AARON BITENCOURT
NO MOMENTO QUE O SOM DA MINHA VOZ preencheu o espaço e a última palavra dita por mim, ressoou no ar, como um abrir e fechar de olhos, a mulher que tinha uma expressão temerosa e os olhos que refletiam o puro medo, mudou suas feições e o ódio estava visível em seu olhar e ouvir as palavras que sobressaíram ao barulho irritante que saia da boca da criança em seus braços, fez cada fibra do meu corpo vibrar e o sangue ferver e borbulhar em minhas veias.— O senhor deseja que eu tampe a boca dela?— disse sem desviar os olhos de mim, como se estivesse me desafiando.— Sua m*****a insolente. — vocifero furioso, porém, o meu corpo todo foi envolvido por um calor escaldante quando a infeliz que sempre pareceu um animal acuado começou a colocar suas garras para fora e suas palavras saíram aos berros.— Chega! Eu cansei e mesmo gostando muito da Melinda, não vou aceitar que o senhor continue me humilhando, pois tudo nessa vida tem limites e eu cheguei ao meu. Durante os três meses que estou aqui, venho aturando o seu mau humor e não é atoa que ao longo de um ano essa pobre criança já teve várias babás. Tendo um monstro como patrão, ninguém, por mais que se renda aos encantos desse anjo, aguenta ficar sobre os domínios de alguém tão perverso. Alguém que tem uma pedra dentro do peito, no lugar do coração e é incapaz de gesto nobre até com um pequeno anjo. Pode procurar outra pessoa, pois sou eu quem não quer mais ficar nesse emprego.A desgraçada colocou a criança que gritava a todo vapor, dentro do berço e caminhou em direção ao cômodo onde ficava guardado as suas coisas e não demorou muito para sair puxando uma mala. Então se aproximou do berço e suas palavras se fizeram presentes novamente.— Eu sinto muito minha princesa e desejo do fundo do coração que Deus olhe por você, que não merece tudo que vem passando, o choro cessou e era como se a criança estivesse perdida em seu próprio mundo.— Eu vou cuidar pessoalmente para que você não encontre nenhum outro emprego — falei extremamente irritado.Com passos largos, a atrevida começou a se mover em minha direção e antes de chegar até a porta, retrucou:— Algum dia todos descobrirá a sua verdadeira face que é a do próprio demônio. O senhor sabe o número da minha conta, então coloque nela tudo que tenho por direito.Assim como o som das malditas palavras que fez a raiva me incendiar ainda mais por dentro, ecoavam no ambiente, e deu lugar ao silêncio, instantes depois ela desapareceu do meu campo de visão. Jamais fui tomado por sentimentos tão ruins, porém, desde tudo aquilo que aconteceu em minha vida, é como se algo sombrio e cruel tivesse se apossado do meu coração. Um monstro que deseja se libertar e anseia por subjugar e exterminar todos os obstáculos que surgem em meu caminho.Manhã seguinte...Depois do ocorrido de ontem, Emília acabou ficando com Melinda e esta por sua vez, após choramingar por um longo período de tempo, acabou caindo no sono profundo, contudo, ainda estava tão possuído de raiva que não consegui dormir, só bem tarde, quando era alta madrugada foi que adormeci. Acordei logo nas primeiras horas da manhã, no entanto, meu coração estava agitado, como se algo que não estava sob o meu controle estivesse prestes acontecer. De banho tomado e arrumado, deixei o meus aposentos, passos precisos foram dados por mim e ao passar pelo corredor que dava acesso ao primeiro andar da minha mansão, o silêncio reinava no ambiente e quando cheguei ao topo da escada, meu olhar se voltou para a mulher que já tem por volta de uns 55 anos, assim que surgiu em minha frente.Emilia e Sebastian são os únicos que trabalham comigo desde o tempo que os meus pais ainda eram vivos e apesar de ter me transformado no ser insensível que sou hoje, respeito a ambos como se fossem da minha família. Meus pensamentos foram deixados de lado assim que me livrei do último degrau e ouvi sua voz.— Bom dia!— Bom dia, você já sabe o que fazer. Dessa vez ofereça um salário ainda maior, mas quero alguém que seja eficiente.— Mandarei colocar o anúncio daqui a pouco.Sem delongas, prossegui em direção a porta e só espero que desta vez não seja mais uma incompetente ou não irei controlar a minha fúria.ALICIA SCOTTMeu olhar continua fixo no rosto pálido da mulher que ainda está em um sono profundo após todos os procedimentos médicos. Eu estava tão perdida e desorientada com tudo que aconteceu em minha vida, que tinha a sensação de que o céu havia desabado sobre mim, no entanto, o choque da realidade me atingiu de verdade quando me foi permitido vir para o quarto em que a minha mãe estava. Senti um aperto profundo no meu peito ao ver o seu corpo frágil e imóvel sobre a cama. Passei toda noite ao seu lado e não consegui dormir, pois mil coisas se passavam pela minha cabeça, as lágrimas grossas inundavam o meu rosto e uma dor insuportável apoderou-se de todo o meu ser.Não teria forças para seguir adiante se algo pior tivesse acontecido com ela, meus pensamentos que estavam a milhões de quilômetros, logo se concentraram nela assim que seus olhos se abriram e um sorriso largo surgiu no meu rosto. Porém, a mulher a minha frente tinha uma expressão totalmente desconhecida por mim. Suas órbitas estavam em um tom mais escuro, seu rosto revelava sinais de uma máscara dura como se ela tivesse perdida em meio aos devaneios.— Mãe! Mãe! Mãe...Chamei a por diversas vezes, mas sua boca continuava fechada e seu olhar distante. O medo me envolveu e antes que eu viesse a ter qualquer outra reação, a porta foi aberta, e o médico, ao lado de uma enfermeira, adentrou o ambiente.— Por que ela está assim? — pergunto e as lágrimas começam a descer pelo meu rosto.Ele se aproximou e começou a examiná-la e a cada segundo que se passava, o meu desespero aumentava. Foram minutos de muita agonia e se eu achava que toda essa situação não poderia ficar pior, as palavras que vieram dele, não só caiu como um golpe cruel que quase me nocauteou, como atingiu a minha alma.— Como havia dito, era possível que houvesse sequelas. Houve uma diminuição muito acentuada da função cerebral, sua mãe acabou entrando em um estado vegetativo. Tendo apenas movimentos involuntários, como a respiração e os batimentos cardíacos e, embora os estímulos extremos, como os sons, continuem chegando até ao cérebro, ela não consegue interceptar e por isso, não tem qualquer reação.Eu tentava processar tudo aquilo e não esperava que o pior ainda estivesse por vir.— E o que pode ser feito? Ela vai ficar boa?— Esse estado pode durar, dias, semanas, meses ou ela pode ficar assim para sempre. Porém, hoje temos vários recursos que ajudam na recuperação do paciente, contudo você vai precisar de bastante recurso já que o tratamento, além de ser caro, é algo que não sabemos por quanto tempo ela fará uso até voltar ao seu estado de consciência.Nos momentos seguintes, ele me explicou tudo e quando fiquei novamente sozinha com ela, meu olhar ficou cravado no seu rosto, o nosso maior bem material é a nossa casa e não posso me desfazer dela. A pouca economia que temos só vai dar para pagar um mês do tratamento e o dinheiro da pensão que ela recebe do meu pai, dá apenas para pagar as contas de casa. Sei que o maior sonho dela era que eu entrasse em uma faculdade e tivesse um futuro melhor, porém, agora tudo isso é pequeno perto de toda essa situação e não importa o que eu tenha que fazer e enfrentar. Chegou o momento de retribuir todo esforço que ela fez durante todos esses anos.ALICIA SCOTTCAMBALEANDO, DEIXEI O QUARTO EM QUE minha mãe estava. Vê-la naquele estado me causou um desconforto intenso, como jamais havia sentindo na vida. A tristeza que senti pela decepção com aquele que acreditava ser o grande amor da minha vida, se tornou tão insignificante ao ser comparada com a dor, que tomou conta, não só do meu coração, como estava dilacerando a minha alma. Era como se tivessem cravado algo no meu peito, atingindo o meu coração e este por sua vez, a cada batida, me causava essa angústia profunda de uma dor que parecia não ter fim. Eu queria ficar ao seu lado, mas não me foi permitido. O médico me explicou que de nada adiantaria a minha permanência ali ao seu lado, já que ela estava em estado vegetativo e que não se sabia ao certo quando ela sairia da escuridão em que se encontrava, onde seus olhos podiam estar abertos, mas era como se tivessem envolvidos por nuvens negras. Como ele, disse tudo dependeria dela, dias semanas, meses e a pior palavra ve
Minutos depois...ALICIA SCOTTTODA FOME QUE ESTAVA SENTINDO SE esvaiu, fiquei tão ansiosa que liguei imediatamente para o número que havia no anúncio. Uma voz suave ecoou do outro lado da linha e eu fiquei satisfeita quando a senhora Emília falou que agendaria uma entrevista para hoje no horário da tarde. Sorridente, deixei a lanchonete e agora estou no quarto com a minha mãe, aproximo-me do seu leito e sento-me na cadeira perto da cama. Logo em seguida seguro uma de suas mãos, enquanto meus olhos ficam fixos nos seus, que embora estejam abertos, não demonstram nenhum sinal de vida. O médico disse que apesar de ela não reconhecer o que acontece ao seu redor, seria bom que eu conversasse com ela. — A senhora é a pessoa mais forte e guerreira que eu conheço, sei que logo tudo isso vai passar, mas enquanto estiver aqui, eu vou dar o meu melhor. Depois da tempestade, finalmente mãe, hoje eu terei a chance de conseguir um bom emprego, daqui a algumas horas irei para uma
ALICIA SCOTT SAÍ DAQUELA SALA DANDO PASSADAS TÃO LONGAS, que parecia que estava correndo. No entanto, minutos atrás, eu senti minhas pernas ficarem pesadas e não conseguia sair do lugar, meu coração jamais havia batido tão descompassado e meus olhos arderam, pois assim como Linda, resolvi chamá-la assim, o seu pai era dono de uma beleza excessiva que feria os olhos desacostumados, sua aparência física mais parecia com aqueles príncipes relatados nos livros de conto de fadas. Suspirei fundo, o cheiro inebriante dele ainda estava impregnado em minhas narinas, fiquei parada, feito boba, com a mamadeira em mãos, frente à porta. Não sei por quanto tempo permaneci naquele estado de devaneio, como se estivesse sob algum feitiço, até que ouço o choro de Melinda e o choque da realidade me atingiu e menos de um segundo depois, eu me recrimino por tais pensamentos, pois sou a prova viva que nem sempre ser dono de uma beleza exterior significa que se tem um bom coração, pois aquele que machucou
ALICIA SCOTTDEPOIS DE PASSAR UM BOM TEMPO no jardim, assim que o sol começou a esquentar e ao ver o horário no relógio em meu pulso, como já eram quase nove horas da manhã, tratei de entrar com Linda, afinal, não era bom que ela ficasse exposta ao sol depois das dez horas. Tomamos banho e não demorou muito para que ela viesse a dormir, isso foi o que eu achei, ao pensar que ela estivesse num sono profundo. Puro engano, pois a sapequinha estava a todo vapor e só tive tempo para lavar as mamadeiras, ao ouvir seu choramingar através da babá eletrônica, fui ao quarto pegá-la e ao chegar na cozinha, como Abigail iria arrumar a dispensa, eu só liguei o micro-ondas, programei no tempo certo para que viesse a esterilizar os objetos, entre eles, as chupetas dela, e seguimos para sala, além de poder ouvir quando o tempo estipulado acabasse, como ela estava nesse processo de não parar quieta, era muito bom um lugar espaçoso para que viesse a andar melhor. Se pass
AARON BITENCOURTASSIM QUE DEIXO O MEU CLOSET, ouço várias batidas na porta. Sabendo de quem se tratava, acabo por mandar entrar e não demorou nem um segundo para Emilia surgir no meu campo de visão e ao ver suas feições, de certo aquela atrevida já havia relatado o que tinha acontecido, mas assim que os lábios enrugados se moveram e ela abriu a boca, antes que viesse a murmurar algo, foi interceptada por mim. — Antes de contratar aquela garota, você deveria ter dito, quais são as regras — digo com um tom severo em minha voz. — Sempre fiz isso e ao longo desse um ano que se passou, foram inúmeras as babás que passaram por aqui, em contra partida, foi a Melinda quem sofreu as consequências por não receber os devidos cuidados — ela fez uma pausa como se estivesse buscando coragem para prosseguir, já que durante todo esses anos a mulher a minha frente jamais falou num tom semelhante ao que estava usando, totalmente indignada. — Eu sei o quan
No dia seguinte...ALICIA SCOTTENTRO NO MEU QUARTO, LIVRANDO-ME em seguida da minha mochila e acabo por lançar o meu corpo sobre a minha cama, as lágrimas ainda insistem em surgir sem o meu consentimento. Não que ainda seja pelas palavras duras que me atingiram ontem de uma forma que senti uma agitação intensa no meu peito, e fiquei totalmente sem rumo, no entanto, depois que aquele homem arrogante se foi, eu não consegui controlar e chorei tudo que me foi permitido. Embora Emília estivesse ali para me consolar e dizer o quanto eu era especial, principalmente para Melinda que em poucos dias havia mudado tanto, pois antes era somente gritos e tristeza que se via em um ser tão pequeno, pois hoje ela via aquele par de olhos azuis como oceano, brilhar intensamente. Aquilo acabou por me fazer deixar as lamentações de lado, pois, eu já havia passado por muita coisa nos últimos dias e não ia me deixar vencer por alguém que simplesmente vive cercado por amarguras do seu passado e insiste
ALICIA SCOTTERA SURREAL DEMAIS PARA SER VERDADE. O ser arrogante estava ali na porta da minha casa e de nada parecia com aquela figura majestosa que tem o ar de soberba, como se fosse o dono do mundo. Paralisada. Era assim que estava e acredito que nem o som provocado pelo barulho da chuva, era capaz de se sobressair ao som causado pelas fortes batidas do meu coração, e certamente, o homem a minha frente estava ouvindo. No entanto, o som das palavras que escaparam dos seus lábios só fez com que meu órgão interno ficasse ainda mais desenfreado e aquela angústia sentida antes aumentou assim como o medo cru dominou minha mente. — Alicia! Eu preciso de você "Meu Deus! Linda! Deus, não permita que nada de ruim tenha acontecido com a minha princesa!" Por alguns segundos fui tomada por um estado catatônico como se minha alma houvesse deixado o meu corpo, tentando me tele transportar magicamente para dentro daquela mansão. Todavia, fui arrancada daquele esta
ALICIA SCOTTESTOU MUITO SONOLENTA, NO ENTANTO, o cheiro que impregnou minhas narinas, deixou minha mente completamente enevoada.— Aaron! — exclamo. Atordoada perante aquela embriaguez e o estado de entorpecimento que ainda me encontrava, lutei para deixar a escuridão e voltar a minha lucidez, meus olhos se abriram e minha visão estava um tanto turva, pisquei algumas vezes tentando me acostumar com a pequena claridade. Quando voltei a mim, todo aquele devaneio não era mais que uma simples ilusão, meus olhos passeiam ao meu redor e além de nós duas, não havia ninguém dentro do quarto.Entretanto, aquele aroma continuava predominante no ar. Fecho os meus olhos e novamente fui consumida pelo breu total. Na manhã seguinte...Ainda estava inquieta com o que havia acontecido na noite anterior. As dúvidas me rondavam e acabei atribuindo tudo ao cansaço, desvio o olhar para Linda, que não para de se mexer, anunciando que logo vai despertar, colo