Matthis deixou Ingrid sozinha e desapareceu sem dizer para onde iria. A jovem, no primeiro momento, caminhou de um lado a outro sem saber para onde ir ou o que fazer, então decidiu que não ficaria entediada sem fazer nada, dessa forma começou a tentar jogar nos caca-níqueis, mas não conseguia já que nunca havia jogado na vida.
Riu de si mesma e fez menção de deixar a máquina, porém se surpreendeu com a aproximação repentina de um homem desconhecido.
ㅡ Precisa de ajuda? Sou um exímio jogador e posso ajudá-la. ㅡ se ofereceu enquanto subia as mangas de sua blusa social. ㅡ Eu estava te observando há algum tempo e percebi que esse não é muito seu forte.
A mineira riu novamente.
ㅡ Não mesmo. A verdade é que eu nunca estive em um cassino antes então... ㅡ simplesmente deu de ombros.
ㅡ Para tudo há uma primeira vez. A propósito sou Alessandro. ㅡ se apresentou ao esticar a mão em um cumprimento.
ㅡ Ingrid.
☆
A mulher em seus aparentes vinte anos berrava em desespero e dor ao sentir as terríveis contrações lhe atingirem.
Encontrava-se na companhia da parteira do clube-cassino e do pai do bebê que estava por vir, um dos clientes mais assíduos do local, naquele humilde quarto que ficava nos fundos do clube.
O suor lhe escorria pela face e sua feição novamente era de dor quando mais uma contração lhe atingiu. Agora estavam vindo em menor tempo e ela mal se recuperava de uma quando outra já se manifestava.
Recordou-se brevemente de quando chegou a Porto Alegre vinda da Bahia em busca de subir na vida de forma rápida. Seus sonhos, porém, foram duramente frustrados. Não conseguiu um emprego ou um lugar decente para morar e sua saída foi começar a vender seu corpo para conseguir se manter.
Passou a trabalhar na Ginza, contudo tentou fugir de lá após descobrir a gravidez, tendo em vista que o único destino dado aos bebês das garotas da boate era a morte ou eram levados para algum orfanato onde cresciam, mas de onde não podiam ser adotados, pois o destino deles, se meninos era servir a máfia e se meninas a prostituição. Todavia não obteve êxito ao tentar fugir, foi pega por um dos empregados do clube-cassino.
Priscila, a jovem, abandonou as lembranças ao sentir como se algo estivesse saindo de dentro de si. Percebeu então a cabeça do bebê surgindo e durante mais uma contração juntou toda a força que lhe restava empurrando e visualizando o resto do frágil corpo surgir. Uma menina.
A parteira de forma ágil cortou o cordão que a ligava ao bebê, enquanto esta ouvia o estridente choro soar pelo cômodo. A parteira limpou como pôde o sangue do corpo da criança e a enrolou em um cobertor quente, a aconchegando em seus braços. Logo a jovem mãe ofereceu à criança o seio para que pudesse se alimentar.
A bebê sugou forte, o que fez a orgulhosa mãe sorrir em resposta.
ㅡ Parece que alguém aqui está com fome ㅡ sorriu ainda mais ao ver os grandes e brilhantes olhos castanhos da bebê, enquanto passava a mão delicadamente pelos ralos cabelos negros como o ébano. Ela era sua cópia.
ㅡ Ande logo com isso ㅡ a voz irritadiça do pai da criança, um conhecido promotor da cidade, soou no ambiente a tirando de seu momento com sua filha ㅡ Quero deixar este lugar imediatamente.ㅡ disse impaciente enquanto tragava seu charuto e caminhava pelo cômodo apertado.
A mais nova mãe suspirou pesadamente enquanto se recordava do que ele lhe dissera dias antes. Tiraria sua filha de si.
Não havia dúvidas de que Humberto Vila Real era o pai de sua filha, nem ele mesmo duvidava disso, tendo em vista que ela era exclusiva, somente dele. Nunca se deitou com outro homem.
ㅡ Por favor, Humberto, eu lhe imploro, me deixa ficar com ela...ㅡ suplicou em uma última prece.
O homem em seus trinta e oito anos a olhou com desprezo e após jogar o charuto no chão e pisar no mesmo com sua pesada bota, vociferou:
ㅡ O que eu te disse, Priscila? Hun? ㅡ a encarou de forma feroz ㅡ vou levá-la comigo. Não quero minha filha crescendo no meio desse ninho de ratos, vagabundos e toxicodependentes.
Encarou com nojo o humilde quarto o qual ela dividia com outras duas garotas, percebendo que sua filha não poderia ficar ali, de forma alguma. Mesmo que fosse uma bastarda ainda era sangue do seu sangue.
Priscila chorava ao perceber que seria afastada de sua filha.
ㅡ Sinto muito, querida, mas não posso ficar com você ㅡ disse, como se de alguma forma a garotinha pudesse lhe entender ㅡ Você merece algo melhor.
ㅡ Então pretende mesmo desaparecer com o bebê daqui, não é Humberto? Não quero devolução ㅡ Matthis disse sério após adentrar o cômodo, falando como se a criança fosse uma mercadoria.
ㅡ Tenho certeza do que quero, vou levá-la comigo. De modo algum posso permitir que minha filha, sangue do meu sangue, se perca como a mãe ㅡ encarou Priscila de soslaio com desprezo no olhar ㅡ porque sei que é isso que fariam com ela futuramente, a trariam para cá.
ㅡ Então vá logo e que ninguém saiba do que aconteceu aqui ou então faço você e esse monstrinho desaparecerem e ninguém nunca irá saber que fui eu.
Mais tarde, naquele mesmo dia, Priscila viu sua filha ser levada para longe de seus braços, não podendo fazer nada para impedir.
☆
Matthis voltou ao salão de jogos após resolver o problema e visualizou uma cena que o irritou instantaneamente, Ingrid aos risos com outro homem. Olhando melhor percebeu que ela não vestia o casaco, o que o enfureceu ainda mais.
Sem esperar nem mais um segundo, caminhou na direção deles e a pegou pelo braço com o objetivo de tirá-la dali.
ㅡ Ai... ㅡ resmungou pela dor do aperto. ㅡ Matthis? O que é isso? Está me machucando. ㅡ disse enquanto ele a puxava pelo salão.
ㅡ Calada! ㅡ ele rosnou ao seu ouvido.
O homem que fazia companhia para ela nos caca-níqueis tentou ajudá-la, entretanto Matthis fez sinal para um de seus seguranças dar um jeito nele.
ㅡ Matthis...
ㅡ Eu já disse para ficar quieta.
Quando menos percebeu ele adentrou um quarto e a jogou na cama.
ㅡ O que é isso? Você ficou louco? ㅡ A jovem demonstrou confusão e irritação em sua face.
ㅡ Louca ficou você. Eu a trago para jantar em um lugar de alto luxo, te deixo uns minutos sozinha e você já flerta com outro? Você é como todas as outras mesmo.
Ingrid suspirou profundamente tentando buscar uma calma que não possuía no momento.
ㅡ O que você está falando? Primeiro: eu não estava flertando com ninguém, ele só veio me ensinar a como jogar na máquina, segundo: é, você me trouxe aqui, mas me deixou um longo tempo sozinha e terceiro: não estou entendendo seu comportamento, não temos nada para você agir assim.
Ele a encarou com os olhos flamejantes de raiva e disse por fim:
ㅡ Eu não posso mesmo confiar em você novamente.
Ingrid iria falar algo, porém uma batida na porta a interrompeu.
Matthis caminhou a passos pesados e a abriu em um rompante.
ㅡ O que quer? ㅡ gritou com quem quer que estivesse do outro lado.
ㅡ Senhor, o casaco de sua acompanhante caiu no salão. ㅡ A voz de uma mulher soou e Matthis pegou a peça com brusquidão, logo batendo a porta "na cara" da moça e jogando o casaco sobre Ingrid em seguida.
ㅡ Veste essa droga logo. Quero ir embora.ㅡ disse rude.
ㅡ O que houve com você?
ㅡ Só faça o que eu digo.
ㅡ Quer saber de uma coisa? ㅡ se levantou da cama e pegou sua bolsa ㅡ Eu vou embora sozinha, posso muito bem pegar um táxi até minha casa. De agora em diante nossa relação será apenas de professor e aluna, não vamos misturar as coisas.
Ela disse séria e se encaminhou até a porta, porém ele colocou as duas mãos sobre a cintura dela e colou seu corpo sobre o seu.
ㅡ Olha... me desculpe, eu me excedi. ㅡ a virou ficando de frente com ela ㅡ Me desculpe de verdade, você é uma mulher incrível e eu não quis te machucar.
ㅡ Mas machucou. ㅡ retrucou olhando instintivamente para o braço onde havia leves marcas dos dedos dele.
ㅡ Me perdoe, isso não vai acontecer novamente, acredite em mim. Estamos criando uma boa relação e não quero que isso acabe.
Ingrid suspirou e o encarou.
ㅡ Tudo bem.
Matthis sorriu e deixou um beijo na bochecha dela.
ㅡ Vamos para casa. ㅡ segurou sua mão e a encaminhou até a porta ㅡ Ah espera, não esquece de vestir o casaco.
Ingrid assentiu e logo deixaram o local após todo aquele transtorno.
☆
Matthis estacionou o carro em frente ao prédio onde Ingrid vivia e a encarou.
ㅡ Gostou da nossa noite? ㅡ indagou e ela deu de ombros.
ㅡ Apesar de todo o transtorno no final, eu gostei do lugar, do jantar e todo o resto. Mas como eu disse não acho certo que continuemos com esses encontros, até porque somos professor e aluna. ㅡ disse e ele a encarou revirando os olhos.
ㅡ Somos adultos, independentes e livres.
ㅡ Vamos com calma e dar tempo ao tempo. Agora preciso ir, estou cansada e só quero minha cama.
ㅡ Tudo bem.
ㅡ Boa noite, Matthis.
ㅡ Boa noite, Ingrid.
Enquanto a observava adentrar o prédio, Matthis bateu no volante com força. Se exaltou naquele dia e isso não poderia voltar a acontecer, não até ter certeza de que ela já estava sob seu poder.
Com sorte Ingrid é ingênua o suficiente para aceitar seu pedido de desculpas, que claramente não era verdadeiro, ele não estava arrependido de verdade.
O norueguês tem estudado sua orientanda com cautela e precisão, sabendo exatamente as coisas que ela gosta ou odeia, tudo com o único e claro propósito de ludibriá-la para enfim tê-la em suas mãos e quando isso acontecesse Matthis a moldaria exatamente ao seu bel-prazer.
No fim Matthis queria que Ingrid ficasse tão dependente dele a ponto de, depois que ele executasse todo seu plano, ela nunca mais quisesse ir embora.
Matthis percebeu que Ingrid estava estranha na reunião daquele dia.Percebeu isso pois enquanto ele explicava pontos importantes sobre como ela deveria defender sua dissertação, ela parecia distante, poucas vezes comentava algo, o que o estava irritando.— Está tudo bem, Ingrid? — Indagou ao se aproximar cautelosamente dela.Novamente ela estava distante.— Desculpe, senhor Andreassen, não ouvi o que você disse.— É claro que não, está avoada, não está prestando atenção em nada do que estou falando hoje e isso não é bom. Estou lhe dando dicas de como fazer uma defesa memor&a
— Posso ligar o sistema de som do carro? — Ingrid pergunta a Matthis. Já estavam há trinta minutos naquele veículo e o silêncio cortante já estava lhe incomodando. Nenhum dos dois falava nada.Sem tirar os olhos da estrada o norueguês responde de forma direta e curta:— Não! — A garota inicialmente franze o cenho, tentando entender o porquê daquela reação dele, entretanto prefere não dizer nada, o que dá abertura para ele continuar: — Não gosto de nada que me desconcentre enquanto estou dirigindo e música com toda certeza é uma dessas coisas.Ingrid dá de ombros e olha através da janela, proferindo:— Tudo bem!A chuva estava mais forte agora e também fazia um pouco de frio, o que faz a jovem se inclinar e pegar sua mochila no banco de trás do carro, tirando um casaco mais quente de lá. Ao perceber seus movimentos Matthis liga o aquecedor e logo voltam cada um para sua bolha de silêncio.Matthis tinha todo o percurso esquematizado em sua cabeça. Deixaram Porto Alegre às 20:30 da noit
Ingrid despeja café em sua garrafa térmica e encara o relógio de parede localizado na cozinha do apartamento. Duas e meia da manhã. Suspira pesadamente já exausta, entretanto ainda tinha algumas coisas para fazer e não podia ir para a cama ainda. Haviam se passado alguns dias desde a mini viagem que ela fez com Matthis até a vinícola dele e eles se aproximaram muito após isso, entretanto, apesar da tensão sexual e atração ser muito forte da parte de ambos, ainda se mantinham afastados a pedido de Ingrid por causa da ética. Sim, os dois são adultos, solteiros e bem resolvidos, contudo um caso entre professor e aluna sempre será visto com maus olhos e poderia lhes trazer problemas dentro do ambiente universitário caso chegasse ao conhecimento de alguém, mas esse afastamento é apenas até ela terminar o mestrado. Matthis lhe garantiu que quando isso acontecer ele não irá perder mais tempo e a terá para si. Ingrid não entendeu o peso das suas palavras naquele momento, apenas concordou que
— Eu estou muito nervosa. — a voz de Ingrid soa em tom ansioso depois que ela ingere mais um pouco de água da sua garrafinha. O grande dia havia chegado, o dia que defenderia sua dissertação de mestrado.— Não fique, minha filha, você se dedicou tanto para isso, tenho certeza que se sairá muito bem. — sua mãe diz com a mais pura certeza do mundo. A filha havia lhe contado sobre as noites em que passava em claro escrevendo e estudando para a dissertação, ela não tinha dúvidas que ela conseguiria passar com louvor.— Concordo com sua mãe, minha filha. Você está mais do que pronta. — José, seu pai completa.Os pais dela haviam chegado de Minas dias antes a pedido da filha. Para ela era imprescindível a presença deles ali e assim como sempre fizeram ali estavam para apoiá-la.— Obrigada, mãe, obrigada, pai por todo o apoio, eu amo muito vocês.— E nós amamos você, bonequinha. — seu pai a chama pelo apelido de infância apertando a ponta do seu nariz e logo ela lhes indica o auditório onde
— Ainda não consigo acreditar que você vai para outro país, você tem noção do quão bom isso será para sua carreira, Ingrid? — a voz de Manuela soa de forma ansiosa enquanto observa aquela que por dois anos foi sua colega de apartamento arrumar suas coisas.ㅡ Eu sei, mal posso acreditar que eu realmente passei para um doutorado na Noruega. ㅡ Ingrid responde animada, ao passo que termina de dobrar suas roupas e colocar nas malas.Na primeira fase que constituiu na prova de admissão que era de cárater eliminatório, Ingrid foi uma das alunas que obteve uma das melhores notas, o que a fez passar para a segunda fase que foi de seleção por meio de análise de informações acadêmicas e de documentos. Por ter sempre se envolvido nos programas extracurriculares da faculdade durante a graduação, Ingrid possuía um currículo acadêmico impecável para alguém na sua idade e foi uma dentre as três pessoas selecionadas para a vaga no doutorado pleno na Universidade de Bergen, tendo ganhado o primeiro lug
Ingrid terminava de ler avidamente mais uma página de um dos muitos livros que Matthis lhe dera, o alquimista de Paulo Coelho. Ele possuía milhares e milhares de livros na enorme biblioteca de sua casa e lhe deu total acesso à mesma, isso porque ele passa muito tempo fora e como as aulas dela ainda não começaram era uma forma de não fazê-la se sentir entediada enquanto ficava ‘’presa’’ na residência.Ela já estava a alguns dias na Noruega e como era de se esperar ainda não se acostumou com o país. Os costumes, o clima, a gastronomia eram muito diferentes das do seu amado Brasil, mas ela não reclama, pois sabe que em algum momento irá se acostumar. Matthis tem sido incrível em sua vida. Quando está em casa os dois ficam conversando por horas a fio sobre as coisas que já aconteceram na vida de cada. Ele a trata muito bem e a tem levado para conhecer vários pontos turísticos da cidade, sobre isso não há o que reclamar, por outro lado, uma coisa que a incomoda é o fato de que os emprega
Quando Matthis e Ingrid chegam ao local de realização do evento, uma enorme mansão com uma bela arquitetura, eles atraem olhares de todos os lados. Por Matthis ser um dos homens mais influentes da Noruega isso acaba por acontecer sempre e por Ingrid ser sua acompanhante isso a colocava na frente dos holofotes também, mesmo que isso não a agradasse. — Não estou acostumada a receber tantos olhares e atenção. — A brasileira comenta com o norueguês ao adentrarem a propriedade. — Pois deveria. Mulheres bonitas como você deveriam estar habituadas a isso. — ele diz simples a encarando intensamente e Ingrid cora violentamente ao ouví-lo dizer isso. Ele lhe dá passagem para ultrapassar a porta de entrada da mansão primeiro e logo a segue. Ingrid sente a grande e quente mão dele ser apoiada bem no final de suas costas nuas devido ao grande decote na região e um arrepio bom sobe por sua espinha. No interior da mansão, novamente os dois são alvos de olhares curiosos dos que já estão lá. Eram r
Matthis ultrapassa a porta de entrada de sua mansão enquanto retira seu paletó. Ele é seguido por Ingrid e ambos encontram-se molhados devido à chuva que os atingiu quando a jovem tentava ir embora do evento sozinha e ele a alcançou.O caminho até a residência foi feito sob absoluto silêncio e a brasileira percebeu que o norueguês estava irritado, ela só não sabia com o que. Provavelmente com seu comportamento, mas não é como se importasse.Ele caminha até a mesa de bebidas, logo despejando uísque em um copo com gelo e Ingrid retira seu xale, ficando perdida sobre o que fazer, se tentava uma conversa ou não, porém prefere não tentar no momento, pois aparentemente ele não está com bom humor para tal.— Eu vou subir para o quarto. — Ela finalmente quebra o silêncio que já estava se tornando incômodo e o visualiza se virar em sua direção. — Vou tirar essa roupa molhada, devia fazer o mesmo ou ficará doente. — Sugere.— Vá, mas volte, quero que beba algo comigo. — Ele expõe, não como um