Capítulo 8

Matthis deixou Ingrid sozinha e desapareceu sem dizer para onde iria. A jovem, no primeiro momento, caminhou de um lado a outro sem saber para onde ir ou o que fazer, então decidiu que não ficaria entediada sem fazer nada, dessa forma começou a tentar jogar nos caca-níqueis, mas não conseguia já que nunca havia jogado na vida.

Riu de si mesma e fez menção de deixar a máquina, porém se surpreendeu com a aproximação repentina de um homem desconhecido.

ㅡ Precisa de ajuda? Sou um exímio jogador e posso ajudá-la. ㅡ se ofereceu enquanto subia as mangas de sua blusa social. ㅡ Eu estava te observando há algum tempo e percebi que esse não é muito seu forte.

A mineira riu novamente.

ㅡ Não mesmo. A verdade é que eu nunca estive em um cassino antes então... ㅡ simplesmente deu de ombros.

ㅡ Para tudo há uma primeira vez. A propósito sou Alessandro. ㅡ se apresentou ao esticar a mão em um cumprimento.

ㅡ Ingrid.

A mulher em seus aparentes vinte anos berrava em desespero e dor ao sentir as terríveis contrações lhe atingirem.

Encontrava-se na companhia da parteira do clube-cassino e do pai do bebê que estava por vir, um dos clientes mais assíduos do local, naquele humilde quarto que ficava nos fundos do clube. 

O suor lhe escorria pela face e sua feição novamente era de dor quando mais uma contração lhe atingiu. Agora estavam vindo em menor tempo e ela mal se recuperava de uma quando outra já se manifestava. 

Recordou-se brevemente de quando chegou a Porto Alegre vinda da Bahia em busca de subir na vida de forma rápida. Seus sonhos, porém, foram duramente frustrados. Não conseguiu um emprego ou um lugar decente para morar e sua saída foi começar a vender seu corpo para conseguir se manter.

Passou a trabalhar na Ginza, contudo tentou fugir de lá após descobrir a gravidez, tendo em vista que o único destino dado aos bebês das garotas da boate era a morte ou eram levados para algum orfanato onde cresciam, mas de onde não podiam ser adotados, pois o destino deles, se meninos era servir a máfia e se meninas a prostituição. Todavia não obteve êxito ao tentar fugir, foi pega por um dos empregados do clube-cassino. 

Priscila, a jovem, abandonou as lembranças ao sentir como se algo estivesse saindo de dentro de si. Percebeu então a cabeça do bebê surgindo e durante mais uma contração juntou toda a força que lhe restava empurrando e visualizando o resto do frágil corpo surgir. Uma menina. 

A parteira de forma ágil cortou o cordão que a ligava ao bebê, enquanto esta ouvia o estridente choro soar pelo cômodo. A parteira limpou como pôde o sangue do corpo da criança e a enrolou em um cobertor quente, a aconchegando em seus braços. Logo a jovem mãe ofereceu à criança o seio para que pudesse se alimentar. 

A bebê sugou forte, o que fez a orgulhosa mãe sorrir em resposta. 

ㅡ Parece que alguém aqui está com fome ㅡ sorriu ainda mais ao ver os grandes e brilhantes olhos castanhos da bebê, enquanto passava a mão delicadamente pelos ralos cabelos negros como o ébano. Ela era sua cópia. 

ㅡ Ande logo com isso ㅡ a voz irritadiça do pai da criança, um conhecido promotor da cidade, soou no ambiente a tirando de seu momento com sua filha ㅡ Quero deixar este lugar imediatamente.ㅡ disse impaciente enquanto tragava seu charuto e caminhava pelo cômodo apertado. 

A mais nova mãe suspirou pesadamente enquanto se recordava do que ele lhe dissera dias antes. Tiraria sua filha de si. 

Não havia dúvidas de que Humberto Vila Real era o pai de sua filha, nem ele mesmo duvidava disso, tendo em vista que ela era exclusiva, somente dele. Nunca se deitou com outro homem. 

ㅡ Por favor, Humberto, eu lhe imploro, me deixa ficar com ela...ㅡ suplicou em uma última prece. 

O homem em seus trinta e oito anos a olhou com desprezo e após jogar o charuto no chão e pisar no mesmo com sua pesada bota, vociferou: 

ㅡ O que eu te disse, Priscila? Hun? ㅡ a encarou de forma feroz ㅡ vou levá-la comigo. Não quero minha filha crescendo no meio desse ninho de ratos, vagabundos e toxicodependentes.

Encarou com nojo o humilde quarto o qual ela dividia com outras duas garotas, percebendo que sua filha não poderia ficar ali, de forma alguma.  Mesmo que fosse uma bastarda ainda era sangue do seu sangue.

Priscila chorava ao perceber que seria afastada de sua filha. 

ㅡ Sinto muito, querida, mas não posso ficar com você ㅡ disse, como se de alguma forma a garotinha pudesse lhe entender ㅡ Você merece algo melhor. 

ㅡ Então pretende mesmo desaparecer com o bebê daqui, não é Humberto? Não quero devolução ㅡ Matthis disse sério após adentrar o cômodo, falando como se a criança fosse uma mercadoria. 

ㅡ Tenho certeza do que quero, vou levá-la comigo. De modo algum posso permitir que minha filha, sangue do meu sangue, se perca como a mãe ㅡ encarou Priscila de soslaio com desprezo no olhar ㅡ porque sei que é isso que fariam com ela futuramente, a trariam para cá. 

ㅡ Então vá logo e que ninguém saiba do que aconteceu aqui ou então faço você e esse monstrinho desaparecerem e ninguém nunca irá saber que fui eu.

Mais tarde, naquele mesmo dia, Priscila viu sua filha ser levada para longe de seus braços, não podendo fazer nada para impedir. 

Matthis voltou ao salão de jogos após resolver o problema e visualizou uma cena que o irritou instantaneamente, Ingrid aos risos com outro homem. Olhando melhor percebeu que ela não vestia o casaco, o que o enfureceu ainda mais.

Sem esperar nem mais um segundo, caminhou na direção deles e a pegou pelo braço com o objetivo de tirá-la dali.

ㅡ Ai... ㅡ resmungou pela dor do aperto. ㅡ Matthis? O que é isso? Está me machucando. ㅡ disse enquanto ele a puxava pelo salão.

ㅡ Calada! ㅡ ele rosnou ao seu ouvido.

O homem que fazia companhia para ela nos caca-níqueis tentou ajudá-la, entretanto Matthis fez sinal para um de seus seguranças dar um jeito nele.

ㅡ Matthis...

ㅡ Eu já disse para ficar quieta.

Quando menos percebeu ele adentrou um quarto e a jogou na cama.

ㅡ O que é isso? Você ficou louco? ㅡ A jovem demonstrou confusão e irritação em sua face.

ㅡ Louca ficou você. Eu a trago para jantar em um lugar de alto luxo, te deixo uns minutos sozinha e você já flerta com outro? Você é como todas as outras mesmo.

Ingrid suspirou profundamente tentando buscar uma calma que não possuía no momento.

ㅡ O que você está falando? Primeiro: eu não estava flertando com ninguém, ele só veio me ensinar a como jogar na máquina, segundo: é, você me trouxe aqui, mas me deixou um longo tempo sozinha e terceiro: não estou entendendo seu comportamento, não temos nada para você agir assim.

Ele a encarou com os olhos flamejantes de raiva e disse por fim:

ㅡ Eu não posso mesmo confiar em você novamente.

Ingrid iria falar algo, porém uma batida na porta a interrompeu.

Matthis caminhou a passos pesados e a abriu em um rompante.

ㅡ O que quer? ㅡ gritou com quem quer que estivesse do outro lado.

ㅡ Senhor, o casaco de sua acompanhante caiu no salão. ㅡ A voz de uma mulher soou e Matthis pegou a peça com brusquidão, logo batendo a porta "na cara" da moça e jogando o casaco sobre Ingrid em seguida.

ㅡ Veste essa droga logo. Quero ir embora.ㅡ disse rude.

ㅡ O que houve com você?

ㅡ Só faça o que eu digo.

ㅡ Quer saber de uma coisa? ㅡ se levantou da cama e pegou sua bolsa ㅡ Eu vou embora sozinha, posso muito bem pegar um táxi até minha casa. De agora em diante nossa relação será apenas de professor e aluna, não vamos misturar as coisas.

Ela disse séria e se encaminhou até a porta, porém ele colocou as duas mãos sobre a cintura dela e colou seu corpo sobre o seu.

ㅡ Olha... me desculpe, eu me excedi. ㅡ a virou ficando de frente com ela ㅡ Me desculpe de verdade, você é uma mulher incrível e eu não quis te machucar.

ㅡ Mas machucou. ㅡ retrucou olhando instintivamente para o braço onde havia leves marcas dos dedos dele.

ㅡ Me perdoe, isso não vai acontecer novamente, acredite em mim. Estamos criando uma boa relação e não quero que isso acabe.

Ingrid suspirou e o encarou.

ㅡ Tudo bem.

Matthis sorriu e deixou um beijo na bochecha dela.

ㅡ Vamos para casa. ㅡ segurou sua mão e a encaminhou até a porta ㅡ Ah espera, não esquece de vestir o casaco.

Ingrid assentiu e logo deixaram o local após todo aquele transtorno.

Matthis estacionou o carro em frente ao prédio onde Ingrid vivia e a encarou.

ㅡ Gostou da nossa noite? ㅡ indagou e ela deu de ombros.

ㅡ Apesar de todo o transtorno no final,  eu gostei do lugar, do jantar e todo o resto. Mas como eu disse não acho certo que continuemos com esses encontros, até porque somos professor e aluna. ㅡ disse e ele a encarou revirando os olhos.

ㅡ Somos adultos, independentes e livres.

ㅡ Vamos com calma e dar tempo ao tempo. Agora preciso ir, estou cansada e só quero minha cama.

ㅡ Tudo bem.

ㅡ Boa noite, Matthis.

ㅡ Boa noite, Ingrid.

Enquanto a observava adentrar o prédio, Matthis bateu no volante com força. Se exaltou naquele dia e isso não poderia voltar a acontecer, não até ter certeza de que ela já estava sob seu poder.

Com sorte Ingrid é ingênua o suficiente para aceitar seu pedido de desculpas, que claramente não era verdadeiro, ele não estava arrependido de verdade.

O norueguês tem estudado sua orientanda com cautela e precisão, sabendo exatamente as coisas que ela gosta ou odeia, tudo com o único e claro propósito de ludibriá-la para enfim tê-la em suas mãos e quando isso acontecesse Matthis a moldaria exatamente ao seu bel-prazer.

No fim Matthis queria que Ingrid ficasse tão dependente dele a ponto de, depois que ele executasse todo seu plano, ela nunca mais quisesse ir embora.

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