Lia Perroni Eu corri para fora do escritório e fui para a cozinha, onde estava Esmel com Luz. Eu sabia que Marcelo não faria nada comigo na presença da nossa filha.— O que houve, mamãe? — Esmel perguntou, notando o olhar desesperado no meu rosto.Eu sorri, ainda um pouco abatida.— Nada, querida. Só estava conversando com seu pai sobre alguns assuntos — eu disse, tentando manter a calma.Nesse momento, o grito de Marcelo interrompeu a cozinha. Ele estava gritando por mim, e pelo tom, ele estava furioso.— Sua vadia! — Marcelo disse, entrando na cozinha. Ele marchou até mim e me deu um tapa no rosto.Com o tapa, eu caí no chão. Esmel gritou assustada, e o meu lábio começou a sangrar. Esmel desmaiou, e só nesse instante Marcelo percebeu a presença da nossa filha.Luz, que viu toda a cena, correu para socorrer Esmel.— Não toque na minha filha! — Marcelo disse, empurrando Luz e pegando Esmel no colo.Eu me levantei do chão e corri para o lado da minha filha, preocupada.— Olha o que vo
Lia PerroniNo dia seguinte, acordei com Esmel agarrada à minha cintura. Uma onda de náusea tomou conta de mim e me levantei correndo da cama, seguindo para o banheiro para vomitar.Eu me apoiei na pia, sentindo-me fraca e desorientada. A náusea era intensa e eu não conseguia controlar o meu estômago. Esmel entrou no banheiro atrás de mim, olhando para mim com preocupação.— Mamãe, você está bem? — ela perguntou, sua voz cheia de ansiedade.Eu assenti com a cabeça, tentando tranquilizá-la.— Sim, querida, estou bem. Só estou me sentindo um pouco mal — eu disse, tentando sorrir.Mas Esmel não parecia convencida. Ela se aproximou de mim e me abraçou, como se quisesse me proteger.— Eu não quero que você fique doente, mamãe — ela disse, sua voz trêmula.Eu a abracei de volta, sentindo-me grata pela preocupação da minha filha.— Eu vou ficar bem, querida. Prometo — eu disse, tentando transmitir confiança.Já que Esmel estava acordada e de pé, decidi arrumá-la para a escola.Dei um banho n
Lia Perroni Arregalo os olhos ao escutar a voz de Marcelo, me viro para ele lentamente, sentindo um arrepio na espinha. Seu olhar é penetrante, e posso sentir a desconfiança emanando dele. — Ah, você chegou na hora certa — digo, forçando um sorriso natural. — Eu e Luz estávamos apenas... espalhando ratoeira pela casa. Temos alguns filhotes de rato aqui, então tome cuidado para não pisar em nenhuma. Marcelo se aproxima de mim, seu rosto tão colado que posso sentir sua respiração quente em meu rosto. Seu olhar é intensamente desconfiado. — Verdade? — ele pergunta, sua voz cheia de dúvida. Eu assinto com a cabeça, tentando manter a calma. — Então você deve demitir Luz — Marcelo conclui, sua voz firme. — Ela não está fazendo o seu trabalho direito. Meu coração afunda. Não posso deixar que Marcelo demita Luz, ela é minha única aliada na casa. — Não! — digo, um pouco alto demais. — Quero dizer, não há necessidade de demiti-la. São apenas filhotes de rato, e já coloquei reméd
Lia Perroni Abro os olhos e me encontro em um quarto branco, conectada a aparelhos. Olho ao redor, constatando que estou em um hospital. — Mamãe! — Esmel grita, passando pela porta. Ela ainda está com o uniforme da escola e seu rosto está manchado de lágrimas. — Esmel? O que você está fazendo aqui? — pergunto, abraçando minha filha. — Mamãe... — Esmel diz, com a voz embargada pelo choro. — A senhora está bem agora? Papai falou que a senhora caiu da escada e quase perdeu meu irmãozinho. É verdade que vou ter um irmão? — ela pergunta, com os olhos brilhando. Encaro-a, confusa, e levo a mão à barriga. — Então, eu não o perdi... — sussurro, incrédula. Esmel me olha, curiosa. — O que você disse, mamãe? — ela pergunta. Sorrio, emocionada. — Nada, meu amor! Onde está seu pai? — pergunto. Milhões de perguntas invadem minha mente. Eu realmente estou grávida, e Marcelo ajudou a salvar meu bebê, como pedi antes de desmaiar. Mas o que ele pretende fazer? O que ele quer em
Lia PerroniNo dia seguinte, recebi alta do hospital. Esmel e eu voltamos para casa, um refúgio que, apesar da aparente normalidade, agora me parecia carregado de apreensão. Na cozinha, Luz preparava o jantar, o aroma reconfortante das ervas pairando no ar.— Boa tarde, senhora — ela disse, um sorriso caloroso iluminando seu rosto. — Como se sente hoje? — perguntou, a genuína preocupação em seus olhos.Esmel, com sua energia contagiante, correu para a mesa, pegou uma maçã e a mordeu com satisfação, o som crocante ecoando pelo ambiente.— Sinto-me fisicamente melhor, mas uma sensação estranha me perturba, como se algo ruim estivesse prestes a acontecer — respondi, minha voz carregada de apreensão.Luz me encarou, a preocupação evidente em seu olhar.— A senhora acha que o senhor Marcelo vai tentar algo? — perguntou, a voz baixa.Marcelo estava desaparecido desde que o mandado de prisão foi emitido. Ninguém sabia de seu paradeiro, e a polícia continuava a procurá-lo. O fato de ele estar
Lia Perroni, três meses depois...Volto do trabalho, exausta, mas com uma sensação de realização. Hoje faz três meses que comecei a trabalhar na galeria de arte, um refúgio que encontrei em meio ao caos que minha vida se tornou. Três meses também se passaram desde o desaparecimento de Marcelo. A polícia ainda não tem notícias dele, e a incerteza paira como uma sombra constante.Apesar do medo que ainda me assombra, aprendi que não posso paralisar minha vida e a de Esmel. Marcelo pode ter me tirado muito, mas não vou permitir que ele me roube a capacidade de seguir em frente. A cada dia, me esforço para construir uma nova rotina, um novo lar, uma nova esperança.E agora, tinha um bebê crescendo dentro de mim, uma esperança se renovando a cada dia.Ao entrar no apartamento, o cheiro de bolo recém-assado me envolve, uma obra de Luz, que agora é mais do que uma funcionária, é uma amiga, uma irmã.Esmel corre ao meu encontro, seus olhos brilhando com a alegria de me ver.— Mamãe! — ela gr
KairósA consciência retorna como um clarão súbito, dissipando a névoa do coma. Abro os olhos, sentindo o peso do corpo e a estranheza do ambiente hospitalar. A primeira pergunta, urgente, escapa dos meus lábios.— Quanto tempo eu fiquei em coma? — pergunto à minha irmã, Camila, a voz rouca e fraca.Camila me encara, a expressão séria e preocupada.— Três meses, Kairós. Você ficou dormindo por três meses — responde ela, a voz carregada de pesar.Três meses. Um abismo de tempo se abre diante de mim, e a única imagem que emerge da névoa da memória é a de Lia. Onde ela está? O que aconteceu?— Você sabe para onde Lia foi? — pergunto, a voz ansiosa.O rosto de Camila se contorce em desgosto.— Você ainda pergunta por ela? Foi por causa dela que você está preso nessa cama! — exclama, a irritação transparecendo em cada palavra.Fecho a cara, a injustiça da acusação me enfurecendo.— Não fale besteira! Não foi ela quem cortou os freios do meu carro — retruco, a voz carregada de indignação.C
KairósFinalmente recebi alta e agora estou no aeroporto, prestes a embarcar rumo a Lia. Camila está ao meu lado, os olhos marejados, tentando me dissuadir.— Por favor, não vá. Você não sabe o que o marido dela pode fazer se te encontrar perto dela — implora Camila, a voz embargada.Suspiro, sentindo a preocupação dela pesar sobre mim.— Eu preciso ir. Sei que você teme que algo me aconteça, mas preciso ver a verdade com meus próprios olhos — respondo, a voz determinada.Camila me encara, a resignação em seus olhos.— Sei que não vou te convencer a ficar. Então, tome cuidado. Não acredite em tudo que ela disser e, por favor, volte para casa assim que descobrir a verdade — pede ela, me abraçando com força.Assinto, retribuindo o abraço.— Certo, vou me cuidar. Você também se cuide, ok? — digo, tentando acalmá-la.Ela sorri, um sorriso triste, enquanto meu voo é anunciado. Pego minha mala e me despeço de Camila, seguindo para o portão de embarque.Logo estarei frente a frente com Lia.