Capítulo 03

RUBY PORTMAN

Sophia estava na cozinha, movimentando-se com a familiaridade de quem já considerava meu apartamento quase uma extensão de sua própria casa. O cheiro do café fresco e do pão torrado enchia o ar, criando uma atmosfera aconchegante que contrastava com o som constante das teclas do meu laptop enquanto eu trabalhava no relatório do trabalho. Tinha um prazo apertado para entregar, e a manhã parecia ser o único momento em que eu conseguia encontrar um pouco de paz para me concentrar.

Enquanto eu digitava, Sophia começou a puxar assunto, algo que ela sempre fazia para quebrar o silêncio, especialmente quando percebia que eu estava mergulhada demais em meus pensamentos. Ela mexia na frigideira, preparando algo que eu ainda não conseguia identificar, mas que certamente seria delicioso, como sempre.

— E então, Ruby? — Começou, sem olhar para mim. — Como vai seu relacionamento com o Johnny? Ainda não tivemos a chance de conversar sobre ele direito.

Suspirei, interrompendo a escrita por um momento, os olhos ainda fixos na tela, enquanto tentava encontrar a melhor forma de responder àquela pergunta. Johnny era... complicado. Não por ser uma pessoa difícil, mas porque, por mais que tentasse, eu ainda não conseguia me conectar com ele da maneira que gostaria.

— Johnny é um bom homem. — Comecei, o tom de voz mais baixo do que pretendia. — Ele é atencioso, carinhoso, sempre se preocupa comigo. Mas... não sei, às vezes sinto que falta algo.

Ela virou-se para me olhar, o interesse bem evidente em seus olhos.

— Falta algo? Como assim?

— É como se... não houvesse uma faísca. Ele é ótimo, realmente é, mas às vezes parece que estamos apenas... passando o tempo juntos, sem aquela conexão profunda. E, honestamente, às vezes sinto que estamos juntos mais por conveniência do que por paixão. — Dei de ombros, tentando explicar o que nem eu mesma conseguia entender completamente.

— E isso te incomoda? — Falou, voltando a atenção para o fogão, mas claramente absorvendo cada palavra.

— Incomoda um pouco. Eu queria sentir mais, queria que houvesse aquela intensidade que parece estar sempre faltando. Não sei se estou sendo injusta com ele ou comigo mesma, mas as vezes não posso ignorar o que sinto.

— Você sempre foi intensa em seus relacionamentos, Ruby. — Comentou Sophia, mexendo na frigideira. — Talvez esteja esperando algo que Johnny não pode te dar. Ou talvez... você ainda esteja comparando-o com alguém do seu passado.

Aquelas palavras me atingiram mais do que eu gostaria de admitir. Era verdade que, por mais que tentasse, ainda fazia comparações inconscientes entre Johnny e Harry. Sabia que não era justo, nem com Johnny, nem comigo mesma, mas era algo que, às vezes, parecia inevitável.

— Talvez. — Admiti, a voz mais baixa, quase como se estivesse falando mais para mim mesma do que para Sophia. — Mas não posso continuar assim para sempre. Preciso encontrar uma maneira de seguir em frente, de verdade.

Sophia colocou os pratos na mesa, virando-se para mim com um olhar compreensivo. — E você acha que Johnny é o homem certo para isso?

Antes que eu pudesse responder, a porta da cozinha se abriu de repente, e Johnny entrou, irradiando uma energia que imediatamente preencheu o ambiente. Ele não percebeu o que estávamos discutindo, ou talvez estivesse simplesmente entusiasmado demais para notar.

— Ruby! — Ele exclamou, com os olhos brilhando de excitação. — Adivinha só! Minha empresa de fotografia foi convidada para um evento exclusivo onde vários magnatas estarão presentes! Isso pode ser uma grande oportunidade para nós! Céus!

No primeiro instante, meu coração quase parou, pensando que ele poderia ter ouvido a conversa anterior. No entanto, ao ver seu entusiasmo, percebi que ele não havia captado nada. Senti um misto de alívio e culpa, sabendo que acabara de questionar nosso relacionamento em minha mente.

Levantei-me rapidamente, tentando entrar no ritmo da alegria dele. 

— Isso é incrível, Johnny! Parabéns, você merece. — Aproximei-me, dando-lhe um beijo rápido e, em seguida, apontando para Sophia. 

— Ah, essa é a Sophia Smith, minha melhor amiga. Ela acabou de voltar de uma viagem incrível a Mauritânia, e olha só, ela também é fotógrafa. 

Johnny virou-se para Sophia, ainda radiante. 

— Sophia! Finalmente conheço você. Ruby sempre fala muito bem de você. É um prazer conhecê-la.

Sophia sorriu, um sorriso genuíno que só ela conseguia dar, e estendeu a mão para cumprimentá-lo. 

— O prazer é meu, Johnny. Parabéns pelo convite para o evento, é realmente uma grande oportunidade. — Ele apertou a mão dela com firmeza, claramente satisfeito com a recepção.

 — Sim, estou muito animado. É uma chance única para expandir a minha rede de contatos e mostrar o meu trabalho para um público muito influente. Trabalhei bastante para isso.

Enquanto Johnny continuava a falar sobre o evento, Sophia lançou-me um olhar de relance, um olhar que dizia muito sem precisar de palavras. Ela entendia, talvez melhor do que eu, as complexidades do que eu estava sentindo. Mas, como sempre, ela respeitava meu espaço e sabia quando deixar as coisas passarem.

Sentamo-nos à mesa, e enquanto Johnny detalhava seus planos e expectativas para o evento, eu me concentrei em manter o foco na conversa, tentando afastar as dúvidas que haviam surgido mais cedo. Ele era apaixonado pelo que fazia, e isso era algo que eu realmente admirava nele. Era um homem dedicado, comprometido com seu trabalho e com seu futuro.

Ele, como sempre, falava com entusiasmo, explicando como ele planejava usar o evento para promover sua empresa e expandir ainda mais as suas conexões. Havia um brilho nos olhos dele que eu reconhecia bem, aquele brilho de alguém que está fazendo o que ama, que encontra propósito e alegria em seu trabalho. Eu sorria e concordava, torcendo para que ele não notasse a ligeira desconexão em meu olhar, mas eu gostava dele mais durante esses momentos.

— Ruby, você deveria vir comigo. — Johnny sugeriu de repente, interrompendo meus pensamentos. — Seria ótimo ter você lá para me apoiar.

O convite pegou-me de surpresa, e por um momento, fiquei sem saber como responder. Minha mente começou a girar, tentando encontrar uma desculpa ou uma razão válida para recusar, mas antes que eu pudesse articular qualquer coisa, Sophia interveio.

— Acho que seria uma ótima ideia, Ruby. — Comentou, com um sorriso encorajador. — Pode ser uma boa oportunidade para vocês passarem mais tempo juntos em um ambiente diferente, eu acho que seria ótimo.

Ela sabia o que estava fazendo, incentivando-me a dar mais uma chance ao relacionamento, a tentar ver as coisas por uma nova perspectiva. Eu sabia que ela tinha razão, que talvez eu estivesse sendo dura demais em meus julgamentos.

— Sim, talvez seja uma boa ideia. — Concordei, sorrindo para Johnny. — Vou ver como estão as coisas no trabalho, mas adoraria ir, é claro.

Johnny parecia satisfeito com minha resposta, e logo voltou a falar sobre os detalhes do evento, enquanto eu tentava afastar os pensamentos conflitantes que insistiam em me assombrar. Sabia que precisava dar mais espaço a ele em minha vida. Depois do café da manhã, Johnny se levantou, dizendo que precisava sair para resolver algumas coisas da empresa antes do evento. Ele me beijou rapidamente e se despediu de Sophia com um sorriso.

— Vou indo, mas nos vemos mais tarde, Ruby. Sophia, foi um prazer conhecê-la. — E com isso, ele saiu do apartamento.

Sophia e eu ficamos em silêncio por um momento após ele partir, cada uma processando o que havia acabado de acontecer. Ela voltou a se sentar na mesa, olhando-me com aquela expressão que dizia que ela estava pronta para continuar a conversa de onde havíamos parado.

— Ele realmente parece um cara legal. — Comentou, pegando sua xícara de café. — Mas não posso deixar de notar que você está... hesitante.

Assenti, sem surpresa por ela ter captado isso. 

— Ele é legal, Sophia. Realmente é. Mas você me conhece. Sabe que eu preciso de algo mais, algo que me faça sentir viva, conectada. E não estou certa de que ele possa me dar isso. Nossa, será que estou sendo assim tão injusta?

Ela me olhou com compreensão, mas também com uma leve tristeza nos olhos. —

 Ruby, talvez você esteja buscando algo que só você pode encontrar. Johnny pode não ser perfeito, mas nenhum relacionamento é. Talvez seja hora de você decidir o que realmente quer.

Senti um nó na garganta, sabendo que suas palavras eram verdadeiras. Johnny era bom para mim, mas eu precisava decidir se era o suficiente, se ele era o homem com quem eu queria construir algo mais duradouro, ou se estava me apegando a ele por medo de enfrentar a realidade de que Harry ainda ocupava um espaço significativo na minha vida.

— Eu sei. — Admiti, finalmente, deixando escapar um suspiro profundo.

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