Camila narrando:Quando os tiros começaram lá fora, o coração disparou. Eu sabia, era o Guilherme. Ele tinha vindo. Ele me achou.Mas antes que eu pudesse gritar ou sequer correr até a porta, ela se abriu.Jamile.Entrou como uma sombra maldita, com os olhos arregalados e um galão de gasolina nas mãos.— Você não vai ficar com ele, Camila. NEM EU, NEM VOCÊ! — ela gritou, com a voz insana.Antes que eu pudesse reagir, ela trancou a porta, com uma barra de ferro pesada, e virou o galão de gasolina com raiva, jogando no chão, nas paredes, nos móveis, no colchão.— VOCÊ NÃO VAI TER O QUE EU PERDI! VOCÊ ROUBOU TUDO DE MIM!— Jamile, para! Pelo amor de Deus! — eu implorei, tentando pegar o galão da mão dela, mas ela me empurrou com força.Tomei impulso, tentei agarrar de novo, mas ela já tava com uma caixa de fósforo na mão.— A gente vai arder juntinhas, irmãzinha, que romântico, né? — ela sorriu torto, completamente fora de si.Riscou o fósforo.O barulho da chama crescendo foi a coisa ma
Guilherme narrando:A ambulância cortava a cidade com sirene ligada, mas pra mim o tempo parecia correr diferente. Eu olhava pra Camila ali deitada, com aquele rosto marcado pela fuligem, os olhos cansados e ainda assim, linda.Viva.E isso já era mais do que o suficiente pra mim.Eu segurava a mão dela como se tivesse voltado no tempo, lembrando de tudo que a gente passou pra chegar aqui. E por mais que ainda tivesse o gosto amargo da perda da Jamile, de tudo que ela se tornou, meu coração só conseguia focar nela.A médica conferia os sinais, tranquila, mas firme.Os batimentos dela estão estáveis. Vamos chegar no hospital em menos de cinco minutos.Camila virou o rosto pra mim e sussurrou:— Só quero saber do nosso bebê, Gui… se ele tá bem…— Ele tá, amor — falei, encostando minha testa na dela. — Ele é guerreiro. Puxou você.Ela deu um sorriso fraco, mas foi o suficiente pra me desmontar. Porque ver aquele sorriso ali, depois de tudo que ela passou, era como ver o sol nascendo depo
Camila narrando:Chegamos em casa já era tarde, o céu ainda escuro e o silêncio dominando tudo. As luzes da varanda apagadas, a casa tranquila… todo mundo tava dormindo. Graças a Deus.Eu só queria silêncio, o conforto do nosso quarto, e o calor dos braços do Guilherme.Entramos devagar, ele fechou a porta com cuidado, e fomos direto pro quarto. Assim que entrei, senti o cheiro familiar do nosso cantinho. Me deu um alívio tão grande, parecia que eu tinha voltado à vida.Sentei na beirada da cama e olhei pra ele.— Você contou o que aconteceu pra sua mãe? Ou pra Dona Maria? — perguntei baixinho, com medo até de acordar alguém com a minha voz.— Não falei nada não, amor. — ele respondeu tirando o casaco e jogando de lado. — Amanhã a gente conta, com calma. Hoje você só vai descansar.Ele veio até mim, me olhou com carinho e começou a tirar minha roupa devagar, com o maior cuidado do mundo. Como se cada botão fosse uma ferida sendo curada, cada peça removida com amor.— Deita um pouquinh
Camila narrando:Acordei com a luz suave do sol entrando pela fresta da cortina. O quarto tava silencioso, calmo… e pela primeira vez em muito tempo, eu acordei em paz.Pisquei devagar, os lençóis ainda cheirando a amaciante, o travesseiro com o perfume do Guilherme… mas ele não tava ali.Estiquei a mão na cama, sentindo o lugar dele já frio. Sentei devagar, com o corpo ainda cansado, mas leve. Tudo doía um pouco, mas era uma dor de quem sobreviveu. De quem voltou.Levantei e fui direto pro banheiro.Ainda me sentia com o cheiro da fumaça presa na pele.Liguei o chuveiro, deixei a água quente cair sobre meu corpo, escorrer pelas costas, pela nuca… e por alguns minutos, só fiquei ali. De olhos fechados, em silêncio. Respirando. Sentindo a vida me abraçar de novo.Lavei meu cabelo com calma, usei aquele creme que eu sempre guardava pra ocasiões especiais e, pela primeira vez, senti que hoje era uma dessas ocasiões. Hidratei o corpo com carinho, como se cada toque fosse parte da cura.Me
Camila narrando:Depois de toda aquela bagunça gostosa com a Gabi, a gente se ajeitou de novo na cama. Guilherme me olhou com aquele sorriso calmo, cheio de amor, e se aproximou devagar.Passou a mão no meu rosto com carinho, afastando uma mecha molhada do meu cabelo, e me deu um beijo demorado, cheio de emoção. Quando se afastou, encostou a testa na minha e sussurrou:— Eu te amo. E tô indo, tá? Tenho uma reunião cedo. Depois vou me arrumar lá na empresa mesmo…— Por que não se arruma aqui? — perguntei, quase manhosa, querendo ele por perto.— Porque eu sei que se eu ficar aqui, vou querer te ver, te tocar… e não vou conseguir respeitar a tradição. E hoje, eu quero te ver só no altar. Desse jeitinho que você sempre sonhou. — ele sorriu e beijou minha testa.Eu sorri, com o coração derretido.— Vai, então. Mas volta lindo. Quero casar com o homem mais gato do Rio.— Mais gato e mais apaixonado. — ele piscou e levantou da cama, indo pegar a roupa.Gabi foi atrás dele, fazendo mil pergu
Camila narrando : Saí do quarto com o coração apertado, as mãos suando dentro das luvas rendadas, o véu leve balançando com meus passos lentos. Cada degrau que eu descia parecia um passo rumo a uma nova vida. Mas quando cheguei na metade da escada, a porta da casa se abriu. E quem entrou foi ele. Seu Jorge. Meu pai. Os olhos marejados, o rosto cansado, mas com uma ternura que eu nunca tinha visto antes. Parou ali, bem na entrada, me olhando como se visse um milagre. — Você tá linda, filha… — ele disse, com a voz embargada, se aproximando devagar. Meu coração apertou ainda mais. Eu não esperava por ele. Não hoje. Não depois de tudo. Ele me abraçou forte, como se quisesse compensar o tempo perdido com aquele gesto. E eu me segurei pra não desabar. — Obrigada… — murmurei, tentando manter a voz firme. — Achei que o senhor não viria… — falei, olhando nos olhos dele. — Eu não podia perder seu casamento. — ele respondeu, e então olhou em direção ao jardim. — E… eu
Guilherme narrando:Quando ela apareceu no começo do corredor, o tempo… parou.O barulho sumiu. As vozes, as cadeiras, os convidados… tudo virou plano de fundo. Era como se só existisse ela, caminhando na minha direção, com aquele vestido branco de renda, o sorriso tímido e os olhos marejados.Minha noiva. Minha mulher. Minha vida.E quando o Seu Jorge colocou a mão dela na minha…Eu senti.Senti que tudo que eu passei valeu a pena. Que cada luta, cada dor, cada cicatriz… me trouxeram até aquele momento.Ela tava ali. Inteira. Viva. Minha.— Você tá… inacreditável. — eu sussurrei, segurando a emoção com todas as forças.Mas a verdade é que por dentro… eu tava desabando de amor.— Tô aqui… por você. — ela respondeu, com aquele olhar que sempre me desmonta.Entrelaçamos os dedos e nos viramos pro celebrante. O vento batia leve, e eu ouvi o som das folhas balançando lá atrás. O jardim tava lindo, mas nada se comparava ao que tava na minha frente.Ela.O celebrante começou a falar, e eu t
Camila narrando:Dançar com o Guilherme ali, no meio do jardim, com todas aquelas luzes piscando ao nosso redor, a música suave, a Gabi sorrindo perto… foi o momento mais feliz da minha vida.Tudo parecia ter parado só pra nós dois. Eu me sentia leve, viva, amada como nunca antes. E por um instante, esqueci de tudo o que já tinha doído. Agora era só alegria. Só amor.Foi quando ouvi uma das meninas gritar:— Camila! Tá na hora de jogar o buquê!Todo mundo riu, bateu palma, e eu fui puxada gentilmente até o centro da pista. As mulheres se aglomeraram atrás de mim, algumas empolgadas, outras fazendo graça, mas todas sorrindo, com os olhos atentos ao que viria.— É agora, hein! Quero ver quem vai ser a próxima! — falei rindo, já de costas, segurando firme o buquê.— Um, dois, três… e já! — gritei, jogando com força pra trás.O buquê voou no ar, rodopiando, e caiu direto nas mãos de uma das funcionárias da empresa, a Letícia, uma das mais tímidas, que ficou sem saber onde enfiar a cara qu