Levanto às 6:30 da manhã, tomo um banho relaxante passando e repassando várias vezes o plano que criei antes de dormir. Serei rápido hoje e não a forçarei a nada para conseguir a confiança dela, já que seu histórico diz que não tem muita confiança em ninguém e que agride muitas pessoas sem que elas tenham feito algo contra ela, menos o tal paciente Liam que parece adorar irritá-la.
Não demoro muito para comer, normalmente de manhã não me dá muita fome, só como porque minha mãe fez eu me acostumar com o hábito de comer pouco durante o café, ela me dizia que é melhor do que nada.
Pego a estrada às 7:15 eu havia marcado de chegar às oito para a consulta e como não há transito para chegar em Santis Lorde não tenho com o que me preocupar. Além do que poderá acontecer hoje. Eu não espero nada de mais hoje com certeza não conseguirei nada, mas com o tempo talvez eu descubra o motivo de ela ser como é. Acho que se a garota fez muitas agressões no Manicômio tem que ter um motivo.
Isso sempre me cai muito mal, sempre esperar o melhor das pessoas mesmo que elas não mereçam um pouquinho de esperança, mas enquanto em algumas pessoas isso falta, tem esperança até demais em mim.
Meu irmão mais velho o Juiz Elliot Price, por exemplo, ele nunca entraria em uma cidade como Santis Lorde, mesmo que isso ajudasse nossos pais, meu irmão é muito esnobe nessa área. Nunca fomos muito amigos ou até mesmo próximos.
Chego mais cedo e fico esperando no meu carro até dá a hora. Quando faltam apenas cinco minutos bato a porta.
— Bom Dia, Dr. Prince — Samanta atende a porta com um belo sorriso no rosto, parece estar de bom humor — Estávamos esperando o Doutor chegar.
— Bom Dia, Samanta.
Ela dá espaço para que eu entre. Bridget está no balcão e acena para mim quando me vê, sorrio de volta educado.
Samanta pega alguns papéis sobre o balcão e os entrega a mim, ainda sorrindo. Seu sorriso me faz lembrar do que Bridget me disse ontem, sobre Samanta dormir com um dos pacientes e lembro automaticamente de perguntar quem é o famoso Liam.
— A Sra. Del Monte me pediu para entregar a você esses papéis, você terá que preenchê-los assim que a primeira consulta terminar — Ela explica e aceno com a cabeça, concordando — Abrimos hoje a ala de jogos mais cedo, sua paciente está junto com os outros. Há algo que gostaria de saber?
— Na verdade tem sim. Eu gostaria que me mostrasse o paciente Liam, se não me engano é esse o nome.
Os olhos de Samanta se arregalam novamente como ontem, parece que caiu a ficha. Liam é o paciente que dorme com Samanta. Ela tenta fazer seu sorriso voltar ao lugar, mas ela não tem sucesso com isso, Bridget se levanta do seu lugar e me espera próxima a pequena escada que há após o balcão querendo evitar o que está por vir.
— Desculpe-me, mas por que quer vê-lo? — Ela suspira, ainda tentando sorrir.
— Ontem quando estava lendo as ocorrências de minha paciente, percebi que havia um nome que se repetia constantemente e se quiser que eu prove, elas estão aqui na minha mão, o nome do paciente é Liam — Termino de falar e Samanta solta o ar que parecia estar prendendo.
— Tudo bem, Bridget levará você para a ala de jogos o senhor o encontrará lá.
— Obrigado — Viro-me para olhar Bridget, esperando — Bom Dia, Bridget.
— Bom Dia, Dr. Price.
Não preciso segui-la dessa vez, me recordo do caminho que tomamos ontem, então consigo andar alguns passos à frente de Bridget. Não nego que meu coração está saltando de nervosismo, espero que ele continue batendo e que não saia do meu peito.
Estou nervoso e ansioso demais para ver e falar com a minha primeira paciente desde que sai da faculdade. Eu cuidei de pequenos casos durante a faculdade, mas nunca de casos como esse em que a pessoa talvez sofra mesmo de alguma coisa séria.
Espero novamente Bridget entrar antes de mim e ouço também seu nome ser chamado por vários pacientes, mas ela espera ao lado da porta que eu entre. Encontro John novamente ao lado do mesmo sofá que estava ontem e o paciente alto e normal está no sofá conversando com John. A garota continua na mesma posição que estava ontem, mas hoje não está chovendo para que ela fique ali observando o nada, o que para mim é a mesma coisa que ficar observando a chuva.
É claro que não contarei isso a ela já que ela quer olhar a chuva que olhe, mas espero que ela me escute e me ajude a tratá-la. Ambos sairemos ganhando com isso.
— Eu explicarei a Catarina que ela terá um psicólogo a partir de hoje e depois deixarei vocês a sós e cuidarei dos outros.
— Tudo bem — Concordo, mas antes que ela se afaste me lembro de algo — Bridget, antes me mostre quem é o paciente Liam?
— Claro, é aquele ao lado de John no sofá — Ela aponta com um pequeno aceno de cabeça em direção ao paciente alto de barba e cabelo escuros.
Agora entendo um pouco melhor o que acontece. Deixarei isso para discutir depois assim que tirar outras conclusões com a consulta com Catarina.
Bridget se aproxima dela sem ter medo, o que de acordo com o depoimento de Samanta é impossível, porque Catarina é uma aberração e pode matar qualquer um apenas com o toque por ter se aproximado dela.
Com passos pequenos e lento me aproximo também, Bridget sorri para a garota e espera eu estar mais perto para disser alguma coisa.
— Oi, Catarina. Tudo bem? — Bridget pergunta, simpática. Catarina concorda balançando a cabeça — Bom, eu só vim aqui para avisá-la que a partir de hoje você terá um psicólogo que ajudará você com os seus... problemas, — ela explica e a cabeça de garota se movimenta na direção dela — sei que não gosta muito de conversar sobre isso, mas isso é necessário.
Há outra poltrona diante da que Catarina está sentada e assim que Bridget se afasta sento-me nela sentindo o tecido macio e fofo sob mim. Então concluo que está inteira. Ela não deve ser muito usada, pois ninguém deve se aproximar muito de Catarina. Será que todos têm medo dela?
Seu rosto está novamente na mesma direção de sempre e seus olhos estão voltados para a janela, onde por incrível que pareça agora está chovendo. As gotas da chuva atingem os vidros da janela fazendo pequenos barulhos quase inaudíveis e suaves. Chega quase a ser gostoso de ouvir.
Não sei o que a faz olhar tanto para fora, como se fizesse muito tempo que ela não sai e quisesse estar lá.
Assim que penso isso seu rosto se volta para suas pernas, como se ela tivesse ouvido meus pensamentos e não quisesse que eu saiba o que sente, ela sente falta de estar do outro lado dessas paredes.
— Oi, Catarina. Eu sou o Dr. Ian Price — Apresento-me e ela continua olhando para sua perna — Poderia me disser seu nome completo? — Pergunto e ela nega — Por que?
Catarina está segurando a manga de sua blusa e só consigo ver a ponta de seu dedo indicador quando ela aponta para os papéis sobre a mesa entre nós. Ela tem razão eu sei seu nome completo e mesmo que não soubesse os papéis diriam isso por ela.
— Tudo bem, sei que apontou para os papéis porque sabe que neles está a maioria dos seus dados. Então irei perguntar algo que não está neles, qual é o motivo de você agredir tantos enfermeiros?
Novamente ela aponta para os papéis, mas não sai nenhum som ou gemido de sua boca e graças ao capuz da blusa não consigo ver seus olhos e cabelo.
— Você não irá falar comigo?
Ela olha para outra direção, para o sofá onde Liam parece estar dormindo, então olha novamente para mim e balança o dedo indicador que não estava mais coberto pela manga da blusa. Ele se move para os lados depois ela levanta a cabeça permitindo que eu veja seus olhos e rosto, ainda não consigo distinguir a cor por causa da escuridão, mas vejo seus olhos se moverem para o lado como se fossem uma resposta.
— Se eu fazer perguntas de sim ou não você me responde? — Pergunto mais animado e dessa vez ela mexe o dedo para baixo e seus olhos também, junto com um movimento leve de cabeça — Tentarei ser exato então, você tem vergonha de falar em público? — "Não", essa foi a resposta pelo mexer do dedo para os lados — Se eu levar você para uma sala, onde só haverá nós dois, você se expressaria melhor?
Sua resposta foi "Sim". Sei que com isso não terei problema a senhora Del Monte me disse por telefone quando me contratou que eu teria uma sala a meu dispor se eu precisasse e como virei uma vez na semana vai ser bom conversar com Catarina em um lugar onde ninguém a conheça e que não há vários olhares sobre ela, como se a pressionassem.
— Então semana que vem quando eu voltar nos encontraremos no meu consultório temporário aqui mesmo no Santi's, tudo bem? — Eu explico e ela diz sim com os movimentos e o olhar para baixo — Não a forçarei a responder o que não quer, mas eu gostaria que se esforçasse a me provar que você não é uma aberração como dizem e que tem um porquê para você olhar a chuva cair.
Vejo a ponta de seus lábios se curvarem em um sorriso, ela me entendeu e sorriu, isso é um avanço muito útil para meu relatório. Que não terá muito o que escrever já que nossa conversa foi minimizada a perguntas de sim ou não.
— Foi bom conversar com você, Catarina. Mesmo que só eu tenha falado por aqui — Agradeço e o sorriso permanece — Até a próxima consulta.
Aceno para Bridget que está conversando com John pois a maioria dos outros pacientes estão ocupados jogando e não precisam da sua ajuda.
— Já acabou? — Ela pergunta.
— Nem tem muito o que falar já que ela não se expressa com todos aqui. Farei o relatório e deixarei no balcão na entrada e avise a Sra. Del Monte que usarei minha sala na próxima semana e se tiverem problemas com Catarina não esqueçam de me ligar.
Meu relatório tinha dez linhas, isso porque decidi escrever mais do que havia para escrever, se eu quisesse escrever a verdade do que realmente aconteceu na consulta daria muito menos do que dez linhas, mas são dez linhas muito bem-feitas. Decidi que ficaria mais um pouco para observar Catarina na ala de jogos, conversei com John porque foi ele quem defendeu Catarina das ofensas de Samanta. Ele não falou muito porque precisava prestar a atenção nos pacientes. O silêncio de Catarina era tão profundo que eu poderia entrar nele e descobrir muito mais do que ela quer que a maioria de nós saibamos. Contei os dias para voltar na semana seguinte e decifrar mais histórias atrás daquele silêncio. Passei a semana estudando sobre Catari
Chego em casa com muito tempo de sobra para a hora que minha mãe havia marcado de chegar. Ela falou que passaria em uma cidade antes de vir até aqui, isso me dá tempo para fazer sua comida favorita, pelo menos um prato dela já que não sou um cozinheiro nato para fazer vários pratos franceses. Consigo fazer o famoso"Coqau Vin"e um pouco de arroz para acompanhar. Minha mãe pode ser uma pessoa refinada, mas gosta de comida caseira. Salada de beterraba e repolho roxo, vinho da safra favorita dela (esse foi ela quem pediu). Enquanto oCoqau Vinestá no fogão preparo a mesa do almoço do lado de fora da casa. Tem uma porta de vidro na cozinha que leva para o quintal. Nele há uma árvore bonita onde tem um bala
Noite passada eu não tinha conseguido dormir e o problema foi que imaginei, ou melhor, sonhei em como seria minha vida se eu decidisse ter algo com Bridget e não consigo me imaginar assim. Com ela tudo parece estranho. Não que ela não seja bonita, ela é muito bonita, mas não me imagino tendo uma vida com alguém, parece que depois da Alexis eu acabo me saindo mal no amor. Eu não quero parecer rude, mas agradeço por Catarina não ter tido algum problema durante a semana que me fizesse ir até lá e ter que decidir logo o que falar com Bridget. Na verdade, tive que me preocupar com algo novo, melhor dizendo, pessoas novas. Como minhas novas vizinhas da frente. Eu não sei o que aconteceu. Só me lembro que dur
Não consegui dormi nos dias seguintes. Eu tentei várias vezes durante o dia e até mesmo a noite sonhar novamente com Catarina para saber mais sobre aquela história da praga. Ainda não acredito no que minha mãe disse, mas é interessante. Tentei também lembrar da voz que eu ouvi pedindo para Catarina me mandar embora antes de começarem a bater na porta com brutalidade e eu não tive sucesso. Não fiquei muito em casa para não acontecer de uma das minhas novas vizinhas aparecerem sem serem convidadas, então passei um bom tempo na lanchonete do centro. Uma lanchonete branca com detalhes vermelhos e pretos. O movimento sempre é calmo durante o dia e de tarde, mas no almoço não é assim, há tanta gente que não consigo respirar direito.<
Catarina não me contou nada sobre o homem que ela tinha desenhado, inclusive quase me fez perder a cabeça por alguns instantes, quando seus olhos me cativaram por um bom tempo. Assim que saio do Hospício percebo que minha respiração está diferente, claro, fui acusado de ter abandonado meu filho que eu nem sabia que tinha. Pelo menos para Catarina eu tenho um filho, ela deixou claro que não sonhou com a mãe da criança, mas que tentaria. Dirijo por mais tempo do que costumo dirigir, pois meus pensamentos voam dessa vez. Tento ao máximo me concentrar na estrada, mas eles parecem ter vida própria colocando momentos da minha vida que já vivi na minha cabe&c
— Se você aceitar jantar comigo — Sugiro. Seus olhos ganham um brilho esperançoso, então sem dizer nada apenas sorrindo ela entra. — Eu já tinha feito o jantar e eu sempre faço para mais de uma pessoa. — Eu imagino, Ian. E sei também que você cozinha muito bem. Entro na cozinha e coloco um prato no balcão para que ela se sirva da comida que está no fogão, eu não me sinto na obrigação de montar uma mesa para jantar sendo que apenas eu irei comer. Hayley pega o prato enquanto ai
Não há remetente na carta, sem um nome no qual eu possa ter certeza que a carta seja verdadeira, talvez a senhora da livraria saiba o que pode estar esperando por mim assim que eu ler esse livro, mas não voltarei a ver ela para que me olhe como me olhou hoje. Talvez eu esteja completamente encrencado. Depois de deixar o livro de lado eu acabo me sentando para fazer a lista dos possíveis lugares nos quais posso levar Catarina, não sei se serão os melhores lugares para que ela veja, mas escolho os pontos turísticos da cidade e as lanchonetes mais calmas também. Meia hora antes do combinado para ir ao jantar na casa das vizinhas eu decido tomar banho, não consegui ler o livro, mas tenho certeza de que a curiosidade vai ficar martelando na
Como alguém ficou sabendo sobre essa história para poder escrever esse livro? Pelo o que entendo, essa foi a peste que fez Santis Lorde se tornar a cidade sombria que ela é hoje. Ainda não sei como fez ela ser abandonada, quase uma cidade fantasma e também não sei o que eu, ou melhor, Catarina tem a ver com essa história? E porque ela estaria em um salão lotado de pessoas mortas? # # # # # Passei o resto da semana deitado, em pé e sentado, mas não larguei o livro nem por um segundo. Consegui adiantar muita coisa, li moti