Costa do Marfim – 1789
O navio que atracou no porto não era esperado por nenhum dos negociantes do local, muito menos pelo Governador, o Duque de Limoges. Uma cidade francesa famosa por suas porcelanas e artistas. Piérre de Telliard deixara a França quando a esposa falecera, vendo na terra longínqua de sua pátria, a oportunidade de criar suas duas filhas numa atmosfera menos conturbada que a do seu país naquele momento. A doença que acometera sua mulher um ano antes, já causara uma devastação na alma das meninas, e agora o risco da monarquia ser deitada por terra, traria um sofrimento ainda maior à mente de duas jovens saídas dessa perda recente. Assim, ele se viu fechando o acordo com o Rei e partindo em busca de um futuro desconhecido, na terra quente dos cacaueiros.
A estação chuvosa já se alongava por um mês, e o Duque de Telliard encontrava certa dificuldade em chegar ao porto, ainda que a missiva do seu capitão de milícia indicasse que se tratava da visita de um nobre espanhol, o Conde de Aramayona. Não sabia exatamente o que um Conde, e principalmente espanhol, fosse querer naquelas paragens, mas não era um homem de se opor ao bom comércio, se essa fosse a razão que trouxera o nobre até ali. A monarquia sempre precisava de novas divisas, e a França também.
O pé pisou forte no chão enlameado, espalhando o barro molhado pela barra da calça marrom escura, assim que saltou do tílburi. Não haviam outros que detinham aquele tipo de condução na colônia, o que por si só, indicava a presença do governador em pessoa. Os olhos escuros do homem perscrutou o crepúsculo que começava a se abater sobre as casinhas de comércio à margem do porto. Os passos continuaram sobre a lama até a estalagem, a única da colônia. Não era uma parada de passeios, tão somente negócios eram tratados em lugares como aquele. A porta oleosa surgiu diante dos pingos intermitentes de chuva que cobriam a vista do Duque, e ele a empurrou sem bater.
A atmosfera quente e nauseante do lugar gritava contra o bom gosto do francês, que ajeitou o colete sob o casaco, procurando por seu visitante. Em meio ao burburinho do local, divisou o capitão da milícia ao canto, conversando com um homem alto, que não passara de seus trinta anos; a pele bronzeada e os cabelos castanhos dourados. A blusa branca estava solta sobre o corpo e as calças pretas, porém rotas, denunciavam os anos de uso. A cabeleira branca do governador mexeu desconfortável sobre sua cabeça, mas ele se manteve firme em seus passos, se aproximando de ambos. O capitão prestou sua reverência, mas o homem ao seu lado apenas baixou levemente os olhos escuros.
– Este é o Duque de Telliard... – anunciou o franzino capitão de milícia, em seu garbo sob o uniforme bem cuidado.
– Sou Rámon, o imediato do Allera. – Os olhos do governador, entretanto, não fingiram gostar do homem, que não se deu ao trabalho de ser cortês. – Meu capitão solicitou sua presença a bordo, seria possível? – Ambos se mediram veladamente, e o imediato sentiu a necessidade de uma persuasão: – Não há nesse porto um lugar discreto para se tratar de negócios...
Houve uma pausa longa, em que a caneca do imediato foi sorvida com rapidez, e o governador tomou a palavra para si:
– Certamente não trato de negócios no porto. – Um brilho trespassou os castanhos dele. – Apresente um convite ao seu senhor, minha residência o receberá esta noite para um jantar... – não esperou resposta e virou-se para sair, mas voltou seu rosto rapidamente para o imediato e completou antes de ser seguido pelo capitão da milícia: – Às oito, em ponto, e espero que não se importe que Gerard o acompanhe.
– Tenho certeza que o capitão aceitará o convite – Rámon murmurou antes que ele deixasse a estalagem.
Piérre, apesar da meia idade sobre seus ombros, podia sentir os olhos do imediato em suas costas. Não gostara dele em absoluto, não confiava em espanhóis, principalmente pelas notícias recentes de um destemido bucaneiro nas costas das colônias ao norte... No entanto, ele saberia detectar se havia nobreza no Conde de Aramayona, caso contrário, a forca era o destino certo para eles.
...xxx...
– Ainda são sete e meia. – A voz de Rámon preencheu o ar da cabine luxuosa do navio enquanto fechava a porta atrás de si.
As pesadas cortinas de veludo adamascado emprestavam um ar lúgrebe ao cômodo, não deixando entrever uma réstia de luar. A luz tremulante da vela cobria de sombras a cabine, mas deixava a figura em frente ao espelho, mais imponente, fechando os últimos botões do casaco sobre o peito. O traje totalmente escuro contrastava com a pele clara e os olhos de um verde intenso do Conde de Aramayona. Os cabelos pretos estavam fixos num rabo-de-cavalo e a barba era recém feita. Nada estava fora do lugar, a não ser a nobreza do proprietário do Allera.
– Eu estou pronto. – Ele contraiu o canto do lábio em aprovação a visão de si mesmo no espelho. – Como das outras vezes, passarei pelo fausto jantar e me regarei dos prazeres da cidade.
– Não gosto do governador – o imediato disse taxativo.
– Não se gosta de governadores – ele se virou calmamente, intensificando os violetas no imediato ao completar: –, se gosta do que eles podem nos oferecer...
– Não gosto da cidade – Rámon insistiu enquanto ele se dirigia até a porta.
– Não me importo com a cidade ou o governador. – A linha fina do nariz acompanhando o resto dos traços bem feitos sob a luz bruxeante. – Quero apenas o ouro.
– Quem o vê falar assim, não diz que é um nobre.
Ele ampliou a linha dos lábios, rubros, e estalou a língua. Violetas nos pretos de Rámon, intensos.
– Fatalmente quem o olha, não diz que é meu irmão.
– Um pai em comum não diz muita coisa.
– O gosto por vinho e mulheres diz mais. – Acariciou-lhe o rosto.
Os dois sorriram e deixaram a cabine.
...xxx...
A casa do governador não era muito longe do porto, o coche do mesmo fora buscar o Conde no Allera, e como havia sido determinado, o capitão da milícia estava em seu posto. Nada fora do lugar, o Conde observou ao tomar o assento dentro do tílburi. A estrada sinuosa, o calor úmido dos trópicos e as plantações de cacau ao longo de toda a estrada, não tiravam o brilho da noite. Principalmente da lua cheia, entrevista entre as poucas nuvens restantes no céu. Violetas apreciavam o luar quando a voz do condutor interveio em seus pensamentos:
– Chegamos, senhor.
Um meneio de cabeça depois, e ele e o capitão atravessavam os jardins bem cuidados da residência do Duque de Telliard. Ainda que a casa fosse imponente diante de todas as outras construções da cidade, não havia para o Conde, uma ostentação de nobreza. Era tão somente a casa do governador da Coutê d'Ivore. Ele suspirou e prosseguiu lentamente atrás do miliciano. O mordomo que os recebeu, os conduziu entre as poucas salas até uma menor e com as janelas abertas para os jardins, de onde exalava um cheiro forte de rapé.
O homem de porte médio metido numa veste verde escura, contrastava com o tom claro do aposento ao seu redor, onde móveis sólidos de carvalho formavam uma atmosfera digna de Limoges. Havia nobreza ali, o Conde fitou em definitivo seu anfitrião.
– Vejo que me precipitei em minhas conjecturas. – Estendeu-lhe a caixa de rapé.
– Não, obrigado – agradeceu, o Conde, polidamente. – Permita me apresentar, Alejandro de Aramyona.
– Piérre de Telliard, mas isso você já deve saber – o Duque completou ao devolver a caixa á mesa do canto.
– Tive o prazer de conhecer Limoges e... – ele foi interrompido pelos passos apressados sobre o chão de madeira encerada, que irromperam na sala na forma de uma cabeleira preta e fios soltos.
– Papai... – as palavras sumiram com a mesma rapidez que lhe chegaram aos lábios, sob o olhar severo do Duque. – Je suis désolée. – Ela inclinou a cabeça, os cabelos caindo–lhe sobre o rosto.
– Te son perdonados. – Violetas fitaram atentamente a moça que não passava dos seus dezessete anos. O colo claro e os braços à mostra no vestido azul de cetim.
– No hablas francés? – Ela ergueu seus chocolates aos violetas, curiosa.
– Un peau – o Conde respondeu após uma breve pausa.
– Onde estão seus modos, Ellen? – interrompeu o Duque. – E onde está Emilie que a deixou sozinha?
– Mas papai... – a menina tentou falar, os olhos ainda presos aos violetas. Violetas que pareciam um lago parado de águas túrgidas. – Eu não sabia que tinha visitas.
O Conde desviou o rosto para a janela, contendo o sorriso.
– Pois bem, sua irmã sabia. – E com o rosto corado, acrescentou rapidamente: – Agora suba, sim?
A menina mordeu o lábio, o Conde notou, e numa nova reverência, despediu-se:
– Au revoir, monsieur...
– Au revoir, mademoiselle.
– Vinho? – o Duque ofereceu, não muito certo de que não arruinara seu negócio.
– Sim...
– Ora, eu não lhe indiquei um assento... – concluiu encabulado, o antes tão seguro Duque de Telliard.
– Não faz mal. Posso? – O Conde indicou com a cabeça a poltrona perto das janelas.
– Claro – Piérre disse entusiasmado, servindo a ambos de vinho. A intempestiva entrada de Ellen, sua caçula, apesar de indevida, servira para afastar seus temores quanto ao Conde. E, ele agora pensava o quão lucrativa poderia ser aquela conversa.
Os dois nobres se acomodaram diante do jardim, as taças de vinho nas mãos.
– O jantar não demora a sair, espero que aprecie a cozinha francesa.
– Eu aprecio o mundo, governador. – Os lábios pousaram sobre a taça, sorvendo o líquido escuro. – Era sua filha? – Ele foi direto, sem tirar os olhos do jardim ou demonstrar qualquer emoção que não a curiosidade implícita de suas palavras.
– Perdoe–me o jeito como ela entrou... – o governador se endireitou desconfortável na poltrona. – É a minha caçula, Ellen. Tem o gênio da minha falecida esposa.
– Eu sinto muito por sua perda. – Ele não desviou o olhar para o rosto do Duque.
– Eu também, criá-las sozinho tem sido uma árdua tarefa.
– Emilie é a mais velha, eu suponho. – Bebeu mais de sua taça.
– Sim, mas não deixe que a intromissão de minha filha o impeça de apreciar o vinho e sua estadia em nossa cidade. – O Duque analisava cada detalhe do homem ao seu lado. A veste impecável, os modos imponentes, tudo tão devidamente cuidado, que não o via dentro de um navio. Certamente viera tratar de negócios, nenhum nobre sai de suas terras para passear pelas colônias.
– Não se preocupa com a Revolução na França? – interpelou–o friamente, Alejandro.
– A monarquia é o berço da civilização. Não há como mudar isso.
Violetas brilharam na noite.
– Sangue real é igual ao de qualquer plebeu. – Ele ergueu a taça á altura dos olhos fitando o líquido espesso. – O mesmo gosto, o mesmo cheiro, a mesma cor... Só é mais frio.
A escolha daquelas palavras para designar a nobreza de sua estirpe foi colhida com surpresa pelo Duque, que incerto de onde o Conde queria chegar, não tencionava abrigar revolucionários sob seu teto, principalmente de outro país. A batida na porta e o anúncio do jantar pela moça negra, que se apresentou numa reverência curta, os tirou daquela situação embaraçosa. Ao menos por parte do Duque.
...xxx...
Meninas de dezessete anos não deviam sonhar, não deviam ler... Ela pensava deitada sobre seus lençóis brancos cheirando a rosas. Tão rubras quanto o copo de vinho que ele segurara na mãos. Havia algo de errado naquele homem, ela sentia, mas o som melodioso da voz dele em sua mente... em espanhol e francês tão bem pronunciados, a fazia esquecer o arrepio em sua espinha ao vê-lo manter seus violetas sobre ela, o tempo todo que estivera no escritório de seu pai. Era como se ele soubesse que ela estava entre os teixos do jardim, mas como poderia?
Ellen rolou na cama, ele não a vira, ninguém nunca a via!
Lembrou–se das palavras de Emilie, de que um dia seria pega em suas peripécias, porque sempre dava um jeito de espreitar os negócios do pai... mas que culpa ele tinha se os livros a faziam sonhar? Que culpa tinha de gostar de coisas diferentes como espanhol e italiano enquanto as outras meninas queriam tocar piano e bordar? Por que era errado se importar com o que acontecia com a França, se tudo o que possuíam de valor estava lá... inclusive o corpo de mamãe? Ela suspirou, retirando a mecha de cabelo do rosto, atirando-a para cima. Estranha era Emilie e sua apatia, pensou por fim, agarrando–se ao travesseiro... Ele ao menos falava espanhol.
...xxx...
– E como foram os negócios? – indagou Rámon assim que o Conde se desfez do casaco escuro.
– Doces como uma taça de vinho... – Atirou o colete sobre a cama, desabotoou a blusa e se sentou na cadeira em frente a mesa de mogno.
– Quando pilhamos a casa do governador?
– Não pilhamos – ele interveio, as botas sujas sobre o tampo de madeira. – Não há nada aqui de valor... – Correu o dedo indicador sobre o lábio rubro, pensativo, e por fim, completou sério: – Não para o que queremos.
– Então partimos ao alvorecer, é isso? – Rámon espetou os cabelos.
– Não... – Os olhos de Alejandro ganharam um brilho escuro, pouco convencional para quem o conhecia como o irmão. – Ficamos.
– Como ficamos? – o tom de preocupação era latente na voz do imediato. – Temos uma carga valiosa a bordo e se nos descobrem com ela, ganharemos a forca.
Os lábios do Conde crisparam quase que involuntariamente enquanto violetas passeavam pela figura do irmão.
– Não acredito que se preocupa com uma cordinha de nada...
– A minha vida de pouco vale sem a de cada um que jurou fidelidade a Alejandro de Aramayona. – Pretos cruzaram os violetas num lampejo. – Todos aqui se juntaram a sua causa, Alejandro! – Bateu com os punhos na mesa. – Há uma recompensa gorda para cada cabeça desse navio, e mesmo que a sua nunca lhe saia do pescoço, a deles rolaram.
O semblante sereno do Conde em nada se alterou com as palavras do irmão.
– Estás com medo que a Revolução nos pegue em alto-mar? – inquiriu-o cínico. – Não faz jus ao seu sobrenome...
– Tome-o de volta se isso lhe trouxer á razão – rebateu certeiro em pretos brilhantes. – O que o prende aqui?
Silêncio, um longo silêncio se impôs aos dois, fazendo Rámon alterar seu semblante.
– O que quer do governador que não pode ser pilhado?
Uma nova linha curvou os lábios do Conde.
– Talvez eu lhe conte no momento certo... – Ergueu–se da cadeira, tomando a direção da cama e desabando sobre ela. – Não tema pela tripulação, o Duque está fascinado pelos negócios com Aramayona. Sequer cogita que somos o navio bucaneiro do qual se ouve falar por aí. – Ele fechou os olhos, os braços cruzados sob a cabeça.
– Vai comprar cacau para viagem?
– Não é má ideia... – disse entre os dentes, num sibilo baixo.
– Amanhã darei ordem para a compra de mantimentos enquanto você brinca de negócios com o Duque.
– Faça como quiser... Apenas me deixe descansar.
Ele ouviu a porta se fechar minutos depois, e violetas se abriram fixos no teto da cabine, sem ruído. O francês dela sussurrando em sua mente, os olhos entre os teixos, curiosos sobre ele. Ela não poderia ter percebido nada, mas por que isso o incomodava tanto? Algo escorregava ao lado dele, provavelmente um rato... um movimento direto, e tudo na cabine era novamente silêncio e escuridão, a não ser pelos chocolates na mente de Alejandro.
– Papai? – A menina de cachos loiros fixou seu olhar no governador sentado à mesa de carvalho. – Entre, Emilie – disse bondosamente, virando-se para a filha. Emilie, ao contrário da irmã, ostentava duas contas azuis quase transparentes como olhos, que juntamente aos cachos loiros, davam-lhe um ar angelical. – O que há traz tão cedo, aqui?– Vim me desculpar por ontem, eu deveria ter alertado Ellen...Ele apreciou o semblante da filha por instantes e com um sorriso, acrescentou:
Rosas...O quarto dela cheirava a rosas, as mesmas que estavam sobre a cômoda quando ele entrou. Depositando-a na cama, ainda desmaiada. A lama que fatalmente denunciaria que ela estivera fora, e como esconder aquilo? A mente dele trabalhava numa solução, nos violetas que buscavam por respostas no cômodo. Silencioso, como as sombras que se apossavam do quarto, ele abriu a cômoda, tomando uma peça limpa de dormir entre os dedos, na certeza de que se a criada a acordasse nas primeiras horas do dia, nada encontraria além da moça entre os lençóis macios. Lençóis sobre os quais ele se sentou quando começou a despi-la. Quando a sua pele fria tocou a quente dela, fazendo-o estremecer. Os dedos correndo lentamente sobre o corpo de menina exposto, como o desejo tornava seus
Os dedos corriam firme sobre as teclas brancas e pretas, mesmo que o olhar do Conde a fitasse atentamente, mas Emilie era diferente de Ellen... Não tremeria sob os violetas, não havia motivo para isso. Apenas se concentrava na melodia.– O conde me parece distante... – interveio, baixo, o Duque. – Algo o preocupa?– O cacau... e sua filha. – Desviou o olhar de Emilie para o homem ao seu lado, pego de surpresa pelas palavras de Alejandro. – Emilie? – Não teve como não estranhar. Era a primeira ve
Pingos grossos de chuva, o chão sob seus pés afundava a cada passo, encharcando–lhe a barra da roupa. Chocolates se estreitavam na escuridão e seu corpo tremia a cada novo disparo do céu sobre sua cabeça, porém, já chegara até ali e não voltaria, mesmo que seus ossos estivessem banhados pela chuva. As pequenas mãos afastavam os galhos de árvores que surgiam pelo caminho enquanto penetrava ainda mais na floresta ao redor da casa. Seus pés negros pela lama. O barulho incômodo das gotas nas folhas e o ranger do vento frio entre as copas das árvores... Talvez devesse voltar, estreitou o corpo entre os braços. Os dentes tremeram quando avançou mais um pouco e a tempestade desabou de vez sobre el
O vento soprava forte por entre as velas pretas do Allera quando Alejandro pisou na proa do navio. O cheiro de maresia, que há muito havia abandonado seus sentidos, invadindo sua alma. As mãos crisparam sobre a amurada enquanto fechava os olhos e sorvia aquele aroma acre. Era bom estar de volta... Mesmo que parte de seu coração estivesse em terra.– Capitão, estamos prontos para partir... – anunciou Rámon ao seu lado. – Basta apenas ordenar.Os cabelos pretos ricocheteavam em seu rosto conforme tomava a direção do castelo da popa. Os violetas que foram à terra sem encontrar os cho
Não havia nada num raio de muitas milhas, nada que lhe trouxesse paz ao coração. Deitada sobre os lençóis bem cuidados, ela fitava o céu estrelado, que vira surgir aos poucos, por trás da cortina de lágrimas que não deixava seus olhos. Então, as notas flutuaram até seu ouvido, fazendo tremer cada célula de seu corpo, mas de um modo muito dissonante do que era antes... Os lábios tremeram, embebidos num gosto acridoce. O gosto da desilusão.O barulho da porta se abrindo, mesmo que levemente, não a tirou de seu torpor. Não tencionava ter contato com o mundo a sua volta, não naquele momento, mas seu visitante parecia não querer passar
– A febre já cedeu? – disse ao entrar na cabine com uma nova terrina de água fresca.– Apenas um pouco... – Os violetas se voltaram para o rosto suado. – Ela delira o tempo todo – explicou ao mergulhar o tecido de algodão na terrina e torcê-lo, restirando o excesso, levando-o à testa de Ellen em troca do outro.– Faremos uma nova sangria, se não baixar... – sugeriu Rámon.– Não pense que gosto disso... – Encarou o irmão em violetas brilhantes.–
– Ela já foi? – Sorriu-lhe malicioso, o imediato, ao entrar a segunda vez na cabine aquela manhã. – Sim, você a assustou – rebateu Alejandro enquanto ajeitava o lenço sobre o pescoço. – Duvido muito – contrapôs firme Rámon. – É mais fácil você ter feito isso... – Impossível, ela está apaixonada, meu caro. – Vestiu o casaco com um sorriso ainda sob seus lábios. – E você... – deixou no ar, sabendo que os olhos violetas do irmão parariam sobre ele. – Último capítulo