Enquanto estava deitada em minha cama, não pude evitar as lágrimas. A faculdade era minha única chance de ser alguém na vida e ela estava acabada. Também perderia contato com meus colegas, sendo que alguns eu tinha bastante afinidade já. Isso também poderia me abrir portas, pois lá eu encontrava pessoas a partir da Zona C. Então no dia seguinte eu teria que abrir o jornal e procurar um emprego. E não importava do que fosse. Eu precisava ganhar qualquer dinheiro. Agora era minha função sustentar a casa. Poderia ser de Kevin, meu irmão mais velho. Mas ninguém sabia onde poderia estar naquele momento. Já fazia tempo que Kevin ficava pouco em casa. Quando vinha, não coseguia disfarçar o cheiro de álcool e drogas ilegais. Várias vezes vi minha mãe indo encontrá-lo no portão e fazendo-o esconder tudo que tinha nos bolsos ou na mochila antes de entrar em casa para que ninguém visse o que ele tinha ali. Eu sempre fingi que não sabia de nada. Mas creio que todos, exceto Leon, sabiam o que realmente Kevin fazia. Eu não sabia ao certo se ele só usava ou se também vendia. Eu só tinha certeza de que ele não ajudava a família com um real. O fato de meu pai ter perdido todo nosso dinheiro fez com que ele se afastasse ainda mais da nossa casa e da nossa família. Ele era muito revoltado com a situação que Adolfo Lee, nosso pai, nos colocou. Kevin tinha 23 anos. Mamãe alega que desde o início sabiam que ele não seria o filho que ganharia a oportunidade de cursar a faculdade. Nunca se interessou pelos estudos. Então decidiram que teriam outro filho, neste caso, eu. Sempre fui muito focada e dedicada com tudo que me fosse pedido. Leon, por sua vez, foi um descuido de meus pais. Então eu sempre fui de alguma forma, a esperança da família, sendo pela possibilidade de poder conseguir um emprego ou até mesmo um marido rico que proporcionasse uma boa vida não só para mim, mas para minha família. O fato de todos me acharem bonita me dava ainda mais vantagem, afinal ser bonita e inteligente não era para qualquer um. E eu realmente tentava aproveitar todas as oportunidades que me surgiam.
Kevin Lee era um homem bonito, alto, moreno, olhos azuis, ou seriam verdes? Nossa família tinha o dom de ter olhos que mudavam de cor... Sempre no tom azul-verde, ou verde-azul, dependendo da claridade do lugar onde estávamos. Kim me dizia que meus olhos ficavam verdes quando eu estava brava, mas eu nunca tive certeza, até porque nunca fui olhar nos espelho quando estava furiosa. Mas meu amigo era extremamente observador, então de alguma forma eu não ignorava a opinião dele. Eu tinha os mesmos olhos de meu irmão.
Kevin Lee era disputadíssimo pelas garotas. Acho que não só pela sua aparência, mas também pelo tipo dele: misteriosos, seguro de si, atrevido, ambicioso. Eu e ele nos dávamos bem na infância. Conforme fomos crescendo, fomos nos afastando. Embora eu não fosse das mais obedientes, eu não costumava fazer muitas coisas erradas. Ilegais, quase nunca. Kevin, por sua vez, parece que procurava problemas, desde se envolver com mulheres casadas até entrar na vida dos entorpecentes. Ele era um problema constante para meus pais. No entanto mamãe sempre tentava de alguma forma protegê-lo, mesmo não estando de acordo com as coisas que ele fazia. Meu pai, depois de ser o responsável pela nossa falência, não se achava mais no direito de exigir respeito dos filhos. Eu continuei o respeitando e o admirando, pois ele ainda assim era um pai carinhoso e dedicado, mesmo tendo feito tudo que fez. Mas Kevin nunca viu desta forma e quando a pobreza chegou definitivamente na nossa casa, ele partiu. Vinha somente quando não tinha o que comer ou precisava de algo que só minha mãe poderia lhe dar tipo dinheiro que ela tirava eu não sei de onde, uma cama quente e um carinho materno.
Apesar de tudo, ele sempre apostou em mim como a esperança da família. E eu ficava feliz por ele acreditar que eu poderia um dia mudar toda nossa situação.
Naquela noite, ele apareceu em casa e quando percebi ele estava no meu quarto. Quando o vi, limpei as lágrimas. Não queria que ele me visse num momento de fraqueza ou que culpasse meu pai pelo meu sofrimento.
- Olha quem apareceu. – eu brinquei.
- Olá. – ele disse. – Nova cor de olhos?
Olhei sem entender muito bem e ele disse sorrindo:
- Vermelhos.
Eu sorri tristemente. Não sabia exatamente a que ele estava a par.
- A que devemos a honra da sua visita?
- Apague a foto que você postou na sua rede social.
- O quê?
- Eu vi... Parece se oferecendo aos homens.
- Kevin... Seu bobo. Não tem nada a ver isso.
- Claro que tem.
- Veio para casa para me m****r apagar minha foto?
- Também... Fiquei furioso quando meus amigos me mostraram.
- Ora, não sabia que seus amigos me seguiam.
- Mas seguem. Então, melhor começar a não expor tanto sua vida por aí.
- O que tem a ver?
- Eu não quero. – ele disse rispidamente. – Acho melhor você fazer o que estou mandando, senão vou ter que m****r mamãe exigir isso de você.
- Kevin, você não se atreveria.
- Eu já disse.
- Você soube que vou ter que sair da faculdade?
- Sim... Mamãe me contou. Adolfo Lee acabou com o sobrenome da nossa família.
- Kevin, não diga isso. Nosso pai errou, mas não pode ser punido para sempre.
- Nós seremos punidos para sempre... Será que você não entende? Qual sua chance de um bom casamento quando seu futuro marido souber?
- A estas alturas todos na Zona E já sabem disso, Kevin. E eu não me importo.
- Deveria.
- Deveria? E você também deveria se importar com tantas coisas, como o bem estar de sua família. Onde você estava quando precisamos?
- Katrina, eu não quero discutir isso com você. Não lhe devo satisfações. Como não moro mais nesta casa, a responsabilidade é toda sua.
- Você não vai me ajudar então?
Ele riu:
- Ajudar? Eu não tenho um emprego, como vou ajudá-la a sustentá-los?
- Arranje um emprego e volte para casa. Podemos dividir as despesas. Isso me ajudaria muito... E ajudaria você também.
- Não, obrigado.
- Kevin...
- Não. O pouco do dinheiro que mamãe tinha investiu em você e não em mim. Você deve isso a eles agora.
- Eu... Não tenho ideia do que vou fazer. – confessei.
- Opções não faltam. – ele disse ironicamente.
Eu bati no braço dele:
- Seu bobo. – eu sabia que pelo olhar dele a sugestão era algo inapropriado.
- Na última das opções, você pode trabalhar com seu amigo Kim.
- Eu não sei fazer isso...
- Quem não sabe pentear e maquiar?
- Eu. – falei sinceramente.
- O que você sabe fazer?
- Eu... Não sei no que eu sou boa.
- Acho que postar fotos nas redes sociais também não é seu forte. E não vai ganhar dinheiro com isso.
- Pode vender para os seus amigos. – eu disse rindo.
- Sua boba... Mas fotos sensuais podem dar uma boa grana. Tenho uns contatos se você quiser. Nossos pais nunca ficariam sabendo.
- Você está falando sério?
Eu fiquei ofendida e ele não disse nada. Por incrível que pareça, eu não duvidava que ele estivesse falando sério.
- Sua beleza pode render dinheiro.
- Acha que eu poderia ser modelo?
- Nunca vi modelos na Zona E... Mas tem boas garotas de programa. Poderia ganhar bem com isso.
- Kevin, acho que você não é meu irmão de verdade. Foi trocado na maternidade.
Ele riu e disse:
- Eu poderia ser seu cafetão.
Olhei-o preocupada e triste. Aquilo provavelmente era uma brincadeira.
- Kat, dinheiro é dinheiro e ninguém vive sem. Vivemos num dos países com a maior desigualdade social que existe nas redondezas. Então todo trabalho é digno.
- Não... Nem todos. Eu jamais venderia meu corpo. – afirmei.
- Se nada der certo, pode trabalhar comigo.
- Então você trabalha agora? Pode ajudar nossa família...
- O meu trabalho não dá muita grana... O suficiente para mim e meus vícios. Você sabe do que estou falando.
- O que está fazendo? No que está trabalhando?
- Eu... Não posso dizer.
- Então é ilegal?
- Não... Mas é imoral.
Dizendo isso ele saiu e foi conversar com minha mãe, enchendo-a de elogios para que ela o amasse ainda mais. Eu fiquei ali, pensando no fardo que eu tinha que carregar e em tudo que ele havia me falado. Kevin poderia nos trazer ainda mais problemas que já tínhamos. E eu tinha certeza de que este dia chegaria.
Na manhã seguinte eu acordei cedo, coloquei uma de minhas melhores roupas, penteei meus cabelos deixando-os mais volumosos e fiz uma maquiagem leve. Iria para faculdade explicar aos meus amigos que eu precisaria abandonar os estudos e depois sairia à procura de um emprego. E eu não estava em condições de escolher muito.Quando cheguei fui diretamente para sala. Eu estava bem adiantada, então poderia ver todos antes de começar a aula e me despedir. Logo chegou Kim. Abraçamo-nos e ele disse:- Recuperada da balada?- Sempre. – eu disse piscando.- Por que não respondeu minhas mensagens ontem? – ele perguntou.- Kim, se você soubesse tudo que aconteceu comigo... – falei sem conseguir esconder a tristeza.- Então começa, querida.- Nem sei por onde... Quer que eu comece pela parte que vou deixar a faculdade ou pela que vou ter que consegui
Nunca pensei que achar um emprego fosse tão difícil. Eu realmente gastei a sola do meu scarpin mais caro e nem minha boa aparência meu ajudou. O papel que eu havia conseguido na faculdade ajudava a não me dizerem não completamente. Ficavam com meu currículo que era praticamente em branco e prometiam me ligar assim que houvesse uma vaga. Eu não poderia me dar ao luxo de esperar. Eu precisava do emprego urgentemente. No fim da tarde, voltei para a faculdade e fui encontrar meus amigos no nosso lugar secreto. Todos já me esperavam. - E então, alguma novidade? – perguntou Kim. – Conseguiu o emprego? - Claro que não. – falei jogando minha bolsa longe e sentando em uma mesa, completamente esgotada. Tirei meus sapatos e disse:
Ouvi gritos. Não sabia se era sonho ou realidade, pois meus olhos ainda estavam fechados. Logo ouvi as vozes cada vez mais próximas. Uma claridade passeou sobre minhas pálpebras e ouvi o barulho da janela se abrindo:- Acorde, Kat... Acorde.Abri meus olhos e o sol cegou meus olhos. Fechei-os novamente, preguiçosa:- Que houve? Se não ganhamos na loteria, qual motivo desta gritaria toda?- Levante-se daí agora, Katrina Lee. – disse minha mãe seriamente.Ergui meu corpo, me recostando na cabeceira dura e desconfortável.- O que houve?- Encontrei um emprego para você.- Então... Já vou começar? – perguntei ironizando a forma como fui acordada.- Vamos lá, Kat. Se mexa que você tem muito a fazer.Levantei confusa e cambaleante. Leon me olhava atento, junto de minha mãe. Ela trazia nas mãos o Jorn
À noite mandei meu currículo para o castelo de Noriah, candidatando-me à vaga de dama de companhia da rainha Anne Marie Chevalier. Eu não tinha nenhuma expectativa de ser chamada, mas se eu não enviasse minha mãe ficaria muito chateada. No anúncio não dizia o valor do salário, mas dava para imaginar que seria muito mais do que eu poderia ganhar em um ano de trabalho num lugar normal na minha zona. O currículo exigia foto atual, sem qualquer tipo de maquiagem ou ornamento, cabelos soltos e fundo branco. Também deixava bem claro que o processo de escolha seria feito em etapas e que só havia uma vaga. A rainha Anne já tinha uma dama de companhia e agora haveria duas pessoas para este cargo. Ou seja, a antiga ocupante do cargo continuaria a ocupar seu posto.À noite, enquanto estava deitada em meu quarto, tive um pouco de medo de tudo que estava acontecendo com a minha família
No dia seguinte, Léo me chamou para passearmos juntos. Eu já não tinha nenhuma forma de divertimento a não ser sair para procurar emprego. Então não parecia ruim sair com um amigo. Eu me arrumei mais que o normal. Eu sabia que ele gostava de mim e não queria decepcioná-lo com minha aparência cansada dos últimos dias. Não que eu tivesse interesse nele, mas o fato de ter a certeza de que ele se interessava por mim me deixava um pouco mais vaidosa que o normal.Ele me buscou à tarde com seu carro. Minha mãe fazia gosto de meu namoro com Léo, afinal, ele era de uma família de muito mais renome do que a nossa. Na verdade, acho que ela queria que eu me envolvesse com qualquer homem que pudesse proporcionar melhores condições financeiras para nossa família. Não sei se esse era o sonho de todas as mães do Reino de Noriah, mas da minha mãe e
Logo minha mãe ficou sabendo do meu namoro com Léo e de alguma forma isso a deixou feliz. Acho que ele no fundo só queria que eu não tivesse uma vida como a dela. Mal sabia ela que eu não tinha nenhum sentimento por Léo, então se ele fosse meu marido um dia, eu teria uma vida como a dela: triste e sem amor. Eu era uma garota esperta, mas nos assuntos de amor eu era ingênua. Eu sabia que não havia chegado meu príncipe encantado ainda. e eu nem sabia se acreditava nele. Nunca houve um garoto que fizesse meu coração bater mais forte, embora eu tenha tentado me envolver várias vezes. Mas eu era jovem. Tinha 19 anos, em breve faria 20. Eu tinha tantos objetivos para minha vida que nem sabia se existia espaço para um homem. Também tinha medo de me apaixonar por um homem bonito, mas que não era uma boa pessoa, como meu irmão Kevin, por exemplo. Ou até mesmo me casar com uma boa pessoa e com o tempo ele se tornar como meu pai: um homem completamente irresponsável, que só dava trabalho. Eu a
Mas eu o Sofia estávamos erradas. A fila foi andando bem rápido e assim como uma multidão de meninas entrou nos jardins do castelo, outras muitas saíram, tão rápido quanto ingressaram. Algumas saíam sozinhas, outras em duplas, algumas em pequenos grupos. Havia as que saíam em lágrimas e também as que não perdiam a compostura. No fim, eu não sabia se todas ali realmente tinham o mesmo objetivo. Fui me dando conta que as eliminadas estavam maquiadas, mesmo que algumas usando o mínimo dos mínimos. Por sorte eu deixei meu corretivo onde estava. Melhor passar pelo menos na primeira fase. Conforme a fila andava, eu conversava com as outras garotas e embora nenhuma que saísse confirmasse, todas achávamos que roupas muito curtas ou justas, bem como maquiagens e tintura iram eliminando uma a uma. Logo estávamos próximas do portão e embora fosse rápido, j
Passar a noite no castelo de Noriah não estava nos meus planos. Muito menos conhecer os dois príncipes no mesmo dia e ser chamada de anti monarquista. Dereck era mais ou menos como eu imaginava: um homem com cara de garoto, que falava o que vinha à sua cabeça. Mas o fato de eles se preocuparem comigo de alguma forma me deixou muito impressionada. Eu era somente uma garota comum da zona E atrás de um emprego no castelo. Pensando bem não era um emprego qualquer; eu estaria lado a lado com a rainha Anne, a mãe deles. Então de certa forma era um cargo importante dentro do castelo. Agora, ser socorrida por Magnus, realmente não estava nos meus planos. Ele era um homem bem discreto, pouco aparecia sua imagem nos veículos de comunicação. Geralmente ele estava mais nas aparições na televisão, ao vivo. Como eu não assistia muito, acabava não sabendo muito sobre ele ou sua ap