A sala da terapeuta era um refúgio silencioso e discreto, muito diferente da opulência e das tensões que costumavam cercar minha vida. O piso de madeira clara rangia levemente sob meus passos, e o cheiro suave de lavanda vinha de um difusor posicionado em uma prateleira ao lado de livros bem organizados. O espaço era pequeno, mas acolhedor: um sofá cinza com almofadas macias, uma poltrona de couro caramelo para a terapeuta, uma mesinha de centro com uma jarra de água e dois copos. As paredes eram decoradas com quadros abstratos em tons pastéis, transmitindo uma calma que parecia quase ilusória.Sentei-me no sofá, cruzando os braços e os tornozelos, tentando encontrar uma postura confortável, mesmo sabendo que isso era mais um esforço para mascarar meu desconforto interno e físico por causa do gesso na minha perna. Fiquei quieta por um momento, olhando para as almofadas, tentando evitar a sensação de que estava sendo observada.— Você parece pensativa hoje. — A voz da terapeuta, Dra. M
O sol acabava de nascer, lançando tons alaranjados e dourados sobre o jardim imaculadamente cuidado. A brisa da manhã carregava o cheiro fresco de grama recém-cortada. Eu já estava sentado à mesa do pátio, cercado por papéis, anotações e relatórios. Trabalhar aqui, ao ar livre, era uma mudança em relação ao meu habitual escritório frio e impessoal. Talvez fosse o frescor da manhã ou apenas uma desculpa para me manter longe de tudo. Passei a mão pelos cabelos enquanto revisava os documentos do Future Mind Fund. Tudo estava bem alinhado, mas ainda havia algo fora do lugar. Sempre havia algo. Levantei os olhos ao ouvir o som de passos no cascalho. A movimentação ao redor da casa era mais agitada que o normal. Os funcionários iam e vinham com arranjos de flores, toalhas de mesa e caixas de porcelana fina, enquanto minha mãe coordenava tudo com a eficiência de um general. — Damien? — A voz firme dela interrompeu meus pensamentos. Ela apareceu no pátio, impecável como sempre. Usava um
— Olivia — a terapeuta começou, com o tom calmo e firme que ela sempre usava —, lembre-se de que as respostas que você procura não virão de um único momento. Elas são o resultado de uma jornada. Não tenha medo de ouvir o que sua intuição lhe diz. Assenti, um pouco distante. Suas palavras ressoavam, mas a ideia de “ouvir minha intuição” parecia mais assustadora do que reconfortante. O que ela me diria, afinal? Quando a sessão terminou, levantei-me devagar, ajustando as muletas com cuidado. Cada movimento parecia mais pesado hoje. No corredor, Alex estava à minha espera. Ele não disse nada, mas seu olhar preocupado me envolveu, como se quisesse carregar parte do peso que eu sentia. Antes que eu pudesse falar, ele me envolveu em um abraço firme, longo, daqueles que dizem muito sem palavras. — Vamos? — ele murmurou contra meu cabelo. Assenti, permitindo-me relaxar por um breve momento. Juntos, saímos do consultório e seguimos para o clube de hipismo. No carro, o silêncio nos acompanh
A noite já havia caído quando terminei de ajeitar a gravata, observando meu reflexo no espelho com uma leve sensação de desconforto. Desci as escadas, e o som de vozes preenchia o salão. Quando entrei na sala, a primeira coisa que percebi foi que todos já estavam ali: Orlando Montenegro, sempre com sua postura confiante; meu pai, com aquele carisma irresistível; e, claro, Olivia, que imediatamente capturou minha atenção. Ela estava linda, como sempre, mas algo em sua expressão me chamou a atenção. Havia um cansaço evidente em seus olhos, uma distância que não conseguia ignorar. Seus olhos evitavam os meus, o que só aumentava minha inquietação. — Damien — a voz de minha mãe, me tirou do transe. Ela se aproximou com aquele sorriso elegante, o mesmo sorriso que fazia todos ao redor se sentirem especiais. — Pensei que fosse nos deixar esperando para sempre. — Eu jamais faria isso, mãe — respondi, depositando um beijo suave em sua bochecha, tentando disfarçar a apreensão. Antes de cons
Odeio o Damien Carter e a forma como ele se comporta, como se só ele tivesse voz nesse acordo. Eu mal consegui engolir a comida enquanto o jantar prosseguia. O ambiente estava carregado, mas a minha irritação não vinha do comportamento dos outros à mesa — era o que Damien acabara de fazer. Anunciar o nosso namoro falso sem me consultar, sem sequer discutirmos quando seria o momento adequado… Aquilo foi tão… impensado. Ele não me deu tempo de preparar o terreno. Eu mal sabia como reagir a isso. Tentava me concentrar na conversa, mas as palavras pareciam descer pela minha garganta sem fazer sentido. Era como se eu estivesse ali, mas ao mesmo tempo, tão distante. Cada vez que olhava para o lado, via os olhares inquisidores de Alex e o sorriso disfarçado de aprovação de meu pai, como se tudo fosse um grande teatro. Eu não sabia como me comportar, mas uma coisa era certa: meu estômago estava embrulhado. Não sabia mais o que esperar. Eu queria que ele tivesse se consultado comigo, planeja
Eu a segurei com mais força, o corpo dela tremendo contra o meu enquanto a água fria nos envolvia. Seus braços estavam apertados ao redor do meu pescoço, como se eu fosse sua única âncora no caos. Por um momento, senti como se o tempo tivesse parado. Tudo ao redor — o som das folhas ao vento, o murmúrio distante da festa — desapareceu. Era só ela. Só nós dois. Seu rosto estava tão próximo que eu conseguia sentir a leveza da sua respiração. Olívia estava ofegante, os olhos grandes fixos nos meus, carregados de confusão e algo mais, algo que eu não conseguia identificar completamente. A fragilidade dela me atingiu como um soco. E, ao mesmo tempo, havia algo naquela proximidade que me fazia querer quebrar todas as regras, cruzar todas as linhas. Eu deveria estar focado no que acabara de acontecer, em como ela quase se afogou, em como eu havia corrido para salvá-la sem pensar duas vezes. Mas não conseguia. Tudo o que minha mente conseguia processar era o calor do corpo dela contra o meu
O beijo aconteceu antes que eu pudesse reagir. Foi rápido, mas intenso, e deixou meus pensamentos completamente embaralhados. Por um instante, senti o calor dos lábios de Damien contra os meus, e algo dentro de mim congelou, mas ao mesmo tempo derreteu. O gosto da água clorada, o cheiro dele misturado com o perfume leve ainda impregnado... Tudo isso me atingiu como um vendaval.Eu sabia que deveria me afastar, mas meu corpo não respondeu de imediato. O toque da mão dele no meu queixo, firme, mas ao mesmo tempo gentil, me manteve no lugar por alguns segundos a mais do que eu gostaria de admitir. Meu coração parecia uma bateria descontrolada, batendo forte o suficiente para ecoar nos meus ouvidos.Por que ele fez isso? E por que, por um instante, eu quis que ele continuasse? Não era para ser assim. Não com ele.De repente, a realidade me atingiu como um balde de água fria. Eu não podia fazer isso. Não com Damien. Com um impulso, levei minha mão ao peito dele e o afastei. Ele recuou imed
O beijo. Não foi planejado, não foi racional e foi completamente errado. Não sei o que passou pela minha cabeça. Talvez tenha sido o momento. Talvez a fragilidade dela, o jeito como seus olhos me encaravam, pedindo algo que nem eu sabia se podia oferecer. Mas nada disso justifica. Eu sabia que estava errado, e mesmo assim fiz. Enquanto descia as escadas, meus passos eram pesados. Não posso agir como se os meus impulsos fossem mais importantes que a lógica. Minha mente voltava ao instante exato em que meus lábios tocaram os dela. Foi breve, mas o suficiente para virar meu mundo de cabeça para baixo. Eu não tinha planejado. Não era parte do acordo. Não deveria ter acontecido. Entrei na cozinha, abrindo gavetas à procura de algo útil. Os sons dos talheres batendo ecoavam no ambiente silencioso. Encontrei uma tesoura velha, o cabo gasto pelo tempo. Passei os dedos sobre as lâminas enferrujadas, tentando ignorar a sensação de peso no meu peito. Fechei a gaveta com força, como se isso pu