O professor anunciou:
— Enfim, chegou o grande dia. Após um mês de longas partidas conheceremos os grandes campeões do 60°Torneio do Tempo do Colégio “General Câmara”.
— Senhoras e senhores! Dois competidores, com estilos diferentes, estão prestes a se enfrentar em apenas uma partida pelo título de novo campeão do 5°Torneio de xadrez do nosso colégio.
“— Precisa de tanta algazarra? É só mais uma partida.”
Renan refletia encarando sua oponente do outro lado do tabuleiro enquanto o professor Orpheu se deliciava apresentando os jovens enxadristas à plateia.
O Torneio do Tempo acontecia a cada quatro anos e contemplava vários estilos de jogos: xadrez, dama, ludo, entre outros.
Neste dia, entre tantos alunos, pais e professores, estava Thereza apreensiva vendo seu filho sentado na cadeira no centro do ginásio. Apesar de não entender de xadrez, observava atentamente o painel suspenso acima dos jogadores.
“— É hoje que vou tirar esse sorrisinho esnobe da cara dela!” — pensou o jovem garoto. Uma sensação de rancor e raiva queimava-lhe o peito.
Entre os presentes naquele local, estava um homem de meia idade sentado bem ao centro e na última fileira da arquibancada. Em silêncio, analisava Renan e refletia:
“— Olhar frio e fixo, postura tensa, leve tremor na parte superior do lábio e braços cruzados. Está tenso, meu garoto?!?”
“— O que a jovem à sua frente lhe fez?...Será um amor não correspondido?”
“— Medo de perder para uma garota?” hahaha...Soltou uma leve gargalhada.
“— Deixe me ver... o que temos do outro lado?” — falou consigo mesmo.
“— Olhar confiante, nariz empinado, sorriso debochado, mãos sobre a mesa e batendo os pés no chão.”
— Hum! Vejo que está muito confiante, cabelo de fogo!
“— Mas por que olha tanto para os lados?...Está procurando alguém ou apenas não consegue suportar que te encarem?...E esta soberba em sua postura?”
— Interessante!
— Deste lado, temos Renan Lopez de 17 anos!
— E deste lado, temos Ophelia Regis de 15 anos!
A plateia gritava o nome deles conforme a apresentação efusiva do professor Orpheu.
Thereza enxergava em Renan a mesma postura e fisionomia do seu sobrinho que há tantos anos desaparecera.
Magro, alto, cabelo preto cobrindo a fronte e a lateral de sua cabeça, nariz afinado, olhos pretos e vazios, além do queixo pontudo que combinavam com seu estilo de roupa. Um moletom cinza aberto cobria sua camiseta branca e uma calça jeans azul desgastada estava sobre seu tênis preto.
Fez-se silêncio no ginásio. Era o início da grande final. Renan com as peças brancas e Ophelia com as peças pretas. Seguindo a partida a seguir:
Renan: jogou e4 movendo o seu peão branco;
Ophelia: respondeu com e5 movendo seu peão preto;
Renan: cavalo f3;
Ophelia:cavalo c6...
A partida seguia equilibrada, mas Renan levava mais tempo para tomar as decisões deixando-o com menos tempo no relógio. Em certo momento, aparentava estar sereno, mas seu rosto suava, seu coração acelerava e cada vez mais, estava prestes a entrar em ebulição.
Ao lado, o professor Orpheu sentia orgulho em ver a filha Ophelia que lhe trazia lembranças de sua falecida esposa.
”— Este semblante confiante misturado com estes cabelos ruivos caindo pela sua pele alva. Tão inocente a minha pequena com este vestido cinza e florido!”
Estando inerte em seus pensamentos não reparou o movimento brusco de Renan que deixara acabar o tempo no relógio.
Num ímpeto de frustração, Renan cerrou os punhos batendo violentamente contra a mesa fazendo com que toda a realeza que ainda resistia, cair sobre o tabuleiro.
O público espantou-se com aquela reação, um burburinho instalou-se sobre a arquibancada e Ophelia, comemorava sua vitória indo em direção ao pai.
Renan levantou-se, fechou o zíper do moletom e colocou as mãos dentro do bolso.
Apenas um senhor achou aquela situação engraçada. Se levantando, saiu rapidamente entre a multidão.
— Já basta! Isto é tudo que eu preciso saber!
Ophelia saiu dos braços do pai, estendeu as mãos e falou:
— Renan, por que ficou bravo? Achou mesmo que tinha chance de me vencer ou não suporta perder para uma garotinha que nem eu?
Renan deu de ombros, fechou a cara e disse:
— Da próxima vez não conte com o tempo para me vencer.
Saiu andando e sua mãe aproximou-se:
— Filho, quantas vezes vou ter que te dizer para controlar sua raiva? Todo mundo está comentando o que você acabou de fazer.
Renan bufou, olhou as pessoas naquele local e falou para a mãe:
— E quantas vezes preciso te falar que não me importo com o que pensam de mim?
Saiu caminhando lentamente pensando na partida perdida e a mãe lhe fitava pensando em outro garoto:
— Igualzinho o Rui.
Andou pelo corredor do colégio, de vez em quando, parava em alguma sala. Em uma delas, analisava uma ou outra partida de xadrez pensando como alguns caiam no “mate do louco”, sacrificavam a dama e tantas outras jogadas difíceis de compreender. Em outra sala, não entendia aonde estava a competitividade num jogo de cartas.
Caminhou até o portão do colégio e saiu sem direção a ser tomada.
E ali estava ele, em uma quinta-feira de manhã com seu moletom cinza e debaixo de um céu nublado.
Percorreu alguns quarteirões até chegar à praça “Leste”. Alguns bancos de madeira, pequenos pinheiros, arbustos, uma fonte central, além de mesas e bancos de concreto faziam parte do cenário.
Uma leve neblina pairava sobre o local e havia pouca movimentação de pessoas, o que deixou o rapaz apreensivo até que...
— Hey rapaz! — uma voz altiva lhe chamou.
Renan olhou para a direita e um homem sentado no banco de concreto, com os cotovelos apoiados na mesa e com as mãos no queixo o encarava.
— Está falando comigo?!— perguntou com um semblante de raiva.
— Sim, meu amigo! — disse. — Preciso de alguém para jogar comigo.
Renan aproximou-se mantendo a postura ereta e com ar superior, falou: — Damas?!? —Sim! Damas. Não sabe jogar? — o senhor questionou-o colocando as mãos sobre a lateral do tabuleiro construído sobre a mesa. — Sei jogar, mas é uma perda de tempo! — Desdenhou e virou-se. — O que você sabe sobre o tempo? Pelo que pude observar foi ele que te fez perder o torneio do colégio, não é mesmo?! Renan virou-se e perguntou: — Quem é você? Prontamente, o senhor respondeu: — Eu?? Sou apenas alguém querendo jogar damas! Renan analisou aquele homem petulante. Aparentava ter uns 50 anos, branco, baixinho, gordinho de bochechas rosadas, olhos verdes e um cavanhaque grisalho que cobria toda sua boca, além do cabelo curto e grisalho abaixo de uma boina cinza. Vestia uma camiseta branca com um sobretudo preto, uma calça social preta e um sapato cinza.Notou ainda, que havia uma pequena corrente prateada presa entre a calça e algum objeto dentro do sobretudo. — Não fique ai me encarand
Era chegada a tão esperada noite de sexta-feira. Em seu quarto, Giulia se preparava para curtir. Fazendo os últimos retoques em sua maquiagem escutava sua música favorita no notebook, Fear of The Dark do Iron Maiden. Embalada pelo ritmo, a jovem garota terminara de passar seu batom preto e se jogou sobre a cama pensando em como terminaria aquela noite. Observou, vários objetos espalhados entre a estante e as prateleiras fixadas na parede. Segundo ela, era uma forma de proteção contra as forças ocultas do além e, por isso, gerava muita discussão com o avô, Carlos. Quadros, esculturas de gesso, pôster de bandas de rock, medalhões, cartas de tarô, bichos de pelúcia, revistas de maquiagem, pentagrama e incenso se misturavam ali, sinal de uma adolescente que ainda procurava se descobrir internamente. E, claro, encarava a foto de Adam que estava entre cartas e bonequinhos de vodu. — Ai Adam! — suspirou. O quarto sombrio era iluminado pela tela do notebook, velas vermelhas e br
— Está sim! Encontro vocês lá daqui a pouco. — confirmou Ramon saindo para atender outro cliente. Giulia olhou no relógio fixado na parede do bar, faltava meia hora para dar meia noite e um arrepio percorreu o seu corpo. — Vamos Giu. Termina de beber que precisamos ir. Giulia bebeu encarando Ramon, um rapaz branco, baixinho de cabelo preto e curtinho. Olhos castanhos e, quem olhava atentamente, repararia os dentes desalinhados. Sem questionar aquela conversa, partiram em direção a saída, foram em silêncio até o estacionamento e entraram no carro. — E aí? O que está rolando? — Giu fitou a amiga. — Você já ouviu falar sobre o mito dos 15 anos de Joaquim Ledô? Giulia deu risada. Já escutara sobre, mas seus conhecimentos sobre o ocultismo faziam-na achar graça naquela velha história para assustar crianças. Cruzou os braços entre o ventre e falou: — Sim, já me falaram, mas gostaria de ouvir a sua versão. — Então! Muito bem. Dizem que Joaquim Ledô era um senhor
Os quatro se entreolharam e Adam disse: — Quinhentos Vans?! Achei o que o pai dele tivesse mais dinheiro. hahaha— e saiu à procura da pirâmide. Os demais se dispersaram com as suas lanternas. Giulia foi em direção ao centro e refletia: “— Não sabia que Adam era assim. Perda de tempo.” — E o que eu estou fazendo aqui? Acham que andar no cemitério neste horário me assusta? — falou entre os túmulos. Um clarão apareceu no céu e um trovão foi ouvido. — Que estranho! Olhou para o céu enquanto uma chuva fina caia manchando sua maquiagem. — Parece que o mundo está acabando lá fora e aqui dentro, temos esta chuva fina. A garota permaneceu estática, foi quando o barulho de um gato foi ouvido o que a fez virar a lanterna um gato preto a fixava com os olhos verdes. Avistou um pequeno objeto triangular na coleira do animal e, ao apontar a lanterna, viu que era o tal cristal. O gato saiu em disparada, Giulia correu atrás dele parando em um dos corredores e avistou o
Flutuando pelo museu Paulo Marzola, Otavius indagava-se: “— O que estou fazendo aqui?” “— Quem são essas pessoas?” De repente, fitava a cena que acontecia numa das salas. Um garoto ruivo aparentava estar chorando enquanto uma mulher de cabelo ruivo e curto entregava-lhe um quadro. Otavius se aproximou visualizando um borrão de uma pintura que parecia ser peixes com alguns tons de azul. — O que você está fazendo aqui? — ela indagou-o.— Não tens permissão para estar aqui. Em instantes, estava a sós com o garoto que segurava um pequeno cartão e que parecia estar escrito “Pisces”. Num piscar de olhos, Otavius caminhava pelo zoológico da cidade até ver-se em frente à jaula de um leão que logo, transfigurou-se em um homem de meia idade, corpulento com seu longo cabelo loiro que estava preso por uma fita verde. Viu o homem retirar a fita verde entregando-a para uma bela garota loira que segurava um cartão branco, virando-se para ele gritou: — Toma seu rumo! Não tem
Otavius riu e falou: — Que exagero. Quem viria até aqui para fazer isso? — desdenhou. Num piscar de olhos, um estampido percorreu o ambiente e Otacilia caiu aos pés do marido. Toni abaixou-se, desesperado sobre o corpo da esposa. Otavius entreviu um homem se aproximando apontando um revólver e disparando contra seu pai. O jovem rapaz acompanhava toda a cena em câmera lenta como se fosse um filme de terror, deixando o livro cair sobre o chão, e nada daquilo fazia sentido. “— Estou sonhando? Não! Nem meu pior pesadelo seria tão cruel.” — refletia e balbuciava. O coração bombeava sangue para seus membros. Sua razão e suas pernas mostravam-lhe o caminho para fugir, mas sua emoção e seus braços diziam-lhe para lutar. Sentia um frio intenso na barriga e um aperto no peito que se transformaram em lágrimas. — O que foi garoto? Por que choras? — o atirador perguntou-lhe. — Quem é você? O que te dá o direito de tirar a vida deles? — respondeu colocando as mãos sobre a face.
Dia 15/06/2015 O dia amanheceu ensolarado na cidade de Jandaia. Neste dia, a vida de alguns adolescentes estava prestes a mudar. 06:30hs Mel dormia em sua cama. Auro dormia no sofá. Mais uma vez, passara a noite jogando. Renan permanecia sentado na cadeira de seu quarto analisando o convite que recebera e que estava sendo iluminado pela luminária. Giulia estava deitada em sua cama mexendo no celular. Otavius estava tomando banho para esquecer-se da noite terrível que findara. 07:30hs Mel escovava os dentes ainda vestindo seu pijama de dormir. Logo após, retirou o pijama e foi tomar banho. Auro despertou, ainda sonolento, observou o horário que marcava no relógio e sua decisão estava tomada. Renan tomava café da manhã com a mãe dizendo-lhe que sairia em breve e que não teria horas para voltar. Giulia separou a roupa que usaria naquele dia. Primeiro, teria que tomar café com o avô que acabara de prepará-lo. Otavius bebia suco enquanto escutava seus
— ...a sede do nosso torneio! Todos olharam-na com cara de espanto. Estavam ali em frente a porta de entrada do antigo Laboratório “Ferreira Pereira”, desativado em 1965 após a investigação policial que descobrira o plano terrível de seu fundador. O local era rodeado com árvores, matagal, erva daninha, além de um pântano aos fundos. Na frente, havia um portão enferrujado e a cerca de arame estava destruída com o passar dos anos. Quem quisesse se aventurar por ali encontraria um estreito caminho ladrilhado que percorria até a recepção. A fachada do prédio estava desgastada, uma tinta creme misturava-se aos ferros expostos e ao concreto. — Venham meus pequenos. Já estamos atrasados. — disse fazendo um gesto e convidando a todos a entrarem. Permaneceram em silêncio até que Renan tomou a dianteira aproximando-se da convidante e falou: — Espero que seja sério, não estou aqui para brincadeira! — entrou na recepção e logo atrás, os demais o seguiram. — Bela roupa, jovem