Capítulo 5

De volta ao seu quarto, ela ligou o computador. Tentou apagar de sua mente o desaforamento daquele desconhecido insolente, parte da conversa que teve com sua avó e, concentrou-se no relatório que teria que entregar para Henrique no dia seguinte.

Mesmo a concentração de Selena estando a milhas de distância dela; ela conseguiu arrastá-la de volta na base da força e, quando terminou o relatório, já foi basicamente caindo na cama, para acordar no dia seguinte com uma terrível indisposição e um mal-humor do tamanho da tromba de um elefante.

Mas, mesmo indisposta, ela pulou da cama, fez sua toalete, tomou o café da manhã apressada e a seguir pegou o carro e dirigiu-se para a fábrica.

Assim que ela chegou na empresa para mais um expediente, Henrique e Penélope apareceram na fábrica e, ao vê-la, ele foi logo cobrando-lhe o relatório.

— Você já preparou os relatórios que pedi-lhe? – Henrique perguntou com cara de poucos amigos.

— Já os encaminhei para a sua sala, “papai querido!” — Ela respondeu com um tom de ironia na voz. 

— Será que pelo menos uma vez na vida, você é capaz de responder ao seu pai sem ironias? — Henrique falou visivelmente alterado.

— Sinto muito, mas foi mais forte do que eu. — Selena falou impassível.

Henrique a encarou severo e como se um flashback passasse diante dele; ele pôde ver claramente nos olhos cinza de sua filha, que ela não iria deixar por menos todo mal que ele causou-lhe. 

Por um momento, Henrique mergulhou nas profundezas daqueles olhos e viu expresso neles a rebeldia de Margareth Navarro, assim como sua sede de vingança. A semelhança entre ambas era imensa, a ponto de algumas vezes Henrique achar estar na presença de Margareth. Talvez esse pequeno detalhe o distanciasse de Selena, pois não era fácil encarar sua filha sem ignorar os erros que cometera no passado. Não podia culpar Selena por odiá-lo tanto. Inconsequentemente, ele fora responsável pela morte da mãe dela, e, deliberadamente, mantivera Selena num internato por anos, longe de todos e, principalmente dele. Sua filha tinha todos os motivos para despreza-lo, mas isso não significava que ele fosse tolerar as ironias dela.

— Se não consegue respeitar-me como pai; respeite-me pelo menos como seu patrão. — Henrique retrucou seco.

— Uma pequena correção: acionista!

— As ações só serão suas quando sua avó morrer. — Henrique a informou irritado. — Isso se até lá sua avó ainda as tiver. — Acrescentou enigmático.

— O que quer dizer com isso?! — Selena o interrogou apreensiva.

Após um breve silêncio que para ela transformou-se em uma eternidade, ele respondeu.

— Pergunte a sua avó.

— Se alguém aqui deve-me alguma explicação, esse alguém é o senhor que levantou este questionamento, por tanto trate logo de esclarecer-me este assunto.

— Por que devo esclarecer-lhe alguma coisa? Já que considera-se tão esperta quando o assunto é puxar o meu tapete, já deveria saber do que refiro-me. — Disse ele com certo prazer na voz. — Mas, caso eu não tenha sido claro contigo; digo-lhe que você não perde por esperar: é questão de tempo para os teus míseros cinco por cento estarem na minha mão, juntamente com tudo o que deverias herdar da tua avó.

Depois de dizer àquelas palavras, ele a deixou imediatamente sem dar a ela a chance do revide; de modo que Selena teve que engolir a seco sua vontade de descobrir a procedência daquelas insinuações cheias de duplicidades. 

Aquela referência no mínimo estranha a deixou num estado de nervos terrível, de maneira que àquelas palavras martelaram na cabeça dela durante todo dia, e, ela teria que ser bastante discreta se quisesse arrancar alguma informação a respeito do assunto com a avó dela.

Dona Tereza estava muito fragilizada e ela temia que aquele assunto desagradável de alguma forma a prejudicasse e, se isso acontecesse, ela nunca iria se perdoar. Por outro lado, Selena tinha certeza de que, talvez, não aguentasse guardar só para si àquela dúvida. Tinha muita coisa envolvida naquele jogo de palavras e ela não iria permitir que Henrique e Penélope levassem a melhor às custas dela.

Como aparentemente se esbarrar no funcionário do senhor Munhoz fazia parte de sua rotina; mais uma vez ela teve o desprazer de encarar àqueles olhos terrivelmente verde, que naquele momento resolveu tirá-la para boba da corte: dado o comentário zombeteiro dele, ao ir ao encontro dela.

— Ora, ora! Se não é a viúva Negra mais uma vez cruzando o meu caminho!

— Cuidado, querido, que a viúva Negra pode aniquila-lo com apenas um ferrão. — Ela revidou sarcástica.

— Pelo jeito que andas perseguindo-me é bem provável que queiras cair na minha teia. — Disse ele cinicamente e completou. — Só que, se isso acontecer, eu arranco o teu ferrão antes mesmo que possas imaginar.

A referência dele à viúva Negra era por conta de ela vestir-se apenas de preto, de modo que ela descobriu tempos depois que, ela ganhara aquele apelido entre os funcionários, não apenas por causa de suas vestimentas, mas também devido a rigidez com que conduzia os funcionários da fábrica, onde ela era engenharia de produção.

— Vá sonhando, querido. Afinal de contas, eu não ganhei esse apelido à toa. — Disse ela sem perceber que ele iria interpretar erroneamente as palavras dela.

— Estás querendo convencer-me de que és uma mulher fatal? Apesar desse rosto bonito e desse corpo delgado, você não parece-me fazer jus ao teu apelido; se não qual o motivo para estar tanto tempo sozinha? — Observou a queima-roupa para indignação dela.

— Só mesmo um pervertido como você, para elevar esse assunto a este nível. — Retrucou indignada. — Deverias informar-se mais sobre o apelido antes de tirar conclusões precipitadas a meu respeito.

Diante da fúria estampada no rosto dela; ele deu-se conta de que tinha levado aquele assunto para o lado sexual e, que, provavelmente, ela fosse uma futura candidata para ser uma solteirona — apesar de ela ser uma mulher extremamente bonita.

Selena Navarro tinha uma beleza singular e traços delicados. Ela era alta e esguia; tinha pele clara, cabelos longos e negros; olhos cinzas claríssimos e, pela calça moletom que ela usou na noite anterior, ele percebeu que ela tinha pernas grossas. Porém, mesmo diante de tanta beleza, ela não poderia parecer atraente aos olhos dele e, o motivo era apenas um: ela era uma Navarro — filha de Henrique e Penélope —, e como tal deveria ser destruída e não cobiçada.

Mesmo sabendo que não deveria dar trela para a filha da mulher que o humilhou diante de toda a diretoria dos Munhoz e dos Navarro, ele viu-se obrigado a reconhecer que se excedeu em seu julgamento e disse polidamente.

— Desculpe se interpretei mal tuas palavras. Só queria deixar claro que não há nenhuma possibilidade de eu cair na tua teia “viúva Negra”.

— Quanto a isso não precisa preocupar-se: sou muito seletiva quando o assunto é homem e, definitivamente, você não se enquadra no meu perfil. — Observou para não se sair por baixo.

Sem dar a ele a chance de revidar, ela entrou em seu carro e seguiu direto para a mansão de sua avó, com mais um problema para completar a sua cota: como por exemplo, livrar-se daquele homem que estava mexendo com as estruturas dela.

 

 

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo