Capítulo 4

Depois do jantar solitário, Selena foi procurar sua avó como havia prometido — aqueles momentos eram sagrados para ambas. Era o momento em que elas se reuniam como família, já que dona Thereza era de fato a única família que Selena tinha. Seu pai era uma história a parte a qual ela não poderia contar. Era apenas uma peça ornamental na vida dela, sem nenhuma serventia para ela.

A entrada de Selena no quarto de sua avó chamou a atenção de dona Thereza e nesse momento o olhar da velha senhora pousou sobre as roupas inadequadas de sua neta, que parecia está vestida para caminhar.

Diante daquela visão desleixada, ela perguntou-lhe bem-humorada, sem deixar transparecer sua desaprovação.

— Vai fazer caminhada, Selena? 

— Estou tão ruim assim, vovó? — Selena perguntou divertida.

— Você há de convir Selena, que seus trajes não são adequados para um jantar. — Dona Tereza respondeu analisando-a.

— Não se preocupe vovó, naquela mesa não havia ninguém para se escandalizar com minhas roupas. Eu estava sozinha. — Observou o mais natural possível.

— Querida, você precisa sair para se divertir um pouco. Não é bom para uma jovem da sua idade ficar presa a uma velha rabugenta como eu. — Disse sincera. 

— Pois saiba vovó, que os melhores momentos de minha vida; passei ao seu lado. — Disse-lhe afetuosa. — Aprecio cada segundo que estamos juntas. Eu a amo muito. — Completou carinhosa.

— Oh, Selena! Você é tudo que me restou desta vida — dona Tereza disse extremamente emocionada. — Peço tanto a Deus, minha querida, que você encontre um homem que a ame e a aceite como você é. 

Diante daquelas palavras tiradas do fundo do coração de sua avó, Selena lutou para segurar as lágrimas. O que sua avó pedia era praticamente impossível. Nenhum homem a amaria. Não tinha futuro para ela.

Para não abalar ainda mais os ânimos de sua avó, ela confidenciou incerta.

— Não consigo me imaginar, vovó, dividindo a vida com alguém. Estou acostumada à liberdade... Não me agrada a ideia de sentir-me presa. — Com um meio sorriso amarelado, completou. — Eu nasci para ser só.

— Engana-se minha querida! — Dona Tereza disse surpresa. — Ninguém nasceu para ser só. Nós não somos autossuficientes. Com o tempo você irá perceber que precisará de alguém ao seu lado. — A velha senhora completou preocupada.

Ouvi-la falar com tanta veemência de um relacionamento a dois a fez baixar a cabeça pensativa. A vontade que tinha era de dizer para sua avó que tinha horror da solidão, no entanto ela conteve-se. Sua avó já estava extremamente abatida, e mesmo sabendo que não era correto, o ideal era não dissuadi-la dessa ideia. No fundo, Selena sabia que dona Thereza tinha medo de partir e deixá-la desamparada. Talvez o receio de deixá-la sozinha tenha impulsionado sua avó a tentar uma aproximação entre ela e Henrique. 

Mesmo soando falso o que iria dizer, ela confessou, apenas para agradá-la.

— Talvez tenha razão vovó: namorar nunca fez mal a ninguém — com um sorriso encantador, acrescentou. — Prometo pensar seriamente em suas palavras.

Àquelas palavras mescladas de poucas verdades, tiveram o poder de aliviar o rosto tenso de sua avó e Selena viu brilhar nele, um belo sorriso que iluminou o rosto enrugado da senhora Forlan, e ela pode constatar essa certeza, quando a sua avó observou emocionada.

— Oh, minha, querida! Tenho tanto medo de partir sem antes vê-la casada.

“Vovó, sinto desaponta-la, mas a senhora não verá este dia” Pensou amargurada e desconversou a seguir.

— Deixemos que o tempo se encarregue disso. Tenho certeza de que em algum lugar da Espanha tem um par para mim. — Disse e nesse momento a imagem do jovem desconhecido se projetou na mente dela.  

Seria ele o homem a transformar a aridez do coração dela em um terreno fértil e propício para o amor? Com certeza não. O olhar daquele rapaz sobre ela era de desprezo, por ela ser filha de Henrique Navarro.

A resposta de Selena agradou dona Thereza e mais uma vez ela viu um brilho de alívio nos olhos dela.

Sem ter mais como sustentar àquela situação, Selena depositou um beijo nas faces de sua avó, despediu-se dela e deixou o quarto a seguir, lamentando-se por alimentar falsas esperanças nela. Era crueldade demais! Ela simplesmente não tinha o direito de engana-la. Sua avó não merecia ser iludida daquele jeito. Mas o que poderia fazer?! O que Selena sabia era que muitas pessoas se agarravam a falsas ilusões para continuar sobrevivendo. Se esse fosse o caso de Thereza Forlan, ela preferia mil vezes vê-la criando falsas expectativas, do que vê-la dominada pela desesperança e incerteza.

Sentindo-se terrivelmente desconfortável diante de toda aquela situação, ela decidiu arejar um pouco a cabeça e em seguida pegou o carro para dar uma volta pela cidade. Volta essa que a levou diretamente para a mansão que um dia tinha sido o lar dela; antes de Henrique apossar-se dela e expulsá-la de casa.

Mas, para surpresa dela, ela não era a única a espreitar a mansão dos Navarro; pois tão logo parou o carro a uma distância considerável da residência de Henrique, ela viu o rapaz que quase atropelou, olhando atentamente para a mansão dos Navarro. Assim que ele a viu; fechou o vidro da Mercedes e, nesse momento, ela desceu de seu próprio carro, aproximou-se da Mercedes dele, bateu no vidro, e quando ele desceu do veículo, ela o questionou desconfiada.

— É impressão minha ou você está vigiando-nos?

— Vocês, os Navarro, acham-se o centro das atenções. Acreditam piamente que o mundo gira em torno de vocês. — Ele observou desdenhoso. — Para a sua informação, eu estou pouco lixando-me para a sua família e isso a inclui.

Diante do desaforamento dele, ela revidou terrivelmente próxima a ele.

— O que faz então, quase caindo o olho em cima da mansão dos Navarro? Não esqueça que essa não é a primeira vez que o encontro nos rondando.

— Apesar de não ser obrigado a dar-lhe satisfações, vou aliviar a tua curiosidade. Trabalho para os Munhoz e como tal devo zelar pela segurança deles; afinal de contas, eles estão na tua casa. — Observou rude e após deter-se nas vestimentas inapropriadas dela, acrescentou debochado. — Belíssimo traje para receber os convidados dos teus pais.

— Para a tua informação, querido, eu não curto as festas oferecidas por meu pai e, caso tenha interesse em saber, eu não moro com Henrique. Se parei em frente à casa dele foi porque o vi em uma situação suspeita, se formos levar em conta o ódio gratuito que você sente pelos Navarro — retrucou séria e para irrita-lo, observou debochada, logo depois. — Ou devo acreditar que o nosso primeiro encontro foi tão excitante que você não resistiu a tentação e veio ver-me?

— Se você faz o tipo “garota iludida”, quem serei eu para contraria-la. A única coisa que posso dizer-lhe é que, não há nada em você que interesse-me. — Observou desdenhoso.

— Que coincidência descobrir que temos algo em comum, pois assim como você, também não vi nada de interessante em ti que possa chamar a atenção de uma mulher.

Depois de dizer essas palavras, ela entrou no carro dela, deu a partida e retornou para a mansão de sua avó soltando faísca pelos olhos. Não era por que ele a odiava gratuitamente por ser uma Navarro, que ele tinha o direito de menospreza-la como se ela fosse um nada.

Deixando sua indignação de lado, ela entrou em casa e subiu diretamente para o quarto, enquanto a imagem daquele ogro insolente a acompanhava.

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