Adam Seven
Acordo com o barulho ao meu redor. Pelo que posso ouvir, meu pai está decidido a matar alguém.
— Pai — chamo.
Imediatamente se faz um silêncio pesado na sala. Até parece que imaginei as vozes.
— Meu filho. — Me viro para o lado e o vejo, assim como minha mãe ao seu lado e meus irmãos dormindo em um sofá. Até mesmo o pequeno Florian.
Mamãe leva a mão para tocar meu rosto, mas recolhe. Isso me faz levar a mão ao meu próprio rosto. Está enfaixado.
— O que houve? E a bebê? E a mãe? — questiono me agitando.
— Calma. Não pode se agitar assim. A mulher morreu. A criança, o pai e o segurança de merda estão no castelo. Ainda não decidi o que fazer com eles. Você se cortou com as porcarias que voaram do carro na explosão e nas costas quando caiu. Se queimou em alguns lugares, mas os cortes são mais graves.
Droga! Eu queria ter salvado a mulher.
— Não precisa fazer nada se ele devolver o livro.
— Meu filho, você quase morreu.
— Eu sei, mas foi escolha minha. Eu sabia dos riscos quando me aproximei do carro. Além de ser imprudente indo atrás do ladrão praticamente sozinho.
— Foda-se! Eu vou matar aquele desgraçado... os dois.
— E vai cuidar da menina? Cansou de ser pai de garotos? — falo para amenizar o clima. Só o fato do meu pai falar palavrão na frente dos filhos já mostra o quando está fora de si.
Mamãe apenas me olha e chora em silêncio. Eu não queria fazê-la chorar. Só quero que eles entendam que foi um acidente. O idiota do ladrão jamais iria tão longe.
— Eu ainda tenho braços, pernas, olhos... tudo funcionando bem, não é? — Ela balança a cabeça sorrindo. — Então estamos bem. Não chore, mãe. Dói mais que essas feridas ver vocês assim.
— Não vamos falar sobre isso agora. Você está vivo e só isso importa.
— A múmia acordou? — vejo um Felipe sonolento sentar no sofá antes de levantar e vir até a beira da cama. Todo empolgado, ele me faz contar cada detalhe do que aconteceu. Para ele foi a maior aventura.
Meus pais não curtem muito ouvir, mas não ligo. Acho que acabo de virar o herói do meu irmão.
*
Dia de alta, finalmente.
A cada dia que passa, preciso de menos remédio para dor ou cuidados hospitalares.
Só meu pai veio me buscar, então não foi nenhuma surpresa encontrar a sala principal do castelo cheia de balões e uma faixa colorida desejando boas-vindas. Meio que parece uma festa de Halloween, porque meus irmãos estão com faixas como se fossem múmias. Uma clara tentativa de me imitar. E eu nem estou mais tão enfaixado.
No meio da festa, um homem que já viu dias melhores se j**a aos meus pés. Parece cena de filme, até a música para.
O homem agarra meus pés chorando e implorando. Entendo pouca coisa do que diz, apenas o bastante para entender que é o ladrão. O rosto dele não está muito reconhecível, deve ter apanhado muito do senhor Seven.
Meu pai se aproxima e abaixa perto dele, como se fosse conversar com um amigo. Ele não gosta de dar show, muito menos um violento diante dos filhos pequenos.
Só eu e o homem escutamos ele dizer:
— Afaste do meu filho, verme. Como você fugiu do calabouço?
O homem estremece. E eu só me pergunto o que mais tem nesse castelo, pois não sabia que havia um calabouço.
Antes de ser levado, ele diz:
— Nada que eu faça vai compensar. Serei escravo da sua família para o resto da minha vida e meus descendentes tomarão o meu lugar.
Um seguranças o leva não sei para onde. E a festa volta aos poucos ao seu ritmo.
Quando subo para o quarto, meu pai e minha mãe vão comigo.
— Liberte aquele homem, pai — peço, já deitado.
Ele me olha, relutante.
Mamãe cruza os braços para ele com aquele olhar que faz qualquer um obedecer.
— Está bem. Amanhã ele não estará mais no castelo.
— O segurança também.
Aposto que o ladrão não é o único no calabouço.
— Filho, ele devia te proteger.
— Apenas o demita. — Mamãe opina.
— Está bem. Está bem. Como pude ter um filho tão bom? Ele puxou a você — reclama.
— Agora me deem beijos de boa noite e sumam, estou cansado.
Em cinco minutos estou sozinho no quarto e logo durmo.
*
Nada saiu como esperado.
O homem é completamente insano, só isso explica. Todos os dias ele fica no portão do castelo implorando para nos servir. Os seguranças o escorraçam, mas ele insiste dia após dia.
— Pai, eu não aguento mais. Deixa aquele miserável pagar seus pecados aqui ou ele vai acabar em uma clínica para doentes mentais.
— Ele é problema seu. Contrate-o para seu escravo particular.
Minha cabeça até dói em pensar em ter alguém fazendo todas as minhas vontades.
Suspiro.
— Amanhã você volta às aulas. Acha que está pronto?
— Eu gosto de estudar.
— Sabe que criaturinhas da sua idade sabem ser maldosas.
— Sei. Ainda assim vou tentar. — Levanto. — Vou avisar a segurança para deixar o “meu escravo” entrar.
Saio da sala e faço o que me propus. Aviso ao homem para ir embora e voltar amanhã de manhã.
No dia seguinte acordo com o uniforme passado e uma estátua humana ao lado da cama.
— Em que posso servir, senhor?
— Saia — resmungo, virando na cama. — Não quero que fique olhando eu me trocar.
Levanto, só de cueca, e vou até o banheiro.
Depois do banho para na frente do espelho.
— Você não está nada gatinho, Adam Seven. — Balanço a cabeça enquanto passo o produto receitado pelo médico em cada ferimento, depois faço o curativo onde tem que fazer. Consigo fazer sozinho. A explosão me pegou de frente, tudo está ao alcance das minhas mãos. A ferida das costas, minha mãe cuida sempre antes de eu dormir.
Vestido para voltar a normalidade, levo um susto com o homem parado na porta.
— Meu Deus, cara! Vai se tratar.
Desço as escadas correndo e vou para a mesa do café da manhã no horário de sempre, encontrando minha família reunida.
É uma manhã agitada, como sempre.
Logo estou na escola. E é quando começam as provocações e o bullying.
Uma semana, é o tempo que eu aguento antes de desistir e escolher estudar em casa. E em casa também acabo me isolando.
Mas nada disso foi a pior coisa que me aconteceu.
Eu enfrentaria uma explosão por dia se isso evitasse a maior tragédia que nos abateu pouco tempo depois. O alicerce do meu pai, a nossa base, se foi, deixando somente Raoul, a última alegria que daria a nossa família em vida.
Um Seven nasceu, uma Seven se foi.
Nosso mundo desabou. Tivemos que fazer a dor virar força para sobrevivermos.
E sobrevivemos.
Bela DuboisAlguns anos após a explosão...— Tia May, por que só podemos ir no postinho? Eu vi um monte de coisa da janela. Quero ir naquele chospin. — Reclamo outra vez. Não aguento mais ficar em casa o tempo todo.Minha tia ri. — Você quer dizer shopping?— É.— Seu pai não gosta que você saia. Mas fique tranquila que isso vai mudar quando você for para a escolinha semana que vem. Pulo na cama, empolgada. Meus cabelos balançam para cima e para baixo.— Vou brincar com outras crianças.— Vai.— Vou aprender a ler igual a tia.— Vai sim.— Semana que vem tá demorando. — Caio sentada no colchão.— Paciência, querida. Tudo tem o tempo certo de ser.Não vejo por que tenho que esperar. Faço bico e fico emburrada, até tia May pegar o livro de contos de fadas. É sua arma secreta para me deixar feliz.Me deito ao lado dela e fico enrolando seu cabelo em meus dedos enquanto ela lê vários, até que acabo dormindo.*No dia seguinte, papai também não vem para casa e nem nos próximos. Ele pass
Adam SevenUm tempo antes de Bela chegar a mansão...— A que devo essa visita, irmão? — pergunto enquanto Henry se senta no sofá e cruza as pernas em sua atitude de dono do lugar.O imito.Com o passar dos anos, convenci o meu pai a me deixar viver sozinho. Só mantenho alguns empregados e me divirto nas noites, geralmente com prostitutas ou em baladas liberais, onde posso usar máscaras sem ser questionado, onde posso ser cruel sem ser questionado. Não são todas as mulheres que gostam de um sexo mais duro.Para mim eram só feridas em cicatrização, mas para algumas pessoas eu me tornei assustador. Ainda mais que com o passar dos anos, meu corpo decidiu que eu seria o maior dos meus irmãos, e meus olhos foram afetados com a explosão, não tem mais o cinza dos Seven, agora é um dourado meio avermelhado. Pelo menos não perdi a visão.Foi melhor me afastar, melhor para evitar desavenças entre meu pai e qualquer pessoa que olhasse demais para mim.A visita do meu irmão atrapalhou minha pesqui
Adam SevenTempos atuais...— O senhor Dubois ligou para avisar que está trazendo a filha. Por que está fazendo isso, meu menino?Deixo as coisas do experimento de lado e olho para ela. Sabia que ela questionaria meu ato, afinal tudo nessa casa acaba no conhecimento dessa senhora, mesmo que eu tenha ordenado a outro empregado que arrumasse um dos quartos para Bela.— Só porque eu posso, madame Pilar.Ela sorri. Quando faz isso seu rosto todo se modifica, deixando-a com mais rugas, ainda assim ela quase sempre está sorrindo. É estranho. Não vejo toda essa graça nas coisas simples que ela enxerga.— Sei que está mentindo. Você sempre tem um propósito em seu coração doce.Reviro os olhos. Essa mulher baixinha e enrugada, que eu não me lembro de ter visto sem um avental, me faz parecer um menino levado.— Eu não sou doce.— Não é? Então por que dá ouvidos a uma velha como eu?— Me pergunto isso sempre.A risada dela enche meu corpo de energia. A mulher é espontânea em tudo que faz, nunca
Bela Dubois— Me acompanhe.Sei que não é a primeira vez que ele diz isso, posso ver sua expressão impaciente. Mesmo que ele esteja na porta e eu ainda parada na frente da casa.Continuo imóvel.— Não.— Como se você tivesse escolha. — Não sei porque olhei para o rosto dele, posso tê-lo conhecido hoje, mas sei que o sorriso que entorta sua boca para o lado é indicio de crueldade, sinto em meus ossos. E confirmo com sua próxima ação. — Fifi! — Ele assobia e vejo o cão imenso vindo em minha direção, enquanto e ele vira as costas e entra na casa.— Maldito! — resmungo e corro atrás dele. A senhora que vi o desafiando parece ser uma boa pessoa, mas tive medo de contar com isso e acabar toda marcada de mordidas de cachorro.Quando entro na casa, me surpreendo, mesmo podendo ver muito dela por fora. É tudo tão organizado, mesclando tons de madeira escura e preto.O sofá convida a sentar, mas não me arrisco. Melhor enfrentar a fera de pé.— O que você quer de mim?— O que quero de você? — el
Bela Dubois— Pronto. Quando posso sair dessa casa? — digo entregando o último papel assinado.— Primeiro vamos conhecer seu quarto. Não está curiosa?— Você disse que é um porão. Não deve ser grande coisa, e eu não ligo desde que possa ser livre.— Me siga. — O homem levanta em todos os seus músculos e altura. É realmente lindo. Se fosse em outra ocasião...Não pense besteiras, Bela Dubois. Me recrimino.Também levanto e o sigo escada acima. Enquanto uma voz chata questiona: Agora que assinou os papéis é Bela Seven.Balanço a cabeça para espantar o pensamento inconveniente e Adam me olha com a sobrancelha arqueada. Deve me achar louca. Mas foda-se!Ele me leva até o fim do corredor e abre uma porta que mostra uma escada, exatamente como nos filmes de terror em que a gente grita para o personagem não descer. O porão é estranho, se desce para ele do segundo andar.Por um momento a idiota aqui confundiu porão com sótão. Imaginei algo mais iluminado. Que idiota!— Que lugar é esse? — per
Adam SevenBela aceitou mais rápido que eu esperava. Ela nem mesmo leu os papéis que assinou. Se tivesse lido, tenho dúvidas que aceitaria.Passei tudo para que meu advogado providencie a certidão de casamento, e assim que ele saiu madame Pilar parou na minha frente com as mãos na cintura.Um minuto inteiro se passou sem que falasse nada, apenas me olhava.— O que foi? Já devia estar curtindo suas férias.— O que o senhor pretende com aquela menina? Sabe muito bem que ela não dá conta de manter essa casa limpa e organizada sozinha. Tem nove quartos aqui, meu filho.— Mas apenas um é usado.— Você entendeu o que eu quis dizer.Bufo.— Achei que eu não era um monstro aos seus olhos.— E espero que continue assim, porque se eu souber que machucou essa menina, ficarei extremamente magoada com você.— Eu não vou machucar essa garota.— Existe muitas formas de machucar, e nem todas são físicas.— Mulher, some daqui! — Me levanto e seguro seu braço gentilmente. — Não vou machucar essa menina
Bela DuboisDeu tudo errado.Jogo o pano enxarcado no chão e caminho para longe da bagunça que fiz.— Que porra! — resmungo. Não quero falar alto e levar outra bronca.Eu demorei quase uma hora só para achar o local onde ficava vassoura e as coisas de limpeza. O acordo de fazer limpeza pela minha liberdade estava mais que bom para mim, afinal conheço os empregados lá de casa e sei que isso é um trabalho como qualquer outro. Não sei o que meu pai achou que aconteceria quando me jogou aqui, mas farei com que se arrependa, vou fazer dar certo.Pego uma vassoura e começo a dançar pela casa antes de começar o trabalho em si. Canto e danço devagar.Mesmo com raiva do meu pai é a música que ele cantava quando estava em casa que me vem à mente. Um sonho a dois, de Roupa Nova. Ele dizia que era a música favorita da mamãe, então eu quis que fosse a minha também.Ao fim da música, a vassoura volta ao seu uso padrão. Mãos à obra.Achei que estava arrasando quando joguei água no chão e comecei a e
O amor é uma flor amarela Encontrando liberdade na paixão.Bela DuboisTudo saiu melhor do que eu esperava. Jamais imaginei que Cinderela encontraria o amor no baile dos Seven. Fico tão feliz por ela. Meu único objetivo era fugir do casamento e dar a chance dela mesma buscar sua liberdade. Afinal, ela ficaria diante de homens poderosos. Um deles teria que ajudar... E como ajudou.Suspiro me lembrando.Minha amiga brilhava enquanto estávamos passeando pelo shopping e escolhendo livros.Não vejo a hora de chegar em casa e ler os que são da falecida Seven. Pelo quanto minha amiga falou deles, deve ser incrível.Acaricio a capa de um.Quando chegar em casa vou mandar mensagens com as atualizações das minhas leituras. Queria ter redes sociais, mas é melhor não. Vou manter esse celular muito bem escondido do meu pai. Depois que Cinderela tomou meu lugar, ele anda muito insuportável.Por falar nele...— Pai, onde estamos indo? — pergunto quando o carro para diante de um enorme portão de fer