— O que você quer, Rebeca? Estou ocupado.Rebeca. O nome ressoou na mente de Rosa. Era óbvio que ela não estava ali apenas como uma visitante comum. Havia algo na maneira como Rebeca se comportava, o ar de familiaridade, a intimidade forçada, que indicava uma história com Ricardo, algo que ele claramente não estava disposto a discutir.Rebeca entrou no escritório como se fosse dona do lugar, sua postura confiante e os saltos estalando no chão de mármore. Ela ignorou a pergunta de Ricardo por um instante e se virou para Rosa, o sorriso presunçoso ainda colado em seu rosto.— Oh, eu só estava passando para ver como você está. — Rebeca se aproximou com passos lentos e calculados. Ela parou ao lado da mesa de Ricardo, os olhos agora focados em Rosa. — E para conhecer sua nova "aquisição". Parece tão... jovem e inexperiente. Ela tem alguma chance de durar aqui, Ricardo? — O tom de voz dela era venenoso, cheio de desdém.A situação já era desconfortável o suficiente, e a última coisa que Ro
Faltavam apenas quinze minutos para o fim do expediente, e ela mal podia esperar para sair daquele escritório sufocante. Arrumou seus pertences, organizou os papéis em ordem e apagou as luzes. Ela fechou a porta com cuidado e caminhou em direção ao elevador. Quando as portas se abriram, seu coração deu um salto ao encontrar Ricardo ali, envolvido em uma conversa no telefone. Ele estava com o semblante sério, como de costume, discutindo algo sobre um encontro após o expediente. A presença dele tornava o ar mais pesado, e Rosa, sem jeito, evitou ao máximo olhar diretamente para ele.“Sim, eu estarei lá. Não se preocupe. Vou chegar a tempo,” - Ricardo disse ao telefone, sem sequer notar Rosa à primeira vista. Ele parecia alheio ao desconforto dela, focado em seus planos. As portas do elevador se fecharam, e o silêncio entre os dois foi constrangedor.— Você veio de bicicleta? — ele perguntou, com um tom de deboche ao ver Rosa indo em direção à sua bicicleta trancada com um cadeado no pos
A noite do jantar finalmente chegou, e o nervosismo de Rosa crescia conforme o carro se aproximava da mansão. Sabia que estaria cercada por pessoas importantes, e mesmo que estivesse vestida como uma dama, sentia-se fora do lugar. O táxi, pago pela empresa, quando parou em frente à propriedade, ela não pôde deixar de ficar deslumbrada. A mansão era imensa, com detalhes arquitetônicos luxuosos e um jardim magnificamente iluminado, repleto de flores que sua mãe adoraria ver."Que lugar..." — ela pensou, admirando a grandiosidade do cenário à sua volta. Cada passo que dava pelo caminho de pedras a levava para mais perto daquele mundo que não era o seu.De repente, seu telefone tocou, quebrando a calma daquele momento. Era Ricardo.— Boa noite, senhor Trajano. — Ela atendeu.— Já cheguei. Onde você está? — Ele ignorou o cumprimento de Rosa, soando impaciente.— Estou no jardim. Onde o senhor está? Vou até você. — Ela respondeu.— Também estou no jardim. Por que não a vejo? — Ele estava vi
Ela estava atrasada. De novo. — Droga! — sussurrou, enquanto enfiava os pés nos sapatos molhados que havia deixado na entrada de casa. Quando finalmente chegou ao portão de ferro da mansão dos Trajanos, Rosa já estava completamente molhada. O vento e a chuva haviam transformado seu coque em uma confusão de fios que caíam sobre seu rosto. Suas roupas coladas ao corpo, e seus pés encharcados, pareciam esponjas. “Por que estou atrasada mesmo? Ah, claro, o despertador não tocou, a conta de energia estava atrasada, e a luz foi cortada na noite anterior. ...” – ela pensava. Ao colocar sua bicicleta no canto do jardim lateral, Rosa correu para a porta de serviço. Não queria ser vista pela senhora Trajano naquele estado miserável, mas seu plano foi destruído assim que ouviu uma voz cortante ecoar do alto da escadaria. — Está atrasada, de novo! — A senhora Trajano apareceu, como sempre, com o olhar cheio de desdém. Vestida com seu roupão de seda caro, seus cabelos brancos perfeitamente ar
Rosa saiu da casa dos Trajanos sentindo o peso do dinheiro suado no bolso. Agora, já final de tarde, Rosa subiu na bicicleta, e começou a pedalar, ainda garoava, ela se sentia exausta.Enquanto pedalava ladeira abaixo, algo chamou sua atenção. De longe, os faróis de um caminhão brilhavam intensamente, ofuscando sua visão. Assustada, ela perdeu o controle e escorregou numa poça de lama, caindo bruscamente no chão. A bicicleta foi arremessada para o lado, e Rosa sentiu uma forte dor no joelho. — Droga! — foi a única coisa que conseguiu murmurar antes de sentir o impacto. Enquanto tentava se recompor, um carro luxuoso parou ao seu lado. O motorista buzinava incessantemente, claramente impaciente. O motorista, irritado, começou a fazer gestos com as mãos, claramente frustrado por não conseguir passar por causa da bicicleta, e de Rosa caída no asfalto. — Você foi atropelada ou está só deitada aí de graça, atrapalhando o tráfego? — Eu... O homem, revirando os olhos, pegou o celular e
Rosa finalmente avistou sua casinha. Era uma casa simples, feita de madeira, como aquelas de interior, mas na cidade. O quintal era grande, com canteiros onde sua mãe plantava algumas hortaliças e flores, e uma pequena horta nos fundos. Rosa desceu da bicicleta com cuidado, tentando não agravar os ferimentos, e empurrou a velha porta de madeira que rangeu ao abrir. O cheiro da comidinha que sua mãe havia feito, tomou conta de suas narinas. Sua mãe, mesmo doente, sempre fazia questão de deixar algo preparado. Dentro da casa, tudo era muito simples. O piso era de tábuas gastas, as cortinas eram feitas à mão por sua mãe, e o pouco que tinham de móveis era antigo. Na cozinha, tinha um fogão à lenha e uma mesa de madeira, já arrumada para o jantar. Ao lado, uma poltrona onde sua mãe costumava sentar, com uma colcha de retalhos por cima. Ao entrar, Rosa ouviu o som da voz fraca de sua mãe, chamando com preocupação: — Filha, é você? Ela seguiu o som até o quarto, onde a mãe estava deita
Após Ricardo subir as escadas, Rosa respirou fundo, aliviada por ele ter saído. Voltou a trabalhar, focando em terminar logo o serviço e sair dali, mas, antes que pudesse terminar, ouviu uma batida suave na porta. Rosa foi atender. Quando abriu, deu de cara com um homem de terno elegante, segurando um envelope nas mãos.— Boa tarde, senhorita Rosa? — ele perguntou, com um sorriso formal.— Sim, sou eu. O que deseja? — Rosa respondeu, confusa.— Tenho aqui uma correspondência urgente para você — disse ele, entregando-lhe o envelope.Rosa franziu a testa, sem entender do que se tratava. Ela abriu o envelope com cuidado e, ao ler o conteúdo, sentiu o coração disparar. Era uma convocação judicial.— O que... o que é isso? — perguntou, sentindo as mãos tremerem.— É melhor você ler com calma — respondeu o homem, já se afastando. — Apenas cumpro meu dever.Rosa ficou parada ali, com o envelope nas mãos, sem saber o que pensar. Justo quando ela começava a se sentir mais leve, uma nova tempes
[...]Rosa chegou em casa e suspirou profundamente, sentindo o peso da decisão crescer em seu peito. A oferta era tentadora em um sentido prático, mas o que isso significaria para sua liberdade, sua dignidade, sua mãe? A dívida era enorme, e a ameaça de perder a casa pairava como uma sombra sobre ela.Rosa precisava falar com sua mãe. Caminhou até o quarto da mãe, quando abriu a porta, encontrou Dona Cida deitada, a respiração fraca, mas serena. — Mãe? — chamou suavemente, se aproximando da cama.— Rosa, minha filha... — disse ela, com a voz suave, mas cheia de carinho. — Está tudo bem?Rosa mordeu o lábio, hesitante em contar à mãe o que estava acontecendo.— Nada não... mãezinha, só queria ver como a senhora estava, e dar boa noite. — Rosa não teve coragem de preocupar a mãe, nesse momento parecia que ela já tinha a resposta.— Oh, minha filha, estou bem. — Dona Cida piscou lentamente, absorvendo as palavras da filha. Ela segurou a mão de Rosa e a apertou com a pouca força que rest