Eu lancei um olhar impaciente para os dois e falei sem rodeios:— Os lugares do jantar foram organizados por faculdade. Emilia, você não sabe ler?Emilia, com aquele tom irônico de sempre, virou a cabeça e respondeu:— O Davi me encontrou e perguntou onde você estava. Só fiz um favor em trazê-lo até aqui. Por que tá gritando comigo?Davi me encarou e disse, num tom baixo:— Só quis dar uma passada para te ver e cumprimentar os colegas. Afinal, fomos tão próximos naquela época.A fala dele tinha uma intenção clara. Todos sabiam do nosso romance nos tempos de faculdade. E, depois, quando ele ficou doente e eu fiquei ao lado dele sem hesitar, nossa história virou quase uma lenda no campus. Era óbvio que nossos colegas de turma lembravam muito bem disso.Antes que eu pudesse responder, Emilia se intrometeu novamente:— Vocês não eram praticamente um casal? Por que agora parecem dois estranhos? Kiara, você era tão apaixonada pelo Davi que, na época, parecia que dava a própria vida por ele.
Eu olhei para o rosto dele, ouvi a sua voz, e era como se eu fosse uma marionete sendo manipulada, obedecendo incondicionalmente. Levantei-me e segui com ele.De relance, ouvi as reações surpresas às minhas costas:— Não é aquele ex-aluno ilustre que acabou de discursar? O que doou quinze bilhões?— Meu Deus! Ele conhece a Kiara? Qual é a relação deles?— Ai, meu Deus, de perto ele é ainda mais bonito! Alto, charmoso... É o homem mais lindo que já vi na vida real!Eles continuaram falando alguma coisa, mas à medida que me afastava, as vozes iam sumindo. Minha atenção estava completamente voltada para Jean.Ele me guiou em direção à área próxima ao palco e, enquanto caminhávamos, explicou:— Estou sentado com os dirigentes da universidade. Eles estavam comentando que o curso de Design de Moda vai comemorar 30 anos no ano que vem. Estão planejando o primeiro festival "Ciência, Arte e Moda", com várias atividades culturais e acadêmicas. Aí pensei em você, mencionei seu nome e eles pediram
Jean não tinha bebido muito, ainda estava bem lúcido, mas seu rosto estava levemente avermelhado, e seus olhos brilhavam de um jeito diferente do habitual. — Você ainda vai conversar com seus colegas? — Perguntou Jean ao virar-se para mim, enquanto as pessoas ao redor começavam a se dispersar. Alguns já haviam ido embora, outros estavam por aí revendo velhos amigos. Eu olhei para ele, sentindo meu coração disparar, batendo forte e descompassado:— Minhas coisas ainda estão no mesmo lugar, preciso voltar para lá.— Certo, vai lá. Eu ainda tenho algumas coisas para resolver, mas mais tarde te aviso quando for embora.Reforcei a minha posição:— Se você estiver ocupado, não tem problema. Posso voltar sozinha, não precisa se preocupar em me acompanhar.— Não estou ocupado, só jogando conversa fora com antigos colegas. — Respondeu ele, enquanto seus olhos profundos e úmidos fixavam-se nos meus. Com um leve sorriso no canto dos lábios, completou. — Por que, está com medo que eu perca o con
Eu e Nina saímos do salão da festa, e o vento gelado nos atingiu de frente, fazendo nós duas estremecer de frio. Aquela neve que tinha caído dias atrás veio e foi embora rapidamente, e o sol até voltou a aparecer, mas de manhã e à noite o frio ainda era intenso. Nina, com pouca roupa, começou a tremer de frio e virou-se para perguntar:— Como você vai voltar?— Eu... — Comecei a responder, mas, de repente, alguém surgiu ao lado do ginásio e chamou:— Kiara.Nós duas olhamos na direção da voz ao mesmo tempo. Era Davi. Ele de novo! Parecia um fantasma que não nos deixava em paz.Davi se aproximou, e o cheiro de álcool logo ficou evidente. Só de vê-lo com bebida eu já sentia uma repulsa imediata. Mesmo que ele não tivesse mais nada a ver comigo, lembrar de tudo o que eu tinha sacrificado por ele me dava uma raiva difícil de conter.— Meu carro está no portão da escola. Posso levar vocês para casa. — Explicou ele, antes de se virar para Nina e perguntar: — Nina, você está hospedada em qu
Depois de soltar aquelas palavras, eu entrei no carro.Nina veio logo atrás e também subiu. Jean, para nos deixar mais à vontade, deu a volta e entrou pela porta do outro lado, ficando um pouco mais distante de Davi.Mesmo assim, Jean inclinou-se levemente em direção à janela e, com a mesma calma que era sua marca, disse:— Senhor Davi, seja razoável. Facilitar a vida dos outros é facilitar a sua própria. Não cometa um erro no calor do momento.Aquela frase me pegou de surpresa.Era claro que aquilo foi uma indireta para Davi. Na verdade, parecia mais uma ameaça! Mas Jean disse aquilo com tanta tranquilidade e cortesia que era impossível acusá-lo de qualquer coisa.Nina arregalou os olhos, olhando para mim com uma mistura de surpresa e satisfação.Eu, por outro lado, permaneci calada. Não sabia bem como reagir, então preferi fingir que não tinha ouvido nada.O carro era espaçoso, e nós três estávamos bem confortáveis. Felizmente, Nina não era como a irmã de Jean, que fazia questão de s
Jean passou boa parte do caminho com os olhos fechados, parecendo descansar. Quando o carro parou, ele abriu os olhos lentamente e ajustou a postura, sentando-se um pouco mais ereto.Nina inclinou o corpo para frente, olhando para ele, e disse com educação:— Obrigada, Jean. Se um dia tivermos a oportunidade de nos encontrar de novo, faço questão de te pagar um jantar.Pensei comigo mesma que essa oportunidade provavelmente não existiria. Nina trabalhava em outra cidade e raramente voltava a Saurimo, então as chances de um reencontro eram mínimas.Mas, contrariando minhas expectativas, Jean sorriu com elegância e respondeu:— Com certeza teremos essa oportunidade.Nina captou imediatamente o tom implícito na resposta dele e, com um olhar cheio de malícia, levantou as sobrancelhas para mim. Depois, abriu a porta e desceu do carro.— Até mais, então! — Despediu-se ela.— Tchau! — Acenei para ela enquanto descia. Assim que Nina saiu, meu corpo, quase sem perceber, deslizou um pouco para o
Meu amor por ele, naquele silêncio profundo da noite, era como um carro em alta velocidade, descontrolado e prestes a colidir.Jamais imaginei que, depois de uma desilusão tão pesada e dolorosa, eu pudesse entregar meu coração a outro homem tão rapidamente. Mesmo que fosse como uma mariposa se jogando ao fogo, eu aceitava o risco de bom grado.Mas, ao mesmo tempo, havia algo profundamente triste nisso. Ele era tão brilhante, tão perfeito, tão inalcançável. Era impossível não amá-lo, mas a intensidade desse amor me deixava hesitante, com medo de encarar tudo de frente.Eu o encarava, perdida em meus próprios pensamentos, sem saber quanto tempo havia passado, até que uma voz baixa e calma quebrou o silêncio no carro:— Seu coração está batendo muito rápido.Meu corpo inteiro estremeceu, e voltei à realidade de forma abrupta. Meus olhos, desfocados, encontraram os dele, que já estavam abertos.— Você acordou? — Perguntei, sentindo meu coração disparar ainda mais enquanto ajustava meu ombr
Eu, completamente envergonhada e nervosa, interrompi Jean apressadamente:— Eu vou resolver tudo. Confie em mim.Ele assentiu com a cabeça, e as feições perfeitas e marcantes dele pareceram se iluminar com certa emoção:— Tudo bem, eu confio em você. E… espero por você.— Hum.— Está frio lá fora. Suba logo. Qualquer coisa, me ligue.— Certo. — Concordei com um aceno enquanto recuava alguns passos. Também o alertei. — Volte para casa e descanse cedo. Não se esforce demais. Sua saúde é o que sustenta seu trabalho.— Vou fazer o que você disse.— Tchau.— Até logo.Caminhei em direção ao prédio, me virando para trás a cada poucos passos, meus olhos buscando Jean. Mesmo depois de entrar no portão e no elevador, ele continuava parado ali, me observando.Quando finalmente cheguei ao meu apartamento, fui até a varanda e olhei para baixo. O carro dele ainda estava lá, estacionado. Por causa do ângulo, não consegui enxergá-lo, mas eu sabia que ele ainda estava ali.Apoiando-me no parapeito da