Por Zuldrax
Mais de um mês se passou, e a 'tão importante' missão continuava sem nenhum progresso. Desesperado, Alister convocou sua guarda pessoal para acompanhá-lo em uma jornada. Vislumbrei seu rosto determinado. Aquele reizinho queria ir para Salis, o terceiro grande reino de nosso mundo. Para nós, eles não fediam nem cheiravam. Tratava-se de um povo simples, sem capacidades especiais, cujo intelecto era seu único orgulho. Não queriam guerras e não se metiam nos nossos assuntos.
Desenvolviam-se em busca do progresso e da ciência. Sua neutralidade me deixava enjoado, mas não os odiava e, portanto, não via motivos para caçar briga em seu território. Eles tratavam de forma cortês qualquer um que pisasse em seu reino e, justamente por isso, nem os halisianos nem os zafisianos os visitavam. Não queriam correr o risco de se encontrarem e gerarem tumulto no meio daquela gente.
O fato de Alister estar indo para lá só poderia significar que ele estava realmente desesperado. Isso me alegrava. Em uma das conversas que teve com Haigar, seu “fiel” amigo e meu espião, soube que a biblioteca de Halis continha apenas parte do segredo para a viagem dimensional e Alister acreditava que a biblioteca de Salis possuía a parte chave do feitiço de que precisavam. Resolveram ir ao reino de Salis e implorar ao rei Nicolas que lhes permitisse estudar os livros da biblioteca real de Seradon.
Queria que algo ruim lhes acontecesse pelo caminho, mas, infelizmente, a viagem correu bem. Inicialmente, foram bem recebidos pelo rei Nicolas e sua esposa, Megan, que os convidaram para um jantar. Alister aceitou o convite com uma cortesia exagerada. Com um aperto de mão, disse:
— Será uma honra jantar com Vossa Majestade e sua bela família neste reino tão encantador.
“Hipócrita”, pensei. Ele queria agradar o rei Nicolas com palavras doces para ver se conseguiria mais facilmente seu objetivo, e acabou que, mais tarde, conseguiu. No jantar, Nicolas apresentou seu filho Henry. Rolou uma conversa chata, uns risos para lá e para cá, mas logo a coisa ficou séria.
Alister começou a relembrar a história de sua família. Disse que acreditara que sua irmã estava morta e que agora seu maior desejo era revê-la. Todos naquela mesa se emocionaram com a história, e a família real inteira se compadeceu de Alister. Ele obteve, então, a permissão para que Hiratamino estudasse os livros da biblioteca.
O príncipe Henry, em especial, ficou muito interessado nessa história de viagem dimensional e resolveu ajudar. Ele tinha um espírito aventureiro, pelo que pude perceber. Queria ver se realmente era verdade e, caso fosse, conversar com Lenissya para descobrir mais sobre o outro mundo. Alister consentiu, afinal, estava em débito com eles.
Hiratamino ficaria hospedado no castelo real, na cidade de Seradon, até encontrar o que precisava. Alister e seus homens voltaram para Henir, afinal, ele era o rei, e caso se descuidasse, eu não pouparia esforços em trucidá-los.
Passaram-se algumas semanas. Alister caminhava impaciente de um lado ao outro de seu quarto. Haigar estava com ele, tentando acalmá-lo, mas era inútil. Seria outro dia monótono se não fosse pela estranha figura que apareceu ao final do dia no palácio. Era Hiratamino. A seriedade em seu rosto fez com que Alister duvidasse por alguns segundos que havia esperança. No entanto, erguendo um livro grosso, de capa branca, com uma gravura hexagonal na frente, disse:
— Encontrei o feitiço de que precisávamos.
Alister não se conteve de alegria e disparou sua energia em forma de um feitiço luminus, iluminando a sala central do palácio com a cor que representava o reino de Halis: o azul. Ele estava empolgado, mas o velho Hiratamino interrompeu sua alegria, dizendo:
— Não será fácil trazê-la de volta, talvez seja impossível. O feitiço que precisamos está entre os mais complexos de Nível 4.
Quem diria que seria assim? Talvez Lenissya realmente não pudesse retornar. Acho que fiz a mesma cara que Alister e seus subordinados naquele momento. Estive perdendo tempo acompanhando essa missão estúpida, quando havia tantas outras coisas importantes a fazer. Talvez houvesse outra maneira de chegar a Lenissya para matá-la...
Nível 4 é um nível máximo de domínio da energia aura. Eu possuía esse nível à maneira zafisiana, mas Alister não passava do nível 3. Mesmo sendo da família real, ele não herdara o grande potencial da energia halisiana. Hiratamino, com muitos anos de experiência e treino, a muito custo chegou à força máxima do nível 3, o mesmo potencial de Alister.
Grande parte da população era apenas nível 1, os guardas em geral possuíam nível 2, e alguns poucos magos mais treinados conseguiam feitiços simples de nível 3. Quando a maior parte da esperança deles se esvaiu, Hiratamino se ajoelhou perante o rei e disse:
— Mas se me deres tempo e me permitires, treinarei, me fortalecerei, e, se necessário, morrerei tentando trazer Lenissya de volta.
Alister respondeu:
— Sabes o que me pedes? Jamais o sentenciaria a tal destino!
— Não há outra escolha e Vossa Majestade sabe disso.
O rei abaixou a cabeça e ficou pensando por uns instantes. Em seguida, ergueu seu olhar e, encarando seu amigo de forma convicta, disse:
— Me fortalecerei contigo e somaremos forças nessa tarefa.
Sem querer contrariar o rei, Hiratamino consentiu. Treinaram arduamente nos meses que se seguiram, tentando concentrar e liberar a energia de forma específica e aprendendo formas de sincronizá-las entre si. Resolvi treinar um pouco também, pois de forma alguma queria perder para Alister. Eu gostava de passar as horas livres aprimorando minhas habilidades com armas.
Nas últimas guerras, utilizei com mais frequência uma adaga, mas minha arma predileta é, e sempre será, a espada. Concentrando minha energia na arma, eu conseguia reverter feitiços, desmanchá-los, aumentar o alcance do corte, dentre outras técnicas. Mas um treinamento desse tipo era desnecessário. Eu já era bom demais nisso. Quis tentar algo diferente.
No acervo do meu palácio, há uma dióxy de reversão que todos consideram inútil. Ela reverte nossa energia, que normalmente circula no sentido horário, para o sentido anti-horário, mudando sua forma e dificultando sua identificação. Era quase impossível controlá-la, o que inviabilizava sua utilização. Resolvi que treinaria com ela, um desafio um tanto interessante e que, quem sabe, poderia ser útil algum dia.
Essa dióxy foi colocada em um bracelete para que fosse mais fácil transportá-la sem tocá-la diretamente. Nas primeiras vezes que usei o bracelete, quase desmaiei. O impacto de ter a energia revertida de repente gerava um imenso estresse no corpo. Aos poucos, fui me habituando, e em poucos dias não sentia mais o impacto negativo da dióxy.
O tempo foi passando e meu treino com a dióxy de reversão teve grandes avanços; porém, o de Alister teve progressos ainda maiores. Após pouco mais de um ano de treinamento de controle e sincronia, Alister decidiu abrir o portal. Sabendo que uma grande quantidade de energia seria drenada e que a sincronia da energia dele com a de Hiratamino deveria ser perfeita, planejaram antecipadamente e cuidadosamente a forma como iriam proceder.
Essa tarefa continuava desconhecida para o povo de Halis. Embora muitos empregados no palácio tivessem achado estranha a viagem deles a Salis, suas reuniões secretas e todo esse treino rigoroso, não desconfiaram nem um pouco do que estava por acontecer.
Alister, Hiratamino, Haigar e Ikzar se dirigiram a uma sala secreta no palácio, localizada abaixo do trono da sala de reuniões extraoficiais. Lá, colocaram suas capas sobre um banco largo feito de tábuas de carvalho ancestral e iniciaram seu plano.
Alister começou a magia, concentrando todo seu esforço para a invocação de um portal por onde Hiratamino passaria. Logo, seu olhar baixou, cansado, pois a magia lhe exigia muito. Hiratamino teve que ajudar, pois Alister não conseguiria abrir o portal sozinho. Sincronizaram suas energias até que uma luz policromada apareceu diante deles, para onde Hiratamino prontamente se dirigiu, segurando a dióxy localizadora. Essa dióxy o guiaria exatamente para onde a energia de Lenissya estava.
Logo, o velho desapareceu do nosso mundo para o desconhecido. Se tudo corresse conforme o planejado, ele pegaria a princesa, invocaria um novo portal utilizando o restante de sua energia e voltaria de imediato. Aquele mundo poderia ter muitos perigos, e talvez ele sequer conseguisse chegar lá. Aguardamos.
Passados sete minutos de intensa ansiedade, uma nova luz surgiu naquele cômodo, semelhante à do portal que Alister abrira, só que desta vez vinha do exterior. Sim, eles estavam voltando!
Por ZuldraxPara minha decepção, aquele velho voltou são e salvo. Mas como? Era para ele ter morrido! Ao seu lado, caída no chão, estava uma moça de longos cabelos pretos, formosa, de estatura média. Parecia ter desmaiado. Alister, ao vê-la, se emocionou e abaixou-se para tocar-lhe no ombro. Aposto que ele queria abraçá-la, mas, assim como eu, percebeu que havia algo de errado com ela.Uma coisa diferenciava a nós, a realeza, das outras pessoas: a capacidade de ver a energia aura que rodeia cada ser. Lendas dizem que este mundo é que escolheu as pessoas que possuiriam tal habilidade, e a família escolhida reinaria e julgaria sobre as demais. Tal habilidade foi passada de geração em geração, não sendo constatada em ninguém mais além da família real.Os halisianos possuem uma energia em um tom azulado, os zafisianos possuem uma aura de cor avermelhada, e os salisianos de coloração esverdeada, sendo que nas mulheres a tonalidade é mais clara que nos homens. Aquela garota, no entanto, não
Por LorenaNos dias que se seguiram, Alister não ousou colocá-la em maiores riscos. Ele a manteve presa naquele lugar e não a submeteu a outros tipos de magia. Talvez estivesse arrependido do que fizera no primeiro dia. Talvez seu amor fraterno estivesse falando mais alto. Mesmo assim, as condições em que ela se encontrava não eram as melhores. Permanecia trancada e vigiada naquele quarto escuro. Ela não dizia nada e frequentemente chorava em silêncio.Alister algumas vezes tentou falar com ela, mas eles não se entendiam. Ela olhava confusa para ele e depois escondia seu rosto nas capas. Logo Alister percebeu a necessidade de um feitiço que permitisse se comunicarem.Os halisianos também eram uns trapaceiros, pois criaram um feitiço para ensinar a fala e a escrita para as crianças de forma imediata. Nem sempre usavam esse feitiço, pois as crianças que recebiam esse conhecimento implantado não desenvolviam muito bem o intelecto e a capacidade de raciocínio. No entanto, ela já não era m
Por LorenaDesde que eu chegara, só uma coisa passava pela minha cabeça: eu tinha que voltar para casa! Mesmo não estando mais amarrada, era muito desconfortável ficar presa naquele quarto com um estranho me vigiando quase o tempo inteiro.Às vezes, aquele chefe malvado vinha ver como eu estava, mas por quê? Eu não sabia o que tinha feito de errado para estar ali, não sabia o que queriam comigo, e, quando não era o medo e a dúvida que me dominavam, era a saudade.Eu ficava me lembrando dos meus pais, do último passeio que fizemos nas férias até Fernando de Noronha, e de como minha mãe tinha ficado apavorada quando eu disse que queria mergulhar com os tubarões. Ela era muito protetora. Meu pai já era mais tranquilo, gostava de se reunir com os amigos para conversar, comer churrasco e beber cerveja. Se dependesse dele, o ano inteiro seria festa.Também ficava pensando nos meus amigos. Será que a Beatriz tinha se saído bem na prova? Uma angústia muito grande tomava conta de mim, me fazend
Por LorenaAlister me observou por mais alguns segundos antes de sair. Logo em seguida, o homem que me vigiava entrou no quarto.Será que eu realmente estava em outro reino? Se fosse esse o caso, estaria em um país ainda governado por um rei, mas... onde isso poderia ser? Europa, talvez? Ou, quem sabe, eu nem estivesse mais na Terra. A maneira como cheguei aqui e o fato de ter começado a falar outra língua... Seria realmente magia?Uma curiosidade imensa começou a tomar conta de mim. Agora que eu podia falar a língua deles, quem sabe eu conseguisse alguma informação valiosa daquele guarda:— Olá!Tentei fazer o cumprimento no tom mais amigável possível e, embora no dia a dia eu fosse meio tímida, eu precisava desvendar tudo aquilo. Era uma necessidade! Ele permaneceu em silêncio. Em algum momento, ele teria que falar alguma coisa, então apelei:— Você é sempre assim tão calado? Qual o seu nome?— Haigar, e gosto de falar apenas quando necessário.— E você não acha necessário conversar
Por LorenaSozinha naquele imenso quarto, enquanto as lágrimas escorriam, percebi que não adiantava ficar remoendo tudo aquilo. Precisava esfriar a cabeça e encontrar outra solução, pois chorar e discutir com ele não me levaria a lugar algum. Respirei fundo, tentando me acalmar e organizar meus pensamentos.Fiquei deitada, olhando para o teto por um bom tempo, até que Haigar entrou. A aura dele era de um azul escuro também, mas diferente da de Alister. Possuía variações no valor e na saturação, era um pouco mais translúcida, menos intensa e se movia de formas diferentes. Ele trazia consigo uma bandeja com comida e bebida. Ótimo... eu estava faminta!— Com licença, princesa, trouxe sua comida!— Haigar, eu não estou com fome. Será que poderia me deixar sozinha? — O que eu realmente queria dizer era: "Será que pode deixar a comida aqui e sair?"— Tenho ordens de ficar aqui até você comer tudo. Seu irmão parecia bem chateado. Por acaso você brigou com ele?— Não quero falar sobre isso.—
Por Lorena— Minha mãe? — perguntei, confusa. Provavelmente, a imagem que vinha à mente dela era bem diferente da minha. A única mãe que conheço está na Terra, e só de pensar nela, eu sentia um aperto no coração. Poucos dias aqui, e a saudade já estava me consumindo.— Sim, a rainha Rainessya! Seu rosto, seu cabelo, a serenidade da sua pele... apenas seus olhos se parecem com os de seu pai.Era estranho ouvir falar de pais que eu não conhecia e ser reconhecida por pessoas que eu nunca tinha visto. Ela me olhou de cima a baixo antes de se aproximar e me entregar as roupas que trazia.— Acho melhor tomar um banho e se trocar, princesa!Realmente, eu precisava disso. Apesar de não sentir calor, meu corpo suava constantemente, embora eu me sentisse seca. Era estranho! Eu ainda usava meu velho jeans junto com a blusa do uniforme escolar. Meus tênis não estavam nos meus pés. Fiquei me perguntando onde os tinham colocado.— Poderia me dizer quem é você?— É mesmo! Desculpe a minha falta de e
Por LenissyaKeissy assentiu e me guiou pelos corredores do palácio, passando por amplos espaços, salas e portas. Eu já não conseguia me concentrar no ambiente; estava mais preocupada, pensando no que diria quando finalmente chegasse até onde ele estava.Descendo três andares de escadaria, avistei de relance uma imensa porta aberta. As pessoas atravessavam por ela, indo em direção a um grande salão mais adiante. De longe, vi alguns guardas na entrada do salão.Seguimos naquela direção, e foi então que percebi que meu suposto irmão provavelmente estava ali. Parei, tomada por uma forte vontade de recuar, mas Keissy pegou minha mão e, me puxando alguns passos à frente, disse em um tom suave e alegre:— Quer ver seu irmão ou não?Seu sorriso me deu confiança. Eu me sentia um pouco mais segura andando ao lado dela. Quando estávamos prestes a passar pela porta de entrada do salão, um dos guardas nos abordou:— Keissy! O rei está esperando por você?— Não, Brook, mas tenho certeza de que ele
Por LenissyaPensei em Haigar. Ele teve um filho, o que significava que sua aura deveria estar unida à de uma mulher. No entanto, sua aura era apenas azul-escuro.— Tem como não haver compatibilidade? O que acontece se as auras não se juntarem?— Em raros casos isso acontece, e não sabemos explicar o motivo. Quando ocorre, não podemos conceder a bênção, e o casal é obrigado a procurar outro parceiro. Sem a união das auras, eles se tornariam infelizes e incapazes de gerar filhos.— Mas, e no caso de Haigar?— O caso dele é diferente. Ele perdeu a esposa na guerra, e quando uma pessoa morre, sua energia se dissipa completamente, sem deixar rastros. A aura liberada desfaz a união, permitindo que, posteriormente, essa pessoa encontre um novo amor.Comecei a pensar se isso acontecia com os humanos com os quais cresci e nas diferentes situações que os casais viviam.— O que acontece em caso de traição?— Esse tipo de coisa não ocorre há muito tempo, até porque, se uma terceira aura for inser