Capítulo 2

Adam Seven

Acordo com o barulho ao meu redor. Pelo que posso ouvir, meu pai está decidido a matar alguém.

— Pai — chamo.

Imediatamente se faz um silêncio pesado na sala. Até parece que imaginei as vozes.

— Meu filho. — Me viro para o lado e o vejo, assim como minha mãe ao seu lado e meus irmãos dormindo em um sofá. Até mesmo o pequeno Florian.

Mamãe leva a mão para tocar meu rosto, mas recolhe. Isso me faz levar a mão ao meu próprio rosto. Está enfaixado.

— O que houve? E a bebê? E a mãe? — questiono me agitando.

— Calma. Não pode se agitar assim. A mulher morreu. A criança, o pai e o segurança de merda estão no castelo. Ainda não decidi o que fazer com eles. Você se cortou com as porcarias que voaram do carro na explosão e nas costas quando caiu. Se queimou em alguns lugares, mas os cortes são mais graves.

Droga! Eu queria ter salvado a mulher.

— Não precisa fazer nada se ele devolver o livro.

— Meu filho, você quase morreu.

— Eu sei, mas foi escolha minha. Eu sabia dos riscos quando me aproximei do carro. Além de ser imprudente indo atrás do ladrão praticamente sozinho.

— Foda-se! Eu vou matar aquele desgraçado... os dois.

— E vai cuidar da menina? Cansou de ser pai de garotos? —  falo para amenizar o clima. Só o fato do meu pai falar palavrão na frente dos filhos já mostra o quando está fora de si.

Mamãe apenas me olha e chora em silêncio. Eu não queria fazê-la chorar. Só quero que eles entendam que foi um acidente. O idiota do ladrão jamais iria tão longe.

— Eu ainda tenho braços, pernas, olhos... tudo funcionando bem, não é? — Ela balança a cabeça sorrindo. — Então estamos bem. Não chore, mãe. Dói mais que essas feridas ver vocês assim.

— Não vamos falar sobre isso agora. Você está vivo e só isso importa.

— A múmia acordou? — vejo um Felipe sonolento sentar no sofá antes de levantar e vir até a beira da cama. Todo empolgado, ele me faz contar cada detalhe do que aconteceu. Para ele foi a maior aventura.

Meus pais não curtem muito ouvir, mas não ligo. Acho que acabo de virar o herói do meu irmão.

*

Dia de alta, finalmente.

A cada dia que passa, preciso de menos remédio para dor ou cuidados hospitalares.

Só meu pai veio me buscar, então não foi nenhuma surpresa encontrar a sala principal do castelo cheia de balões e uma faixa colorida desejando boas-vindas. Meio que parece uma festa de Halloween, porque meus irmãos estão com faixas como se fossem múmias. Uma clara tentativa de me imitar. E eu nem estou mais tão enfaixado.

No meio da festa, um homem que já viu dias melhores se j**a aos meus pés. Parece cena de filme, até a música para.

O homem agarra meus pés chorando e implorando. Entendo pouca coisa do que diz, apenas o bastante para entender que é o ladrão. O rosto dele não está muito reconhecível, deve ter apanhado muito do senhor Seven.

Meu pai se aproxima e abaixa perto dele, como se fosse conversar com um amigo. Ele não gosta de dar show, muito menos um violento diante dos filhos pequenos.

Só eu e o homem escutamos ele dizer:

— Afaste do meu filho, verme. Como você fugiu do calabouço?

O homem estremece. E eu só me pergunto o que mais tem nesse castelo, pois não sabia que havia um calabouço.

Antes de ser levado, ele diz:

— Nada que eu faça vai compensar. Serei escravo da sua família para o resto da minha vida e meus descendentes tomarão o meu lugar.

Um seguranças o leva não sei para onde. E a festa volta aos poucos ao seu ritmo.

Quando subo para o quarto, meu pai e minha mãe vão comigo.

— Liberte aquele homem, pai — peço, já deitado.

Ele me olha, relutante.

Mamãe cruza os braços para ele com aquele olhar que faz qualquer um obedecer.

          — Está bem. Amanhã ele não estará mais no castelo.

— O segurança também.

Aposto que o ladrão não é o único no calabouço.

— Filho, ele devia te proteger.

— Apenas o demita. — Mamãe opina.

— Está bem. Está bem. Como pude ter um filho tão bom? Ele puxou a você — reclama.

— Agora me deem beijos de boa noite e sumam, estou cansado.

Em cinco minutos estou sozinho no quarto e logo durmo.

*

Nada saiu como esperado.

O homem é completamente insano, só isso explica. Todos os dias ele fica no portão do castelo implorando para nos servir. Os seguranças o escorraçam, mas ele insiste dia após dia.

— Pai, eu não aguento mais. Deixa aquele miserável pagar seus pecados aqui ou ele vai acabar em uma clínica para doentes mentais.

— Ele é problema seu. Contrate-o para seu escravo particular.

Minha cabeça até dói em pensar em ter alguém fazendo todas as minhas vontades.

Suspiro.

— Amanhã você volta às aulas. Acha que está pronto?

— Eu gosto de estudar.

— Sabe que criaturinhas da sua idade sabem ser maldosas.

— Sei. Ainda assim vou tentar. — Levanto. — Vou avisar a segurança para deixar o “meu escravo” entrar.

Saio da sala e faço o que me propus. Aviso ao homem para ir embora e voltar amanhã de manhã.

No dia seguinte acordo com o uniforme passado e uma estátua humana ao lado da cama.

— Em que posso servir, senhor?

— Saia — resmungo, virando na cama. — Não quero que fique olhando eu me trocar.

Levanto, só de cueca, e vou até o banheiro.

Depois do banho para na frente do espelho.

— Você não está nada gatinho, Adam Seven. — Balanço a cabeça enquanto passo o produto receitado pelo médico em cada ferimento, depois faço o curativo onde tem que fazer. Consigo fazer sozinho. A explosão me pegou de frente, tudo está ao alcance das minhas mãos. A ferida das costas, minha mãe cuida sempre antes de eu dormir. 

Vestido para voltar a normalidade, levo um susto com o homem parado na porta.

— Meu Deus, cara! Vai se tratar.

Desço as escadas correndo e vou para a mesa do café da manhã no horário de sempre, encontrando minha família reunida.

É uma manhã agitada, como sempre.

Logo estou na escola. E é quando começam as provocações e o bullying.

Uma semana, é o tempo que eu aguento antes de desistir e escolher estudar em casa. E em casa também acabo me isolando.

Mas nada disso foi a pior coisa que me aconteceu.

Eu enfrentaria uma explosão por dia se isso evitasse a maior tragédia que nos abateu pouco tempo depois. O alicerce do meu pai, a nossa base, se foi, deixando somente Raoul, a última alegria que daria a nossa família em vida.

Um Seven nasceu, uma Seven se foi.

Nosso mundo desabou. Tivemos que fazer a dor virar força para sobrevivermos.

E sobrevivemos.

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