Pelo jeito, Benedita sabia exatamente a gravidade da sua condição. Também entendia que, se a cirurgia desse certo, seria como renascer. Mas, se não desse, tudo o que estava vivendo agora não passaria de uma lembrança. — Você ainda vai ter muito tempo para viver assim, pode confiar. — Disse, encostando minha testa na dela e tentando tranquilizá-la. — Carolina, meu irmão é muito bom em fingir que é forte, mas ele é teimoso e às vezes não sabe como se expressar. Não fica brava com ele, tá? — Benedita comentou de repente, com um tom tão sincero que me pegou desprevenida. Achei que ela queria falar da cirurgia e já estava pensando em como confortá-la, mas, antes que eu pudesse dizer algo, ela continuou: — Eu sei que você está dando uma lição nele esses dias. Acertei, né? Fiquei sem graça com a pergunta e dei um leve toque no braço dela. — Benê, de onde você tira essas ideias? Para de inventar coisas. — Carolina, não me trata como criança. Eu já li um monte de romances, sei mui
— Deita direito, vou escutar seu coração! — Gilberto disse enquanto tirava o estetoscópio do pescoço. Nós todos observávamos a cena em silêncio, tensos. George, que sempre tinha um semblante inabalável, estava claramente rígido, como se estivesse segurando a respiração. Era apenas um exame, não uma cirurgia, mas, mesmo assim, dava para sentir o nervosismo dele. Mais uma vez, percebi o quanto George prezava por Benedita. Sem pensar, segurei sua mão. Ele me olhou de lado, e eu apenas assenti levemente, tentando tranquilizá-lo. Benedita, no entanto, parecia paralisada. Ela apenas olhava fixamente para Gilberto, como se estivesse hipnotizada. Luana percebeu a situação e se aproximou, inclinando-se ligeiramente: — Deita direitinho e deixa o Dr. Gilberto ouvir seus batimentos. Não dói nada. Benedita já tinha falado com Luana antes e parecia ter criado uma simpatia imediata por ela. Foi só então que Benedita piscou os olhos e, obediente, se deitou na cama. Eu percebi clarament
— Carolina! — Benedita ficou alerta imediatamente. — O que você disse? Você também gosta daquele médico? Isso não pode! Você só pode gostar do meu irmão. Ela já não estava mais preocupada com a própria pulsação descontrolada. Em vez disso, me olhava com um ar extremamente sério e nervoso. Eu segurei o riso, mas fingi uma expressão de total resignação: — Mas o Dr. Gilberto é bonito demais! Quando vi ele pela primeira vez, pensei: isso não é um médico, é um deus que desceu à Terra. — Não pode! — Benedita segurou meu braço. — Ele pode até ser bonito, mas, olhando bem, ele nem chega aos pés do meu irmão. Meu irmão é muito mais charmoso, muito mais homem. E, o mais importante, meu irmão é uma pessoa verdadeira, diferente desse médico. Eu a olhei, confusa: — O Dr. Gilberto não é verdadeiro? Como você sabe disso? Benedita fez um biquinho emburrado e começou a balançar meu braço: — Carolina, você não pode gostar de outro homem além do meu irmão. Você é do meu irmão, só dele!
Benedita não queria de jeito nenhum que George ficasse com ela. Mas, ao mesmo tempo, eu também não tinha coragem de deixá-la sozinha. A única solução foi pedir ajuda a Luana, que, por sorte, estava de plantão naquela noite. — Carolina, eu estou de plantão, trabalhando, e você quer que eu cuide da Benedita? Isso é abuso de amizade! — Luana brincou, fingindo estar ofendida. — Não é bem cuidar dela. — Expliquei, fazendo uma voz manhosa. — Ela vai passar a maior parte da noite dormindo. Só queria que, se você tiver um tempinho, desse uma olhada nela, pra ver se está tudo bem. Só isso! Luana bufou, cruzando os braços: — Olha só... Tantos anos de amizade, e, comparando com o que você faz por Benedita, eu não sou nada. — Não fica com inveja! — Brinquei, levantando o polegar em sua direção. — No meu coração, você é insubstituível. Nem o George chega perto! — Eu não sou o George. Não precisa me enganar com essas palavras bonitas. — Luana retrucou, pegando a minha mão e analisando o
Ouvindo essa explicação, meu coração deu uma pontada. Luana já carregava o peso de uma longa paixão não correspondida. Se não fosse por minha insistência, ela jamais teria tomado coragem de procurar Gilberto. E agora, ele simplesmente jogava aquelas palavras tão diretas na cara dela. Eu tinha certeza de que aquilo devia estar doendo demais para ela. Se ele não queria aceitar o sentimento dela, tudo bem. Mas precisava ser tão insensível assim? Eu estava prestes a intervir, a defendê-la, quando Gilberto interrompeu Luana: — Eu não disse que era um problema. E, aliás, você só pode me causar problemas a mim. Hã? O que ele quis dizer com isso? Fiquei confusa e olhei para Luana, que parecia tão perdida quanto eu. Ela tentou protestar: — Gilberto... — Você não disse que gosta de mim? — Ele cortou novamente, sem rodeios. — Então, se gosta de mim, por que está aceitando flores e atenção de outros homens? — Completou, num tom sério, mas que não escondia um certo ressentimento.
— Ai! — Soltei um suspiro de dor, puxando o braço instintivamente. Uma mão forte agarrou meu braço com força e me puxou de lado. Olhei para cima e encarei um rosto completamente desconhecido. O homem parecia visivelmente desconcertado ao me ver. Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele soltou meu braço de repente e saiu correndo sem olhar para trás. Com a testa latejando pela pancada, levei a mão ao local dolorido enquanto observava sua figura apressada desaparecer no corredor. Depois, olhei para trás, para a porta da sala da Luana, e tudo se encaixou: aquele cara estava parado ali, ouvindo à conversa. Ele estava tão focado no que ouvia que nem notou minha saída, e foi por isso que acabamos nos esbarrando. Então, era ele... O tal admirador que tinha mandado flores para Luana? Eu estava perdida nesses pensamentos quando George apareceu, caminhando em minha direção. Eu me preparei para ir até ele, mas, antes que pudesse dar um passo, ouvi a voz de Luana vindo de dentro
George encostou a testa na minha, esfregando-a de leve, antes de murmurar: — Mas eu senti tanta saudade de você... Tanta, tanta... Ele segurou minha mão e a pressionou contra o peito quente de forma intensa. Instintivamente, puxei a mão de volta e a escondi atrás de mim, como se o toque queimasse. George sorriu ao ver meu nervosismo e, com a voz baixa, perguntou: — Você não sente saudade de mim? — Não sinto, nem um pouco. Só quero dormir, estou cansada. — Respondi apressada, tentando empurrá-lo para longe e procurando as chaves da porta na bolsa. Quanto mais eu tentava, mais atrapalhada ficava. Não conseguia achar as chaves de jeito nenhum, até que George, com calma, as tirou da minha mão. — Amor. — Ele disse, inclinando-se para perto do meu ouvido. Meu corpo inteiro ficou quente, como se o calor dele tivesse me contagiado. Ele abriu a porta para mim e, no momento em que eu ia entrar, segurou meu braço. — Você realmente não vai me deixar entrar? — Não, não vou. — Fa
George foi embora. Tomei um banho rápido e me joguei na cama. Peguei o celular e logo vi que tinha uma mensagem da Luana. Ela tinha enviado uma foto e uma mensagem. Na foto, Benedita aparecia dormindo tranquilamente, e a mensagem dizia: [Benedita está ótima.] Eu sabia que podia confiar a Benedita a ela sem nenhuma preocupação. Escrevi rapidamente uma resposta: [Obrigada, querida.]Nem bem enviei a mensagem e o celular começou a tocar em vídeo. Luana estava esperando eu responder? Pensei que, com certeza, ela queria compartilhar a felicidade de finalmente ter ficado com Gilberto. Curiosa para ouvir os detalhes, atendi a chamada. A imagem de Luana apareceu na tela. Ela estava recostada em sua cadeira de escritório, com uma expressão de felicidade tão radiante que nem a tela conseguiu esconder. — Tá estampado na cara. Felicidade não dá pra esconder, né? Esse sorriso bobo tá quase saindo da tela! — Que poeta você é. — Disse Luana, rindo, enquanto levantava o polegar para mim.