Um dos meus maiores orgulhos é que, se me procuravam, iam me encontrar. E para o azar de Lorenzo, eu o conhecia muito bem para saber quais lugares ele frequentava. Com essa desculpa em mente, estou sentada nesta mesa específica, deste restaurante específico, nesta hora específica. Deixei que uma boa noite de descanso limpasse minha cabeça, e por enquanto desfruto de uma salada com extrema lentidão, porque sei que ele virá.— O que você está fazendo aqui, Sara? — ouço o famoso Lorenzo dizer irritado.Solto um pequeno sorriso de malícia, olho para o lado para me concentrar nele. Se antes ao me ver parecia indiferente, hoje com a surpresa, o peguei desprevenido.— Parece que é a única coisa que você me pergunta desde que voltei? Que tedioso da sua parte — tomo da minha taça com "tranquilidade".— Você não gosta da comida deste restaurante.— Trocaram de chef, e eu de opinião — respondo.— Você tinha que sentar justamente na minha mesa favorita e vir a esta hora? Justo agora quando o almoç
O que estou pensando?Me dá nojo só de pensar. É um traidor. Um traidor covarde de quem nunca deveria ter sido amiga. Ele me afastou com um péssimo humor, ele também se afasta, embora mais lentamente, como se esperasse algo diferente.Nenhum de nós fala, estamos mergulhados no silêncio. Eu olhando para o lado, pela janela para a cidade, ele não sei o que estará vendo, nem me interessa. Ou minto dizendo que não me importa, fecho mais minha jaqueta porque sinto que estou revelando muito do meu colo hoje. É tão estranho. Nunca me incomodei em mostrar pele.— Será que posso me juntar à mesa de vocês? — interrompe-nos uma voz feminina.Meu olhar se desvia para saber quem estava falando conosco. Não a conheço. É uma mulher alta e esbelta, de olhos e cabelos castanhos. É muito bonita e elegante. Embora o que mais chame minha atenção seja uma de suas mãos com um grande diamante de lapidação esmeralda. Uma certeza se planta em mim antes mesmo de ouvir a confirmação.— Emma... — diz Lorenzo cont
Digamos que ao longo da minha vida eu mesma me coloquei em situações absurdas e vergonhosas. Assim que completei a maioridade e fugi da casa dos meus pais, saí para percorrer o mundo e tive vários relacionamentos pitorescos. Meus ex são dignos de documentário, e vivi várias desilusões amorosas que na verdade não levei muito a sério.Por isso me surpreende o quanto estou sensível com toda essa situação. Por estar deste lado da mesa recebendo o convite que tanto acreditei merecer. Era o que eu esperava, ter um papel importante no casamento do meu melhor amigo, e mesmo assim... não me sinto bem.— Você está muito emocionada com nossa surpresa e por isso não consegue dar a resposta? — Emma me convida a falar.— Bem... foi... uma grande surpresa. Isso sim... — digo para ganhar tempo.Me concentro no cartão dentro da caixa, viro-o e atrás há uma foto dos noivos. Parece uma sessão profissional deles, muito felizes. A foto fica na minha memória enquanto finjo prestar atenção no resto dos prese
Ambos começamos no programa de engenharia biomédica que era reconhecido internacionalmente. Eu tive a ideia, mas não consegui concluir o curso, Lorenzo sim. Eu poderia ter ido para outra universidade? Sim. Eu fiz isso? Não, porque me sentia confortável com o ambiente e o tinha por perto. Fui estudar Engenharia de Sistemas, essa eu consegui terminar.— Você acha que todas as decisões da minha vida giram em torno de você, Sara? — ele reclama.— Ha — solto, de ingratos o mundo estava cheio. Olho diretamente para ele — Vou te fazer uma última proposta, Lorenzo.— Fala.— Não irei ao seu casamento, não terei contato com sua noiva, nem com você. Nunca mais terá que me ver pessoalmente ou conversarmos diretamente se é isso que tanto deseja. Já que nossa amizade e vida juntos não valem merda nenhuma para você, para mim também não valerão nada...Solto essas palavras com amargura, e sua boca se contorce com a mesma amargura. Não sei se vejo dor em seus olhos, ou se sou eu quem sente a dor e est
Os casamentos por conveniência não eram novidade em nosso círculo social. Eram algo normal e aceitável aos olhos de todos. Primeiro, as famílias deveriam ter compatibilidade em objetivos, oportunidades de negócios e só depois vinha a atração sentimental do casal. Assim, por último.Sob essa fórmula foi que os pais de Loren se casaram, os senhores Lorenzo Lewis e Victoria Laurent. Eles tinham tudo a seu favor, exceto a atração sentimental. Tinham um casamento de cripta. Como não? Lorenzo pai era muitos anos mais velho que Victoria, e também não é que a senhora Victoria fosse particularmente agradável.Nesse inferno de relacionamento cresceram Loren e seus irmãos gêmeos, Julián e Richard. Os três foram infelizes, e eu sei que marcados por essa situação. Eis o ponto principal da minha reflexão: Loren não queria repetir a mesma história de seus pais. Não lhe agradava que tivessem um casamento aberto ou amantes aqui e ali, isso não era para ele. Ele queria um casamento por amor.Então, se a
— Em vez de desaparecer, descanse aqui, vem, vem — guiei-o para que repousasse sua cabeça nas minhas pernas. A partir daí acariciei seu cabelo rebelde — Está se sentindo melhor?— Me sinto patético. Não sou seu gato — reclamou. Contive meu riso e fiquei séria.— Aconteça o que acontecer, estou aqui com você. Você não está sozinho. Estamos juntos, sempre estaremos...Mais silêncio de sua parte, por isso me dediquei a pentear seu cabelo para acalmá-lo. Apenas isso.— Sara... — ouvi-o sussurrar.— Diga...— Tenho... tenho algo para te contar... — senti sua respiração agitar-se.— Me conte — comentei com leveza.— Eu...Ele tentou se virar para levantar a cabeça, mas não conseguiu completamente porque seu cabelo se enrolou no meu cinto de pedrarias. Quando percebemos, comecei a rir descontroladamente, ele me dizendo para não rir e dando tapas tentando se soltar. Tal ataque de riso me deu que caí na cama, e no puxão, puxei Loren comigo. Acabei com a cabeça dele entre minhas pernas.— Pare d
Finalmente cheguei à casa dos meus pais. Estou parada na porta tomando coragem para tocar a campainha, respiro fundo e faço isso, toco. A porta abre mais rápido do que eu esperava, quem abre é uma menininha que me chega pela altura do umbigo.— Sobrinhaaaaa! — Salomé vem me abraçar eufórica.— Minha tia favoritaaaaa! — correspondo ao abraço igualmente eufórica, balançando-a de um lado para outro.Sim, eu tenho uma tia de 11 anos. É estranho? Aprendi a conviver com isso. A história é assim. Meu avô paterno Lemuel refez sua vida com Selena, uma mulher mais jovem que ele, que ele conseguiu engravidar. Para complicar mais a situação, Selena é a melhor amiga da minha mãe. Era, antes do nascimento de Salomé.— Vocês poderiam parar de se chamar assim? Quanto mais vocês crescem, mais estranho isso soa... — comenta Selena entre dentes.Ela está na cozinha com minha mãe, ambas entre legumes picados e panelas fervendo. Devem estar preparando o jantar.— Não seria o contrário? Já estamos acostumad
A refeição transcorre bem se eu ignoro sua existência, comemos a salada, o macarrão, o frango, e chegamos à sobremesa. Mas preciso ir ao banheiro, me retiro rapidamente para lá, faço o que tinha que fazer e quando saio...Leonel está me esperando do lado de fora, no corredor.— Podemos conversar por alguns minutos, filha? — pergunta ele abatido e sem energia.Quero dizer que não, mesmo assim, faz tanto tempo que estou brigada com ele, que cedo. Me abraço de desconforto.— Que seja rápido. O tiramisù está me esperando...Leonel sorri com minha piada. Céus, não gosto de estar assim com meu pai. Tê-lo por perto é pior.— Desde que você chegou à minha vida, minha maior prioridade foi cuidar de você. Ganhar sua confiança e carinho. Recuperar o tempo perdido — afirma, meu coração se sente pequeno como de um pintinho — Nada do que faço é para o seu mal, ou pelo menos não penso que seja para o seu mal.— Do que você pensa para o que é real, há uma grande distância. Você sabe que agiu errado...