A manhã seguinte ao nascimento da menina começava a clarear o quarto de James e Marissa, onde Ravenna tentava dormir, mas sem sucesso pois acordara inúmeras vezes durante a noite suada e ofegante, relembrando as horas de terror passadas ao lado de Beline. Ela decidiu, então, levantar da cama e lavar o rosto para checar a bebê que dormia com a criada no andar de baixo. A criada insistira para ficar com a menina mesmo Ravenna determinando que ela precisava descansar. Andando em direção ao lavatório, ela parou sentindo as pernas fraquejarem e repousou a testa na grande porta de madeira escura do quarto de banho. “Era difícil”, pensou, “continuar sem Beline era uma tarefa muito difícil”. A dor não parava de queimar em seu peito, seu coração sempre em constante agonia. O único motivo de segurar as lágri
No primeiro lar para crianças que encontraram, as funcionárias não tinham a menor ideia de quem era Anthony ou a criança. Não recebiam um bebê recém-nascido há meses. Ravenna inspecionou todos os bebês do orfanato e não achou a filha entre eles. Já estavam na estrada há 3 dias, paravam em estalagens para dormir, alimentar-se e trocar os cavalos, e no dia seguinte seguiam viagem até o próximo lugar da lista.Passaram sete dias viajando atrás de todos os orfanatos próximos até chegarem ao orfanato St. Joseph. Ravenna estava exausta e malnutrida, não comia uma refeição decente há mais de duas semanas, não conseguia pregar os olhos a noite e chorava sempre que estava sozinha. Jaden e Meredith eram seu braço direito e esquerdo, e a esperança de encontrar a filha era o que a mantinha de pé ali.
A cidade continuava a mesma de sempre, cinza e suja, cavalos e carruagens empesteando as ruas que, mesmo na baixa temporada, já possuíam um odor característico de Londres. Algumas pessoas andavam pelas calçadas como se não houvesse amanhã enquanto outras sorriam e pensavam estar em algum tipo de passeio pitoresco. Em todos os casos, todas aquelas pessoas eram insignificantes, poderiam cair ao chão sem vida naquele instante e Ravenna acharia algo natural e talvez, até agradável. Ansiava apenas por chegar em casa o mais depressa que pudesse para ver a mãe, a carta não explicava que doença ela havia contraído, apenas dizia que não havia muito tempo, o que deixara Ravenna com o coração apertado de preocupação. A viagem de volta transcorrera sem qualquer agitação, Meredith dormia durante a maior parte da viagem, enquanto Ravenna observava a pai
A aristocracia inglesa não passava de uma grande hipocrisia disfarçada de bons costumes. Os nobres expunham uma vida de moral imaculada, de acordo com a visão da atual soberana, quase passíveis de canonização. Mas por trás das cortinas escondiam toda a sua depravação, imundice e pecados. Governados por alguém que considerava as mulheres inferiores aos homens, a nobreza era um verdadeiro show de horrores para Ravenna. Enquanto divagava perdida em seus pensamentos, ouviu alguém bater à porta e Darcy logo se agitou em seu colo.— Entre — ela ordenou, imaginava que Meredith viria trazer seu chá e checar o novo residente antes de ir dormir.— Milady... — Meredith lhe chamou, a hesitação aparente em sua voz — Nós temos algo importante para lhe falar.Ravenna girou o corpo no
Seymour House. Londres, 1844Killian Harvey Crawford Seymour, Visconde de Combermere, primogênito de Michael Harvey Crawford Seymour e Samantha Harvey Crawford Seymour, era o herdeiro do título de Conde de Beaumont, e único irmão de Hellen.Aos vinte e quatro anos o jovem cavalheiro já visitara quase toda a Europa e também a América. Passava mais tempo pelo mundo do que próximo à família. Killian não sentia-se em casa na Inglaterra e muito menos dividindo a residência com seus pais, por isso os evitava ao máximo.Desde criança aprendera a nunca questionar a autoridade de seu pai — o oitavo Conde de Beaumont era um homem frio como um inverno congelante — e a jamais cometer um erro sequer em sua presença. Michael era o típico nobre inglês que visava apenas a riqueza e a glória. Um
Paris, 1846Dois anos em Paris não servira para amenizar o remorso de Killian, que seguia em sua missão de afogar sua culpa por sua irresponsabilidade indo a festas e se embriagando.Killian voltava para casa ao amanhecer após uma noite inteira regada a mulheres e bebida, seguia cambaleante pelas escadas quase derrubando seu valete ao tentar lhe entregar a bengala e o chapéu. O criado o avisou sobre as correspondências do dia e enfatizou que a condessa enviara uma carta urgente para o filho. Killian desconfiou ao ouvir que sua mãe escrevera para ele, a mulher nunca nem sequer notara a existência do filho, o ignorava bem como ignorava Hellen. Como não estava em condições de interpretar qualquer mensagem escrita por qualquer um, decidiu ler a missiva quando estivesse minimamente sóbrio.Já era quase noite quando Killian, enfim, acordou. A
Londres, 1846Ravenna adorava visitar a casa da senhorita O’Hara, ou como gostava de chamá-la:srta. Mela.A família O’Hara possuía um grande casarão em uma das ruas mais prestigiadas de Londres, além de uma majestosa propriedade no campo. Ravenna adorava o bom gosto e requinte com o qual tio Dom decorava cada cômodo da casa. A rainha poderia pedir-lhe conselhos sobre moda se não fosse tão esnobe.Ravenna aguardava a amiga em uma sala ampla decorada por quadros de paisagens ao ar livre, alguns retratavam praias e mares de diferentes lugares do mundo. Ravenna sabia da paixão de Eva pelo Brasil e acostumara-se a ver sempre algo na casa que remetia ao país, um dos quadros retratava o que Ravenna imaginava serem as praias do Rio de Janeiro. As paredes eram de um t
— KILLIAN HARVEY CRAWFORD SEYMOUR! — Uma voz irritada e indicando um péssimo humor, o berrou enquanto sacodia o corpo de Killian, que sentiu a claridade invadir o cômodo segundos depois.Mas qual cômodo? Killian pensou.— Eu não ficarei aqui a manhã toda, seu bêbado miserável! COMO PÔDE VOLTAR PARA CASA, EXPULSAR NOSSA MÃE E NEM SEQUER VIR FALAR COMIGO? — A garota continuava berrando aos quatro ventos fazendo até com que Pierre, o valete, fizesse cara de quem estava prestes a ter os tímpanos estourados.— Hellen, por favor não grite ou você me matará antes mesmo que eu consiga levantar desta cama. — Killian respondeu e abriu os olhos relutante inspirando profundamente.— Não estaria assim se não tivesse bebido até desmaiar! Seus amigos precisaram carregar voc&e
Crawford House, 1849Após três longos anos residindo no campo, Killian e a irmã criaram uma rotina confortável, onde apenas o conde viajava para Londres afim de tratar de assuntos políticos na câmara dos Lordes, e voltava assim que suas obrigações chegavam ao fim. Hellen permanecia em Crawford House em tempo integral, nas horas vagas aprendia por conta própria a tocar violoncelo na companhia da Srta. Reed, sua preceptora. Emilly Reed era sua melhor amiga, sua confidente e aquela que a ensinava a controlar seus impulsos. Killian fazia sua parte e tratava a irmã com carinho e lhe dava toda a proteção que ela poderia precisar, contudo, haviam determinados assuntos que apenas a Srta. Reed entendia. Como por exemplo, as regras de Hellen, que começaram logo após sua vinda para o campo. Ela não poderia conversar sobre aquele assunto com Killian, de jeito nenh