Capítulo 3
Ao encerrar a ligação, o policial sacudiu a cabeça com o rosto nublado de preocupação. Mesmo com a chamada direta dos sequestradores, o rastreamento continuava impossível.

Ao me virar, encontrei Valentino paralisado a alguns passos. Seu rosto tinha perdido todas as cores e as palavras saíam entrecortadas:

— Bruna, meus tios foram realmente sequestrados? Mas o Arthur me jurou que era tudo armação sua...

Ignorei sua perplexidade e não tinha ânimo para explicações, cortando seco:

— Ligue para ele. Agora. Conte a verdade.

Meus olhos não saíam do relógio. Como o tio do Arthur, dono de uma fortuna, ainda não tinha transferido os cinco milhões? Após minutos de espera inútil, decidi ligar.

— Bruna? — A voz envelhecida ecoou na linha. Abri a boca para falar, mas ele antecipou com um suspiro carregado. — Bruna, mentira tem perna curta. Naquela família, só seus sogros te toleram, ninguém realmente se importa com você. Até quis te ajudar por pena, coitadinha... Mas até a piedade tem limite. Se não fosse sua mania de inventar histórias, meu sobrinho não teria fugido de você.

Meus dedos contraíram no aparelho. Então percebi que os cinco milhões estavam perdidos.

— Foi o Arthur que inventou essa história? — A voz me saiu mais aguda que o pretendido. — O senhor pode verificar com a delegacia, os policiais estão aqui comigo. Eles podem provar que estou falando a verdade.

— Não precisa contratar figurantes. Mesmo que me engane hoje, vai enganar a si mesma? — Ele me interrompeu com suspiros teatrais e sua voz ganhou um tom paternal insuportável. — Sei que você gosta do Arthur e não quer desistir. Mas o coração do Arthur tem dona, e ela voltou. Se dói tanto, por que não entrega os papéis?

Desliguei com um toque brusco. As unhas cravavam na palma da mão.

Como parentes do sangue podiam ver aquela tragédia como mera disputa de casal?

Do outro lado do corredor, Valentino finalmente conseguia contato.

— Arthur, me escuta! Seus pais parecem ter sido sequestrados... A polícia...

Antes que ele terminasse, Helena interceptou com voz melosa:

— Valentino, caiu no conto da louca? Quanto ela está te pagando? Dobro o valor.

— Não é mentira! — O grito ecoou nas paredes descascadas.

Ouvi o ruído da passagem do celular.

— Arthur. — A voz de Helena pingava mel. — Seu primo agora é ator coadjuvante.

— Chega, Valentino. Está me envergonhando. — Repreendeu Arthur, com frieza.

— Arthur, seus pais estão em perigo. Pelo amor de Deus, transfere cinco milhões para Bruna salvar eles! — Valentino soluçou.

Arthur deu uma risada seca e retrucou:

— Claro, tudo pelo meu dinheiro. Diga para a Bruna parar de fingir e se fazer de coitada, ela está enlouquecendo. O que a Helena fez para merecer isso?

A linha caiu com um clique definitivo.

Sem alternativas, soltei um sorriso desesperado na cara do policial e sugeri:

— Vamos embora. Mesmo sem o resgate, eu tenho que ir. Sou a isca perfeita pros sequestradores.

O agente franziu a testa, negando com veemência:

— Loucura completa. Você está se oferecendo de alvo móvel.

Baixei a voz, surda mas teimosa:

— Se forem conhecidos... Minha presença pode distraí-los. Policiais vão só espantar.

O silêncio pesou entre nós até ele ceder. Arranquei em disparada para a Ponte Central. No trajeto, o celular dos bandidos voltou a apitar.

— Cadê o dinheiro? — A voz anasalada do outro lado cortou o silêncio.

Encarando o vento que apunhalava meu rosto, respondi com a garganta travada:

— O dinheiro está debaixo da ponte. Cumpra sua parte. Cadê eles?

— Prédio abandonado em frente à ponte. Apê 301. — A ligação caiu antes que eu replicasse.

Arranquei em disparada. Cada passo no asfalto rachado parecia fincar agulhas nos pés. Quando arrombei a porta enferrujada, um fedor metálico de sangue me invadiu as narinas. O coração batia no ouvido igual maracatu de rua.

A trilha vermelha me levou até o apartamento 301. O sangue escorria em rios por baixo da porta. Ao empurrá-la, o cenário me arrancou um grito abafado.

Meus sogros exibiam dois rasgos profundos no ventre, jorrando vida pelo assoalho. Ajoelhei em pânico, usando minha blusa como torniquete improvisado, tentando conter o inevitável.

Com mão trêmula, minha sogra me impediu:

— Para com isso, Bruna. Já não adianta.

— Já liguei para o hospital. — Eu soluçava, misturando lágrimas com sangue nas mãos. — A polícia também está a caminho. Por favor, aguente mais um pouco. Desculpa... Eu devia ter conseguido o dinheiro.

Ela deu um sorriso cansado.

— Escuta aqui, isso não é sua culpa. Esses bandidos nunca iam nos deixar vivos. — Um acesso de tosse a interrompeu, manchando os lábios de vermelho. — Divorcia desse merda do Arthur. Deixamos tudo no seu nome. Some daqui e siga em frente...

Um estalo me fez sacar o celular. Liguei para o número de Arthur. Porém, nada. Percebi o bloqueio nas ligações.

Tentei enviar mensagens no WhatsApp: [Seus pais tão sangrando até a morte no apê 301. Aparece, porra!]

Contudo, conta do WhatsApp exibia a maldita marcação azul não lida.

Quando olhei de novo, os olhos deles pareciam vidro fosco. Despenquei no chão úmido, engolida por um vazio que doía no peito.

— Srta. Bruna, você está bem? — A voz do policial veio de trás de mim.

Ergui a vista para ver a dupla de agentes petrificados diante dos corpos. O mundo girou feito pião.

— Pegamos os caras. — O mais velho se aproximou e me segurou, dizendo em voz baixa. — O dinheiro está intacto. — Ele completou em voz pastosa. — Sinto muito, chegamos tarde. Meus pêsames.
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