Aos poucos Amélia foi acordando, estava em um quarto branco e amarelo pálido com uma tv enorme embutida na parede, um vaso de flores do campo de perfume suave; era um hospital particular.
Não fazia ideia de como foi parar ali, ela não tinha convênio médico e nem um centavo no bolso para pagar. Se sentou na cama reclinada confortável, o lençol macio escorregou revelando a camisola fina com o logotipo do lugar de alto padrão.
Esse é o tipo de hospital que os artistas e gente montado na grana procura quando precisa.
Pelo menos a dor praticamente sumiu. Não via sinais de que passou por algum procedimento cirúrgico, felizmente.
Amélia suspirou de alívio. Sentindo-se observada, ela se virou nos travesseiros macios; seus olhos se depararam com um homem parado perto da porta fechada.
O homem a observava em silêncio. Incrivelmente alto e forte, imponente, o terno preto de alfaiataria cara talhava um porte muito sofisticado e másculo. O físico desenvolvido era invejável; os olhos de tom profundo de cinza esverdeado, faziam seu rosto ser ainda mais expressivo.
Com a barba farta, perfeitamente aparada, moldando o queixo longo e quadrado, ele parecia encarnar um verdadeiro espartano.
Cada detalhe de sua aparência exalava força e mistério, como se fosse esculpido para atrair olhares. Os lábios, alinhados em uma linha precisa, conferiam um toque de severidade que apenas acentuava sua expressão marcante e impecavelmente desenhada.
Tudo nele irradiava masculinidade, poder e uma aura enigmática que parecia prender o ambiente ao seu redor. Seu magnetismo era quase irresistível, um reflexo de sua essência indomável.
Ela percebeu que estava olhando para ele por tempo demais. Envergonhada, piscou os olhos algumas vezes.
Fazia muito tempo que não se deparava com alguém daquela posição social. Se sentia tão insignificante perto de alguém como aquele homem a sua frente.
Ele retirou uma das mãos do bolso da calça e passou pelos cabelos castanhos claros, os alinhando no corte moderno, os fios estavam úmidos pela chuva.
O homem andou com passos firmes para perto da cama, parando somente quando a viu puxar o lençol rapidamente e se cobrir até o pescoço.
- Acho que está no quarto errado, senhor. - os olhos dela travaram nos dele em desafio.
Que merda! Ele não deveria se aproximar assim. Amélia não queria ficar perto de alguém como ele.
O cara olhou para ela com severidade. Amélia se arrepiou de uma forma diferente, ela não sabia traduzir o que estava sentindo.
Era vergonha? Medo ou Curiosidade?
- Não estou no quarto errado, Amélia Bastos.
O choque de seu nome pronunciado por aquele tom de voz grosso e rude, a deixou sem reação.
Ele continuou olhando fixamente nos seus olhos. De repente, seus lábios se curvaram levemente para o lado esquerdo, fomando um meio sorriso diabolicamente atraente.
- Estou no lugar de seu responsável, momentaneamente.
Levou alguns minutos para compreender o que ele queria dizer com essa afirmação, mas logo entendeu a situação toda.
Amélia só conseguiu sentir raiva, desalento e frustração, desviou o olhar para a janela como se perdesse o interesse na conversa e naquela pessoa.
- Então foi você quem me atropelou. - ela acenou com a mão esfolada, despreocupadamente. - Eu não vou prestar queixa, estava chovendo, fica propício a acidentes.
Agora entendia quem ele era e como sabia seu nome. Ele a atropelou e como precisava prestar socorro, pegou seus documentos de identificação e se responsabilizou por ela no hospital.
- Não deveria mesmo. Você foi imprudente. – o tom de voz rude dele, era como se estivesse tocando sua pele.
Quem ele pensa que é?!
- Foi você quem me atropelou! O único imprudente aqui é você. Eu já disse que não vou prestar queixa, portanto pode ir embora.
- Somente uma maluca para tentar concertar um carro sob a chuva sem nenhuma ferramenta.
- Você não sabe nada sobre mim! É só um riquinho arrogante. – Amélia respondeu com rispidez.
Seus olhos ferviam de raiva. Agora ela quem provocou seu próprio acidente! Era só o que faltava.
- Não estou preocupado com o que você acha. Se está bem, vista-se. Vou te levar para sua casa.
- Não preciso de ajuda, você pode ir embora.
- Mesmo? – ele ironizou. – Como vai sair daqui sem a sua bolsa e sem nenhum dinheiro? Vai voltar para casa andando?!
- Ótimo! – ela resmungou entendendo que ele estava certo.
Assim que percebeu que os olhos dele estavam avaliando seu corpo. Praguejando baixinho, ela se enrolou ainda mais no lençol do hospital.
Amélia estava mortificada de vergonha, já conseguia imaginar os pensamentos depreciativos dele, enquanto fazia aquela análise descarada.
- Se essa é a única forma de me livrar de você, saia. Eu vou me vestir. - respondeu enfrentando seu olhar firme e minucioso.
- Como quiser, Amélia. – ele respondeu com um sorriso misterioso.
A entonação melódica que usou para falar o seu nome, provou um verdadeiro caos em seu interior. Esse maldito estava brincando com a cara dela.
Assim que ele saiu, se levantou procurando suas roupas. Entrou no banheiro, mas não encontrou nada lá.
Queria ir para casa sem olhar para esse homem de novo, mas não adiantava fazer birra, ninguém viria buscá-la, e ele estava com a sua bolsa.
Também precisa buscar o seu carro. Se ele ficasse na frente daquele prédio, com certeza seria levado pelo guincho.
A roupa de camaleão não estava em nenhum lugar. Estava prestes a se enrolar no lençol e sair para perguntar por ela, quando viu uma sacola de papel sobre a poltrona de tecido cru.
Dentro dela havia um vestido preto, com decote desenhado em renda, que se abria em foma de A depois da cintura. A etiqueta mostrava o nome de uma grife plus size exclusiva, com o tamanho exato de seu manequim; 48.
Ainda com vestido nas mãos ela não conseguia chegar a uma conclusão sobre aquilo. O vestido era perfeito, serviu como uma luva quando ela decidiu usar. Não sabia nada sobre aquele homem, e ele deduziu o seu tamanho com uma só olhada?!Tudo estava confuso demais. O que aconteceu com fantasia de camaleão, e por que ele se deu ao trabanho de comprar uma roupa daquelas para uma desconhecida que ele considerava uma maluca?!No espelho do banheiro ela deu uma ultima olhada em seu reflexo. Seus cabelos estavam embaraçados e molhados, seu rosto estava horrível, com um inchaço enorme no formato de bola na testa; um corte no lábio e um na sobrancelha esquerda; parecia cuspida pelo próprio desespero.Mas a roupa trazia a dignidade que precisava para sair desse quarto. Ela pagaria pelo vestido, obviamente.Saiu do quarto sem olhar para o homem. Quando sentiu uma tensão estranha e só ouviu o silêncio, resolveu apelar para seu orgulho próprio.- O que aconteceu com minha roupa? – ela levanto
O cheiro do homem ao seu lado era uma droga. Uma mistura alucinógena entre o amadeirado sofísticado e o doce excêntrico. Amélia se pegou inspirando fundo, só para reter aquele cheiro delicioso por mais tempo. Suas mãos enormes, com veias saltadas segurando a direção, expunha um anel de obsidiana, e um relógio caríssimo de edição limitada.Lembrava-se que esse modelo era único, alguém da sua antiga vida, tentou adquirir aquele relógio. E quando não conseguiu, foi ela quem arcou com as consequências.Amélia se encolheu. Queria esquecer tudo aquilo, até agora se saiu bem, ela nunca conviveu ou encontrou pessoas como esse homem. Fez um bom trabalho em se esconder e recomeçar como uma outra pessoa.Até aquele acidente, não tinha cruzado com ninguém que pudesse comprometer sua identidade. Sua terapia estava indo muito bem, sua vida era sacrificante, mas a liberdade não tinha preço.Estava tudo bem. Logo chegaria em casa, e ela fecharia essa porta e jogaria a chave fora.O que aconteceu a po
ÍcaroO vestido que mandou trazerem para ela, caiu como uma luva, modelando sua cintura e os seios redondos e volumosos. Sua boca ficava seca de vontade, só de olhar para o contorno daquele decote.A surpresa em reencontrar aquela menina mascarada ainda provocava um frenezi por todo o corpo. Se conter deixou de ser uma opção, depois de tanto tempo, não poderia deixar ela ir sair assim, sem ter certeza que essa mulher gostosa, de olhos desafiadores, era a sua garota daquela noite.O gosto dela era o mesmo. A boca quente de lábios indecentes, a reação pecaminosa de seu corpo ao dela. Sim. Não tinha dúvidas. Era ela, com certeza. A sua garota.O olhar confuso dela inflamava seu sangue, deveria possuír Amélia Bastos no meio da rua? Talvez assim, ela se lembraria de como gemeu inocentemente sob seu corpo, enquanto pedia por mais de seu toque.- Não deveria ter feito isso...A voz dela soou tão baixa, que por um instante julgou ter imaginado suas palavras.Levou a mão ao seu rosto, passand
AméliaA certeza de que fez papel de ridícula era mortificante, mas ela só queria sair da presença daquele homem que a fazia se sentir em brasa viva.Como foi que aquele beijo aconteceu? Tocou os lábios com as pontas dos dedos, ainda sentindo a boca dele ali. Seu sangue pulsava para áreas adormecidas do seu corpo.Deslizou contra a porta. O que havia de errado com ela?! As pernas amoleceram, como se fossem parafina contra o fogo. O batimento acelerado de seu coração deixou a garganta seca, sedenta de algo que não era água.- Eu preciso arrumar um namorado... – murmurou para si mesma.Repassando cada gesto dele, seu jeito forte de pegar e apertar; provar e devorar; certamente ele estava acortumado a ter as mulheres se jogando aos seus pés.Ela não era feita de ferro. Que santa resistia a um homem daquele?Além de gostoso, forte, ele era muito atraente e másculo. E com um beijo desses, poderia fazer qualquer uma perder a sanidade.- Não seja burra Amélia! Pare de pensar nesse homem....
Logo que o dia amanheceu, já estava de pé. Pronta para sair em busca de emprego. Antes de clarear, ouviu o barulho da porta, com certeza Sam voltou para casa cedinho, para não perder o dia de trabalho.Ela sempre foi muito comprometida, mesmo quando ficava doente, não costumava faltar.A caminho da cozinha, passou quarto de Samanta, que estava aberto. Era totalmente diferente do seu, em gosto e pertences. Equanto sua prima era romântica e delicada, o seu gosto era mais sóbrio e sério sem ser impessoal.O seu quarto já era o oposto, era básico apenas com uma cópia de uma pintura de Renoir, era simples e as paredes em amarelo claro conferiam um certo aconchego, os móveis eram rústicos e pequenos e o único detalhe pessoal era uma foto das duas no porta retrato no criado mudo com um abajur simples.Havia várias roupas sobre a cama, sandálias e sapatos muito bonitos e elegantes no chão. Sua prima estava sempre na dúvida do que vestir quando ia sair com aquele novo namorado, era como se ela
Procurar emprego é cansativo e frustrante. Ela rodoy o dia todo procurando uma vaga que cubrisse seus gastos. Mas não encontrou nada que chegasse perto. O único lugar que estava pagando um pouquinho melhor, ficava muito longe da faculdade, e seria impossível chegar lá no horário das aulas.Amélia pegou o cartão do transporte público e guardou na bolsa. Passava das seis e meia da tarde, estava na hora de ir para a lanchonete.Sábado a noite era um dia muito movimentado no estabelecimento. Chegou ao lugar suada, com os cabelos presos em um coque frouxo, e uma mancha na calça jeans. Alguém passou por ela dentro do ônibus e derramou molho de alguma coisa na sua roupa.Cumprimentou algumas pessoas que eram clientes assiduos, e se voltou para os fundos.A cozinha já exalava o cheiro de fritura dos salgados e lanches. Gostava de trabalhar ali, porque não tinha que lidar com o público.O tempo passou rápido. Logo já estava na hora de limpar tudo e encerrar a noite. Levou a última bandeja pa
-Para onde está me levando? Isso é sequestro, sabia?! - protestou ela. Ícaro cerrou o maxilar, evidenciando sua irritação. Lançou um olhar penetrante na direção dela e não disse mais nada. -Pare o carro, eu quero descer! Amélia tentava abrir a porta inutilmente. O cheiro forte de óleo de fritura que ela exalava, deixava a mulher ainda mais constrangida. Não deveria estar perto desse homem de novo. Muito menos assim, suja e cheirando a salgado frito! Que merda de sina era essa, que toda vez que estava mal vestida e nada apresentável, esse riquinho aparecia?! A camiseta azul clara que vestia, estava colada nos seios grandes e nas dobras de gordura de sua barriga. Havia manchas de molho nela, porque o avental que usava na cozinha era pequeno demais para o seu tamanho. Que vergonha! Amélia abraçou a mochila para esconder aquela visão horrível. Seus cabelos estavam presos no costumeiro coque no alto da cabeça, e alguns fios se enroscavam em seus brincos de trio. -Deveria estar em
ÍcaroA pasta sobre sua mesa continha documentos importantes sobre o novo projeto da Acrópole. Estava assinando as páginas que já tinha revisado, quando seu assistente bateu na porta e entrou.- Estava me perguntando onde você se meteu a manhã toda.- Você estava precisando de mim? – Ticiano tirou o celular do bolso, checando sua tela. – Não tem nenhuma chamada perdida.- É porque eu não te liguei. – respomdeu, sem levantar os olhos dos papeis que assinava. – Sente-se.- O complexo da Casa Verano foi concluído com sucesso. A inauguração contarará com um evento grande, eles contam com a sua presença e a do senhor Alberto.Na hora do almoço, sempre repassavam os compromissos para os próximos dias. Era uma maneira eficiente de se preparar para suas reuniões.- A viagem para Dallas está marcada para o dia dezenove, daqui a oito dias, a transação com a Hilse esta na faze final, a sua presença fechará o negócio.- Meu irmão confirmou presença?- O senhor Alberto não irá, disse que não pode