Corria atrás do pestinha, enquanto era observada por Ran, esse tempo de evolução desde que chegaram à Beirão a fizera bem, seus reflexos e sua postura melhoraram significativamente depois de seus treinamentos. Sua mira com o arco era perfeita, lidava já bem com armas de fogo e gostava particularmente de pequenas lâminas, mais fáceis de esconder nos cabelos.
Raoul estava por ali, sondando sua irmã. Se ela não conhecesse a ligação entre eles, poderia jurar que ele vivia por cortejá-la. Mas, não era bem o caso. A intensidade com que ele olhava para tudo era muito perturbadora. Ela se sentia desconfortável com aquilo.
Depois de alguns minutos ainda observando seus exercícios com o pequeno Louis, se retiraram para se armar e seguir para a reunião do conselho. Era hora de fazer atividades mais calmas com ele para que a adrenalina baixasse o suficiente para quando a irmã chegasse e pudesse dormir.
Deveria ir se encontrar com a avó, no entanto, ao invés disso montou um cavalo e saiu em disparada depois de deixar Louis com sua mãe. Na clareira mais distante, estava meditando sobre suas opções, a partir de agora. Poderia continuar se escondendo da família ou lutar para continuar seguindo o que realmente desejava.
Puxando seu arco e as flechas da sela do cavalo, mirava nas árvores enquanto praticava, alvos estáticos eram fáceis agora. Os móveis também não eram mais tão complicados de acertar. Depois de recolher as flechas cravadas nas árvores, começou a praticar a transformação de suas partes do corpo no garou. Como tinha apenas 18 anos, ainda era um processo doloroso e difícil, mas estava confiante.
Um crac no meio das árvores e ela nem pensou, apenas retirou uma de suas pequenas lâminas de seu cabelo trançado e atirou de maneira certeira ouvindo um 'aí' vindo de dentro da mata.
Como não reconheceu a voz, puxou uma das armas de treinamento e apontando na direção do grito foi com ela em punho, tentando fazer o mínimo de barulho possível, quando deu de cara com um lobo diferente dos de sua matilha. Disparando em seu ombro no reflexo e tentando controlar a própria transformação, olhou para ele com ódio. Defenderia seu terreno nem que tivesse de matar esse lobo.
O tiro drenava sangue dele de maneira rápida e ela abraçou essa oportunidade, atacou com os punhos fechados, socando a mandíbula dele, enquanto chutava na sequência sua pata dianteira esquerda onde ele havia levado o tiro. Ele parecia mal reagir, se era por causa dos ferimentos ou por ela ser quem era, não tinha certeza.
– Princesa, pare!
Um grito veio do outro lado onde ela atacava o lobo cinzento. Ainda que tivesse parado pela voz de comando de Fernando, apontava sua arma diretamente para a cabeça do lobo que pouco a pouco se transformou novamente em um homem. Um oriental, ela não conseguia precisar de onde. Ele tinha um dos ombros perfurados pela bala, e, o lugar onde sua lâmina cortara seu rosto já estava com uma linha rosa fina.
– Rafaela, o que houve com você?
– Estava treinando e ele apareceu, não reconheci o cheiro e ataquei.
– E não reparou que ele não estava reagindo? Esse é Kwan, da guarda da princesa Hyuna. Vamos torcer para Ranielle não achar seu comportamento inapropriado.
Depois de socorrido o jovem Kwan estava na sala da casa da avó de Rafaela, com uma expressão neutra em seu rosto, enquanto Hyuna e Ran discutiam o ocorrido.
Para todos os efeitos, Rafaela estava apenas treinando e foi surpreendida. Estavam todos chocados com sua capacidade de defesa, ainda que Kwan não tenha reagido às agressões, ela poderia facilmente ter revidado qualquer ataque dele. Após a Alfa Hyuna deixar a sala em que estava com a Alfa, encarou a princesa enquanto saía com o jovem na sua cola.
– Rafaela, por favor…
A jovem loba entrou no escritório do avô e fechou a porta atrás de si, enquanto encarava a parede para não ter que olhar a irmã nos olhos.
– Não vou te morder. Pode olhar pra mim agora.
Os olhares se encontraram cinza e vermelho num choque e no segundo seguinte, Ranielle estava pulando no colo da irmã.
– Se mamãe pudesse ter visto, por Gaia estou tão orgulhosa de você!
A efusão pegou a caçula de surpresa, porém ela retribuiu o abraço. Sentia falta de receber carinho, por ser a mais calma, também sempre foi a mais sentimental. Afastou-se pouco da mais velha e olhando novamente em seus olhos fez a pergunta que temera desde que descobrira quem o ‘inimigo’ era.
– Não se preocupe, não está em perigo. Ela apenas quer esconder que um de seus melhores guardas levou uma surra de uma nanica.
– Mas, ele apenas não reagiu, duvido que tivesse ganhado uma luta em que ele também lutasse.
– Eu duvido que não teria ganhado. Você é incrível, assim como eu sabia que seria. Para todos os efeitos te dei uma bronca e vai se precaver melhor da próxima vez, ok?
– Sim, senhora! – Bateu uma falsa continência e antes de sair mirou uma pasta com letras “Secreto” escritas sob o marrom tedioso. – O que tem nessa pasta?
– Oh, nada demais. Apenas processos d’O Conselho que não devem ser vistos por olhos civis. Agora meu beijinho e já para o quarto.
Antes de conseguir evitar, foi para a mesa e leu a primeira linha da primeira página. Sequestros, mortos, quadrilha... Sua mente estava fabricando mil coisas.
– O que é isso, Rafaela?
– Não vá embora de novo, por favor!
– Como assim?
– Você não sabe, não se dá conta do inferno que nossas vidas viraram quando você sumiu.
– Querida, eu não vou a lugar nenhum.
– Não acredito em você. É a mesma conversa mole de quando me abandonou naquela casa. É a mesma coisa... Mas, agora você tem Louis. Tem que cuidar dele.
– Isso não é da sua conta e esse assunto está encerrado!
– Não é justo.
– A vida nem sempre é, mas, não vou a lugar nenhum, isso é uma promessa.
Mais calma, ela subiu para o quarto e tomou um banho pensando em como as ocorrências do dia a cansaram. Ela dormiu sem aguardar mais nenhum segundo, aproveitando-se apenas do presente em sua cama, próxima de sua família.
~~
Como temia, estavam recrutando lupinos e vampiros para ir atrás da quadrilha. O ideal seria montar uma força de reconhecimento de quatro a seis membros. Para terem menos suspeitas, foi requisitado um grupo misto, jovens acima de 18 anos, com treinamento em combate e que tivessem proficiência em idiomas, por se tratar de um ambiente asiático, japonês, mandarim ou coreano eram indispensáveis. Rafaela se candidatou, mas foi vetada pela irmã com um simples olhar.
O grupo foi liderado por Kwan, quem ela descobriu tardiamente ser um dos melhores guardas de Hyuna, tinha Fernando, Magnus, Laura, Angela e Riana. O objetivo era se portar como turistas e serem levados ao covil da quadrilha, como requerentes de ‘produtos exóticos’. Depois da reunião onde ficou decidido, ela foi diretamente à irmã. A mescla de lupinos e não-mortos, foi desconfortável de início mas estavam todos tentando agir pelo bem maior ali.
– Porque eu não devo ir?
– Estamos dividindo as forças, você sabe, mescla.
– Tire Fernando então... eu quero ir!
– O não, já foi dado e está fora de discussão.
– Me pergunto, Ran, se teria aceitado qualquer ‘não’ do mundo.
Com os olhos vermelho vibrante, Ranielle encarou a irmã com fúria enquanto apertava seu braço até as garras começarem a arranhar a pele.
– Eu tinha uma missão que era minha e de ninguém mais. Não cabe à você decidir se era válida ou não. Não preciso cuidar de mais uma criança, Rafaela. Louis já dá trabalho suficiente. Fique quieta na sua e não tente me desafiar. Acredite em mim, não é muito saudável.
– Nem mesmo para seus aliados, não é?
Depois de praticamente esfaquear a irmã no peito, saiu batendo a porta e correndo floresta adentro. Seus instintos diziam que deveria desobedecer, no entanto não era saudável. Parou próximo do rio e mergulhando os pés na água podia sentir o gelo diferente da temperatura febril de seu corpo.
Se inclinando tocou com as pontas dos dedos o rio que fluía e pensou momentaneamente no que deveria fazer agora. Haviam montado um time de três para três e as vampiras estavam em vantagem sobre ela somente por serem vampiras.
Com as aparências de jovens despreocupados com a vida fazendo um mochilão, ela não poderia se encaixar, sempre fora séria demais para todos os efeitos. Estava meditando, quando sentiu a presença agora conhecida de Kwan. Seus olhos tinham o mesmo brilho acinzentado que os dela e sua boca formava um meio sorriso contigo.
– Está brava porque não foi selecionada?
– Não estou brava e se estivesse provavelmente não seria da sua conta.
– Ui... Defensiva também.
Por todo o enxofre do inferno. Será que não podiam lhe dar um minuto de paz?
– Não estou defensiva, apenas não quero conversar com você nesse momento.
– E o que diria princesa, se lhe pusesse à par de nossa missão ainda que não esteja nela?
O brilho no olhar de Rafaela foi indescritível, seria como fazer parte, sem necessariamente ir à campo. Ela gostava do som dessas palavras e encarou o jovem com outros olhos.
– Minha irmã quer me proteger por causa dos problemas que enfrentou quando decidiu vingar nosso avô.
– Todos sabemos o que foi necessário para que sua irmã tivesse sua vingança, por isso acho que está mirando sua fúria no lugar errado. Agir como uma criança mimada, desafiar e magoar a alfa não vai te deixar mais próxima do seu objetivo.
– Ora... Elucida então o cenário que tem na mente, sábio Kwan.
– Rafaela, sua irmã não é pega por sentimentos, ela é pega por lógica. Se provar à ela que é a arma mais indicada para ser enviada, ela poderia fazer uma troca ou até mesmo uma substituição.
– Ela não faria isso.
– Isso só mostra como é despreparada para jogos políticos, meu bem.
Ela queria bater nele de novo, mas, concluiu com um gosto amargo no fundo da garganta, que seria uma atitude infantil, a mesma da qual ele acabara de acusá-la. Trançando os cabelos automaticamente enquanto o torcia num coque e dava um nó para ficar preso, pulou no riacho raso, sentando-se nas pedras e meditando sobre as palavras que ouvira. Entendendo esse momento como algo íntimo, Kwan se retirou sem mais dirigir palavra alguma à princesa. Ela precisava de algum tempo para entender o que discutiram, mesmo que ainda não tenha lhe dito nem um terço do que realmente gostaria.
A lua minguante estava marcada por uma mancha rosada na parte de baixo, dando um charme nela, enquanto a única coisa que Rafaela conseguia pensar era em como jogar o jogo que faria a irmã confiar nela o suficiente.
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No dia seguinte, foi arrumado tudo para a partida do grupo no próximo final de semana. Ela olhava Magnus com certo rancor e apesar de não ser culpa dele, não conseguia deixar de nutrir esse sentimento. Era o maior entre os lobos, maior inclusive que o próprio pai, diziam que se assimilava ao avô e isso era uma vantagem que ele usava a seu favor. Só viram ele perder numa briga para a irmã, que era mais forte apesar de ser mais minguada. James cutucou a caçula dos Ferreira enquanto a chamava para tomar um café na casa da avó.
– Já decidiu o que fazer com o que o japonês te disse?
– Ele é coreano, e, não... Ainda não sei o que fazer. Como posso provar algo que ninguém deseja ver?
– Sendo inteligente, como sempre foi. Parta para a briga com os lupinos da matilha e recuse-se a se casar. Assim Ranielle vai ver como se parecem.
– Estou sentindo minha orelha queimando... – Ran descia as escadas da casa com Louis no colo, enquanto observava os irmãos discutindo algum assunto que pelo teor ela devia ser incluída. – Estão falando mal de mim, seus pestinhas?
– Na verdade... Eu pensei numa coisa.
– Continue, Rafa.
– Já que Fernando vai partir na missão, pensei se poderia me ajudar a treinar como ele faz. Posso evoluir mais se for minha tutora. Melhor que qualquer outro, já que nos últimos 6 meses ele me moveu para a turma de Elite e estava me preparando para ser da guarda d’O Conselho.
– Ele não me disse nada disso.
– Pedi para não dizer, sabia que poderia não aprovar e realmente quero fazer algo útil.
– Certo... Vou falar com ele antes de ele partir e vamos ver sobre essa situação. Agora parem de falar mal de mim e vão logo mover essas bundas para fazer alguma coisa útil.
Como apenas parte do que ela disse era uma meia verdade, bom... uma meia mentira. Fernando ainda não sabia de sua aspiração de entrar na guarda, mas, realmente estava na Elite do treinamento. Agora era só esperar pelo melhor da conversa dele com Ranielle e torcer para que a irmã tivesse um pouco de compaixão pelos segredos alheios.
O final de semana chegou e sem muitas despedidas partiram para o continente asiático. Como era uma missão, foram com documentos falsos, que não poderiam ser localizados nem mesmo se as polícias humanas decidissem. Óbvio que tinham alguns membros do alto calão sabendo de suas incursões, mas, era tão secreto que até mesmo generais e comandantes não sabiam da existência de outras raças, que dirá as missões que eram realizadas.Rafaela não desceu do quarto antes da partida da comitiva, estava com o estômago revirando de ansiedade pelo resultado da conferência da irmã e Fernando que tomou lugar naquela manhã. Uma batida em sua porta chamou sua atenção e indo abrir topou com a cabeleira loiro escura cacheada de Louis.–
Não mais se falaram pelos próximos dias, o clima volátil se estendeu à casa que dividiam com a família e onde uma entrava a outra saía na sequência. Marieta e José nunca tinham presenciado uma briga tão feia entre os irmãos Ferreira antes. O treinamento ficava cada vez mais intenso e Rafaela apesar de não pensar em desistir se questionava se estava trilhando o caminho para o sucesso.Seu primeiro exame foi ligeiramente fácil, o que ainda não a habilitava ao cargo de guarda, porém era um degrau a mais. Seus esforços foram reconhecidos pelos colegas que estavam juntos tentando uma vaga também. Lobos e não-mortos lutando por uma causa comum, era normal 100 anos atrás, e, está voltando a ser agora que a Alfa e o Rei da região estavam de acordo com as regras que deveriam ser
Raoul havia arrumado rapidamente uma mala pequena. Com a mesma desculpa de Rafaela, de que iriam apenas realizar um resgate, mal sabia ela que se ele precisasse de uma arma ou de toda a guarda para mantê-los à salvo era questão de assobiar. Possuía contatos em todo o mundo e não seria difícil conseguir ajuda se realmente precisassem dela.Inconsciente desse fato, a jovem loba não tinha ideia de que havia enrolado um rei, suas vontades e um reino inteiro sobre seu dedo mindinho.Assim que partiram, a animosidade já tomou conta dela, que estava a passos de distância de realizar um ataque em direção à ele. Sua vontade maior era de ter ido sozinha, ainda não entendia a escolha de parceiro para uma missão de resgate, Raoul nem mesmo conhecia seu irmão. Porque dever
Paquistão, finalmente. Encontrariam-se com Kwan ali, para posteriormente prosseguir para a China em direção à Coreia do Sul. Estava ansiosa por ver novamente o famoso guarda número um de Hyuna e tinha o pressentimento de que seria muito melhor viajar com alguém que não tinha tanta bagagem com sua família.– Devemos avistá-lo a qualquer momento.– Sim, vai ser uma honra encontrar com o lupino que você chutou a bunda.– Cale-se, Raoul, ele nem mesmo deve se lembrar de nós.– Oh, querida… Um homem jamais se esquece
Um estrondo foi ouvido do lado de fora da porta, Rafaela e Raoul se levantaram com as armas apontadas para a porta e apesar de terem dormido na mesma cama ainda se olhavam com suspeitas. Era incomum para ela dormir acompanhada e para ele dormir acompanhado sem liberar toda a libido de seu corpo.Com os olhos furiosos ouviram do outro lado da porta “Parada de Chung-Ze”, sem nem mesmo se moverem passaram alguns momentos se encarando enquanto uma centelha de reconhecimento enchia seus olhos.– Que horas serão?– Não sei… – Os olhos cinzentos da lupina denunciavam ansiedade. Enquanto os azuis do não-mort
Desmantelar uma quadrilha em sua mente era a parte fácil, difícil mesmo seria lidar com a recusa de Raoul e Kwan que a encaravam como se fosse louca. Hyuna e Ranielle estavam se descabelando à sua maneira, com as duas alfas o assunto era um pouco mais complexo, já que um incidente internacional dessa magnitude seria como uma terceira guerra mundial velada entre espécies.Apesar dos olhares duros, não passou despercebido para os integrantes da sala que Raoul estava encarando a lupina com um desejo nada saudável. Parecia estar disposto a atravessar um rio a nado, para poder tocar na pele pálida dela à mostra. Suas pupilas estavam novamente volteadas com o brilho vermelho que indicava fome ou um desejo incontrolável dele por algo que naquele momento jamais seria seu. Kwan não ficava muito atrás, praticamente babando pelas curv
Ótima forma de começar uma investigação, de um jeito que faria sua irmã sentir orgulho com certeza. Ela sentiu um carro se movendo mas constatou ainda que tardiamente que seus olhos estavam vendados e suas mãos presas por uma espécie de corda. Nada demais se não fosse o forte cheiro de sangue. Seus sentidos se ajustaram rapidamente, trazendo a leitura de três respirações distintas.– Você está acordada, bom... O chefe gosta de testar a mercadoria antes de ela ser colocada no mercado.Ela estava estática e somente seu fôlego se mostrou mais curto.– Sabemos o que você é e a razão pela qual estava nas ruas. É apenas uma puta nova tentando fazer vida. Não lhe disseram que o
Com a chegada de Farrah, os ânimos que já estavam quentes foram à ebulição. Raoul estava louco de preocupação, assim como os demais da sala. Somente Kwan ainda se mantinha mais calado, provavelmente analisando formas de realizar o resgate sem que comprometesse muito a unidade lupina próxima. As baixas seriam desastrosas, já que os Víboras eram poderosos e pareciam ter alianças muito mais poderosas que eles no jogo de poder.– À essa altura, ela deve estar nas mãos das Víboras, o melhor agora, é colocar toda a nossa força atrás deles.– O rastreador dela está realmente inativo?– Posso tentar consertar, no entanto, seria mais prático se vocês conseguissem fazer um