Gabrielle
Antes que eu pudesse iniciar a tentativa de parar Gadreel – seja lá do que ele estivesse tentando fazer – ele atendeu ao celular. Nem se importou com o fato de eu poder ouvir a conversa. Não desviou o olhar de mim, mantendo-se focado, mesmo enquanto falava. Como alguém conseguia sustentar o olhar assim, tão intenso, enquanto conversava com outra pessoa?
― Quanta chateação… ― murmurou ele, deslizando o celular de volta ao bolso. ― O serviço de quarto da rede Park é uma porcaria.
― Está hospedado no Hotel Park? ― perguntei.
― Sim, cheguei ontem à cidade, e como já estou acostumado a essa rede… ― explicou, girando o copo entre os dedos. ― Deveria ter me hospedado em um dos seus.
― Eles têm o melhor serviço da cidade ― re
Lucas Park Às vezes, quando olho no espelho, não consigo de deixar de sentir uma ponta de decepção. Não entenda errado, eu agradeço a Deus todos os dias pela nova chance que recebi, pela oportunidade de viver e fazer tudo aquilo que, por lógica e apontamento médico, eu seria incapaz de fazer. Ninguém consegue explicar como foi que eu sobrevivi, muito menos como a únicas sequelas restante fossem as dores de cabeça constante e os lapsos de memória. Meu corpo, que parecia ter sido o mais afetado de início, foi o que melhor se recuperou. Minha mente nunca voltaria a ser a mesma, fosse pela lesão no hipocampo ou pela crescente e doentia obsessão peça única mulher que eu daria minha vida. Sim, eu tinha consciência do poço fundo que estava, dia após dia, me afundando. Não me importava
Lucas Park Enquanto eu observava a expressão de deboche de Tico, algo dentro de mim se contraiu. A comparação com Castillo fez o sangue correr mais rápido. Ele ainda era uma sombra, uma lembrança incômoda que todos pareciam gostar de usar contra mim. Como se eu tivesse algo a provar — e de fato, talvez tivesse. Afinal, Gabrielle havia escolhido estar ao meu lado, mas isso não significava que eu estivesse imune à ameaça de ser substituído, seja por Gadreel ou qualquer outro fantasma que aparecesse. Tentei ignorar o peso da cerveja fria em minhas mãos, mas sabia que, até que Gabrielle e eu nos entendêssemos, todos os olhares ao redor permaneceriam como um alerta mudo de que eu não poderia vacilar. ― Só precisam aguentar mais algumas semanas ― prometi ― Enquanto isso, me deixem saber se pre
Lucas Park Eu estava preparado para tudo: desprezo, gritos e até uma nova tentativa de me afastar. Cada passo em direção ao quarto dela era acompanhado por uma busca incansável em minha mente, procurando a melhor forma de apaziguar a tempestade que, claramente, eu havia causado. Me preparei psicologicamente para o que quer que viesse... mas não para aquilo. A porta estava entreaberta, um convite silencioso. Quando entrei e caminhei em seu espaço, pronto para um confronto, o que encontrei desarmou completamente todas as armas que eu havia preparado para me defender. Ela estava adormecida, seu rosto sereno em meio aos longos cachos esparramados no travesseiro, a pele lisa e suave se revelando pela camisola de cetim vermelho que moldava cada linha de seu corpo. Dormia tão profundamente que seria um sacrilégio acordá-la. Me aproximei de sua cama e, com o máximo de cuidado
Lucas Park A porta estava aberta. Não fiz questão de bater ou perder tempo com formalidades. Jullian, sentado atrás de sua mesa, virando a cabeça em minha direção ao ouvir meus passos, com uma expressão divertida. Castillo logo o acompanha, o mesmo olhar de desdém refletido em seus olhos. Eu era uma piada. ― Juro por Deus que vou dar um tiro na cabeça de cada um nessa sala se não for importante o que têm a dizer! ― disparei, meu tom ríspido ecoando pelo ambiente. ― Bom dia para você também. ― respondeu Castillo, o sorriso ainda plantado no rosto, como se nada pudesse abalar seu humor. Jullian fechou a cara, seu semblante agora sombrio, uma ocorrência incomum. Ele parecia realmente surpreso, talvez até chocado, com meu tom e minhas pal
Lucas Park Olhei para ele e para a mão em meu ombro. Ele entendeu o recado e a retirou rápido, pois sabia que, se continuasse, eu arrumaria um jeito de quebrar qualquer dedo que me tocasse por mais um segundo. Estava cansado de interpretar o personagem que haviam cuidadosamente esculpido em mim. Por um instante, foi como se eu estivesse finalmente livre, como se as amarras que seguravam minhas mãos durante todo aquele tempo tivessem se soltado. E, embora soubesse que logo precisaria apertá-las novamente, sentia uma estranha paz ao perceber que Jullian já tinha compreendido. ― Você está nisso com eles, ― acusou Jullian, me lançando um olhar de desprezo, um olhar como nunca antes. ― Não fale do que você não sabe. ― Rebati, ainda com firmeza. ― Pense nisso como um jogo, ― comento
Lucas Park Como pude ser tão cego? Ele havia me dito com todas as palavras que não se tratava de dinheiro, e eu ainda insistia em enxergar o conglomerado como o prêmio. Gadreel não queria a segunda maior empresa do mundo; ele queria vê-la em ruínas, tudo destruído, e tudo por uma simples diversão doentia — para me provar que podia. Era minha culpa. Eu havia trazido essa desgraça até ela. ― Por que ele faria isso? ― perguntou Jullian, inclinando-se ligeiramente sobre a mesa, a descrença estampada no rosto. ― Por minha causa. ― disse uma voz às nossas costas, firme e cheia de um peso que fez o ar da sala congelar. Todos nos viramos, surpresos, ao ver Leslie parada ali. Desde quando estava ali? Será que ouvira toda a nossa conversa em silêncio? Ela sustentava nosso olhar,
Gabrielle Levaram apenas alguns meses para que tudo aquilo que eu construí desmoronasse. Acho que é verdade quando dizem que um exército é tão forte quanto seu membro mais fraco. Eu deveria saber que ele era o elo mais fraco da corrente que eu forçava contra os portões de minha mente. Eu havia construído muralhas altas, cada tijolo cimentado com autossuficiência. Lucas, no entanto, era a brecha que, por mais que tentasse remendar, continuava a abrir-se, dilacerando qualquer defesa que eu pudesse armar. Não adiantava o quanto eu tentasse, ele estava em minha mente, martelando, como um câncer que se espalha silencioso, até comprometer matar todo o sistema que me mantem viva. Lucas se tornou essa doença que eu nem mesmo estava disposta a me curar. Cada pensamento sobre ele vinha como uma dor surda, um peso que me arrastava. E, mesmo assim, a ideia de me curar dele era insuportável. De alguma forma, o desconforto se tornara uma prova da força com que ele vivia em mim,
Gabrielle Quando entrei no estacionamento, tudo aquilo que estava se formando em meu coração apenas se materializou. Eu precisava colocar para fora, de alguma forma. Eu não poderia permitir que aquela fúria fosse depositada em outra pessoa, principalmente se essa pessoa fosse Lucas. De nenhuma forma eu poderia permitir que ele visse aquilo que a tanto custo eu tentava esconder. A passos apressados e nem tão largos quanto eu gostaria, caminhei até estar diante de meu primeiro carro, aquele que eu mais valorizava em minha coleção, o primeiro presente de meu pai. Abri a porta malas e retirei a chave de roda em formato de cruz, e sem nem mesmo me permitir pensar, retirei meus saltos, os jogando em qualquer lugar daquela imensa garagem. Tudo o que eu queria era silenciar os gritos em minha mente. Rapidamente pulei para cima do capo da Porsche v