RUBY PORTMANA sala do tribunal estava pesada, o ar carregado com a expectativa que precedia a decisão. As palavras dos advogados ainda ecoavam na minha mente, tentando encontrar algum sentido, algum caminho que me indicasse o que viria a seguir. Mas eu sabia que nada poderia mudar o fato de que o julgamento de Johnny estava prestes a ser encerrado. E, de alguma forma, eu não estava preparada para o que viria a seguir. Não importava o quanto a minha mente tentasse se preparar. Nada seria suficiente.Harry estava quieto, como sempre. O seu olhar distante parecia focado em algum ponto além do tribunal. Eu queria perguntar o que ele pensava sobre o caso, mas sabia que ele preferia manter as suas opiniões para si. Não que eu fosse muito diferente, mas naquele momento, eu não conseguia afastar a sensação de que estava prestes a ser engolida por uma tempestade.O juiz levantou-se e, com a gravidade de sempre, começou a dar as instruções ao júri. Suas palavras eram claras, diretas, como um a
HARRY RADCLIFFEO ambiente da sala de visitas é bem opressivo. Um tom de cinza uniforme cobria as paredes e o teto, iluminado por luzes frias, brancas demais, que faziam doer nos olhos se expostos demais. O que era irónico, é que havia algo naquele tipo de iluminação que parecia intensificar o vazio de tudo à volta, e para variar, a sala não tinha janelas, apenas uma mesa de madeira escura ao centro e duas cadeiras de cada lado, como se estivessem se preparando para um duelo silencioso.Sentei-me com calma. As minhas mãos ajustaram os botões do meu paletó azul-marinho, com movimentos lentos, esperando que assim o tempo passasse o mais rápido possível.Quando Herodes esteve preso, eu só havia o visitado uma única vez, com a minha mãe; acho que era uma tentativa dela me fazer acreditar, e ela própria acreditar também, que as coisas seriam diferentes, mas não foram, e por isso, aquela foi a última vez que pisei dentro de uma penitenciária.Recostei-me na cadeira e deixei os meus olhos p
HARRY RADCLIFFEO céu sobre Nova Iorque ainda chorava uma garoa insistente quando deixei a penitenciária. O cheiro de concreto molhado misturava-se ao ferro-velho dos portões. Os guardas apenas assentiram com a cabeça ao me ver sair, e fecharam os portões enquanto eu caminhava para fora do recinto total.Do lado de fora, andei até o meu carro estacionado a frente da fachada, e a medida que eu me aproximava, senti a gravata apertando a minha garganta como uma algema, e a luz acinzentada do dia me irritando. Entrei no veículo, fechei a porta com força, enquanto procurava ar e disquei um número do meu celular.— Irving — rosnei, assim que ele atendeu. — Preciso confirmar uma informação. Agora.— Boa tarde para você também, Sr. Radcliffe — respondeu ele, a voz enfastiada. — A que devo o prazer?— O nome “Fleur Étoile” te diz alguma coisa? Uma floricultura, fachada. Segundo uma fonte, pode estar lavando dinheiro para execuções contratadas.Houve um breve silêncio do outro lado.— Repete is
RUBY PORTMANO sol escaldante do início da tarde aquecia cada centímetro do jardim da casa de Milena e Edward, e mesmo com o céu límpido acima das nossas cabeças, uma brisa suave trazia certo frescor que tornava tudo mais suportável. A piscina brilhava com tons turquesa, refletindo o movimento lento das folhas das palmeiras que contornavam os muros altos da propriedade. Vivendo em apartamento, obviamente não poderia dispensar um bom mergulho, e agora estava dentro d'água, com o corpo imerso até a cintura, os cotovelos apoiados na borda, os braços cruzados e a cabeça repousando sobre um deles. Observava tudo em silêncio, absorta.A casa deles era simplesmente maravilhosa. Tinha aquele charme das residências brasileiras de arquitetura contemporânea, com linhas retas, madeira de demolição, concreto aparente e vidros amplos que deixavam a luz circular sem restrição. Os ambientes se conectavam sem rigidez, criando uma fluidez leve e sofisticada. Milena sempre teve um olhar afiado para pro
RUBY PORTMANA noite descia lenta sobre a casa do meu lindo casal favorito, tingindo as amplas janelas de vidro com tons alaranjados que logo se transformavam em um azul profundo e sereno. A luz da sala era suave, amarela, refletida no piso de madeira escura e nas paredes em tons neutros, realçando o charme contemporâneo da arquitetura que Milena havia concebido com tanto cuidado. Aquela casa tinha alma. E nossa, meu sonho é ter algo semelhante, não é como se eu não adorasse o meu apartamento, porque adoro, mas é diferente… é diferente porque eles nem passam o tempo todo aqui, mas é uma extensão deles.Estávamos os três sentados na sala, no fundo, tocava um baixo só de jazz que Edward fez muita, mas muita questão de colocar, e ficamos a conversar entre um gole de vinho e outro. Edward, com um dos pés apoiado no apoio do sofá, tamborilava os dedos sobre a barriga enquanto falava:— Aquele pediatra em Florença ainda atende? Abigail nasceu aqui nos Estados Unidos, mas… a nova menina pre
RUBY PORTMANDesliguei o tablet e o deixei de lado, pousando-o sobre o sofá. Peguei a minha taça de vinho branco, girando o líquido suavemente antes de levar a taça aos lábios. Três anos. Três longos anos haviam se passado desde o desaparecimento de Harry e da sua família. Eu estava prestes a completar 30 anos, uma nova década de vida se aproximando, mas minha mente ainda insistia em voltar ao que aconteceu, ou ao que deixou de acontecer. Três anos de ausência, de silêncio, de especulações e de um vazio que, por mais que eu tentasse, nunca conseguia preencher completamente.Durante esse tempo, eu havia tentado de tudo para esquecer, para seguir em frente. Queria sentir raiva de Harry, nutrir um ressentimento profundo por ele, por ter me deixado sem respostas, sem um adeus. Queria odiá-lo, desejar que ele pagasse por tudo de ruim que significou na minha vida. No entanto, a cada semana, sem falhar, eu pegava-me lendo tabloides, procurando por qualquer sinal, qualquer notícia que dissess
RUBY PORTMANDespedindo-me de Johnny com um aceno rápido, deixei-o na cozinha e me dirigi à porta. Ele estava ocupado com algo, talvez preparando um jantar, ou procurando alguma bebida, como de costume, não questionou a minha saída repentina. Eu sabia que assim que eu chegasse não o encontraria mais, já que nos víamos apenas aos finais de semana, e, muito raramente nos dias úteis, já que eu trabalhava mais do que devia, ele também. E a nossa relação funcionava assim, ninguém se aborrecia com ninguém e tínhamos cada um o seu espaço, embora eu sempre soube que ele quer algo, além disso, já que ultimamente o tema casamento não tem saído da sua boca.Saí do apartamento e entrei no elevador, pressionando o botão para o piso térreo. Enquanto descia, a minha mente vagava, como sempre fazia nessas horas. As paredes do elevador refletiam uma versão minha que parecia diferente da jovem que havia começado a trabalhar na Radcliffe’s tantos anos atrás. Havia uma maturidade que o tempo e as experiê
RUBY PORTMANSophia estava na cozinha, movimentando-se com a familiaridade de quem já considerava meu apartamento quase uma extensão de sua própria casa. O cheiro do café fresco e do pão torrado enchia o ar, criando uma atmosfera aconchegante que contrastava com o som constante das teclas do meu laptop enquanto eu trabalhava no relatório do trabalho. Tinha um prazo apertado para entregar, e a manhã parecia ser o único momento em que eu conseguia encontrar um pouco de paz para me concentrar.Enquanto eu digitava, Sophia começou a puxar assunto, algo que ela sempre fazia para quebrar o silêncio, especialmente quando percebia que eu estava mergulhada demais em meus pensamentos. Ela mexia na frigideira, preparando algo que eu ainda não conseguia identificar, mas que certamente seria delicioso, como sempre.— E então, Ruby? — Começou, sem olhar para mim. — Como vai seu relacionamento com o Johnny? Ainda não tivemos a chance de conversar sobre ele direito.Suspirei, interrompendo a escrita