Patrícia abaixou a cabeça e examinou o papel branco em suas mãos, onde estava anotado o endereço de um cemitério.
Teria a irmã dele falecido? Mas qual seria a ligação entre a morte da irmã dele e seu próprio pai? Patrícia conhecia João o suficiente para saber que ele jamais faria mal a uma menininha.
Percebendo que não obteria muitas respostas dos dois, Patrícia não insistiu mais, seguindo em silêncio até a Mansão dos Amaral. Ao retornar a esse lugar familiar, um turbilhão de emoções invadiu Patrícia.
Educadamente, Gabriel indagou:
- A senhora vai descer?
- Não, não é necessário. Vou esperar por ele aqui.
Sua última interação com Teófilo resumiu-se ao divórcio. Ela não desejava criar mais complicações, especialmente porque cada centímetro daquele lugar carregava memórias dela com ele. Evocar essas lembranças poderia despertar sentimentos profundos que ela preferia evitar.
Se alguém merecesse culpa, era o homem que costumava fazê-la derreter com suas palavras e desvanecer em seus abraços.
Mesmo agora, distante e frio como estava, Patrícia ainda mantinha vivas as lembranças dos momentos bons.
Mesmo ele sendo extremamente odiável, ela ainda não conseguia se forçar a odiá-lo.
O carro continuava ligado, proporcionando um calor constante. No interior vazio, era apenas Patrícia. Seu estômago doeu novamente, e ela se encolheu em uma posição fetal, abraçando seus joelhos como se fosse um camarãozinho encolhido no assento, aguardando a aurora do dia.
No inverno, a noite caía cedo e a manhã demorava a clarear. Apesar de passarem das sete horas, o céu permanecia envolto em neblina, ainda longe de estar completamente iluminado.
As folhas de nogueiras no jardim tinham caído havia muito tempo, e seus pensamentos flutuavam para o passado.
Na estação em que os frutos amadureciam, ela costumava desejar um bolo de nozes de nogueira. Teófilo subia na nogueira que se erguia a mais de dez metros no jardim e sacudia os galhos para que os frutos caíssem.
As folhas verdes e amarelas flutuavam delicadamente, como uma chuva dourada para ela.
Naquela época, Teófilo era acessível, um cozinheiro talentoso e a mimava sem limites.
Enquanto divagava, Patrícia percebeu que estava sozinha debaixo da árvore. A nogueira ainda estava ali, mas tudo havia mudado.
Uma folha solitária caiu, deixando apenas algumas folhas secas penduradas nos galhos, prestes a cair, assim como a relação instável entre ela e Teófilo.
Teófilo saiu da mansão e deparou-se com essa cena. Uma jovem com uma blusa de malha fina olhava para cima, os cabelos sendo acariciados pelo vento frio.
O clima, que nos últimos dias estava ruim, havia se transformado em um dia bonito, e os primeiros raios de sol da manhã iluminavam seu rosto, realçando sua pele quase translúcida, como a de uma deusa que estava prestes a desaparecer.
Uma bandagem ainda envolvia sua mão, e ela ainda vestia as roupas da noite anterior, com um ar de cansaço.
- Teófilo. - Ela não se virou, mas percebeu sua presença.
Teófilo apenas grunhiu em confirmação.
Patrícia se virou lentamente, seus olhos encontrando os dele. Apesar da proximidade física, algo os separava, como se uma distância intransponível os dividisse.
- Eu gostaria de comer aquele bolo de nozes que você costumava fazer.
Um lampejo de surpresa cruzou os olhos escuros de Teófilo por um momento, mas logo em seguida ele respondeu com indiferença:
- A temporada de nozes já passou, Patrícia. Não adianta se lamentar.
Os olhos dela ficaram úmidos, e ela murmurou:
- Pelo menos, antes do divórcio, você poderia realizar esse último desejo meu, não acha?
Três meses sem se verem, ela parecia diferente.
Ele virou o rosto, observando a árvore desprovida de folhas, sua voz perdendo parte da frieza:
- Os frutos congelados do ano passado já não tem o mesmo sabor. Se quiser, espere pelos frutos do próximo ano.
O próximo ano...
Patrícia tocou a casca áspera da árvore, incerta se chegaria até lá.
- Teófilo, você me odeia tanto assim?
Um aceno leve da cabeça foi a resposta dele.
Ela olhou para ele com ternura:
- Então... Você ficaria feliz se eu morresse?
Boom!
As palavras de Patrícia caíram como um trovão em seu coração. Teófilo sentiu um estrondo de emoções em sua mente, momentaneamente perdendo a compostura.
Após um instante, ele se recompôs e respondeu com frieza:
- Bem, é apenas um bolo, entre.
Patrícia o observou se afastar, um leve sorriso brincando em seus lábios.
"Teófilo, será que ainda tem medo da minha morte?"
Um pensamento malicioso brotou em sua mente. Ela se pegou imaginando como seria a expressão dele se um dia descobrisse sobre sua morte.
Ficaria feliz ou triste?
Dentro da mansão, Teófilo retirou os ingredientes da geladeira, ágil em suas ações para descongelá-los. Enquanto o observava trabalhar, uma agonia incessante a consumia. Essa seria provavelmente a última vez que ele prepararia algo para ela.
E, bem, talvez fosse melhor assim. Pelo menos ficaria com uma lembrança.
Patrícia assou batata-doce diante da lareira, o aroma delicioso enchendo o ambiente. Nos invernos passados, esse cheiro costumava atrair a Sra. Clara até ela. A Sra. Clara costumava tratá-la como uma neta de verdade.
Mas, infelizmente, a Sra. Clara faleceu nos últimos dois anos, e o Sr. Ricardo, para escapar da constante tristeza, se mudou para o exterior. A Mansão dos Amaral, que costumava ser acolhedora, agora era fria e vazia. A batata-doce assada ainda era deliciosa, mas sem a Sra. Clara para disputá-la com ela, tudo parecia sem vida.
Após saborear a batata-doce e beber água morna, a dor em seu estômago diminuiu um pouco.
Quando o aroma da cozinha chegou até ela, Patrícia se levantou e viu Teófilo colocando metade do bolo em uma caixa térmica e a outra metade em um prato.
Em algum momento, aquele que costumava girar em torno dela não era mais exclusivamente seu. Ela havia usado as lembranças felizes para evitar encarar a realidade.
- O bolo está pronto. – Disse Teófilo. A melancolia dela escapou à percepção dele.
- Obrigada. - Ela olhou para o prato com o bolo, deliciosamente perfumado, suas cores e aromas perfeitos como sempre, mas seu apetite era nulo. - Não temos muito tempo, precisamos ir ao cartório.
A testa franzida de Teófilo sugeria alguma irritação:
- Não vai comer?
- Não estou com fome.
Ela costumava ser teimosa, e ele sabia ser paciente. Agora, ele apenas a olhou por um momento, jogou o bolo inteiro no lixo e passou por ela sem expressão.
- Vamos.
Ele entregou a caixa térmica a Gabriel, ordenando:
- Leve isso para a Vila Montanha Dourada.
- Sim, Sr. Teófilo.
Naquele instante, Patrícia compreendeu que não havia retorno entre eles. Um ano de resistência parecia uma piada. Ela caminhou rapidamente em direção ao carro, passando pela nogueira. Uma rajada de vento frio passou, fazendo as últimas folhas cederem.
Ela estendeu a mão, apanhou uma das folhas sem vida e murmurou:
- Por que continuar a lutar?
Deixando a folha cair casualmente e esmagando-a sob o pé, as frágeis partes se desfizeram.
A porta do carro se fechou. Apesar do aquecedor, os dois sentados separadamente irradiavam um frio que parecia anunciar o fim do mundo.
A viagem até o cartório foi silenciosa, sem congestionamentos, todos os semáforos se abrindo para eles. Era como se o próprio universo facilitasse o divórcio.
Ao virar a esquina, eles alcançaram o destino. O telefone de Teófilo tocou, e a voz ansiosa de Mariana veio do outro lado:
- Teófilo, o Diego está com febre alta. Eu não queria incomodar, mas a febre dele chegou a 39 graus. Estou com tanto medo. Venha logo...
- Estou indo imediatamente.
Teófilo desligou o telefone e se deparou com os olhos vermelhos de Patrícia, carregados de ressentimento. Ela perguntou, cada palavra carregada de significado:
- Qual é o nome daquela criança?