Capítulo 4

Revelações nas Sombras

O frio da sala subterrânea parecia envolver Camila, mas o calor crescente entre ela e Davi a impedia de sentir o desconforto do ambiente. Estar naquele lugar, cercada pelas obras mais pessoais dele, era como se estivesse dentro de seu mundo interior, descobrindo partes dele que ninguém mais jamais veria.

Davi permaneceu em silêncio por um longo tempo, seus olhos ainda fixos nela, como se esperasse por algo, talvez uma reação, uma palavra. Mas Camila estava paralisada, não apenas pela intensidade do momento, mas pelo medo do que aquele tipo de conexão significava para ambos.

Ele finalmente quebrou o silêncio.

— Sabe, Camila, estas pinturas, estas esculturas, são reflexos de uma dor que não consigo apagar — disse ele, passando os dedos por uma escultura de mármore, onde as formas pareciam distorcidas, mas transmitiam um sentimento de profunda agonia. — Elas são tudo o que resta de uma parte da minha vida que preferiria esquecer.

Camila deu um passo em direção a ele, atraída por sua confissão e pela vulnerabilidade que raramente via em Davi. Algo nela queria entendê-lo mais, queria estar ao lado dele de uma forma que nunca havia permitido para si mesma com ninguém antes. Mas, ao mesmo tempo, ela sabia que estava se aproximando de um limite perigoso, um ponto sem retorno.

— Davi… — ela começou, hesitante. — Todos nós temos algo do qual preferimos nos afastar. Eu também carrego coisas que me assombram, e eu entendo… — Ela parou, sem saber como continuar. Estava à beira de uma revelação própria, mas algo a segurava.

Ele se virou completamente para ela, dando mais um passo em sua direção. Eles estavam tão próximos agora que Camila podia sentir o cheiro da tinta e o aroma amadeirado que ele exalava.

— E o que te assombra, Camila? — perguntou ele, a voz baixa e intensa. — Por que você veio para este vilarejo, fugindo de tudo o que conhecia?

As palavras dele atingiram-na como um golpe. Ela sabia que Davi perceberia que havia algo debaixo da superfície, mas não esperava que ele fosse tão direto. Camila desviou o olhar por um momento, as lembranças de seu relacionamento abusivo e de toda a dor que sofreu emergindo de forma inevitável. A voz de seu ex ainda ecoava em sua mente, as acusações, a manipulação, as ameaças.

— Eu vim porque… precisava de um novo começo — disse ela, tentando manter a voz firme. — Deixar para trás um relacionamento que quase me destruiu.

Davi não disse nada, mas o olhar dele suavizou. Ele compreendia, de uma maneira silenciosa, o peso que ela carregava. E, de algum modo, aquilo parecia criar uma conexão ainda mais forte entre eles, uma compreensão mútua de que ambos estavam feridos, ambos precisavam de algo que, até então, haviam se recusado a aceitar.

— Eu sei como é carregar essa dor — ele murmurou, sua mão se movendo para tocar de leve o ombro de Camila. — Mas fugir não a faz desaparecer.

A proximidade de Davi, o toque suave de seus dedos, fez o coração de Camila acelerar. Havia algo naquele momento que parecia muito mais íntimo do que qualquer palavra dita. O silêncio entre eles carregava uma promessa, uma atração irresistível que estava prestes a se tornar impossível de conter.

Camila finalmente levantou os olhos para ele, e o viu mais de perto, não apenas como o artista recluso, mas como um homem quebrado, assim como ela. As sombras em torno dele não eram apenas metáforas — eram reais, marcas de uma vida marcada pela dor, assim como as cicatrizes emocionais que ela carregava.

Davi inclinou-se um pouco mais, os lábios quase tocando os dela, a respiração entrecortada.

— Eu deveria me afastar — ele sussurrou, a voz rouca de desejo. — Mas você me faz querer quebrar todas as minhas próprias regras.

Camila sentiu um arrepio percorrer sua pele. As palavras dele ecoavam seus próprios sentimentos. Ela sabia que deveria recuar, que estava prestes a entrar em um território perigoso. Mas, no fundo, algo nela ansiava por aquele momento. Por ele.

— E se quebrássemos essas regras juntos? — murmurou ela, a voz mal saindo.

Davi soltou uma risada baixa, amarga.

— Não sabe o que está pedindo, Camila. Eu… — Ele se afastou um pouco, fechando os olhos por um segundo. — Não sou o tipo de homem que você pensa que sou. Há coisas em mim que você não entenderia. Coisas que te fariam correr na direção oposta.

Camila deu um passo à frente, determinada. Ela não queria mais fugir. Não de seus próprios medos, nem de Davi. Havia algo entre eles, uma conexão que transcendia as cicatrizes e sombras de seus passados.

— Então me mostre quem você realmente é, Davi — ela disse, sua voz firme. — Pare de se esconder nas sombras. Deixe-me ver o que você teme tanto que eu descubra.

Davi a olhou, os olhos escuros penetrando os dela, como se buscasse a verdade por trás das palavras de Camila. E, finalmente, ele suspirou, resignado.

— Você está pronta para isso? — perguntou ele, a voz carregada de algo mais profundo do que apenas desejo.

Camila assentiu lentamente, mesmo sem saber exatamente o que estava por vir. Ela estava pronta. Para as verdades. Para as sombras. Para Davi.

Ele se afastou e caminhou até uma grande tela coberta por um pano no fundo da sala. Com um único movimento, ele puxou o tecido, revelando uma pintura que fez o ar ao redor de Camila desaparecer por um momento.

Era uma obra crua, violenta, repleta de figuras humanas contorcidas em dor e desejo. No centro, um homem, claramente inspirado em Davi, estava ajoelhado, coberto de sombras, enquanto uma mulher, parecida com Camila, estendia a mão para ele, tentando tirá-lo da escuridão. Era uma imagem tão íntima, tão real, que ela sentiu uma onda de emoção inundá-la.

— Esta é a verdade, Camila — disse Davi, os olhos fixos na pintura. — Eu sou um homem preso em minhas próprias sombras. E você… — Ele se virou para ela, a expressão vulnerável. — Você pode ser a única luz que pode me libertar.

O silêncio que se seguiu foi pesado, cheio de emoções não ditas, de desejos reprimidos e medos ocultos. Camila sabia, naquele momento, que estava mais profundamente envolvida com Davi do que jamais imaginou. E que, a partir dali, não haveria mais volta.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo