Ecos do Passado
O som das ondas quebrando na praia ecoava na cabeça de Camila, enquanto ela caminhava pela estrada de pedras que levava ao ateliê. O sol da manhã mal havia surgido, mas ela já se sentia tomada por uma ansiedade crescente. O que estava fazendo ali? Ela havia fugido de sua antiga vida em busca de paz, mas encontrou algo bem diferente. Davi. O homem que, com tão poucas palavras, parecia saber exatamente como desestabilizá-la. Ao se aproximar do ateliê, a porta de vidro estava fechada desta vez. Ela hesitou por um momento antes de bater de leve. Nenhuma resposta. Camila apertou a maçaneta, percebendo que estava destrancada, e entrou com cuidado. — Davi? — chamou ela, a voz reverberando pelo ambiente silencioso. Nenhuma resposta novamente. O espaço estava envolto em uma luz tênue, filtrada pelas grandes janelas. As telas e esculturas que preenchiam o ateliê pareciam observar sua presença. Camila suspirou e caminhou até a mesa onde deixava suas coisas. Algo sobre o local a fazia sentir-se constantemente vigiada. Ela começou a organizar os pincéis e preparar o espaço para o trabalho do dia, mas não conseguia tirar Davi da cabeça. Seu jeito reservado, suas palavras enigmáticas na noite anterior. A atração que sentia por ele crescia a cada dia, e isso a assustava. Ele era um homem envolto em mistérios, mas o que a atraía ainda mais era o fato de que ele parecia ver algo nela que ninguém mais via. Quando já estava imersa em suas tarefas, ouviu passos vindo da escada. Davi apareceu, os olhos escuros como sempre, mas havia algo diferente em sua expressão. Ele parecia… perturbado. — Bom dia — disse ele, com a voz mais suave do que o habitual. — Bom dia — respondeu Camila, sem saber como interpretar o humor dele. — Está tudo bem? Davi parou por um momento, como se estivesse pesando suas palavras. Então, com um suspiro, passou a mão pelos cabelos desarrumados. — Sonhos ruins — disse ele simplesmente, como se isso fosse suficiente para explicar o peso em sua voz. — Todos temos nossos fantasmas — disse ela, tentando soar compreensiva, mas sem saber ao certo o que ele queria dizer. Davi a olhou, seus olhos fixos nela por um longo momento. Parecia que ele estava prestes a dizer algo mais, mas mudou de ideia. Aproximou-se da tela em que havia trabalhado no dia anterior e pegou um pincel. — Vamos começar — disse, e assim o assunto foi encerrado. O dia seguiu de maneira tranquila, quase silenciosa, mas a atmosfera no ateliê era densa. Cada movimento de Davi, cada pincelada, parecia carregar um peso emocional, algo que ele tentava desesperadamente esconder. Camila se via cada vez mais atraída por esse mistério, como se precisasse entender o que o afligia. A certa altura, ela decidiu perguntar. — O que você quer dizer quando fala sobre fantasmas? Davi parou, o pincel suspenso no ar. Ele não a olhou de imediato, mas sua respiração parecia ter ficado um pouco mais pesada. — Não são os fantasmas que importam, Camila. É o que fazemos com eles — disse, finalmente virando-se para encará-la. — Eu não deveria estar te contando isso, mas… eu tive uma vida antes daqui. Uma vida cheia de erros. Algumas pessoas fogem de seus fantasmas, outras os enfrentam. Eu escolhi me esconder. Camila sentiu um aperto no peito. Algo em suas palavras ressoava com suas próprias cicatrizes. Ela havia fugido, assim como ele, mas sabia que fugir não era o suficiente para apagar o que viveu. — Às vezes, não podemos fugir para sempre — sussurrou, sem saber se falava dele ou de si mesma. Davi deu um leve sorriso, mas era um sorriso triste, quase amargo. — Não, não podemos — concordou ele, voltando sua atenção para a pintura. — Mas isso não significa que estamos prontos para encarar o que nos assombra. Camila se aproximou, sem conseguir se conter. — Você se esconde aqui, rodeado por arte, mas o que realmente está escondendo? — perguntou, sua voz baixa, mas carregada de curiosidade e algo mais. Ele a olhou intensamente, e por um momento ela pensou que ele fosse se abrir. Mas então, em vez de responder, Davi simplesmente colocou o pincel de lado e caminhou em direção à porta. — Está ficando tarde. Vá para casa, Camila. Amanhã será um dia difícil. Ela ficou parada, assistindo enquanto ele saía sem mais explicações. O que ele queria dizer com “dia difícil”? Por que nunca dava respostas diretas? Assim que Davi desapareceu, Camila sentiu o peso do silêncio preencher o espaço ao seu redor. O mistério que ele carregava era como uma teia que a envolvia cada vez mais, e ela sabia que não conseguiria ignorar aquilo por muito tempo. Parte dela queria fugir, evitar o envolvimento. Mas outra parte estava desesperada para descobrir o que havia nas sombras do passado de Davi. Naquela noite, de volta à sua pequena casa alugada no vilarejo, Camila tentou se distrair, mas era impossível. A imagem de Davi, o som de sua voz e o mistério que ele carregava continuavam a ecoar em sua mente. Ela sabia que estava prestes a se envolver em algo muito maior do que imaginava. Enquanto olhava pela janela, observando a lua refletida no mar, Camila fez uma promessa a si mesma. Não importa o que fosse, ela descobriria o que Davi escondia. Mesmo que isso significasse enfrentar seus próprios demônios no processo.O Peso das SombrasO sol nascente tingia o céu de tons alaranjados enquanto Camila caminhava em direção ao ateliê no dia seguinte. As palavras de Davi ainda ecoavam em sua mente. “Amanhã será um dia difícil.” Ela não fazia ideia do que ele queria dizer, mas sabia que, no fundo, algo estava prestes a mudar. Uma tensão pairava no ar, e ela sentia como se estivesse prestes a atravessar uma barreira invisível.Quando chegou, a porta estava fechada, e ela hesitou antes de abrir. Dentro do ateliê, tudo parecia igual, mas havia uma presença diferente, como se o próprio espaço estivesse esperando por algo. Camila largou a bolsa em um canto e começou a preparar o material de pintura. Não demorou muito até que ouviu passos firmes se aproximando.Davi entrou no ateliê, mas algo em sua expressão estava diferente. Seus olhos pareciam mais sombrios, carregados de uma intensidade que a fez estremecer. Ele olhou para Camila por um breve momento, sem dizer uma palavra, antes de caminhar até uma das te
Revelações nas SombrasO frio da sala subterrânea parecia envolver Camila, mas o calor crescente entre ela e Davi a impedia de sentir o desconforto do ambiente. Estar naquele lugar, cercada pelas obras mais pessoais dele, era como se estivesse dentro de seu mundo interior, descobrindo partes dele que ninguém mais jamais veria.Davi permaneceu em silêncio por um longo tempo, seus olhos ainda fixos nela, como se esperasse por algo, talvez uma reação, uma palavra. Mas Camila estava paralisada, não apenas pela intensidade do momento, mas pelo medo do que aquele tipo de conexão significava para ambos.Ele finalmente quebrou o silêncio.— Sabe, Camila, estas pinturas, estas esculturas, são reflexos de uma dor que não consigo apagar — disse ele, passando os dedos por uma escultura de mármore, onde as formas pareciam distorcidas, mas transmitiam um sentimento de profunda agonia. — Elas são tudo o que resta de uma parte da minha vida que preferiria esquecer.Camila deu um passo em direção a el
O Limiar da EscuridãoCamila sentiu o peso do olhar de Davi cravado nela, as palavras dele ecoando em sua mente como um chamado ao qual não sabia se deveria ou poderia responder. A pintura que ele acabara de revelar era tão visceral, tão cheia de dor e desejo, que parecia quase impossível olhar para ela sem sentir o peso daquela verdade crua.Davi deu mais um passo em direção a ela, seus olhos não desviando por um segundo.— Você realmente acredita que pode lidar com isso, Camila? — Sua voz soava mais como um desafio do que uma pergunta. — Com tudo o que sou, com tudo o que carrego?Ela engoliu em seco, lutando para manter sua voz firme. — Acho que já estamos além desse ponto. Eu já vi o suficiente para saber que… não posso simplesmente ignorar. — Ela hesitou, sentindo o coração disparar. — Não posso ignorar o que sinto por você, Davi.O silêncio que se seguiu foi quase insuportável, carregado de tensão e expectativa. Camila sentia que, a qualquer momento, o chão poderia se abrir sob
Segredos ReveladosO silêncio no ateliê de Davi parecia mais denso do que nunca. A revelação da pintura, uma imagem perturbadora e visceral do próprio Davi sendo consumido pelas sombras, ecoava na mente de Camila. Ela sentia o coração bater descompassado enquanto observava os detalhes daquela obra tão íntima, tão cheia de dor e caos.Davi permaneceu em silêncio ao seu lado, os braços cruzados sobre o peito, o rosto tenso, como se esperasse por um julgamento. Ele parecia preparado para que ela recuasse, fugisse de tudo o que ele acabara de expor.Mas Camila não se moveu. Ela queria entender. Precisava entender.— Davi… — ela começou, a voz vacilante. — O que significa essa pintura? Por que você… — Suas palavras morreram quando olhou para ele, vendo nos olhos de Davi uma vulnerabilidade que ele raramente deixava transparecer.Ele desviou o olhar, andando até a janela, onde a luz da lua iluminava a água do mar ao longe.— É o que eu sempre fui — ele murmurou, com a voz carregada de algo
A Profundidade das SombrasO amanhecer se aproximava, mas o céu permanecia envolto em tons de cinza, como se refletisse o turbilhão de sentimentos que dominavam Camila. Deitada na cama, sentia o calor do corpo de Davi ao seu lado. Ele dormia profundamente, os traços do rosto finalmente relaxados, livres do peso que carregava em vigília. Era a primeira vez que ela o via tão vulnerável, e isso a fez perceber o quanto Davi escondia de si mesmo e do mundo.Camila observou as sombras que dançavam pelas paredes do quarto, criadas pela luz suave da madrugada que começava a invadir o espaço. Sentia que, de alguma forma, havia cruzado um limite invisível. Seu relacionamento com Davi já não era apenas uma questão de atração ou desejo. Agora, estavam conectados de maneira mais profunda, mais perigosa.Davi confiara nela naquela noite, deixando suas defesas abaixarem e mostrando suas cicatrizes mais profundas. Porém, a verdade ainda parecia incompleta. Havia algo mais, algo que ele continuava esc
Desenterrando SegredosO sol estava alto no céu quando Camila despertou, a luz que filtrava pelas janelas do quarto criando um padrão de sombras dançantes sobre as paredes. Davi ainda estava ao seu lado, mas parecia estar em um sono profundo. Camila, embora cansada, sabia que precisava agir. Havia algo que precisava entender, algo que estava começando a entender, mas não o suficiente.Depois de se vestir, Camila decidiu explorar mais a fundo o ateliê de Davi, não por curiosidade insensata, mas porque sentia que precisava encontrar respostas. A pintura que havia visto na noite anterior havia despertado uma inquietação que não conseguia ignorar. Se ela realmente queria estar ao lado de Davi, precisava compreender a natureza dos segredos que ele guardava.Saindo da casa com cuidado para não acordar Davi, Camila se dirigiu para o ateliê. O vento fresco da manhã estava mais forte do que o esperado, e ela se encolheu no casaco, tentando se proteger do frio.Chegando ao ateliê, ela notou que
O Passado ReveladoA noite caiu sobre a pequena vila costeira, trazendo consigo uma calma inquietante. Camila estava em casa, mas não conseguia se livrar da sensação de que estava à beira de descobrir algo importante. O caderno e as fotografias estavam espalhados sobre a mesa, suas páginas e imagens refletindo a luz suave de uma lâmpada solitária.Camila folheou novamente as anotações e olhou para a fotografia da jovem mulher. Algo sobre o rosto dela era familiar, e a conexão com Davi estava começando a se formar na mente de Camila. Ela pegou uma das cartas, tentando decifrar a caligrafia cuidadosamente. O papel estava envelhecido, e as palavras eram um pouco difíceis de ler, mas ela conseguiu distinguir trechos que falavam sobre amor e perda, mencionando uma tal Aurora.O som de batidas na porta a tirou de seus pensamentos. Ela hesitou por um momento, antes de se levantar e ir até a porta. Quando a abriu, encontrou Davi de pé no limiar, seu rosto com uma expressão que misturava preoc
Entre Segredos e SombrasA lua cheia iluminava o céu acima da vila costeira enquanto Camila e Davi seguiam por uma trilha estreita que levava até um armazém abandonado. O caminho era irregular, cheio de pedras e raízes, mas a mente de Camila estava longe dos obstáculos físicos. O que Davi havia revelado sobre Aurora ainda pulsava em sua mente, e agora, a ideia de que havia mais segredos a serem desvendados a deixava em um estado de alerta.— Está tudo bem? — Davi perguntou, quebrando o silêncio, sem tirar os olhos do caminho à frente.Camila assentiu, ainda que seu coração batesse acelerado.— Estou bem… Só não sei o que esperar desse lugar.Davi suspirou, como se também estivesse tentando lidar com os próprios sentimentos.— Nem eu sei o que vamos encontrar — admitiu ele. — Mas Aurora deixou algumas coisas escondidas aqui antes do acidente. Eu não consegui lidar com isso sozinho naquela época, mas agora… talvez seja a hora de encarar.Eles pararam em frente ao armazém. A madeira das