. De fato não demorou muito até Karen parar e eu perceber o motivo: chegarmos a Milena.
— Cuidado — ouvi ela pedir, embora tivesse sido meio baixo.
Por um momento penso em questionar, mas ao olhar na direção da Milena, vejo uma cobra perigosamente próxima. Sua testa tinha um corte que sangrava e a mesma estava desacordada, nem se dando conta do perigo bem ao seu lado. A cobra a cercava como sua presa.
Lancei um olhar, perguntando silenciosamente o que poderíamos fazer para ajuda-la. Karen encontrou meu olhar, porém apenas desviou-o de volta à Milena. Então a garota ergueu a mão e pude jurar sentir uma coisa diferente no ar.
Então, misteriosamente a cobra passa a levitar como se algum ser invisível a erguesse. Nisso pensei que era a ninfa pregando mais uma peça na gente, entretanto, ao olhar de volta para minha colega de quarto com o braço estendido, parecendo segurar algo, fui ligando uma coisa na outra.
Não pode ser..., foi a primeira coisa que me passou pela cabeça. Karen fez um movimento brusco para o lado, fazendo a cobra voar na mesma direção. O animal atingiu com força uma árvore e se aquietou ali. Então a garota desceu do cavalo e caminhou na direção da Milena desacordada.
Imitando seus passos, também desço do cavalo. Meus tornozelos reclamam do impacto, causando uma careta em minha expressão, mas logo me recomponho e fico ao lado de Karen.
— O que foi aquilo? — questionei.
— Você não viu nada — disse. — Isso morre aqui, entendeu? E não aja como se também não tivesse poderes porque posso sentir o que emana de você.
As palavras foram cortadas da minha boca. Apenas assenti.
Karen usou as próprias mãos para limpar o sangue na testa de Milena. Água limpa escorreu dos seus dedos, lavando o ferimento. Logo a mesma me pediu ajuda para erguê-la e o fiz, sem me dar o luxo de questioná-la de onde vinham todos esses seus poderes. 'Será que ela é amaldiçoada como eu?', me perguntei. Diferente dela, não tinha parado para testar quais seriam meus poderes, ainda mais por pensar que só possuía a habilidade de ser um monstro.
Ajudei minha colega a colocar Milena no dorso do seu cavalo e a mesma apenas voltou a montar nele com a tremenda facilidade de sempre. Demorei um tempinho para montar o meu, entretanto, Karen fez questão de me esperar antes de seguir o caminho de volta.
— Tchau, meninas perdidas — ouvi a voz da ninfa ecoar pela floresta.
Continuamos nosso caminho apenas a trote até sairmos da floresta. Ela era bem aberta, então se perder chegava a ser algo meio difícil. Assim que saímos, uma Guerreira vem em nossa direção e logo identifico ser a instrutora.
— Onde vocês estavam? Não sabem que é proibido roubar cavalos?
— Não estávamos roubando — informa Karen. — Ela bateu a cabeça.
A instrutora fez pouco caso ao murmurar:
— Deviam tê-la deixado morrer. — Sua voz voltou ao tom normal: — Tiveram sorte de eu não chamar a oficial aqui ou teriam levado uma punição na certa por terem desobedecido as minhas ordens.
Embora a expressão da Karen tenha ficado neutra, a forma como apertava as rédeas do próprio cavalo indicava que não havia calmaria dentro de si.
— Vamos, Cia — disse minha colega. — Acho que a aula já acabou.
Desta forma, sem esperar mais palavras da instrutora, guiamos nossos cavalos até o estábulo onde desmontamos e deixamos o cavalo no lugar — Karen que se encarregou disso enquanto Milena ficava deitada do lado de fora na grama. Quando ela terminou de deixar os cavalos no lugar, juntas erguemos Milena. Um braço se apoiava nela e o outro em mim.
Demorou um tempo até conseguirmos chegar no nosso quarto pois nossa colega desacordada era pesada. Ao chegarmos no quarto, colocamos Milena na sua cama. Respirei fundo e enxuguei o suor do rosto ao mesmo tempo que Karen se abaixava ao lado de Milena, parecendo avalia-la.
— Você acha que ela ficará bem? — questiono, a observando.
— Deve ficar. O corte foi superficial.
Então como se fosse uma curandeira, retirou as botas dos pés da moça desacordada.
— Minhas irmãs mais novas sempre tinham esses tipos de corte.
— Você tem irmãs?
Ela afirma com a cabeça.
— Tenho quatro. É comum na casta três — disse como se já previsse minha surpresa.
Me surpreendi com a quantidade de irmãs que possuía.
— Bom, eu tenho apenas uma. Mais velha.
Ao notar que Milena parecia bem, Karen se sentou em sua cama.
— Por que a ajudou? — perguntei depois de um tempo, afinal, ambas não se davam tão bem assim.
— Milena faz questão de sempre lembrar que somos uma equipe, então... O quanto antes eu me acostumar com isso, melhor.
Cheguei a cogitar perguntar sobre seus poderes e o que poderia saber sobre os meus, mas deixei a ideia de lado. Se ela queria que o assunto morresse no momento em que soube da tal existência, assim seria.
Subi as escadas da minha cama e deitei na mesma. As aulas costumavam demorar mais ou menos umas três ou quatro horas pelo que tinha entendido. Depois tínhamos o restante do dia livre para descansar. Algumas garotas optavam por fazer uma atividade extra, mas como minhas colegas nem sequer citaram essa possibilidade, acabei deixando qualquer ideia desse tipo de lado.
— Karen? — a chamei.
— Sim?
— Você... odeia a oficial?
— Como eu acho que isso não é segredo para ninguém, bem, odeio sim. Na verdade, odeio tudo.
— Por quê? — a pergunta me escapou.
— Porque... céus, é tudo tão estranho. Nós nascemos para sermos o que a princesa quer que sejamos. Nós nascemos para morrermos lutando. Isso não parece estar certo. Eu nunca concordei pelo menos.
— Talvez esteja cometendo um equívoco. Nós morremos lutando por uma causa muito nobre. Precisamos vencer os Cavaleiros para finalmente reestabelecermos a paz.
— Cia, você nunca pensou que sei lá, os Cavaleiros e Guerreiras poderiam viver em harmonia?
Minha saliva me fez tossir num engasgo pelo susto do que disse.
— Isso é completamente impossível! — exclamo.
— Ah, quer saber, deixa isso pra lá — disse em desdém. — São apenas devaneios meus.
Deixei a conversa morrer ali. Retirei minhas botinas enquanto suas palavras rodavam meus pensamentos. Era completamente estranho pensar daquela forma. Como mulheres e homens podem viver em harmonia? Isso nunca existiu e nunca vai existir. Princesa Marilene é muito maior do que aqueles Cavaleiros malditos, pensei.
Ao terminar de tirar as botinas, deitei preguiçosamente na cama, mas um ruído na cama de baixo atraiu minha curiosidade.
— Onde... Onde estou? — ouvi a voz da Milena baixinho.
Olhei para Karen, mas a mesma apenas virou de costas para nós duas. Ou estava fingindo dormir ou de fato parecia muito cansada. Como ela decidiu não responder a garota que havia acabado de acordar, decidi fazer o mesmo.
Ela vai conseguir se encontrar sozinha.
Sentir os cabelos voando ao vento dava uma grande sensação de liberdade. Respirei fundo, deixando o ar corrido entrar em minhas narinas, aproveitando aquela sensação maravilhosa. O cavalo negro que eu montava parecia estar conectado a mim de uma forma extraordinária. Pelo menos obedecia meus comandos sem hesitar.De repente me ocorreu que eu ter vindo treinar com as Guerreiras foi a melhor coisa da minha vida. A rotina que antes eu estava tão acostumada parecia ter sido deixada para trás e confesso estar gostando desse tipo de mudança radical. Nunca havia experimentado essas coisas e agora... Tudo parecia bom demais para ser verdade.Nossa instrutora de equinos pediu para mostrarmos nossas habilidades através de uma corrida entre nossos cavalos. Eu podia não estar em
Meus olhos se arregalaram em surpresa assim que ela disse com todas as palavras aquilo estava pensando em fazer. Fiquei tão surpresa que não consegui respondê-la de imediato. Diversas perguntas preencheram minha mente pois por causada sua personalidade meio forte, poderiam desconfiar caso estivéssemos fazendo alguma coisa errada.— Karen...— Ah, qual é, Cia. Se fôssemos à noite, tenho certeza que não iriam desconfiar da gente.Estava tão perplexa com sua proposta que só conseguia responder ela com o silêncio. A garota suspirou, parecendo desistir de mim. Karen andou pelo quarto, fazendo círculos. Seus braços foram para trás de seu corpo, cruzando os pulsos enquanto andava. Uma ex
Eu sei que eu sou um monstro, mas a mulher esquisita na nossa frente era muito mais assustadora, tinha certeza. Ela possuía cabelos flamejantes, olhos negros, pele pálida e asas de morcego. Porém, o que mais me chamou a atenção nela era uma perna de égua e outra de bronze. Por um segundo me perguntei se ela conseguia andar com aquilo.— Eu falei para vocês entrarem no quarto — disse o monstro devagar.Suas garras de bronze pendiam ao lado do seu corpo. Dois passos a mulher deu na nossa direção. Eu me afastei dois. Karen fez o mesmo e trocamos olhares.Mal tivemos tempo de pensar no que poderíamos fazer para escapar daquilo, pois aquela coisa esquisita veio rapidamente na nossa direção —
No corredor do meu quarto, fiz questão de colocar o colar de volta no pescoço, com medo da Milena me ver na forma de monstro. Contar para Karen já foi arriscado demais. Até porque agora a oficial que cuidava dos dormitórios, apesar de também ser um monstro, sabia que existiam duas... sobrenaturais no treinamento daquele mês.Ao abrir a porta, agradeci à minha intuição pois a Milena estava de fato no quarto, deitada na própria cama. Entretanto, por causa da luz da lua intensa vindo do lado de fora, consegui perceber a garota se sentando na cama, assustada ao ver um vulto.— Elas pegaram você também? — questionou num tom assustado.Caminhei devagar até Milena e me abaixei perto da
Enquanto desamarrávamos Karen, ela só fazia gemer de dor. Começamos a soltá-la pelos tornozelos. Nos pulsos, Milena a segurou para que a garota não desabasse no chão com as costas feridas. Os machucados eram mesmo horrendos e estavam claramente sensíveis.Quando soltei o último nó, Milena clamou por ajuda e eu logo fui socorrê-la por conta do peso de Karen. Juntas, colocamos a garota devagar na grama, com as costas voltadas para cima. Meu estômago dava voltas só de olhar pro que sua pele tinha se transformado por culpa do chicote.Mais uma vez eu e Milena trocamos olhares, decidindo silenciosamente em levar nossa colega de quarto para a enfermaria. Devagar, segurei seus braços e Milena suas pernas, da mesma forma que tinham feito comigo. Entã
A terceira semana de treinamento começou chuvosa. O céu derramava seu choro sobre nós, Iniciandas. Minhas roupas de iniciação estavam úmidas por estar exposta ao mau tempo. Eu, Milena e Karen esperávamos numa fila para recebermos pela primeira vez, equipamento. Meu coração no peito quase saltava de emoção. Estava próxima de me sentir uma Guerreira de verdade.Não tivemos café da manhã hoje.— Podiam ter preparado tudo isso num lugar coberto — resmungou Karen.Milena revirou os olhos e eu senti que no fundo ela queria contra argumentar.— Podiam ter ao menos nos dado o café da manhã. Estou morta de fo
Não sei quanto tempo demorou até avistarmos a casta 5, mas a boa notícia era que o sol não tinha se posto ainda. Porém a parte ruim da caminhada é que fomos recebidas no território de maneira bem agressiva. De uma hora pra outra estávamos agitadas e assustadas enquanto algumas flechas vinham na nossa direção.Eu mesma estava assustada.Hesitante, puxei uma flecha da aljava e posicionei de mal jeito no arco. Não sabia nem como fazia para atirar. Olhei ao meu redor. Minha equipe e o resto das Iniciandas estavam tão perdidas quanto eu. Gritos enchiam o ar. Tencionei o arco, sentindo os músculos arderem pelo esforço. Ao soltar, acerto alguém. Não sei quem. A pessoa estava sem armadura, então supus ser alguém da casta
A manhã estava fria quando acordei e saí da barraca improvisada montada por nós e pelas Guerreiras que nos acompanhavam. Durante o restante da tarde de ontem, só recebemos instruções de como deveríamos agir no dia de hoje. O objetivo do treinamento da semana era aprender a eliminar as consideradas "desnecessárias" para a continuação da nossa sociedade feminina.Como eu e minha equipe não sabíamos que passaríamos mais de um dia, foi necessário improvisar novas gases e estas improvisações teriam que durar pelos próximos dias. Talvez com a dor mais aguçada, a Karen ficasse mais comportada com as Guerreiras.As armaduras presas em meu corpo pesavam. Minhas pernas reclamavam pelo peso extra, porém, eu dizia a e