Depois de passar pelo interrogatório, fui levada até uma cela que nada mais era do que um cubículo apertado, sem janelas, mergulhado em um cheiro úmido e azedo, como se o mofo fosse parte inseparável das paredes de concreto. O chão de cimento era frio e irregular, e o banco duro de metal, fixo na lateral, parecia mais uma tábua de tortura do que um lugar onde alguém pudesse repousar. O ar ali dentro era denso, sufocante, impregnado com o odor acre de suor velho e desespero, como se as emoções dos prisioneiros anteriores tivessem sido absorvidas pela própria estrutura. Cada respiração trazia uma nova onda de desconforto.Meus pulsos latejavam. A dor, que nunca era completamente ausente, pulsava de forma constante, aguda, como se as articulações estivessem sendo apertadas por dentro. Meus remédios estavam na minha bolsa, mas ali, naquele buraco, era como se eu estivesse isolada de qualquer ajuda. Por várias vezes, tentei chamar os policiais, implorar pelos medicamentos que poderiam aliv
~BERNARDO~Eu nunca me senti tão impotente na vida quanto naquela noite. Mesmo quando Ian fora sequestrado, eu ainda tinha algo a fazer, um plano a considerar. Agora, eu só podia observar Alice sendo levada de mim. Segui o carro de polícia com Alice dentro desde o aeroporto, tentando me manter calmo, mesmo quando o desespero crescia a cada quilômetro que percorríamos. Tudo dentro de mim gritava que aquilo era um erro, uma injustiça, e eu faria qualquer coisa para tirá-la daquela situação. Mas, assim que chegamos à delegacia, fui impedido de vê-la. Tentei de todas as formas: falei com os oficiais, implorei, até tentei usar minha influência. A resposta, no entanto, foi sempre a mesma: não.A frustração se acumulava em meu peito, me deixando cego de raiva. Mas não adiantava bater de frente com eles. Cada tentativa mal sucedida só me fazia perceber que eu estaria sendo mais útil de outra maneira. Forçar a barra com os policiais não ajudaria Alice. O que ela precisava naquele momento era d
O tribunal estava frio, não pelo ar-condicionado ou por uma brisa externa, mas pelo peso do ambiente em si. A sala era uma espécie de cápsula de silêncio e tensão. Cada detalhe parecia amplificado: o som de páginas sendo viradas, os sussurros ocasionais dos advogados, o leve estalar de uma cadeira. Eu estava sentada entre meus defensores, mas, ainda assim, me sentia incrivelmente só, desejando que Bernardo pudesse estar ali ao meu lado. O juiz, com o semblante austero e inabalável, ocupava sua posição elevada, observando tudo com um olhar analítico. Era como se estivesse decidindo o meu destino com uma única análise.Minhas mãos estavam suadas e trêmulas. O cansaço acumulado da noite anterior ainda pesava sobre mim, mas o que me mantinha acordada era a pura adrenalina, misturada com o pavor do desconhecido. Meu advogado se levantou, ajeitou seu terno e se dirigiu ao juiz com uma confiança que me trouxe um pequeno conforto momentâneo.— Meritíssimo, estamos aqui hoje para provar que mi
Quando a porta do tribunal se abriu e eu o vi, parado ali, esperando por mim, tudo ao meu redor pareceu desaparecer. Bernardo estava com o rosto marcado pela tensão, mas ao me ver, seus olhos se encheram de alívio e algo mais profundo, algo que eu sempre sentia quando estava em seus braços: segurança.Sem pensar, corri em sua direção, e ele me envolveu como se nunca mais fosse me soltar. Meu corpo tremia, ainda abalado por tudo o que havia acontecido, mas ali, junto a ele, finalmente consegui respirar com menos dificuldade.— Está tudo bem agora, Alice — ele murmurou contra meus cabelos, sua voz suave, mas carregada de um peso que revelava o quanto ele também estava exausto. — Eu te prometo, isso acabou.Abracei-o ainda mais forte, como se temesse que, se o soltasse, a realidade pudesse voltar a desmoronar sobre mim. A sensação de estar em seus braços era um alívio imenso, como se o mundo parasse de girar por alguns instantes. Fechei os olhos e permiti que aquele momento me envolvesse
Depois de uma noite bem dormida, onde nunca apreciei tanto a maciez do colchão embaixo de mim, o dia seguinte chegou com uma missão que não podíamos mais adiar: contar à minha família o que havia acontecido. Não era uma conversa que eu estava ansiosa para ter, mas sabíamos que, mais cedo ou mais tarde, tudo acabaria caindo na mídia, e seria pior se eles descobrissem pelos noticiários. Então, reunimos meus pais, Liz, Cristiano, Pedro e Gabi na sala de estar, onde a atmosfera já parecia pesada, como se eles soubessem que algo sério estava por vir.Eu estava sentada no sofá ao lado de Bernardo, e ao ver a expressão preocupada no rosto da minha mãe, meu coração apertou. Meu pai estava calado, mas sua postura rígida e a maneira como cruzava os braços deixavam claro que ele também estava apreensivo. Pedro estava distraído com o celular, como sempre, mas até ele parecia perceber que algo importante estava para ser dito. Liz, por outro lado, me observava atentamente, com aquele olhar que só u
Quando finalmente voltei ao hospital na manhã seguinte, percebi que as coisas não seriam fáceis. O ambiente parecia mais frio, mais tenso do que de costume. A equipe estava agitada, e, para piorar, meu nome continuava sendo sussurrado em quase todas as rodinhas de conversa pelos corredores. Não esperava menos, claro. Eu sabia que, eventualmente, o que havia acontecido acabaria se espalhando. Ser presa, mesmo que inocentada rapidamente, era mais do que motivo para cochichos e olhares tortos. Mas o que me pegou de surpresa foi a intensidade dos plantões que me aguardavam. Parecia que o Dr. Mendes estava tentando enviar uma mensagem clara de que não haveria favoritismo ali.— Eles acham que você teve privilégios demais, então vou te sobrecarregar para provar o contrário — ele praticamente grunhiu, quando entregou minha escala.Meus turnos estavam lotados, mais pesados do que os dos outros residentes, como se ele estivesse compensando algo. E os outros, bem, eles claramente não acreditava
Cheguei em casa no meio da manhã, depois de uma longa e exaustiva noite no hospital. O cansaço pesava em cada músculo do meu corpo, e tudo o que eu queria era me jogar na cama e esquecer o mundo por algumas horas. No entanto, quando encontrei Bernardo no terraço, algo dentro de mim me disse que precisávamos de um momento juntos, longe de tudo, apenas nós dois. Eu sabia que ele estava tão exausto emocionalmente quanto eu estava fisicamente. Precisávamos de uma pausa.— Vou tomar um banho — disse, dando-lhe um beijo leve no ombro enquanto passava por ele. — E já volto, tá?Bernardo assentiu em silêncio, os olhos fixos no horizonte, mas com uma expressão pesada. Entrei no banheiro e deixei a água quente correr pelos meus ombros, tentando aliviar o cansaço e, talvez, lavar um pouco da angústia que se acumulava nos últimos dias. O teste de DNA, o trabalho, Valentina... Tudo parecia girar em torno de mim, e eu mal conseguia processar uma coisa antes que outra surgisse.Depois do banho, vest
Eu estava exausta. O relógio mal marcava dez da manhã, mas eu sentia como se tivesse vivido três dias em um único plantão. A noite anterior havia sido implacável, e meu corpo, cada vez mais sobrecarregado pela STC, parecia implorar por um descanso que eu sabia que não teria tão cedo. Para piorar, a dor nas mãos estava cada vez mais intensa. O constante latejar nas articulações dificultava até as tarefas mais simples, e a cirurgia que eu havia escapado mais cedo foi apenas um lembrete do quanto aquilo estava me afetando. O olhar do Dr. Mendes antes de me liberar da operação deixava claro que ele tinha percebido, e que teríamos uma conversa nada agradável sobre isso em breve.Eu precisava de café. E rápido.Entrei na sala de café quase tropeçando nas próprias pernas, lutando contra a exaustão que ameaçava me derrubar. Mas o que me esperava ali era ainda pior. Assim que pus os pés na sala, o sussurro maldoso de vozes me envolveu como uma nuvem de veneno. Eu sabia que estavam falando de m