Eu a amo

Daniel Malta

A vida tem um senso de humor peculiar. Aqui estou, com o coração batendo mais rápido do que deveria, enquanto observo Lizandra rir. Ela faz isso de um jeito tão natural, mexendo nos cabelos como quem não percebe o impacto que causa. O mundo parece desacelerar ao seu redor, mas, para mim, ele só gira mais rápido, como se cada movimento dela fosse uma força centrípeta puxando tudo para o centro do meu universo.

— Daniel, você está me ouvindo ou está no seu mundo de novo? — ela pergunta, com aquele tom meio divertido, meio inquisidor.

— Claro que estou — minto, tentando parecer natural, mas sei que ela não acredita.

Lizandra é assim, cheia de luz e tão simples, mas ao mesmo tempo uma tempestade que deixa tudo ao redor mais vivo, mais caótico. Somos amigos desde sempre. Dividimos aniversários, memórias, sonhos e, no meu caso, um amor que nunca ousei confessar.

Eu a amo. Amo de um jeito que parece ser parte de quem sou, algo gravado no fundo da minha existência. Mas Lizandra não me vê assim. Para ela, sou apenas o Daniel, o amigo que sempre esteve por perto, o garoto que conhece todos os seus segredos e preferências. O problema é que ela não conhece o maior deles, o fato de que, para mim, ela é tudo.

— Está pensando em quê? — ela insiste, com aquele olhar que parece atravessar a minha alma.

— Em nada importante. — respondo, desviando o olhar para o chão.

A verdade é que penso nela o tempo todo. Em cada sorriso, cada gesto, cada conversa. E, mesmo quando não estamos juntos, Lizandra está presente. Nos momentos mais íntimos que tenho com outras mulheres, momentos que eu deveria dedicar a alguém que está comigo ali, de corpo e alma, é Lizandra quem aparece. É o rosto dela que vejo, o sorriso dela que imagino, quando me entrego ao prazer. Um tipo de ironia cruel, como se o universo estivesse determinado a me lembrar de que o que mais quero é o que nunca poderei ter.

Meus pais, Luan  e Júlia Malta, sempre foram o alicerce da minha vida, mas o meu tio Allan e sua esposa, Dorothy, também ocupam um espaço enorme no meu coração. Eles não puderam ter filhos, e eu acabei me tornando um para eles. Cresci entre duas casas, duas famílias, sempre cercado de amor e apoio. Meu tio, senador Allan, é um homem sério, mas de coração enorme. Dorothy, com seu jeito acolhedor, é o equilíbrio perfeito para ele. Lizandra e eu passamos tanto tempo na casa deles que às vezes parece que eles são nossos segundos pais.

— Quando vamos ver o tio Allan e a tia Dorothy? — pergunto a Lizandra enquanto caminhamos pela rua.

— Hoje à noite, claro. Você acha que eu perderia o jantar deles? — Ela sorri, e meu coração se aquece.

Lizandra e eu temos esse ritual. Todos os dias, depois da faculdade, vamos juntos à casa dos meus tios. Eles nos tratam como verdadeiros filhos, e sei que, no fundo, eles desejam que Lizandra e eu acabemos juntos. Mas o que eles não entendem é que esse futuro depende apenas dela, não de mim.

Lizandra é prática, focada, e tem uma visão de mundo que a mantém distante de qualquer tipo de romance. Ela já deixou claro que não sente atração, que não vê sentido em se apressar para seguir o que a sociedade espera. Eu admiro isso nela, mas também é o que me destrói.

Minha paixão por animais é algo que compartilho com ela. Ambos estamos cursando Medicina Veterinária, e sonhamos em trabalhar juntos. Mas meu sonho vai além. Quero a miha fazenda, o meu refúgio.

Enquanto caminhamos, ela olha para mim, os olhos brilhando com uma curiosidade que nunca consigo decifrar completamente.

— Daniel, você acredita que tudo acontece por um motivo? — ela pergunta, o tom mais sério do que o habitual.

— Talvez — respondo, encarando o céu, como se as estrelas pudessem me dar a resposta.

— Sabe, às vezes eu sinto que tem algo bem na minha frente, mas eu não consigo ver o que é.

Minha garganta aperta. Queria dizer que sou eu. Que estou aqui, esperando que ela me veja de verdade. Mas não digo nada. Apenas sorrio de leve e murmuro:

— Quem sabe um dia você descubra.

Ela sorri de volta, aquele sorriso que parece inocente, mas que para mim carrega um peso que ela nunca entenderá.

Enquanto a acompanho até sua casa, um pensamento me invade, como uma sombra que não consigo afastar. E se ela nunca me enxergar? E se eu passar a vida inteira esperando por algo que nunca vai acontecer?

Mas, no fundo, ainda há uma esperança. Uma faísca mínima, mas suficiente para me manter aqui, ao lado dela, esperando pelo dia em que Lizandra finalmente perceba que meu amor sempre esteve ali. E, até lá, continuo fingindo que posso viver com menos do que realmente quero.

Continue lendo no Buenovela
Digitalize o código para baixar o App

Capítulos relacionados

Último capítulo

Digitalize o código para ler no App