Eu ainda estava indo em direção à pista de decolagem. Liguei para ele e pude também me desculpar.— Jack, me desculpe. Desde ontem Lily não reage. E enquanto falava com você a notícia chegou. Venha em paz. Tenho certeza de que ela ficará bem, até você chegar. Sou um entusiasta da esperança.— Não se desculpe. O senhor fez a melhor coisa. Acordei para a realidade da perda. Só torço agora, para que caso aconteça o pior, eu consiga chegar antes.— Se fixe na esperança. Não tenha nenhum outro tipo de pensamento, a não ser esse. Tenha fé.— Obrigado, senhor.*****Antes de embarcar, mandei uma mensagem para Dr. Wallace e Carly, perguntando como Lily estava. Os dois responderam que já haviam entrado na UTI para vê-la, e que ela estava em estado muito grave. A torcida agora era para que eu chegasse a tempo, de pedir perdão a ela em vida.*****Mesmo em um voo tão longo não conseguia dormir. E eu estava proibido de beber, por causa de algumas fortes medicações que ainda tomava. Descumpri orde
A experiência de quase morte que vivi trouxe um conjunto de visões inacreditáveis, além de sonhos de uma vida feliz e plena com o homem que amo. Não sei por quanto tempo permaneci vendo meu corpo. Foram alguns dias, e eu, sendo médica, sentia o físico se esvaindo e a alma presa nesse mundo de ilusões, mas sem querer ir embora.Quando Jack entrou no quarto, todo paramentado, bem abatido, com olhos inchados de tanto chorar e olheiras de noites de insônia, meu coração acelerou. Percebi que o corpo físico reagiu; os braços ficaram mais tensos, a pressão arterial caiu drasticamente. Eu mesma dizia para meu corpo inerte: 'Não morra, agora não. Já fiquei até agora aqui, não morra, por favor'. O problema foi o desabafo dele, quase acabou comigo; eu precisava reagir e voltar para ele urgentemente, foi quando dei uma parada cardiorrespiratória.Os médicos me estabilizaram, mas não deixaram mais ninguém entrar naquele dia para me ver. Só no outro dia, pude vê-lo. Eu queria tocá-lo, falar com ele
Eu já gravava com uma intensidade frenética. O corpo ainda se adaptava. Foram vários meses, e agora vivia ansioso por notícias de Sara/Lily. O medo maior era que o telefone tocasse e trouxesse a notícia devastadora. Contava os dias da semana. Para o diretor e produtor do filme, expus toda a verdade e firmei um acordo contratual. Gravaria até a sexta pela manhã, retornando para as filmagens na segunda à tarde. Era a forma que encontrei para estar perto dela, mesmo que fosse por breves instantes.Carly pediu para permanecer em Lugano e concordei. Sua sobrinha ajudava em casa, junto com outros parentes confiáveis, como o jardineiro e o piscineiro. Todos colaboravam. Não tinham conhecimento da minha rotina como Carly, mas estavam se saindo bem. Em troca, minha mãe adotiva mandava mensagens de manhã, à tarde e à noite, informando o boletim médico. Infelizmente, era sempre a mesma frase: 'A paciente está estável, sem pioras no quadro clínico'.Após o susto da parada cardíaca de Lily enquant
Lily Eu parecia uma criança ansiosa esperando o presente de Natal. Andava de um lado para o outro no quarto da mansão, aguardando o ajuste do vestido de noiva. Eu estava um pouco mais cheinha, tudo bem que precisei tomar muito corticoide durante o tratamento, mas o corpo poderia já ter liberado, era o que eu mais desejava. A costureira chegou quando faltava apenas meia hora para a cerimônia. Optamos por algo simples, apenas para os amigos mais próximos. Por isso, escolhemos a própria casa de Lugano como cenário, no jardim, de frente para o lindo lago. Dr. Wallace e Dawson, os mais velhos, brigaram para ver quem entraria comigo e me entregaria para Jack. Tive que interferir e dizer que entraria com os dois. Dois adultos brigando já era demais. Oito meses haviam se passado desde o retorno do coma. Jack terminara de gravar o filme, e, acreditem, criei coragem e fui ao lançamento com ele. Eu era apenas a futura esposa, uma médica, uma pessoa comum, fora dos holofotes. Isso graças à entr
LilyDeli nos chamou para um chá na cozinha e depois nos levou ao local onde ela havia decorado a festa com painéis de filmes da Disney, inclusive os antigos personagens, de nossas memórias de infância. Era um local arejado, mas fechado, não tinha perigo de estragar todo o esforço de minha mãe adotiva, agora avó coruja.Candance entrou para o quarto cedo, coloquei Carol para dormir e liguei para Jack. — Oi, amor.— Oi, parece cansado.— Muito. Tive que ensaiar em dobro para poder ficar mais dias com vocês.— Aqui, você descansará e está tudo pronto para a sua partida?— Sim, inclusive Dawson está bem ansioso. Acho que ele está com muita saudade de Candance.— Não tenho dúvidas disso, eles se amam! Hoje ela me contou o real motivo por que não sai daqui. Tem a ver com o pai, que fez de tudo para ela estudar medicina, mas sem conseguir realizar o próprio sonho de ser médico.— Acho que não será preciso, ela não terá que sair daí.— Como assim, o que está me escondendo?— Não estou escon
Lily.O brilho deslumbrante das lantejoulas prateadas em meu vestido refletia-se no espelho do quarto do casal. A luxuosa limusine, elegantemente estacionada à porta de casa, aguardava-me para conduzir ao Dolby Theatre, em Los Angeles. Aos 21 anos, encontrava-me indicada para um prestigioso prêmio da Academia de Cinema de Hollywood, sendo reconhecida como a melhor atriz coadjuvante. Nesse momento crucial da minha carreira, eu brilhava como a estrela mais radiante no vasto céu da indústria cinematográfica. Contudo, por trás desse sonho, uma realidade sombria e deteriorada se escondia, revelando-se por entre as cortinas e câmeras.Mesmo após estar elegantemente trajada, optei por abandonar o deslumbrante conjunto de brilho. Despojei-me das joias suntuosas e do vestido, aproveitando o fato de que Jack, meu parceiro e talentoso ator, já havia seguido para a cerimônia antes de mim. Fui rápida em dar seguimento ao meu meticulosamente planejado plano de fuga. Deslizei a mala preparada de deb
Sentei-me no calçadão e respirei a brisa do mar. Era primavera; o sol aquecia o coração e as flores floresciam nos canteiros. O prédio, no qual eu morava, tinha três andares e seis apartamentos. Ninguém tinha conhecimento, mas eu era a proprietária de tudo aquilo. Os aluguéis dos apartamentos proporcionavam-me uma renda extra. Apesar de ser uma cirurgiã reconhecida na cidade, meu salário não seria suficiente para adquirir um prédio no valor de milhões de euros. Sendo assim, este era um dos meus segredos, bem guardado. Cansada da maresia e com a escuridão já se intensificando, dirigi-me para casa, que estava a apenas cem metros dali. ****Sem compreender minha própria reação, entrei no apartamento e fui direto para a televisão. Algo me atraía de volta à cerimônia de premiação do famoso festival. Maldita hora em que Candance e todas as enfermeiras daquele setor decidiram assistir à chegada das celebridades. Por que justo naquele momento tive que o ver, após quinze anos passados? Sent
Acordei sem ânimo no dia da viagem para Cannes, na França. Pietra, a mais nova namorada e atriz também, sem projeção ainda, estava apenas como acompanhante e, para se mostrar ao mundo, ao meu lado, queria aproveitar para fazer um tour pela Europa. Eu estava com o coração apertado, embora não conseguisse explicar o porquê. Tinha sido indicado ao prêmio de melhor ator no festival pelo meu último filme. Isso poderia me consagrar ainda mais, apesar de já ter uma carreira consolidada e dinheiro para várias gerações. Mas, desde o dia em que saiu a lista com os indicados, mesmo que a felicidade inicial tenha surgido, o coração também se apertou. Lembro que estava em casa sozinho. Deu uma vontade louca de beber um whisky, vício que adquiri, depois de algumas decepções, mas que com a correria de gravações e algumas críticas ruins, fizeram eu minimizar. Fui até o bar, peguei a garrafa mais cara e abri. Por sorte, Pietra estava arrumando os últimos detalhes para a viagem, e eu também não a dei