DavidEu acordo com um humor digno de abrir uma guerra. O sol que atravessa as cortinas me irrita mais do que deveria, e o silêncio da casa parece zombar da tempestade que carrego dentro de mim. Depois de uma noite mal dormida, com memórias e dúvidas me corroendo, a única coisa que consigo fazer é levantar e tentar me recompor.Entro no banheiro e tomo uma ducha longa, tentando lavar não só o corpo, mas também os pensamentos que parecem grudados em mim como uma segunda pele. Quando saio, com a toalha amarrada na cintura, me encaro no espelho enquanto escovo os dentes. Meu reflexo me devolve um olhar vazio, um azul tão escuro que nem parece o meu. Não gosto do que vejo.Ao voltar para o quarto, sinto gotas escorrendo pelo meu peito, mas antes que eu tenha tempo de me vestir, minha mãe invade o cômodo sem bater. Respiro fundo para não mandar uma resposta atravessada e me viro para encará-la. Ela não se importa, se joga na minha cama e bate no colchão ao lado, indicando que quer conversa
DavidO silêncio que preenche o carro enquanto sigo para a sede da máfia, a logística La Russa, é quase tão denso quanto os pensamentos que me atormentam. O motor ronca suavemente, e a cidade ao meu redor parece um borrão sem importância. Hoje, a tensão no ar é palpável, quase sufocante. Uma jovem, uma filha de traidor, está sob nosso domínio, e o futuro dela está em nossas mãos. Assim que chego, os homens da segurança me reconhecem e abrem os portões. Eles acenam com respeito, como sempre, mas meu humor está sombrio demais para retribuir. Subo as escadas com passos firmes até o escritório principal. A porta já está aberta, e o Don, meu pai, está sentado em seu lugar de sempre, com a autoridade estampada em cada linha de seu rosto.Darlan já está lá, encostado em uma das janelas, mexendo no celular com a expressão fechada. Ele me encara por um segundo quando entro, mas não diz nada. Eu me sento em frente à mesa do Don, observando-o. É inevitável pensar que, em breve, este lugar será
LizandraÉ estranho como um simples perfume pode ficar impregnado na alma. David foi embora há poucos minutos, mas o cheiro dele ainda está aqui, misturado com o ar tenso da sala, como se ele tivesse deixado um pedaço de si para me atormentar. Eu sinto sua ausência como se fosse algo físico, mas antes que eu possa processar qualquer coisa, a voz do meu pai corta o silêncio como um raio em meio à calmaria.Mal tenho tempo de processar a ausência quando percebo o olhar perdido de Daniel Malta. Ele está ali, mas parece querer evaporar, completamente deslocado, até que balbucia algo como uma despedida e sai rápido, deixando-me sozinha com meu pai. Só que algo me diz que a verdadeira tempestade ainda está por vir.— Lizandra, entre. Agora. — Seu tom é uma faca, afiada e pronta para cortar.Minha primeira reação é de defesa, mas obedeço. Não porque estou intimidada, mas porque sei que isso vai irritá-lo ainda mais. Dante Hurst, o meu pai, está prestes a explodir, e eu... estou pronta para e
David Pode ter gatilho!O poder tem cheiro. Cheiro de pólvora, sangue e terra molhada. Ele pulsa como uma força viva, carrega um peso que só aqueles que o possuem entendem. Desde cedo, aprendi que ser poderoso não é apenas impor respeito, é também inspirar medo. Esse é o legado dos Lambertini. É o que meu pai, Don Vittorio, me ensinou.Meu pai não é apenas o chefe da máfia argentina. Ele é uma lenda, uma força bruta, um homem cuja presença é capaz de silenciar qualquer ambiente. Desde que assumiu o comando, após a morte brutal do meu avô, Don Vittorio governa com punhos de ferro e um coração de pedra. Mas no lar, ele é um homem diferente. Um pai amoroso. É como se houvesse dois homens em um: o mafioso cruel e o pai dedicado.Quando criança, eu não entendia como essas duas versões coexistiam. Até o dia em que ele me apresentou ao lado mais sombrio do nosso mundo. Foi a primeira vez que vi o Don em ação. E foi a primeira vez que percebi que, para sobreviver nesse mundo, é preciso ser im
DavidO desejo pode ser uma maldição. No instante em que vejo Lizandra atravessar o campus, a minha respiração falha. O mundo ao meu redor se dissolve, e tudo o que resta sou eu e a mulher que me atormenta noite após noite. Eu a quero de uma forma que beira o irracional. E o pior? Ela ainda não faz ideia do que sou capaz para tê-la.— David? — a voz de Vilma me chama de volta à realidade.Desvio o olhar de Lizandra e encaro Vilma, que fala alguma coisa sobre um evento da faculdade. Não me importo. Meu foco está todo na garota de olhos azuis brilhantes que se aproxima, completamente alheia ao que provoca em mim.Quando Lizandra finalmente chega, sorrindo, eu marco território sem hesitação. Seguro sua cintura e a puxo contra mim, selando nossos lábios em um beijo firme, possessivo. Sinto o leve sobressalto dela antes de ceder ao meu toque. Vilma pigarreia desconfortável ao nosso lado, mas eu não poderia me importar menos. Quando me afasto, um sorriso de satisfação se espalha pelo meu ros
DarlanAs chaves do quarto dela pesam no meu bolso como se carregassem muito mais do que o metal. Cada passo que dou pelo corredor parece ecoar no vazio, e meu coração bate num ritmo estranho, incomum. Silvia Caruso. Essa garota não devia significar nada para mim. Ela é só mais uma peça no tabuleiro da máfia, um problema a ser resolvido. Mas algo nela me deixa em alerta. Não é apenas o fato de ser linda, nem a tragédia que caiu sobre ela. É algo mais profundo. Algo que me faz querer protegê-la, mesmo sabendo que não deveria.Chego na porta e respiro fundo. Bato duas vezes antes de destrancar. Quando a porta se abre, o cheiro doce e fresco invade meus sentidos. Lá está ela, sentada na beira da cama, os olhos inchados de tanto chorar, mas, ainda assim, deslumbrante. Uma trança delicada pende sobre o ombro, e a camisetinha branca molda cada curva dos seus sei0s, enquanto a saia apertada destaca suas pernas. É um absurdo o quanto essa garota é linda. Putta que pariu, Darlan, controle-se.
DavidSentar à mesa com minha família é um ritual que jamais deixamos de lado, por mais atarefada que seja a rotina. Não é apenas um almoço, é o momento em que a máscara de empresários e mafiosos cai, mesmo que só por uma hora. Aqui, dentro das paredes da mansão Lambertini, somos apenas uma família. Ou algo que se aproxima disso.Mamãe, Liana, está à cabeceira da mesa, como sempre, equilibrando a figura de esposa submissa e matriarca imponente. Quem a vê fora daqui, respondendo apenas quando papai, Don Vittorio, lhe dirige a palavra, um passo atrás dele, jamais imaginaria o furacão que ela se torna dentro de casa. Mas aqui, no nosso mundo particular, ela é quem dita as regras. E ninguém ousa contrariá-la.À mesa, as gêmeas, Alice e Alícia, estão em um duelo silencioso para ver quem consegue fazer menos barulho com os talheres. Darlan, meu irmão, está ao meu lado, atento ao que será discutido depois. Papai, à outra cabeceira, saboreia cada garfada como se tivesse todo o tempo do mundo
Dois meses depois DavidO tédio dessa aula é uma tortura que nem mesmo o pior dos meus inimigos mereceria. Estou preso nesse inferno acadêmico, rodeado por cabeças balançando em falso interesse e vozes que soam como um zumbido interminável. Sinto meu sangue ferver com cada segundo perdido aqui, e minha mente insiste em vagar até Lizandra. Cada detalhe dela invade meus pensamentos, sua risada suave, o jeito como desvia o olhar quando está nervosa, e, claro, o calor incontrolável que ela desperta em mim. Eu não sou um homem paciente, e essa espera está me destruindo.Finalmente, o professor declara o fim da aula, e um suspiro coletivo de alívio ecoa pela sala. Estou quase alcançando a porta quando Vilma, uma colega de classe, se aproxima com um sorriso malicioso que conheço bem demais.— David, pode me dar uma carona? — ela pergunta, mordendo o lábio inferior, como se isso fosse algum tipo de convite irresistível.Não vejo como negar sem parecer rude, então apenas assinto com a cabeça.