Demoro mais um pouco antes de voltar para casa. Fico um tempo a mais lendo a ficha da garota. Não tem como descrever o que passou na minha cabeça no momento em que li as primeiras páginas. Discórdia? Pode até ser. Arrependimento? Não chega a tanto.
Dentro do carro fico tão imerso nos meus pensamentos e ideias que nem percebo que o rádio está desligado. Sinto-me melhor assim que saio da cidade nebulosa de Santis Lorde para uma claridade sem fim que é a cidade onde moro.
Suas árvores são de um verde claro, seus trocos marrons, há pássaros que cantam nas ruas, pessoas andando, caminhando, correndo ou pedalando. É completamente o oposto daquela cidade. Eu não quis dar ouvidos aos comentários, mas eu não vi ninguém além dos funcionários do manicômio nas ruas.
Chego em casa por volta de uma da tarde, decido correr um pouco para tirar algumas suposições que se formaram na minha cabeça. Visto um short e uma regata e dessa vez lembro de pegar meus fones e acoplá-los no celular para ouvir música.
Minha casa é muito grande para apenas uma pessoa morar nela. Acho que minha mãe estava pensando que fugi de casa porque engravidei alguém. E eu não estou exagerando, além dos outros quartos tem um que é completamente mobiliado para uma criança recém-nascida. Ele é muito bonito, mas eu não sabia o que fazer com ele quando vi, então mantenho ele trancado.
A entrada da casa leva a um corredor; na primeira porta à direita é a cozinha; à esquerda é a sala; seguindo reto ainda à direita há uma sala onde seria o meu consultório que não posso usar por enquanto; depois dessa porta há a escada que leva ao andar de cima. Têm três quartos, dois banheiros e o quarto para criança.
Termino de correr e volto para casa para tomar banho. Um banho pensativo, e é o primeiro que eu demoro tanto. Olho-me no espelho e a menina do Hospício aparece na minha mente, de todos os meus pensamentos ela já fazia parte. A pequena brecha que pude ver do seu rosto me permitiu criar diversas hipóteses.
Não que eu tenha me interessado por ela, mas ela não me pareceu estar amedrontada por estar em um manicômio como os outros. Ela parecia feliz com aquilo. É como se ela estivesse tentando fugir de algo que estivesse fora dali.
Saio do banheiro e a campainha toca, quando chego ao pé da escada. Seco meu cabelo e atendo a porta.
Fico decepcionado com a pessoa do outro lado. Alexis, minha ex-namorada. Maluca. Essa sim merece estar no Hospício.
— O que faz aqui? — Pergunto, sem saber se quero mesmo a resposta.
— Fui na sua antiga casa falar com você, mas você não estava e sua mãe me deu seu novo endereço.
— Isso não responde minha pergunta.
Ela sorri, constrangida querendo alguma coisa eu tenho certeza. E eu sei que é falta de respeito conversar com alguém na porta de casa por muito tempo sem convidarpara entrar, mas eu não vou convidar ela, nem se ela fosse a salvação da humanidade. Ela é definitivamente louca!
— Desculpe, você está ocupado?
— Eu estou sempre ocupado Alexis e começo a trabalhar amanhã, se você não se importar em voltar outro dia...
— Olha, eu sei que você deve achar que estou perseguindo você, mas fique tranquilo, eu estou de mudança para cá com umas amigas e eu superei, devo-lhe desculpas por tudo que fiz a você. Eu só pensei em passar aqui e avisar para você não supor que tenho segundas intenções.
Respiro fundo, não que eu queira ser rude, mas apenas desculpas não irão fazer tudo sumir. Ela me fez ficar solteiro durante 6 anos após terminar com ela. Todas as garotas que vieram depois do término ela dava um jeito de fazer elas correrem e ficarem longe de mim, era irritante.
— Alexis, eu realmente estou ocupado e preciso começar agora, com ou sem sua licença. Tenha uma boa mudança — Mentira! Que ela esqueça e não se mude para esse bairro.
Não espero ela responder e fecho a porta na sua cara, pego a ficha da garota do Hospício que eu deixei na cozinha, faço um chá e sento no sofá para lê-las.
Hospital Psiquiátrico
Santi's LordeProntuário do Paciente
"Número do Prontuário: 233
Data de abertura: 21/03/2011
Nome completo: Catarina Davidson Braga
Data de nascimento: Desconhecida
Sexo: F [x] M [ ]
Endereço: Desconhecido Telefone: Desconhecido
Médico(s) do paciente (se houver): Meredith Andrews
Escolaridade: Desconhecida Ocupação: Nenhuma
Limitações: [ ] Cognitiva [ ] Locomotiva [ ] Visão [ ] Audição [ ] Outras: _____________.
Alergias: _____________.
Diagnósticos e Observações: A paciente tem apenas 22 anos de acordo com nossas pesquisas, mas não há nenhum documento onde possamos confirmar tal fato. Nenhum parente próximo vivo.
Ela não conversa e é extremamente agressiva.
Catarina sofre com transtornos, pesadelos e grita a maior parte do tempo. Seu diagnóstico é grave, sem saída e precisa dos remédios para se manter estável. [...]
Catarina, piorou e sua dosagem de remédios tem que ser aumentada. Ela pensa que pode estar em um sonho e está mais agressiva do que nunca.
As dosagens dos remédios foram muito altas e ela definitivamente não tem chances.
Em pouco tempo ela pode morrer..."
A última atualização desse prontuário foi há 3 anos atrás e parece que Catarina sobreviveu a uma face ruim lá dentro.
Ocorrências:
"Catarina quis bater em mim assim que entrei no refeitório e comecei a colocar comida no prato de outras pessoas. Ela se levantou e arremessou seu prato de sopa quente sobre mim."
- Jacob.
"Catarina quase me enforcou com a mangueira enquanto eu estava dando banho em outros pacientes. Ela entrou no banheiro e pegou a mangueira da minha mão."
- Lisa.
"Catarina me chamou de prostituta e se meteu em uma briga com um dos pacientes. O paciente se chama Liam
Cleavaland, ele é maior que ela e mesmo assim isso não a impediu. "- Clarisse.
"Liam puxou o cabelo de Catarina durante o almoço e isso fez com que ela se levantasse e começasse a arremessar facas em sua direção, isso fez com que acertasse duas enfermeiras. "
- Fátima.
Há outras ocorrências a maioria inclui o mesmo parceiro de crime. Liam. Eu não sei o nome de ninguém ali, muito menos os rostos. Amanhã talvez eu pergunte quem é essa pessoa que acaba fazendo Catarina ter ocorrências tão horríveis e com certeza foi por isso que aumentaram a dosagem de remédios dela.
Quando termino de ler e analisar tudo, faço minhas anotações e vou dormir, pensando em tudo que posso fazer se essa garota tiver justificativa para tudo o que aconteceu, ela deve ter. E se não tiver? O que vai ser do meu trabalho?
Levanto às 6:30 da manhã, tomo um banho relaxante passando e repassando várias vezes o plano que criei antes de dormir. Serei rápido hoje e não a forçarei a nada para conseguir a confiança dela, já que seu histórico diz que não tem muita confiança em ninguém e que agride muitas pessoas sem que elas tenham feito algo contra ela, menos o tal paciente Liam que parece adorar irritá-la. Não demoro muito para comer, normalmente de manhã não me dá muita fome, só como porque minha mãe fez eu me acostumar com o hábito de comer pouco durante o café, ela me dizia que é melhor do que nada. Pego a estrada às 7:15 eu havia marcado de chegar às oit
Meu relatório tinha dez linhas, isso porque decidi escrever mais do que havia para escrever, se eu quisesse escrever a verdade do que realmente aconteceu na consulta daria muito menos do que dez linhas, mas são dez linhas muito bem-feitas. Decidi que ficaria mais um pouco para observar Catarina na ala de jogos, conversei com John porque foi ele quem defendeu Catarina das ofensas de Samanta. Ele não falou muito porque precisava prestar a atenção nos pacientes. O silêncio de Catarina era tão profundo que eu poderia entrar nele e descobrir muito mais do que ela quer que a maioria de nós saibamos. Contei os dias para voltar na semana seguinte e decifrar mais histórias atrás daquele silêncio. Passei a semana estudando sobre Catari
Chego em casa com muito tempo de sobra para a hora que minha mãe havia marcado de chegar. Ela falou que passaria em uma cidade antes de vir até aqui, isso me dá tempo para fazer sua comida favorita, pelo menos um prato dela já que não sou um cozinheiro nato para fazer vários pratos franceses. Consigo fazer o famoso"Coqau Vin"e um pouco de arroz para acompanhar. Minha mãe pode ser uma pessoa refinada, mas gosta de comida caseira. Salada de beterraba e repolho roxo, vinho da safra favorita dela (esse foi ela quem pediu). Enquanto oCoqau Vinestá no fogão preparo a mesa do almoço do lado de fora da casa. Tem uma porta de vidro na cozinha que leva para o quintal. Nele há uma árvore bonita onde tem um bala
Noite passada eu não tinha conseguido dormir e o problema foi que imaginei, ou melhor, sonhei em como seria minha vida se eu decidisse ter algo com Bridget e não consigo me imaginar assim. Com ela tudo parece estranho. Não que ela não seja bonita, ela é muito bonita, mas não me imagino tendo uma vida com alguém, parece que depois da Alexis eu acabo me saindo mal no amor. Eu não quero parecer rude, mas agradeço por Catarina não ter tido algum problema durante a semana que me fizesse ir até lá e ter que decidir logo o que falar com Bridget. Na verdade, tive que me preocupar com algo novo, melhor dizendo, pessoas novas. Como minhas novas vizinhas da frente. Eu não sei o que aconteceu. Só me lembro que dur
Não consegui dormi nos dias seguintes. Eu tentei várias vezes durante o dia e até mesmo a noite sonhar novamente com Catarina para saber mais sobre aquela história da praga. Ainda não acredito no que minha mãe disse, mas é interessante. Tentei também lembrar da voz que eu ouvi pedindo para Catarina me mandar embora antes de começarem a bater na porta com brutalidade e eu não tive sucesso. Não fiquei muito em casa para não acontecer de uma das minhas novas vizinhas aparecerem sem serem convidadas, então passei um bom tempo na lanchonete do centro. Uma lanchonete branca com detalhes vermelhos e pretos. O movimento sempre é calmo durante o dia e de tarde, mas no almoço não é assim, há tanta gente que não consigo respirar direito.<
Catarina não me contou nada sobre o homem que ela tinha desenhado, inclusive quase me fez perder a cabeça por alguns instantes, quando seus olhos me cativaram por um bom tempo. Assim que saio do Hospício percebo que minha respiração está diferente, claro, fui acusado de ter abandonado meu filho que eu nem sabia que tinha. Pelo menos para Catarina eu tenho um filho, ela deixou claro que não sonhou com a mãe da criança, mas que tentaria. Dirijo por mais tempo do que costumo dirigir, pois meus pensamentos voam dessa vez. Tento ao máximo me concentrar na estrada, mas eles parecem ter vida própria colocando momentos da minha vida que já vivi na minha cabe&c
— Se você aceitar jantar comigo — Sugiro. Seus olhos ganham um brilho esperançoso, então sem dizer nada apenas sorrindo ela entra. — Eu já tinha feito o jantar e eu sempre faço para mais de uma pessoa. — Eu imagino, Ian. E sei também que você cozinha muito bem. Entro na cozinha e coloco um prato no balcão para que ela se sirva da comida que está no fogão, eu não me sinto na obrigação de montar uma mesa para jantar sendo que apenas eu irei comer. Hayley pega o prato enquanto ai
Não há remetente na carta, sem um nome no qual eu possa ter certeza que a carta seja verdadeira, talvez a senhora da livraria saiba o que pode estar esperando por mim assim que eu ler esse livro, mas não voltarei a ver ela para que me olhe como me olhou hoje. Talvez eu esteja completamente encrencado. Depois de deixar o livro de lado eu acabo me sentando para fazer a lista dos possíveis lugares nos quais posso levar Catarina, não sei se serão os melhores lugares para que ela veja, mas escolho os pontos turísticos da cidade e as lanchonetes mais calmas também. Meia hora antes do combinado para ir ao jantar na casa das vizinhas eu decido tomar banho, não consegui ler o livro, mas tenho certeza de que a curiosidade vai ficar martelando na