Gabrielle Assim que cruzamos a porta da sala subterrânea, ele arregalou os olhos, incrédulo. A limpeza do ambiente, contrastando com o branco imaculado das paredes e do chão de granito natural, transmitia uma sensação de frieza que eu apreciava. Embora, geralmente, eu evitasse tons brancos — pois me lembravam hospitais e doença —, ali essa escolha me trazia segurança. Saber que as paredes poderiam ser pintadas como eu quisesse, se necessário, também me dava uma certa tranquilidade. No centro do espaço, entre os oito pilares estruturais do solar, estava uma imensa mesa de vidro blindado, quadrada, com 2x2 metros de extensão. Era grande o suficiente para eu me divertir à vontade, como se estivesse organizando uma festa particular. À frente da entrada, dispostas ordenadamente na parede, estavam minhas ferramentas. A diversidade de instrumentos me dava uma infinidade de possibilidades: vidro, ferro, madeira — qualquer material que eu desejasse experimentar, ali encontraria
Gabrielle Faltavam apenas quatro semanas para a grande festa. A tensão pairava sobre todos naquela casa, mas era em Leslie que ela se fazia mais evidente. Por alguma razão, ela decidiu se aproximar de mim. Naquela manhã quente de quarta-feira, enquanto tomávamos café, ela sentou-se ao meu lado. — Lucas me contou que você quer passar esses dias no solar — começou, com uma expressão séria. — Esse é um evento importante, princesa. Você deveria participar das decisões finais. — Não me permitiu opinar em absolutamente nada até agora — retruquei, sem olhar para ela. — Não faz sentido me meter nas escolhas nesse ponto. — Me perdoe por isso, eu só me empolguei um pouco — admitiu, forçando um sorriso. — Essa é a primeira festa que damos aqui em casa, e o primeiro aniversário seu com convidados. Não aceito nada menos que a perfeição. Levantei-me calmamente da mesa. — Faça como desejar. Se me der licença... — Espere — pediu, com um tom mais suave. — Eu gostaria
Gabrielle Lucas e eu permanecemos sentados, em silencio, por mais alguns longos minutos. Ele parecia perdido em pensamentos e por mais que eu não quisesse percebe-lo, tornou-se impossível não olhar para ele. Estava tão bonito concentrado daquela forma. Sem nem mesmo perceber, minha mão se moveu até a sua, que se encontravam unidas, em cima da mesa. O silêncio de Lucas me engoliu como um abismo. Por que era tão difícil para ele entender? Como posso amar alguém e ao mesmo tempo ter medo de que esse amor se tornar a arma que usariam contra mim? ― Me desculpe por isso ― pedi ― Sua mãe está dizendo a verdade? ― me lançando um olhar acusatório ― Prefere a morte do que admitir que sente alguma coisa por mim? ― Não é dessa forma. ― É tão ruim assim estar apaixonada por mim, Gabrielle? ― perguntou, deixando a voz pesada fal
Gabrielle Enquanto caminhávamos pelos corredores do shopping, percebi olhares curiosos em nossa direção. Desde o momento em que saímos da sala de reunião, ele havia se mantido ao meu lado, colado em mim, como se fôssemos amigos íntimos desde sempre — o tipo de proximidade que apenas Lucas tinha comigo. Suas mãos, entrelaçadas nas costas, lembravam-me a postura de um soldado em descanso. Aquilo me fez pensar: ele não devia ser uma pessoa comum. Jullian jamais deixaria um completo desconhecido me acompanhar. — Quem é você? — Essa informação é irrelevante — disse ele, sem desviar o olhar do caminho à nossa frente. — O que importa não é quem eu sou, mas o que posso fazer por você. A resposta foi direta e fria, e, de algum modo, fazia todo o sentido. Sim, ele estava certo. Não era importante sua origem, sua formação e nem mesmo seu nome. M
Gabrielle Ao fundo, vi que Leslie já estava acomodada, sentada no último assento e sorrindo para mim. Caminhei vagarosamente em sua direção, deixando os olhares pesados que se pousavam sobre mim. A ansiedade era palpável; todos aguardavam um pronunciamento da minha parte. A diversidade de rostos chamou minha atenção — alguns eu conhecia, outros não. Aqueles que já eram familiares, ainda mais nervosos, especialmente uma garota de rosto magro e corpo esquelético. Ela vestia um terno preto discreto, contrastando com a formalidade do momento. O que Rodriguez pensaria ao ver uma de suas “concubinas” tão modestamente vestidas? Quando me coloquei ao lado de Leslie, ela apenas sorriu. Nunca tinha visto aquele sorriso antes. Era dirigido a mim? Ela me indicou um lugar vazio na ponta da mesa, e percebi que, pela primeira vez, todos na sala estavam diante de seu CEO. A atmosfera era tensa, para dizer o mínimo.  
Gabrielle — Pode soltar o ar agora, Leslie — comentei, me jogando na cadeira, o tom meio provocador. — Não precisa ser tão dura, princesa — retrucou ela, olhando-me. — Vamos perder metade da diretoria até o final do ano desse jeito. — Ela não estava falando sério, Less — brincou Julls, rindo. — Sim, estava — insistiu Leslie, sua expressão fechada. — Ela é exatamente como John. E ficará pior, se permitirmos. Vocês são cegos para isso, mas eu não. Leslie realmente me culpa por parecer o melhor empresário que esse país já teve? E depois de ela mesma ter me colocado nessa posição? A ironia me fez gargalhar. A risada escapou antes que eu pudesse contê-la, fazendo meu corpo vibrar. Era ridículo. Leslie reclamou que eu me parecia com papai, como se isso fosse algo inesperado. Ela me jogou no colo dele desde que nasci, forçando-me a aprender com ele
Gabrielle Os olhos dele se fixaram em mim, desafiadores e quase divertidos. Havia uma mistura de diversão e impaciência ali, como se esperasse por algo — uma ordem, talvez. Algo em sua postura revelava uma prontidão inquietante, como se estivesse preparado para agir a qualquer momento, não importando o que fosse pedido, mesmo que fosse um crime. Sua entrega era precisa e fluida, lembrando os soldados de elite que costumavam frequentar os eventos que John me levava. — Qual é sua patente? — perguntei, tentando arrancar alguma informação. — Essa informação é irrelevante. — Ele se inclinou-se mais perto, até seu rosto ficar a centímetros do meu. — Mas posso garantir que tenho patente suficiente para protegê-la, quando necessário. Ficamos em silêncio por um instante, os olhos presos um no outro em um debate silencioso. Havia algo nele que me desafiava — uma brincadeira velada, como se estivéssemos testando um ao outro sem dizer nada. Por um segundo, senti como se voltas
Lucas Park Às vezes, sentia uma paralisia de me consumir. É como se o tempo desacelerasse, aprisionando minha mente em um ciclo infinito, onde revivia o mesmo momento, repetidas vezes, mergulhando de novo na raiva que me consome. É um veneno lento que corroía meu orgulho. Precisava suportar tudo isso calado, esconder da pessoa que mais amo os demônios que me atormentam, só aprofundava meu inferno particular.