Aquela cama voou como se fosse de brinquedo, porque embora parecesse terno e doce, Milo Keller era tão gigante quanto seus irmãos. Apressou-se para chegar ao lado do menino, sentindo o coração disparado dentro do peito e o levantou nos braços para poder examiná-lo.—Dooooutor! Joooohn!O menino estava sufocando, seus pequenos braços e pernas tentando caíam inertes ao seu lado enquanto tentava inutilmente tomar ar. Um segundo depois o doutor Martínez corria em sua direção e se ajoelhava para examinar o pequeno.—Speedy, a maleta médica, corre! —ordenou e só se ouviram os passos correndo escada abaixo.—Ele não consegue respirar! —disse Milo, com a voz deformada pela angústia—. Não consegue respirar...Mas antes que tentasse algo desesperado como uma respiração boca a boca, o médico o deteve com um gesto severo.—Se acalme, desespero nestes casos não ajuda —disse enquanto avaliava cada reação do menino—. Vem, me ajuda a sentá-lo.Poucos segundos depois Speedy colocou a maleta médica ao s
—Procurem na casa —pediu Milo aproximando-se do alto-falante do celular—. Qualquer coisa que tenha a ver com ele, qualquer coisa servirá.Billy respondeu que começaria a trabalhar imediatamente e enquanto isso eles esperaram impacientes até que o médico voltou a sair, uma hora depois.—Já está estável —disse-lhes e do peito de Milo escapou um suspiro de alívio—. Ele é alérgico, grave, e parece que sua asma pode aparecer só com alguns poucos grãos de poeira. Vai precisar de muito cuidado daqui para frente. Querem entrar para vê-lo?Milo assentiu e o médico os guiou até um quarto particular onde o pequeno estava deitado e dormindo.Enquanto Milo se aproximava da cama, já com mais tranquilidade, pôde notar que era um pequeno com cabelo cor de mel e um narizinho arrebitado. Suas bochechas estavam rosadas pelo calor do ambiente e seus lábios finos estavam ligeiramente entreabertos sob a máscara de oxigênio. Mesmo dormindo parecia cansado e triste, como se tivesse passado por muita coisa.—F
Vinte e quatro horas haviam se passado desde que tinham chegado ao hospital. A equipe já tinha cuidado de tudo, e Speedy havia tomado um avião particular de volta à Suíça para entregar o bebê que tinham ido resgatar à sua mãe. O resto dos rapazes continuava com ele em Praga, esperando do lado de fora daquele hospital, já devidamente vestidos como civis para não chamar atenção.Milo não tinha saído daquele quarto mais que para trocar de roupa; primeiro porque não queria deixar o bebê sozinho, e segundo porque o bebê não queria que ele fosse embora. Ninguém podia explicar, talvez fosse apenas o fato de que tinha sido o homem que o tinha tirado de debaixo daquela cama quando estava sufocando, o certo era que havia um vínculo especial entre a criança e ele.Então quando Jhon entrou para trazer as boas notícias, encontrou-os numa posição que já era quase habitual: Milo meio encolhido na cadeira de balanço tamanho único que não era obviamente para homens do seu tamanho, e o menino todo espar
DOIS MESES DEPOIS—Anja! —o grito do capitão do restaurante retumbou em seu cérebro como uma corneta.Abbot tinha o tom mais estridente e desagradável do planeta Terra e o pior era que gostava de usá-lo, principalmente com ela.Anja limpou os olhos vermelhos pelas lágrimas e saiu do refrigerador da cozinha. Aquele homem gostava de repreendê-la na frente de todos, fossem funcionários ou clientes, chamando-a de inútil e gritando que ela não gostava de trabalhar.Isso era verdade em parte. Não era uma inútil, mas não queria trabalhar, só queria se enrolar em sua cama e morrer de fome e de tristeza, tranquilamente, como qualquer pessoa em luto. Mas infelizmente ainda existia um mínimo de sobrevivência nela, para sobreviver devia comer e, bem... para comer tinha que trabalhar.Vocês dirão: E por que não procurava outro trabalho? Pois porque depois de três anos na prisão quase ninguém estava disposto a lhe dar trabalho. As pessoas fugiam dela como da peste e os que não, se achavam no direito
—Então um corte vermelho... —anotava Anja em seu bloco—. Ao ponto... bem ao ponto... ok, entendo, bem mal passado... sim senhor... sim... —caminhou até a cozinha para deixar o pedido e Sonia a encontrou na volta.—Aquele cara disse que é para você atendê-lo —resmungou e Anja olhou em sua direção."Aquele cara", pensou. Algo sério ele devia ter feito para Sonia para já não ser mais "o gato" e sim "aquele cara".—Boa noite. Me disseram que solicitou uma troca de garçonete. O que vai querer?O homem a olhou, mas ela tinha os olhos fixos no bloco.—Pode me recomendar algo? —perguntou ele com voz suave e ela o olhou nos olhos.—Que vá a um restaurante melhor, estou brava com o capitão do salão e acho que babei em todas as carnes —respondeu Anja e ele caiu na risada, um sorriso limpo e luminoso que fez a moça estremecer.—Então que tal uma sobremesa? Nessas você babou também?—Não, nessas não —murmurou ela.—Bem, seria tão gentil de me trazer a menos ruim? —pediu e ela anotou algo no bloco.
Anja sentiu uma fisgada de dor no peito. Não amava seu trabalho no restaurante mas sabia que dependia dele.—Está demitida. Saia daqui!—Bem, então me pague o que me deve e eu saio! —replicou com um nó na garganta.—O quê? Te pagar? Sabe quanto custa cada um desses cortes de carne, e você arruinou quatro? —sibilou Abbot com desprezo.—Arruinei um, o resto foi problema do cozinheiro e do idiota que não quis comer nenhum! —exclamou Anja enquanto seus olhos se umedeciam. Ganhava o salário mínimo no restaurante e as gorjetas não eram generosas naquele lugar. Se não lhe pagassem ao menos o básico não teria como pagar o quartinho miserável onde morava—. Você me deve a última quinzena e a rescisão de seis meses! Não sou uma idiota, conheço meus direitos!—Você não tem direito a nada! —gritou Abbot—. Você só está aqui porque eu permiti e a menos que queira voltar para a cadeia vai sair agora mesmo! Suma e não volte ou farei com que esse cliente te acuse de agressão! Vai parar na cadeia de novo
Anja pensou cem vezes antes de sair pela porta. Tinha receios do que aquele homem poderia querer? Muitos, mas o assunto era simples: com muita dificuldade tinha conseguido no restaurante, o programa de "reinserção à sociedade" das prisões austríacas era um lixo, e ninguém queria lhe dar trabalho. Antes de ir para a cadeia era administradora em uma escola primária, mas com seus antecedentes já nem podia sonhar com isso.Seu instinto de sobrevivência sempre tinha pesado mais, então eventualmente saiu de seu quarto e desceu as escadas para encontrar uma van preta quase de luxo estacionada em frente ao seu prédio. Milo estava apoiado nela e Anja deu meia volta.—Ei, espera! Aonde você vai? —gritou ele.—A qualquer lugar longe da sua banheira com gelo. Não sou doadora de órgãos, nem voluntária nem involuntária —resmungou ela e Milo deixou escapar uma gargalhada que a fez parar—. O quê?Ele colocou as mãos nos bolsos com um sorriso suave.—Disse a um amigo que precisava me assegurar de que v
Milo sentia que algo se revolvia dentro dele ao vê-la chorar, porque era demasiado evidente o desespero e a sinceridade naquelas lágrimas.—Escuta, não tenho todas as respostas em minhas mãos, mas todos dizem que o DNA não mente, certo? —murmurou levantando seu queixo e olhando em seus olhos. Você não vai saber o que está acontecendo na realidade até que estejamos lá e você repita os exames. Então: quer ir à Suíça comigo? Está disposta a fazer isso, Anja?A moça voltou seu olhar para o céu onde as nuvens abriam caminho entre o sol e um pouco de vento. E apesar do medo que sentia, afirmou com a cabeça.—Sim —disse por fim—. Preciso saber... Podemos ir já?Milo assentiu suavemente.—Claro. Tenho um voo particular esperando por nós.Anja se pôs de pé e juntos caminharam de volta ao estacionamento. Estavam prestes a chegar quando um carro passou ao seu lado em alta velocidade, levantando uma nuvem de poeira que fez Milo xingar e a moça recuar.Anja cobriu a boca e começou a tossir violenta