Quatro dias se passaram desde que Gabriel segurou meu pulso naquele momento no escritório. Desde então, ele deixou de vir para casa durante o dia. Saía cedo, voltava tarde, e eu sabia que fazia de tudo para evitar me ver. De um jeito cruel e contraditório, eu era grata por isso e, ao mesmo tempo, miseravelmente infeliz. Porque, no fim das contas, manter distância era o certo—o melhor para todos nós. Mas não era o que eu queria, e essa certeza tornava a ausência dele ainda mais dolorosa. Agora, toda a comunicação entre nós se resumia a e-mails. Gabriel também criou um caderno de anotações para que eu pudesse deixar recados mais detalhados. Bastava escrever e deixá-lo sobre a mesa do escritório dele. Quando chegava, ele lia e respondia. Eu só pegava o caderno na manhã seguinte, quando ele já tivesse ido embora. Gabriel era um homem bom e com honra, ele não dizia que estava fazendo isso por causa… do que aconteceu… Em vez disso, justificava com razões práticas: dizia que, com
Alguns dias depois… Já passava das nove da noite, e Gabriel estava lá em cima colocando Sofia para dormir. Ele me mandou um e-mail — nossa única forma de comunicação agora —, um e-mail pedindo que Sofia o esperasse acordada pois conseguiria sair mais cedo do trabalho. Assim que ele entrou no quarto de Sofia, eu saí deixando-os sozinhos. Desci as escadas, caminhando pela mansão, eu tentava afastar os pensamentos que me atormentavam. O que estava acontecendo comigo? Eu sempre fui lógica, racional. Sempre mantive minhas emoções sob controle. Mas agora... agora tudo parecia fora do meu alcance. Eu precisava de um lugar onde pudesse pensar. Meus passos me levaram até a biblioteca. Um cômodo que eu já tinha visitado algumas vezes, mas que nunca havia explorado completamente. Era enorme, cheia de estantes antigas, algumas tão altas que precisavam de escadas para alcançar os livros do topo. O cheiro de papel envelhecido me envolveu assim que entrei, e, por um momento, o ambie
É impressionante a força que surge em nosso corpo quando alguém importante para nós está em perigo. Sim, porque eu me importava com Celina e muito. A ponto de erguer uma estante de livros para soltá-la. Quando finalmente consegui mover a estante, Celina tremia debaixo dela, os olhos arregalados, o corpo rígido. Poeira cobria sua pele, misturada ao suor e aos pequenos cortes que marcavam seus braços. Ela parecia não perceber que estava livre. — Celina! — Chamei, tentando tocar seu rosto, mas ela gritou e se encolheu ainda mais, os braços cobrindo a cabeça. — Eu quero sair, socorro! Minha respiração ficou presa na garganta. — Celina, me escuta. Você está bem. Você está livre. Mas ela continuava com os olhos fechados, os soluços irregulares atravessando sua respiração. — Celina, olhe para mim. Ela demorou a responder, como se minha voz fosse algo distante demais para alcançar. Eu a tomei em meus braços e a abracei o mais forte que p
Celina me encarava mas seus lábios não se moviam então eu repeti a pergunta: — Celina… a cicatriz… tem relação com esse acidente? Ela assentiu mordendo o lábio, e quando respondeu, a voz dela estava carregada de uma tristeza profunda, quase como se ela estivesse revivendo aquele momento. — Sim. Eu agonizei presa ali — disse Celina, com a voz baixa, como se revivesse a dor. Ela fechou os olhos por um instante, como se tentasse afastar as imagens da memória. Quando falou novamente, sua voz estava mais firme, mas o peso da experiência ainda pesava nas palavras. — O impacto foi esmagador. A dor foi imediata, uma dor aguda, que parecia irradiante. Eu não sabia o que tinha acontecido naquele momento, mas algo estava errado. Celina respirou fundo, os olhos marejados, mas não se deixou dominar pela emoção. Seguiu contando, tentando manter o controle, como se quisesse afastar o medo que, mesmo assim, transparecia. — O carro estava amassado de uma forma que parecia impossível de res
Passaram-se alguns dias e, felizmente, Celina estava melhorando. Seus machucados estavam cicatrizando, mas, depois de socorrê-la e me certificar de que ela se recuperara, me mantive firme no propósito de evitá-la. Acreditei que era o melhor para todos. Cheguei em casa tarde da noite, cansado, mas com a determinação de colocar minha estrelinha para dormir. Abri a porta do quarto de Sofia e, ao vê-la acordada, notei que Celina não estava ali. — Papai! Você chegou! Sente-se aqui comigo — ela disse, com os olhos brilhando. Sentei-me ao lado dela e dei-lhe um beijo carinhoso na testa. — Papai, estou tão feliz que você me coloca para dormir todas as noites — ela falou, os olhos reluzindo com a sinceridade que só uma criança pode ter. — Eu também estou muito contente, meu amor. — Olhei ao redor, procurando por Celina. — Onde está Celina? Sofia se encolheu um pouco e olhou para o lado. — Assim que ela ouviu seus passos subindo a escada, ela disse que
Agora que nossa comunicação se resumia quase exclusivamente a e-mails, Gabriel e eu ainda não tínhamos tido a chance de conversar pessoalmente sobre as atividades de Sofia durante as férias escolares. A situação era delicada, e eu sabia que a única forma de fazer Gabriel aceitar a sugestão de Sofia — que queria se dedicar à pintura durante esse período — seria uma conversa cara a cara. Se eu enviasse apenas um e-mail, ele, com certeza, rejeitaria a ideia sem nem considerar. Para convencê-lo, eu precisaria argumentar de forma clara, explicar os benefícios de permitir que ela se envolvesse em algo que, à primeira vista, ele poderia ver como uma perda de tempo ou um capricho. Eu tinha que falar com ele pessoalmente, expor meu ponto de vista de maneira convincente. O problema, no entanto, era o impacto que isso teria em mim. Falar com ele pessoalmente, se eu o visse, se eu o ouvisse, seria uma verdadeira batalha contra minha própria vontade. Sentir sua presença, o cheiro in
Eu deveria afastá-lo. Mas meu corpo se moveu por instinto, se entregando àquele beijo como se minha vida dependesse disso. O calor me consumiu, cada toque dele incendiava minha pele, cada suspiro seu era um convite para que eu me perdesse mais. Ele me envolveu de tal forma que a distância entre nós desapareceu. O toque das suas mãos em minha cintura era como fogo, e eu me entreguei sem pensar, sem resistência. Eu não queria mais lutar. Não queria fingir que isso não estava acontecendo. Gabriel segurou minha nuca com firmeza, aprofundando o beijo, como se quisesse explorar cada centímetro de mim. Sua boca encontrou a minha com urgência, como se estivesse faminto, como se houvesse uma necessidade desesperada de se conectar. Eu senti as batidas do seu coração aceleradas contra o meu peito, e o calor dele me invadiu por completo. Ele dominava, puxava-me para mais perto, sem se importar com nada além de me ter ali, naquele momento, naquele espaço onde éramos só nós dois.
Só eu era importante para ela? Foi isso que Celina disse? Ou eu estava enlouquecendo? Eu estava enlouquecendo, isso era um fato. Como podia cogitar demitir o Valter? Cinco anos comigo, de uma lealdade inimaginável. Não sei o que deu em mim. Eu não faria isso. Até trocar o local de trabalho de Samantha e Valter era irracional. Eu gostava que ela dirigisse para mim. Mas eu não podia deixar Celina perto de Valter. Ele estava interessado nela. Não, não podia. Samantha ia dirigir para Celina e Sofia. E o Valter cuidaria apenas dos meus compromissos. Não podia me conter, não queria nenhum homem perto dela. Eu queria ser o homem perto dela. Mas eu não conseguia decifrá-la. Retribuiu meu beijo, me pediu para ser profissional e depois murmurou que somente eu importava para ela. Era impossível entendê-la. Falava uma coisa, fazia outra. E a sensação de não me contar tudo, ainda me perseguia. Acabei mudando de assunto para esfriar meu ânimo. — Como está Sofia? Alguma novidade?