Camila narrando:Ele dirigia feito um louco, cortando as ruas sem rumo, os olhos fixos na estrada e a arma sempre à mostra. Eu tava com o coração na boca, mas por fora tentava me manter firme. Eu precisava pensar. Respirar. Sobreviver.Foi quando me lembrei do que o Guilherme tinha feito um tempo atrás.O rastreador.Ele mandou instalar no meu celular. Disse que era por segurança, principalmente depois do que aconteceu com a Jamile e com o Eduardo.E o celular tava comigo.No bolso da minha calça. Graças a Deus.Fechei os olhos por um segundo e, em pensamento, fiz a única coisa que me restava fazer naquele momento:"Guilherme... Por favor. Sente minha falta. Me acha."Mas Eduardo parecia sentir o meu silêncio, como se meu medo tivesse cheiro.— Achou mesmo que ia viver a sua vidinha feliz com o Guilherme, né? — ele disse, a voz carregada de ódio, sem tirar os olhos da estrada. — Casar, ter filho, sorriso no rosto… achou errado, Camila.— Eduardo… — falei baixinho, com a voz trêmula. —
Guilherme narrando:Desde o momento em que a Camila saiu pra buscar o vestido, eu fiquei com aquele pressentimento estranho no peito. Um peso, uma inquietação. Tentei ignorar. Me forcei a focar na reunião, porque era importante, mas por dentro, algo me dizia que tinha alguma coisa errada.Ela insistiu que tava tudo certo, que o motorista ia com ela e que o segurança ia estar por perto. E mesmo assim, eu queria ter ido junto. Mas não fui.A reunião se arrastou, minha cabeça longe. E foi no final, quando sentei na minha sala pra revisar uns contratos, que o celular vibrou. Mensagem da Camila.Quando abri… o chão sumiu.– Amor, fui sequestrada. Tô num sítio.Junto da mensagem, a localização.Meu corpo gelou. O sangue parou de circular por um segundo. Minha mão tremia e a respiração travou no peito.— Não… não… — murmurei, já me levantando de supetão.Liguei pro segurança que tava com ela. Nada. Caixa postal. Liguei pro motorista. Também nada. Nenhuma resposta.Corri pro computador, acess
Camila narrando:Ele pegou o celular que tinha caído no chão. Meus olhos acompanharam o movimento em desespero. Minha sorte, é que eu tinha apagado a mensagem.Mas ele segurava o aparelho como se fosse dinamite.— Fala, porra! TU MANDOU A MENSAGEM, NÉ?! — ele gritou, e antes que eu pudesse me proteger, me puxou pelos cabelos com força.— N-Não mandei nada! Eu juro! — respondi chorando, implorando, tentando proteger minha barriga, o rosto, a vida.Mas ele me empurrou com brutalidade, me jogando de novo no colchão sujo.— SUA VADIA! — gritou, e no impulso, jogou meu celular no chão e pisou com força. O estalo foi alto, o som do vidro quebrando me fez fechar os olhos. Mas por dentro, eu só pensava: já foi, Eduardo, já mandei, já era.Foi nesse momento que ouvi o barulho da porta se abrindo.E quando olhei… quase não acreditei no que vi.Jamile.De pé, na porta, com um sorriso cínico estampado no rosto, como se aquilo tudo fosse um passeio no parque.— Oi, Camila… sentiu saudades, irmãzi
Guilherme narrando:Assim que o carro parou, a gente desceu em silêncio, já com as armas em punho. Eu respirei fundo, os olhos fixos na trilha de terra batida que levava até o sítio abandonado. A localização que a Camila mandou batia exatamente ali.— Pelo mato. Por trás. Sem barulho. — ordenei, e os dois seguranças assentiram.Avançamos pela lateral do terreno, nos escondendo entre as árvores e a cerca quebrada. O capim alto ajudava a cobrir nossos movimentos. O coração batia acelerado, mas a mente tava fria. Eu só tinha um objetivo: tirar a Camila dali viva.Me agachei atrás de uma árvore grossa e olhei em direção à casa. De onde eu tava, consegui ter uma visão parcial da parte da frente.Só tinha um cara armado lá fora. Um segurança. Estava distraído, olhando pro nada, provavelmente achando que ninguém jamais encontraria esse lugar.— Um só na segurança. — sussurrei pro Paulo, que já mirava nele com precisão. — Espera meu sinal.Desviei o olhar pro lado, pra área da varanda…E foi
Camila narrando:Quando os tiros começaram lá fora, o coração disparou. Eu sabia, era o Guilherme. Ele tinha vindo. Ele me achou.Mas antes que eu pudesse gritar ou sequer correr até a porta, ela se abriu.Jamile.Entrou como uma sombra maldita, com os olhos arregalados e um galão de gasolina nas mãos.— Você não vai ficar com ele, Camila. NEM EU, NEM VOCÊ! — ela gritou, com a voz insana.Antes que eu pudesse reagir, ela trancou a porta, com uma barra de ferro pesada, e virou o galão de gasolina com raiva, jogando no chão, nas paredes, nos móveis, no colchão.— VOCÊ NÃO VAI TER O QUE EU PERDI! VOCÊ ROUBOU TUDO DE MIM!— Jamile, para! Pelo amor de Deus! — eu implorei, tentando pegar o galão da mão dela, mas ela me empurrou com força.Tomei impulso, tentei agarrar de novo, mas ela já tava com uma caixa de fósforo na mão.— A gente vai arder juntinhas, irmãzinha, que romântico, né? — ela sorriu torto, completamente fora de si.Riscou o fósforo.O barulho da chama crescendo foi a coisa ma
Guilherme narrando:A ambulância cortava a cidade com sirene ligada, mas pra mim o tempo parecia correr diferente. Eu olhava pra Camila ali deitada, com aquele rosto marcado pela fuligem, os olhos cansados e ainda assim, linda.Viva.E isso já era mais do que o suficiente pra mim.Eu segurava a mão dela como se tivesse voltado no tempo, lembrando de tudo que a gente passou pra chegar aqui. E por mais que ainda tivesse o gosto amargo da perda da Jamile, de tudo que ela se tornou, meu coração só conseguia focar nela.A médica conferia os sinais, tranquila, mas firme.Os batimentos dela estão estáveis. Vamos chegar no hospital em menos de cinco minutos.Camila virou o rosto pra mim e sussurrou:— Só quero saber do nosso bebê, Gui… se ele tá bem…— Ele tá, amor — falei, encostando minha testa na dela. — Ele é guerreiro. Puxou você.Ela deu um sorriso fraco, mas foi o suficiente pra me desmontar. Porque ver aquele sorriso ali, depois de tudo que ela passou, era como ver o sol nascendo depo
Camila narrando:Chegamos em casa já era tarde, o céu ainda escuro e o silêncio dominando tudo. As luzes da varanda apagadas, a casa tranquila… todo mundo tava dormindo. Graças a Deus.Eu só queria silêncio, o conforto do nosso quarto, e o calor dos braços do Guilherme.Entramos devagar, ele fechou a porta com cuidado, e fomos direto pro quarto. Assim que entrei, senti o cheiro familiar do nosso cantinho. Me deu um alívio tão grande, parecia que eu tinha voltado à vida.Sentei na beirada da cama e olhei pra ele.— Você contou o que aconteceu pra sua mãe? Ou pra Dona Maria? — perguntei baixinho, com medo até de acordar alguém com a minha voz.— Não falei nada não, amor. — ele respondeu tirando o casaco e jogando de lado. — Amanhã a gente conta, com calma. Hoje você só vai descansar.Ele veio até mim, me olhou com carinho e começou a tirar minha roupa devagar, com o maior cuidado do mundo. Como se cada botão fosse uma ferida sendo curada, cada peça removida com amor.— Deita um pouquinh
Camila narrando:Acordei com a luz suave do sol entrando pela fresta da cortina. O quarto tava silencioso, calmo… e pela primeira vez em muito tempo, eu acordei em paz.Pisquei devagar, os lençóis ainda cheirando a amaciante, o travesseiro com o perfume do Guilherme… mas ele não tava ali.Estiquei a mão na cama, sentindo o lugar dele já frio. Sentei devagar, com o corpo ainda cansado, mas leve. Tudo doía um pouco, mas era uma dor de quem sobreviveu. De quem voltou.Levantei e fui direto pro banheiro.Ainda me sentia com o cheiro da fumaça presa na pele.Liguei o chuveiro, deixei a água quente cair sobre meu corpo, escorrer pelas costas, pela nuca… e por alguns minutos, só fiquei ali. De olhos fechados, em silêncio. Respirando. Sentindo a vida me abraçar de novo.Lavei meu cabelo com calma, usei aquele creme que eu sempre guardava pra ocasiões especiais e, pela primeira vez, senti que hoje era uma dessas ocasiões. Hidratei o corpo com carinho, como se cada toque fosse parte da cura.Me