Capitulo Seis

Minutos depois...

ALICIA SCOTT

TODA FOME QUE ESTAVA SENTINDO SE esvaiu, fiquei tão ansiosa que liguei imediatamente para o número que havia no anúncio. Uma voz suave ecoou do outro lado da linha e eu fiquei satisfeita quando a senhora Emília falou que agendaria uma entrevista para hoje no horário da tarde. Sorridente, deixei a lanchonete e agora estou no quarto com a minha mãe, aproximo-me do seu leito e sento-me na cadeira perto da cama. Logo em seguida seguro uma de suas mãos, enquanto meus olhos ficam fixos nos seus, que embora estejam abertos, não demonstram nenhum sinal de vida. O médico disse que apesar de ela não reconhecer o que acontece ao seu redor, seria bom que eu conversasse com ela.

— A senhora é a pessoa mais forte e guerreira que eu conheço, sei que logo tudo isso vai passar, mas enquanto estiver aqui, eu vou dar o meu melhor. Depois da tempestade, finalmente mãe, hoje eu terei a chance de conseguir um bom emprego, daqui a algumas horas irei para uma entrevista e espero que tudo possa dar certo e apesar de estar precisando muito do dinheiro, quero acima de tudo cuidar muito bem dessa criança e ser merecedora do salário que vou receber.

Acaricio sua mão e as lembranças tomam tomar da minha mente, lembro-me do seu doce sorriso, dos seus olhos que sempre tinham um brilho intenso e principalmente de quando ela me abraçava.

— Sinto tanto a sua falta — digo e pisco várias vezes tentando reprimir algumas lágrimas, mas acabei não conseguindo. Todavia, continuei conversando com ela por longos minutos, mas assim que seus olhos se fecharam, dei um beijo em sua testa e com passos largos, deixei o quarto. Queria passar mais tempo com ela, porém, ainda precisava ir até a nossa casa, tomar um banho e trocar de roupa.

Horas depois...

Acabei vindo de táxi para não chegar atrasada. Minhas mãos estavam suadas e trêmulas de tanto nervosismo, paguei o motorista e ao sair do carro, fiquei parada em frente ao portão, olhando para a enorme mansão a minha frente, após me identificar, foi liberada a minha entrada e a cada passo que dava, eu ficava mais encantada.

O jardim era cheio de flores, havia muitas árvores frutíferas, e até um lago enorme com peixes e uma cascata. A mansão era belíssima e enorme, quando avistei a entrada principal, havia uma senhora parada em frente a porta, a qual acreditava ser a dona Emília, encurtei a distância e ao parar em sua frente, a cumprimentei.

— Boa tarde!

— Boa tarde! Acompanhe-me, por favor.

A segui e ao passar pela porta, se o lado externo era luxuoso, por dentro era esplendido. Os móveis brilhavam, os quadros na parede deveriam valer uma fortuna, a decoração era de ótimo gosto, continuei a seguindo e meu olhar ficou cravado no enorme quadro de uma mulher muito bonita, rodeada de flores, seus olhos eram azuis como o mar e sua beleza era estonteante. Continuo andando até que paramos em uma sala enorme, ela se sentou e pediu que eu me acomodasse também.

— Me conte um pouco sobre você, afinal, é tão jovem e como havia no anúncio, será preciso que a pessoa more aqui.

Nos momentos seguintes, contei um pouco sobre mim e o porquê estava precisando do emprego, porém, deixei claro que não estava ali somente pelo dinheiro e sim porque acredito que assim como iria me ajudar, eu faria o meu melhor para cuidar e proteger aquela que ficaria sobre a minha responsabilidade. Ela me contou que a mãe da garotinha havia falecido, por isso a exigência que a babá viesse a dormir no emprego.

— Eu gostei muito de você, e espe... — suas palavras se perderam quando ouvirmos um choro sofrido invadir o ambiente. — Chegou a hora de você conhecer o pequeno raio de luz.

Ela se levantou e eu fiz o mesmo, deixamos o ambiente, atravessamos um longo corredor e paramos em frente a uma porta branca que foi aberta rapidamente, pois o barulho era alto. Uma mulher estava com a garotinha nos braços tentando fazer com ela se aclamasse, mas esta chorava ainda mais alto, porém, quando a senhora Emília se aproximou, ela percebeu e estendeu os bracinhos para ela, entretanto, antes que ela a pegasse, a garotinha moveu a cabeça em minha direção e naquele momento senti uma sensação indescritível tomar conta de mim por inteira, não era somente um raio de luz, era o mais lindo anjo que já tinha visto em minha existência.

O silêncio predominou no ambiente e minhas pernas ganharam vida própria, pois me movi rapidamente na direção dela e quando tentei pegá-la, ela não hesitou e se atirou em meus braços. Não conseguia explicar o misto de sentimentos que pairou sobre mim, só fiquei ali, abraçando-a e quando a afastei um pouco, uma de suas mãozinhas começou a deslizar pelo meu rosto, acariciando a minha bochecha do lado direito, aquilo era tão bom.

— Pelo visto não foi só eu quem gostou de você. Nunca tinha a visto ficar tão quietinha assim.

Esboço um sorriso, porque a sensação que eu tinha era de que já conhecia aquela garotinha há muito tempo e o meu coração estava transbordando de tanta alegria.

— Vou deixar vocês duas um pouco sozinhas e providenciar o lanche da Melinda.

As duas mulheres se retiraram e ao ficar sozinha, eu disse em voz alta o nome dela.

— Melinda, você é linda como o seu nome.

De repente ela começou a choramingar, como se algo a tivesse incomodando, um pensamento passou rapidamente pela minha cabeça e ao deitá-la sobre a cama, percebi que sua fralda estava cheia. A levanto e vou procurar por fraldas limpas e alguns utensílios que precisaria para trocá-la, feito isso, voltei e a coloquei deitada, ao tirar sua fralda, fiquei estarrecida, sua virilha estava avermelhada e áspera. Isso certamente era o motivo de ela estar tão inquieta, cuidadosamente peguei a garrafinha que tinha água morna e molhei um pedaço de algodão e passei lentamente para tirar o excesso do xixi, depois que ela estava limpa, acabei optando por não usar uma fralda descartável e só coloquei uma calcinha por debaixo do vestido. Instantes depois, já arrumada, resolvo ir atrás da dona Emília para ver se o lanche dela já estava pronto e aproveitando que era cinco da tarde, seria bom ela tomar um pouco de sol.

Era estranho que em uma casa tão grande, o quarto dela ficasse no primeiro andar, quando cheguei à sala, olhei para o quadro da mulher e percebi o quanto elas se pareciam, voltei a andar e ao chegar em outro ambiente, encontrei a senhora Emília.

— Já ia ao encontro de vocês duas.

Seguimos para a cozinha e lá comecei a dar o lanche da Linda, enquanto isso, aproveitei para comentar sobre as assaduras.

— Eu já havia percebido, até já tratei pessoalmente, mas com um entra e sai de babás, a Melinda é quem tem sofrido mais, por mais que eu sempre estivesse aqui, nem sempre podia estar de olho o tempo todo para ver se estavam cuidando direito dela.

Trocamos mais algumas palavras e quando a pequena terminou de comer tudo, limpei a sua boquinha, dei água e aproveitei para irmos ao jardim, peguei uma bola e ao jogar no chão, ela logo quis sair do meu braço, embora seus passinhos fossem bem lentos, a sapeca pegava a bola e me entregava. Ficamos por um bom tempo brincando e quando a escuridão já queria tomar conta da noite, entramos e fui dar banho nela.

Minutos depois, deixei Melinda com a dona Emília e esta pediu ao motorista que me trouxesse em casa para que eu pudesse pegar algumas roupas, no sábado será a minha folga, além de visitar a minha mãe, irei aproveitar para fazer uma faxina na casa.

Em meio aos últimos acontecimentos, eu estava feliz por conhecer o pequeno raio de luz. estar com Melinda me traz uma sensação tão boa, que não existem palavras suficientes para descrever tudo que senti.

AARON BITENCOURT

O dia de hoje não foi muito diferente daqueles que tenho vivido. Reunião atrás de reunião, o que acabou por fazer parte das longas horas que passo dentro da empresa, hoje foi só mais um dia cansativo, mas não podia me descuidar, já que os abutres vivem a espreita, esperando o momento certo para atacar.

Olhei para o relógio em meu pulso, já era quase 22h00min., meu motorista mantinha toda sua atenção na estrada, enquanto eu aproveitei cada segundo de paz que estava tendo dentro do veículo, pois aquela criança chorava tanto, que nem estando no andar de cima, estava livre do barulho infernal que atingia os meus tímpanos, me causando um ódio descomunal.

Fiquei ali de olhos fechados, acabei cochilando e quando dei por mim, o carro já havia parado e a voz do homem me arrancou do meu sossego. Peguei a minha pasta e saí do automóvel, ao entrar, fiquei intrigado, pois a calmaria reinava no ambiente, olhei para os lados e não havia ninguém, dei alguns passos e assim que ia subir a escada, a imagem que surgiu em frente, na porta, me deixou paralisado. Imediatamente senti uma corrente de eletricidade percorrendo meu corpo. Um arder em minha pele, como se estivesse me queimando aos poucos. Minha respiração ficou acelerada, meu coração batia descompassado. O rosto da desconhecida parecia ter sido entalhado em mármore raro, lábios carnudos e a sua pele era branca como porcelana, fazendo um belíssimo contraste com seus deslumbrantes, olhos verdes, oliva. Desviei o olhar do seu rosto e olhei para o objeto em sua mão e a calmaria foi interrompida por mim, já que ela estava estática.

— Quem é você? — soei rude e sei disso, com a voz trêmula, ela enfim quebrou o voto de silêncio.

— Eu sou a nova babá da Linda.

Linda! A infeliz já havia dado até um apelido carinhoso para aquela criança, quando eu estava prestes a falar novamente, Emília surgiu no cômodo.

— Você pode ir Alicia.

A garota que parecia estar com os pés grudados no chão, se libertou e saiu apressadamente do ambiente.

— Ela não é muita nova para ser babá? — questiono.

— Apesar de ser jovem, ela é muito dedicada e Melinda gostou dela, porque desde então não chorou.

As últimas palavras me deixaram satisfeito.

— Espero que essa não seja mais uma incompetente que logo queira colocar suas garras de fora.

— Pelo que observei, ela é a pessoa que precisava para cuidar da pequena.

— Pode ir dormir — falei dando o assunto por encerrado.

Emília, com um giro nos calcanhares, caminhou para bem longe, em vez de subir os degraus, dei alguns passos para trás e fiquei parado, olhando para o quadro fixado na parede.

“Marina! Meu único e verdadeiro amor.”

Eu não sei quanto tempo se passou, meus olhos continuavam fixos naquela direção, quando tudo começou a ficar turvo, a imagem parecia que estava se movendo e de repente, o rosto daquela que havia visto minutos atrás, surgiu na tela e as palavras escaparam do fundo da minha garganta.

"Que diabos está acontecendo comigo?"

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