Era difícil ver o mundo através de um prisma cor de rosa, ou ver o copo meio cheio, quando a vida fazia questão de mostrar a cada instante o quanto você era uma perdedora de merda. Quando estava no alto daquele prédio, ela olhava para baixo e decidia se devia pular ou não.
Ficou ali por umas duas horas e chegou a conclusão que estava sendo muito dramática. Ainda havia caminhos a seguir, aquele não era o fim.
Desde a adolescência estava acostumada a ficar deprimida, com o que os outros faziam a ela e dessa vez não seria diferente. Ficaria mal uns dias e depois se levantaria, precisava se levantar. Desceu todos os dez andares do prédio que ficava no centro da cidade e foi caminhando a esmo, entrando no primeiro bar aberto que encontrou. O bar parecia um daqueles pubs dos filmes, com o ambiente pouco iluminado e uma decoração em que a madeira predominava. Ela escolheu sentar-se no balcão, para ficar mais próxima do bar.
Ir a bares também não era um costume seu, com 22 anos de idade, aquele era o primeiro em que entrava na verdade. Quem costumava fugir para ir a bares era Maria do Céu, ela era mais de ficar em casa lendo ou vendo tv, definitivamente a típica jovem nerd.
Regina havia sido desde sempre o que costumavam chamar de vítima da sociedade. Não era pobre, nem se enquadra em nenhuma das diversas categorias de minorias sociais, talvez apenas por ser ser mulher. Era uma jovem de família rica, que nasceu em berço de ouro, como diziam.
Seus pais Maria do Céu e João Vicente eram amorosos e dedicados, nunca lhe faltou absolutamente nada. Porém isso tudo não impediu que ela crescesse com fortes estigmas, sofrendo bullying dos colegas por toda a infância e juventude.
Sempre foi muito tímida e introvertida, diferente da amiga Maria do Céu. Como suas mães eram melhores amigas, deram seus nomes às filhas. Cada uma ganhou o nome da mãe da outra. As duas meninas cresceram como irmãs, inseparáveis e Regina precisava admitir que Céu sempre havia sido sua maior defensora.
Desde muito cedo havia descoberto que precisava usar óculos, sem eles enxergava pouco, o que fez com que se tornassem seus companheiros de toda a vida. Também não ligava muito para moda e tendências, vestia o que considerava confortável e comia muito bem, o que não a fazia não estar sempre no peso considerado adequado, suas roupas giravam sempre em torno do número 42, e quando era criança, era mais gordinha ainda. Por ser dessa forma, o bullying veio forte e ela teve poucos dias que pode considerar bons na sua vida escolar.
Também não teve namorados, apenas um para ser exata, o motivo dela ter subido em um prédio com a intenção de pular, e estar ali naquele bar agora, bebendo o que quer que fosse aquela coisa alcoólica.
Maria do Céu deveria estar igual uma louca atrás dela, já devia ter ligado para os pais de ambas para comunicar o ocorrido e todos deveriam estar em polvorosa, com o seu desaparecimento. Não poderia demorar muito mais, afinal a boa moça que era não iria querer matar ninguém do coração.Porém a pessoa que estava ali sentada naquele bar, só pensava em beber mais uma dose. Faltava muito pouco para terminar a faculdade, pelo menos não teria que ver toda aquela gente por mais muito tempo, não consegui pensar naquilo tudo sem sentir vontade de vomitar.
Quando Leonardo se aproximou, ela vivia na sua costumeira solidão e isolamento social, ele demonstrou interesse nela de imediato, e a convidou para sair. Ela perguntou-se porque não aceitar? Ele era uma gracinha, mas estava longe de ser um galã de filmes e novelas, para ela pensar que aquilo poderia ser alguma piada de mau gosto ou plano diabólico.
Eles saíram por um tempo, tinham gostos parecidos e se davam bem, Regina acabou se envolvendo emocionalmente devido a sua imaturidade com relacionamentos. Ele parecia aceitá-la perfeitamente e aos poucos os encontros levaram a um namoro.
Diferente dela, que estudava Análise e desenvolvimento de sistemas, Leonardo estava no último período do curso de Marketing. Demonstra bastante interesse na empresa do pai dela, que ela julgava ser por serem da mesma área, que ledo engano.
Ela não sabia, mas o nomorado havia se candidatado a uma vaga de estágio na empresa Global Marketing e não havia sido selecionado. Ela nunca teve contato com os amigos dele, quando saíam sempre sozinhos e para lugares públicos e tranquilos.
Nos seis meses em que namoraram, ele nunca foi um cara levado pelas paixões, o que para ela estava ok, pois esse também não era o seu perfil. Haviam trocado poucos beijos, mais por protocolo do que por outra coisa.
No meio da tarde daquele dia, ela estava indo embora da faculdade e o encontrou ele com os amigos, quando se aproximou notou um certo ar de constrangimento e todos ficaram muito quietos de repente. Ela o chamou pois haviam combinado de ir ao cinema mais tarde.
– Leonardo eu preciso falar com você. - Ela disse, parando atrás dele e ajeitando o óculos no nariz.
Ele se virou e a encarou muito sério.
– Mas eu não tenho mais nada para falar com você.
Ela ficou confusa, não entendendo porque ele estava usando aquele tom, ainda mais na frente de outras pessoas.
– Não entendi!
Ele parecia impaciente, como se não quisesse ter aquela conversa
– Só me deixa em paz garota. Eu andei com você o semestre todo, achando que iria me ajudar a conseguir uma vaga na empresa do seu pai. Mas você nem falou de mim para ele não é?
– E porque eu deveria ter falado?
– Ué, você não andava por aí me chamando de namorado? Eu achei que teria alguma vantagem com isso. Ou pensou realmente que eu ia querer ficar com você por livre e espontânea vontade?
Ele não estava fazendo questão de falar baixo, e todos ao redor estavam escutando. Uns disfarçaram um sorriso, outros riram abertamente. Havia até aqueles que dirigiam olhares de pena em direção a ela.
– Então quer dizer que tudo isso foi por uma vaga na empresa do meu pai? Foi tudo um teatro?
– Pelo menos eu não precisei me esforçar muito, se você fosse daquelas que fica querendo vários amassos eu não teria aguentado. Se olha no espelho, você é patética, fica andando por aí de cabeça baixa tropeçando nos próprios pés. Se veste como se vivesse no século passado e não fala duas palavras sem gaguejar de insegurança.
Regina abaixou a cabeça, muito envergonhada da cena que ele estava fazendo.
– Você não precisa me dizer essas coisas, terminar já iria bastar.
– Sabe porque não iria bastar? Porque era bem capaz de você ficar me mandando mensagem ou ligando insistindo. Eu quero deixar bem claro que eu nunca mais pretendo ser visto com você. Que eu quero que volte para o buraco onde se esconde. Quero que se exploda você e aquela empresa de merda do babaca do seu pai.
Regina não quis escutar mais nada, se virou e saiu andando em qualquer direção. Depois de alguns minutos começou a receber mensagens de Céu, que inacreditavelmente já sabia o que havia acontecido. Algum imbecil havia gravado boa parte do esculacho que ele deu nela e postou nas redes sociais da faculdade, em poucos minutos viralizou ela ali parada, enquanto ele acabava com ela.
Recusou todas as chamadas da amiga e desligou o telefone. Caminhou pelo centro da cidade se sentindo miserável até que resolveu entrar naquele prédio comercial.
Agora, depois de ter bebido um pouco, sentia-se mais calma. Aquilo tudo era uma merda, mas era apenas mais uma das merdas que aconteciam com ela.
Ela já deveria estar acostumada a ser o alvo dos deboches de todos ao redor, mas na realidade ainda doía muito. Ser desrespeitada com ser humano, relegada ao status de coisa, abominável, torpe, ridícula.
Essa era a sua vida, talvez devesse viver reclusa, como uma eremita. Quando se formasse, sua profissão permitia que trabalhasse em casa e não precisaria ter nenhum contato pessoal com outro ser humano. Seria perfeito, viva a tecnologia.
Regina estava sentada no bar com um copo nas mãos, perdida em seus devaneios de bebada. Não fazia ideia de como parecia desgrenhada, seus cabelos que eram muito ondulados, estavam totalmente bagunçados, escapando do rabo de cavalo, devido a ter ficado exposta ao vento no alto do prédio por um tempo.
O rosto estava amassado e vermelho de chorar e limpar as lágrimas. Quando ela já pensava em como faria para ir embora, se estava em condições de pedir um carro sozinha, um estranho se aproximou e se escorou ao lado dela no balcão do bar. Devido a miopia e a visão turva das lágrimas ela teve que fazer um esforço para focar em seu rosto.
Percebeu que nunca havia o visto antes, tratava-se de um cara de pele branca e cabelo castanho, com um desses cortes curtos da moda. Os braços que estavam escorados no balcão eram fortes, e evidenciaram um corpo com músculos aparentes, a camiseta preta lisa os deixava à mostra.
O estranho certamente frequentava alguma academia, para ter um corpo daqueles. Era incrível como a bebida levava seus pensamentos por caminhos misteriosos, os bíceps do cara no bar por exemplo. Ela seguia devaneando quando o estranho falou.
— Eu acho que já bebemos o suficiente por hoje, é melhor chamar um carro e ir para a casa em segurança.
— Fique à vontade, quer meu telefone emprestado? - Ela disse, quando se deu conta que ele falava com ela.
— Eu estou falando sobre você. É você quem vai para a casa agora.
Regina ficou sem saber o que responder ao estranho, porque ele estaria falando com ela sobre ir embora, ou melhor, porque estaria ordenando que fosse para casa.
— Eu acho que você está me confundindo com outra pessoa, eu não te conheço.
— Sim, eu também não te conheço, mas vi que você chegou sozinha, bebeu mais do que consegue aguentar e pode ter problemas para chegar em segurança a sua casa. E como eu sou um rapaz muito gentil, vim te ajudar a chamar um carro.
— Mas eu ainda não vou a lugar algum, estou bem aqui
O estranho deu um longo suspiro e puxou o banco que estava ao seu lado para se sentar, deixando evidente que planejava ficar ali.
— Agora você já pode ir embora, eu estou bem e vou ficar.
Regina disse dirigindo-se a ele.
— Eu sei, mas quer saber, eu vou ficar por aqui também. Esse lugar é bem melhor do que o que eu estava, fica mais perto da bebida.
Ela revirou os olhos, julgando que tinha arrumado um problema.
— A propósito, me chamo Ronan e você?
— Regina.
— Muito prazer em te conhecer Regina.
— Talvez sim, talvez não.
Ela respondeu simplesmente, tando mais um gole do seu copo.
— E então, vai me dizer o que te trouxe aqui essa noite?— Não acredito que isso seja da sua conta! Era incrível como aquele cara era insistente, ela estava fazendo questão de ser nem um pouco simpática e mesmo assim ele não ia embora.— Eu sei, mas isso é tipo, uma conversa de boteco. Sabe, as pessoas costumam jogar conversa fora em bares, nem todos ficam no balcão bebendo até cair.Ele disse, insinuando que era o que ela estava fazendo ali. Ela pensou por um momento e sorriu amargamente.— Quer saber, você é um estranho em um bar, que está sendo incrivelmente inconveniente. A pessoa perfeita para ouvir os meus lamentos, talvez no final possa me dar até algum conselho ou palavra de apoio. Ou talvez possa apenas rir comigo disso tudo, você que vai decidir, ninguém mandou que interrompesse o meu mento de paz e reflexão, agora aguenta.Ela disse isso e lhe contou tudo o que havia passado, enquanto ele pedia uma bebida para si mesmo. A escutava atentamente, parecendo genuinamente intere
Ronan foi direto para casa, uma kit-net que estava alugando no centro da cidade. Poderia considerar que obtiveram sucesso em sua missão, mas isso não o deixava orgulhoso de si mesmo. Quando o seu primo Caleb ligou para pedir ajuda, ele não podia negar, devia muito a ele, foram criados como irmãos. Os pais deles era irmãos, e compartilhavam um ódio mortal por um primo que havia deixado sua empresa para um estranho e não para eles. Caleb havia sido contaminado com esse ódio, pois viu o pai se lamentar até sua morte, acabando-se na bebida. Já Ronan não dava a mínima para tudo aquilo, acreditava que cada um fazia o que bem entendesse com o que era seu.Mas o primo estava obstinado a recuperar o que acreditava pertencer a sua família. Estudou administração e conseguiu um emprego na empresa, devido o seu bom desempenho subiu rapidamente de cargo, virando um dos homens de confiança do CEO, Andreas.O dono tinha uma filha única na casa dos 20 anos, o plano de Caleb era seduzi-la e casar com
Foram na moto dele até o shopping mais próximo, e ela buscava peças parecida com as que sempre usava. Depois dela lhe mostrar umas 15 e ele só balançar a cabeça em negativa, Regina começou perder a paciência.— Mas você não gosta de nada que eu escolho.— Porque parece que está escolhendo a mesma coisa que está usando agora.— Você disse não haver nada de errado com o que eu uso.Ela usou as palavras dele contra ele mesmo.— Eu disse, mas combinamos que o objetivo aqui é uma mudança, lembra?Ele falou e pegou um vestido rosa, coberto com uma renda preta. A parte rosa era mais curta um pouco e a renda ia até passar pouco os joelhos. As alças eram finas de amarrar, e o decote era sutil e arredondado.— Esse aqui ia ficar ótimo com um coturno, e não adianta negar, eu tenho certeza que você tem um, no armário.Ela fez uma careta com o comentário dele.— É tão óbvio assim?Ele só fez que sim, colocou a peça no ombro e foi procurar mais na arara de roupas. Pegou mais umas camisetas e croppe
No dia seguinte, Ronan veio no horário combinado para levá-la até a faculdade. Quando escutou a campainha, gritou para a mãe dela mandar ele subir até o quarto. Estava muito insegura com a roupa e precisava da opinião dele.— Olá outra vez Ronan. — Disse a mãe dela, ainda achando inusitada a situação.— Olá senhora, a Regina já está pronta?— Na verdade, ela quer que você suba até o quarto dela.— Tudo bem, com licença.Quando ele bateu na porta do quarto, Regina abriu rapidamente parecendo nervosa.— Isso não vai dar certo. Olha
Quando Ronan a deixou na frente de casa, Regina entrou e já ia direto para o seu quarto, mas percebeu que Céu estava com a sua mãe na sala.— Parada aí, garota. Agora para eu conseguir te ver só dando incerteza aqui na sua casa. E que roupa nova é essa? Eu amei!— Eu tinha que ir lá na faculdade pegar minhas cartas de referência. E andei comprando umas roupas novas.Ela explicou se justificando a amiga.— Sim, é pelo visto qualquer coisa que você precise fazer agora, tem que ser acompanhada daquele cara alto que tem uma moto.— Por acaso vocês não estavam espiando pela janela quando eu cheguei, estavam?
Ronan a levou em um bar que ficava em uma rua com diversos outros estabelecimentos do mesmo tipo. E talvez por uma coincidência do destino, todo o estilo do lugar e a decoração, lembravam um bar de motoqueiros. Havia três mesas grandes de sinuca, e um palco para música ao vivo. Algumas pessoas até se aventuravam no Karaokê. Ronan devia conhecer bem o lugar, pois comprimentou amigavelmente o barman. — O que você vai querer beber? Ele perguntou no ouvido dela, pois a música estava alta. — Não sei, me surpreenda. Ele pediu ao rapaz do bar as bebidas e a puxou até uma mesa que estava vaga. — Você precisa tomar uns dois drinks para ganhar coragem e depois vamos começar.
Mesmo depois de mais algumas bebidas, Regina não achou que estava pronta para tentar outra aproximação. Ronan já estava ficando impaciente.— Tudo bem Regina, chega de drinks para você. Eu acho que já está me enrolando, se tomar mais uma Pina Colada, não vai estar em condições de falar com ninguém.— Não seja um pé no saco Ronan, me deixa aproveitar o momento.Ela disse, sorvendo mais um gole pelo canudo do copo.— Aproveitar entrando para dentro do copo? Porque até agora, você nem chegou perto do objetivo que nos trouxe aqui. A única pessoa com a qual falou por mais de cinco minutos fui eu. — Agora você está se subestimando, porque eu te acho uma boa companhia de bar.Ela disse, enrolando um pouco a língua, deixando evidente que a bebida já a afetava.Ronan sorriu da expressão de Regina, ela já falava com a língua arrastada, e apertava os olhos quando olhava para ele, devia estar com dificuldade para focar. A busca pelo contatinho havia oficialmente acabado, o estado alcoólico em que
Quando chegaram na casa de Ronan, Regina parecia pior do que no bar, havia dormido boa parte do caminho, e reclamado de enjoo o restante do tempo. Ele a ajudou a descer e abriu a porta com a mão que tinha livre, pois com a outra a enlaçou pela cintura. A levou até sua cama, a deitou e começou a tirar os sapatos dela.— O Ronan, a minha mãe acha que eu devo, mas eu não quero transar.Ele deu um longo suspiro, pelo visto ela estava pior do que ele imaginava e provavelmente não lembraria daquele diálogo, mas mesmo assim, ele considerou falta de educação não responder.— Não se preocupe, Regina, ninguém vai transar hoje.Ela levantou um pouco a cabeça, parecendo realmente tonta, e se apoiou nos braços.— Isso é bom! Mas não tem nada de errado com você, eu até acho você bem…— ela pareceu confusa com que palavra usar, até que se decidiu. -- transavel, com tudo isso aí de músculos e essas coisas. Mas eu não quero. Eu acho que preciso de algo menos superficial.Ele não sabia se ria ou se sent