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Bem Vinda Ao Brasil

Pego minha mala e escuto Otto reclamar.

— Sabe que é o meu trabalho te ajudar.

Rio sem graça. Otto é meu motorista e segurança. Ele é muito mais que um funcionário; é um amigo querido.

O homem é alto, cerca de 1,98. Sua altura intimida as pessoas. Por ter um corpo forte, uma barba cheia e nenhum cabelo na cabeça, Otto tem uma aparência ameaçadora... mas é um homem doce e gentil.

A gente se conheceu no meu primeiro trabalho como atriz em Los Angeles. O diretor o recomendou para trabalhar como meu motorista. Desde então, ele tem sido meu amigo e confidente. Até pesquisou diversos seguranças para essa viagem. Selecionei dois para me acompanharem.

Voltar à minha cidade natal me trazia lembranças bem dolorosas e constrangedoras.

"Faça isso pelo filme, faça isso por sua carreira."

Minha cabeça repetia isso como um mantra. Fazer esse filme seria um ponto crucial em minha carreira. Lutei durante anos para chegar onde estou, mas esse papel poderia mudar tudo.

Por ser um filme com um tema polêmico em uma cidade conservadora, meu estômago doía devido ao nervosismo.

— Preocupada com seu novo papel?

Sorrio desconfortável. Otto me conhece mais que todos em minha vida, e isso me acalma, pois confio inteiramente nele.

— Não exatamente... Apenas não consigo afastar as lembranças daquela cidade. – Deslizo o batom sobre meus lábios - Já te contei como foi minha saída daquele lugar...

— Saiba que dessa vez tudo será diferente. – Diz, pegando minhas malas com um olhar reconfortante – Apesar de muitas pessoas terem sido cruéis com você, hoje você é uma mulher crescida. Ninguém dirá como deve agir e pensar.

Sorrio em agradecimento, me sentindo mais relaxada. Essa conversa foi o tapa na minha confiança que eu precisava para encarar meu passado.

(...)

Odiava voar, mas parte de ser uma atriz famosa é ter que voar para os destinos. Meu medo de altura atrapalhava bastante. Agradecia mentalmente por já estar em terra firme. Muitos fãs estavam gritando enlouquecidos. Sorria o melhor que podia; estava cansada. Há anos não pisava no Brasil, e toda essa hospitalidade me deixava recarregada após uma viagem cansativa.

Tirei diversas fotos com meus amados fãs; estar perto deles me dava uma força incrível!

Meu celular toca, e vejo que é Thiago, meu agente e melhor amigo.

— Você já pousou no Brasil? – Ele diz assim que atendo.

Consigo ouvir a voz de outras pessoas na ligação. O moreno já deve estar na casa, conversando com os funcionários. Thiago sempre chega antes nos lugares que me hospedo para organizar meus compromissos; ele realmente é ótimo em seu trabalho, e me orgulho de tê-lo como agente.

— Oi pra você também. – Ele resmunga, me fazendo rir baixo – Já estou chegando. Tive que parar para um lanche.... Estava morrendo de fome!

Ele gargalha, mas logo para, falando em um tom sério.

— Venha logo, pois aqui está um pandemônio... Vou contratar mais seguranças para você. Acho que aqui realmente é barra pesada.

Fico em silêncio, sem saber como responder. Não sei exatamente sobre o que ele estava falando. Já sofria muitos ataques de haters, mas não vejo necessidade de ter mais que dois seguranças. Otto já me protege; agora, com o Yuri e o Gustavo, me sinto muito mais segura.

— Não vejo necessidade disso... Já tem o Otto e os dois seguranças.

— Quando chegar, você vai saber exatamente do que estou falando... Tenho que desligar, não se atrase!

Suspiro, relaxando no banco do carro; estava curiosa para saber sobre essa ansiedade do Thiago. Será que aconteceu alguma coisa?

Otto dirigia tão rápido que mal podia ver a paisagem pela janela. Pouco importava agora; só queria descansar e comer uma comida caseira. Nenhuma comida me alegra mais que a comida feita pelos brasileiros; afinal, sou uma carioca esfomeada!

Ainda ia ter uma coletiva com o prefeito da cidade, que gravaria a maior parte do filme. Era tudo muito grandioso; nunca teve um filme dessas proporções em uma cidade tão pacata. Toda a mídia internacional estava focada em cobrir qualquer novidade do filme. Muitos conservadores odiaram a ideia; cheguei a sofrer ataques de extremistas.

Organizaram protestos em prol da família e bons costumes... Diziam que eu queimaria no inferno por fazer o papel de uma "devassa".

Inclusive ainda tem alguns protestos, porém menos radicais. Por meses, recebi ameaças e xingamentos nojentos pelas minhas redes sociais.... Isso afetou bastante minha autoestima; minha saúde mental estava em declínio.

Me isolei de todos, me afastando das mídias sociais e eventos com grande público; isso chegou a afetar minha carreira de certa forma.

Saio de meus pensamentos ao perceber que já tínhamos chegado ao destino.

Um arrepio invade meu corpo ao ver que em frente à minha casa tinham pichações e um pequeno grupo de pessoas.

"Vadia"

"Está nas escrituras! Levítico 20:13"

A cada pichação que eu lia, sentia uma parte de mim enfraquecer. Era como uma viagem para minha adolescência. Otto me lança um olhar pelo retrovisor, e não consigo disfarçar minha dor com o ódio gratuito.

— Podemos dar a volta e entrar pelo portão da lateral.

Sequei minhas lágrimas e respirei fundo, negando com a cabeça.

— Não precisa. Vamos por esse caminho.

Sorri o mais confiante que consigo, e Otto suspira, segurando o volante com força. Ele me conhecia muito bem para saber que por baixo de toda essa confiança, tem uma pessoa com medo.

Uma menina falava no megafone.

Minha cabeça girava com os sons alt

os e flashes de câmeras.

— A imprensa deve estar adorando esse circo.

Digo irritada. A mídia adora um escândalo sobre minha vida; esses protestos e assédios têm sido um prato cheio para a mídia.

— Saia da nossa cidade! Não queremos essa aberração aqui!

Ela grita ao me ver sair do carro. Sinto meus sentimentos se ampliarem com toda a agitação. Meu coração estava a mil. Otto e outros seguranças contratados empurravam as pessoas para que eu pudesse entrar. Passo pela menina que segurava o megafone, e nossos olhares se encontram; ela parecia presa em meus olhos. O portão começa a fechar; sorri maliciosa antes dos nossos olhares se perderem.

Thiago me vê entrar e me envolve em um abraço caloroso. Sorrio cansada mentalmente e fisicamente.

— Minha amiga, sinto muito pela sua chegada ter sido dessa forma. – diz enquanto nos afastamos. Ele força um sorriso, e vejo o quanto ele estava cansado – Já contratei alguém para limpar o vandalismo do seu muro. Hoje mesmo isso vai ser resolvido.

Suspiro grata por ter finalmente uma boa notícia. Me sirvo de um bom copo de uísque e me sento no sofá, sentindo todo o cansaço do dia bater sobre meu corpo. Me sentia dolorida.

Massageio minhas têmporas em busca de algum alívio para minha dor de cabeça. Balanço meu copo, me concentrando no som das pedras de gelo contra o vidro.

Essa chegada ao Brasil foi muito mais turbulenta do que pensei. Sabia que não ia ser recebida com uma festa ou comemorações, mas isso? Já é demais para qualquer um aguentar.

Como as pessoas podem ser tão idiotas quando se trata de diferenças? Acho que nem o mais sábio dos homens teria essa resposta.

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