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Capítulo 4 - O Crime

Era uma madrugada de sábado para domingo, as duas mulheres voltavam de uma festa num conhecido clube da cidade. Se dirigiam para casa após se despedirem de outros amigos.  Luana exagerou na bebida e era Sophia quem apesar de também um pouco embriagada dirigia com muito cuidado o carro, se esforçando para evitar acidentes. Antes do cruzamento entre duas vias havia um semáforo de três tempos que levava um tempo considerável para liberar o trânsito.

Ao estacionar o veículo, aguardando ser liberada para seguir viagem percebe parar ao lado um outro carro preto. O vidro baixa e ela ver o motorista com uma arma em punho apontada em sua direção. Apesar da pouca visibilidade, tanto por causa da noite sem luar como pela pouca luz no interior do veículo, sem levar em conta estar alcoolizada, era quase impossível identificar quem a ameaçava. O semáforo abriu e o carro preto parte em alta velocidade, deixando-as para trás.

Mesmo esforçando-se como pôde para anotar a placa não foi possível. Não tendo encontrado naquele momento a visão necessária para compreender o que via, devido maldita embriaguez. Mas nem lhe veio à mente que poderia ser Brenda, que vivia inconformada com a perda. Daquele episódio em diante Sophia passou a refletir melhor na realidade que estava vivenciando e após relatar a Luana sobre o que aconteceu ficou ainda mais assustada. Principalmente ao ser lembrada dos muitos casos em que pessoas já haviam sido mortas daquela maneira. Vítimas de desafetos, sedentos por vingança. Ao se ver de frente a essa dura realidade lhe veio na mente o desentendimento que teve meses atrás com a antiga namorada.  Passou, então, a indagar para si mesma se a pessoa no volante daquele carro preto não seria ela.

De certa forma ameaçando-lhe por tê-la abandonado e ainda por cima denunciado as agressões sofridas. Sem contar com a hipótese de que ela estivesse enciumada ao vê-la na constante companhia de outra mulher. Sophia nem podia imaginar o quanto suas conclusões estavam corretas, de fato corria perigo de vida, mas não apenas ela como também a amiga, pois na mente doentia de Brenda elas já tinham se tornado amantes.  Criava suas falsas expectativas, quando na verdade o que existia entre as duas era apenas uma forte amizade que lhes unia. Mesmo que da parte de Sofia havia certa dose de paixão, mas Luana ainda estava inocente quanto a isso.

 Porque demonstrou ser avessa a tal tipo de relacionamento e Sofia preferiu ocultar dela seu interesse para evitar o rompimento no companheirismo que nela adquiriu. Durante toda aquela semana trabalharam duramente, uma administrando seus restaurantes e a outra uma empresa de decoração. Era uma manhã ensolarada de verão, a secretaria comunica a decoradora da presença de uma suposta cliente que desejava contratar seus serviços, e ela é logo atendida. Sem conhecer pessoalmente a professora de academia nem ter ideia do risco que corria a partir daquele momento.

 Ficou à disposição da cliente para prestar-lhe seus serviços. Usando nome falso, com grande habilidade ela diz ter comprado um imóvel que necessitava passar por uma nova decoração. Ela, então, fornece o endereço onde haveriam de se encontrar para que a decoradora pudesse avaliar o lugar e fazer o orçamento dos custos. Na mesma tarde Luana faz uma breve visita no restaurante de Sophia. E, depois de almoçar na agradável companhia da amiga, segue para o encontro com a suposta cliente, a fim de avaliar seu imóvel.

O local era privilegiado e não levantava suspeitas de riscos, apesar de estarem ali apenas as duas mulheres aquele instante.  O prédio era novo e parecia desocupado, não havia uma viva alma por perto. Localizava-se às proximidades de outros condomínios, todos já habitados e às margens de uma movimentada avenida. De posse das chaves do apartamento Brenda sobe com a decoradora ao quinto andar. Entra e mostra o ambiente vazio, sem qualquer móvel, a aparência do lugar deveria ser modificada pela profissional que sem perda de tempo fez uso de seu material para criar um design compatível com o amplo espaço. Enquanto andava pelo local e projetava a melhor forma de aplicar um novo visual ao apartamento, a falsa cliente, em outro cômodo, preparava-lhe uma desagradável surpresa.

 Depois de fazer suas anotações e estar pronta para retornar a seu escritório, na intenção de se juntar aos demais funcionários e executar com eles o novo projeto, ainda reunia distraidamente seu material, quando sentiu um forte golpe à altura do crânio, caindo logo em seguida desfalecida por completo. A violenta pancada recebida foi feita com uma grossa peça de madeira usada as construções. causando-lhe hemorragia cerebral instantânea e letal, levando-a a óbito imediato. Usando luvas para esconder as digitais, Brenda comete o bárbaro assassinato contra aquela inocente e sai dali às pressas.

 Usando roupas e calçados na cor preta, um boné sobre a cabeça e óculos escuros, tudo no propósito de evitar ser reconhecida por algum espectador que porventura estivesse observando tudo. O carro da decoradora permaneceu estacionado por várias horas no mesmo ponto até que pessoas curiosas que passavam pelo local decidiram ir averiguar do que se tratava. Após verificarem todo o terreno em redor e nada encontrarem, subiram e fizeram buscas em todos os cômodos livres dos prédios recém construídos, mas nada foi encontrado, porém ainda restava verificar os apartamentos, mas estes encontravam-se à chave.

Ligaram, então, para a polícia e um grupo de investigadores foram enviados para colher informações e tentar desvendar o mistério. Os militares também deram apoio nas investigações. A construtora responsável pelo empreendimento enviou uma equipe para abrir todos os apartamentos e depois de uma exaustiva busca por todo o perímetro o corpo da decoradora foi localizado, Luana estava caída de bruços sobre uma poça de sangue. Os peritos avaliaram o lugar, chegando a conclusão de que o crime havia sido feito a algumas horas atrás e que a vítima teria sido golpeada pelas costas num momento de distração.  Visto que pelas características encontradas ela não tentou evitar o golpe mortal, logo a vítima não percebeu a chegada do agressor.

 O crime não demonstrava ter sido um assalto ou para abuso sexual já que a vítima não havia sido estuprada e seus pertences ainda permaneciam no local. Nada foi levado e seus documentos pessoais facilitaram-lhe a identificação e puderam localizar parentes que comunicaram o fato aos familiares e amigos, entre eles Sophia.  Já era noite, quando o celular tocou insistentemente. Despertando na empresária a curiosidade de saber a razão de tanta urgência. Após atender a ligação e saber o porquê da insistência sofre um desmaio, caindo sobre o tapete da sala, permanecendo desacordada até que voltou a si, uma hora depois. O corpo de Luana foi entregue aos familiares e velado na capela Santo

Agostinho, no bairro onde ela residia.  Dezenas de pessoas choraram sua trágica morte, entre elas funcionários, amigos e familiares, além de muitos clientes a quem prestou diversos serviços. Afinal, era uma das mais conceituadas decoradoras. Enquanto todos choravam a perda da amiga, filha e profissional, Brenda permanência na academia. Exercia seu trabalho como se nada soubesse sobre o assunto, mas nada passa despercebido diante dos olhos reluzentes do destino.  E ele viu a grande covardia de como ela lançou mão daquela vida inocente e determinou que num futuro próximo ela pagasse pelo terrível mal cometido. Luana foi sepultada vinte e quatro horas depois de encontrada morta naquele apartamento com seu crânio esmagado por uma forte pancada.

 A vida das pessoas que a conheceram e desfrutaram da sua amizade deu seguimento. Mas os meses não sarou a dor de perdê-la, apenas ajudou a superar sua ausência. A assassina continuou administrando seu negócio, dando aulas na academia localizada ao lado do restaurante de Sophia, fingindo não lhe dar a menor importância, até virava-lhe as costas ao vê-la passar, tudo para não levantar suspeitas do crime cometido. Uma trama do além colocou Luzia e Brenda no mesmo caminho, elas se conheceram na festa de aniversário de uma amiga em comum.

Foram apresentadas e tornaram-se amigas íntimas, ao revelarem suas opções sexuais e, assim, cresceu ainda mais a afinidade, e no passar de poucas semanas já namoravam. A relação das duas ficou cada vez mais intensa, ao ponto de não existir mais segredos de ambas as partes no que dizia respeito ao presente, pois o passado pouco interessava. Porém, teria sido melhor para Brenda se soubesse que Luzia conhecia Sophia e que elas viveram um relacionamento conturbado.

Mas, como elas escolheram o anonimato daquilo que um dia viveram ao lado de outras pessoas, dando pouca importância a estes fatos. Tudo permaneceu obscuro e iria, mais tarde, virar uma enorme bola de neve que rolaria sobre as duas amantes. Quase um ano depois de ter cometido o bárbaro crime contra sua rival, Brenda já não aguentava mais guardar aquele terrível segredo apenas para si. Então decidiu revelar tudo para aquela em quem aprendeu a confiar cegamente, numa conversa franca com a namorada ela expõe seu segredo:

   — Preciso te contar um segredo muito sério

   — Não sabia que você possuía segredos assim tão sérios

   — É, mas tenho, e não consigo mais guardá-los só para mim, preciso desabafar com alguém e só confio em dividi-los com você

   — Bem, combinamos que nosso passado ficaria para trás e que nada do que fizemos antes importaria em nosso presente, mas se isso te incomoda tanto e precisa mesmo dividir comigo, vamos lá, me fale do que se trata

 Não iria ser fácil para ela falar sobre algo tão monstruoso, sentia medo que Luzia reagisse negativamente ao ouvir a verdade sobre seu erro, mas sabia que mais cedo ou tarde ela iria acabar descobrindo tudo e se tivesse que saber de toda a história que fosse transmitida por suas próprias palavras, então superou o medo e as expectativas, colocando em pratos limpos seu pior momento na vida:

   — Eu cometi um crime no passado, antes de nos conhecermos

   — Como, assim, um crime? Você causou um grande mal a alguém, um prejuízo incalculável que não pode mais reparar, foi isso?  Ora, quem neste mundo nunca causou algum tipo de maldade a outra pessoa? Esqueça isso!

   — Não, você não entendeu, eu matei uma pessoa!

   — O quê??? ― Por favor, calma, foi um momento de fraqueza!

,  — Você está me dizendo que cometeu um crime hediondo, que tirou a vida de outra pessoa, e vem com essa de fraqueza?

   — Isso mesmo, eu matei por amor!

   — Matou por amor? Você está louca? Ninguém que ama comete tamanha maldade, esse seu conceito de amor é uma insanidade sem limites!

   — Ela tirou de mim alguém que eu amava, não era justo deixar isso passar em branco, precisava me vingar dessa traição!

   — Você, porventura, não se deu conta de que a pessoa que escolheu lhe trocar por ela foi quem cometeu a traição e não a que foi morta injustamente.

E que se ela escolheu deixá-la foi porque o amor que sentia acabou e, certamente teve suas razões para desistir de ficar ao seu lado?

   — Eu sei disso, deveria ter punido as duas, mas não tive coragem, pois a paixão que ainda sentia era tremenda, então apenas tirei a rival do caminho

   — Jesus Cristo, então você comete um desvario desses e ainda fala com naturalidade que poderia ter feito algo pior?!

   — E o que você faria no meu lugar, deixaria alguém vir e roubar a pessoa que ama sem tomar uma atitude contra ela?

   — Se a pessoa por quem estivesse apaixonada decidisse sair da minha vida é porque o amor acabou e nada do que fizesse iria mudar isso.  Então o melhor seria deixá-la ir viver ao lado de quem achasse melhor. Eu jamais tomaria uma atitude horrível como essa, afinal, não possuo instinto assassino!

   — Não me considero uma assassina por tendência, foi apenas uma necessidade casual, uma autodefesa! — Necessidade casual de cometer um crime? Ficou louca de vez?

   — Procure me entender, meu amor, foi um momento de extrema angústia, não pensei direito na situação e acabei cometendo esse ato do qual hoje muito me envergonho, estou muito arrependida e minha consciência me acusa dia e noite!

   — Ah, e você possui consciência? Por favor, não venha com suas ironias, só lhe falei isso por acreditar que seria capaz de me entender

   — Mas eu te entendo! Entendo que me apaixonei por uma assassina capaz de me matar, caso eu vacile!

  — Quer saber, vejo que foi um erro tentar desabafar com você!

  — Isso não é um desabafo, Brenda, é a confissão de um crime bárbaro e sem qualquer fundamento! Não era para mim que devia ter falado, mas para a polícia, você merece estar presa, como uma assassina!

As duas mulheres não conseguiram mesmo chegar a um entendimento e a relação ficou abalada.  Luzia se indignou ao saber do crime cometido por Brenda e não conseguiu perdoá-la, passando vários dias afastada até procurá-la novamente para entender melhor a situação.

E, principalmente, saber quem teria sido a vítima. Interessada em ficar bem com a namorada, Brenda revela o nome da pessoa contra quem cometeu tal barbaridade e Luzia se conteve para não demonstrar tamanha surpresa. Ela sabia que se tratava da mulher com quem Sofia se relacionava e por quem também sentia aversão. Porém não àquele ponto, e ficou perplexa. Passaram-se semanas depois da conversa que tiveram e pensava em como agir diante daquela revelação. Por fim, decidiu procurar Sophia e revelar toda a verdade sobre o que de fato ocorreu com Luana, causando-lhe imensa revolta e desejo de vingança.

Ao estar ciente das barbaridades cometidas por Brenda contra sua amiga, Sophia não perde tempo denúncia a criminosa à polícia. Contando com o importante testemunho de Luzia convence o delegado responsável nas investigações do caso da veracidade dos fatos, que imediatamente ordena a prisão daquela homicida. Brenda encontrava-se no trabalho, quando foi abordada pelos policiais. Todos os presentes passaram diante do ocorrido, pois a tinham na conta de uma mulher honesta e digna, afinal, era uma conhecidíssima profissional.

Após detida e, apesar dos esforços feitos pelo advogado em tentar reverter a situação, permaneceu presa e à disposição da justiça. Com o caso elucidado e a justiça feita, Sophia sente-se aliviada e Luzia recupera sua amizade, porém o destino tinha em mente novos planos para as duas. As várias desilusões na vida fizeram-lhe tomar a decisão de abandonar a antigos hábitos e desejos, confinando-se à religiosidade, prendendo-se na fé sólida num Deus que antes não conhecia.  Como uma evangélica pentecostal aprendeu que para conviver ao lado de seu Criador precisava sofrer uma profunda transformação interior

 Nas constantes visitas feitas na igreja aos poucos fez muitas amizades com os novos irmãos na fé, e isso contribuiu imensamente para que sua monótona vida fosse preenchida e o vazio não mais a fizesse vítima diária da solidão. Numa dessas visitas só templo conheceu Luís Otávio, um pastor evangelista, viúvo, com quem começou uma bonita amizade e acabou por namorar. 

A união do casal foi logo aceita por todos os irmãos que ali se congregavam, pois tinha muito apreço pelo casal. Após um curto período de namoro decidiram se casar e toda a comunidade cristã cooperou para que o enlace matrimonial acontecesse meio a uma grande festa, onde diversas igrejas reuniram- se para juntos comemorarem. Em pouco tempo aquela antiga mulher que apesar das inúmeras tentativas frustradas não conseguia ser feliz.

 Parecia ter encontrado a paz e felicidade sonhada, e ao lado de um homem, o que para ela parecia impossível.  Não ocultou do esposo seu trágico passado, fez questão fé revelar a ele toda a sua história bem antes do casamento e foi bastante compreendida. Meses depois ela já fazia parte do grupo de senhoras da comunidade evangélica e, sendo esposa de um pastor respeitado por todos era, também, vista de forma respeitosa.

Jamais havia experimentado tamanha importância como um ser humano ou até mesmo como mulher. Ficaram para trás seus temores, suas frustrações e os antigos erros, entre eles seus envolvimentos homossexuais, dos quais muito se entristecia. Na nova vida conquistada ao lado daquele com quem jurou fidelidade e na companhia dos novos amigos sentia-se perfeitamente realizada, mais ainda com a chegada de Luciana, a primeira filha do casal.

Dois anos se passaram e receberam a missão de deixarem tudo para trás e seguirem rumo ao desconhecido como missionários, foram enviados para outro Estado e ali atuaram esforçadamente a fim de ganhar almas para Cristo.  Nos anos seguintes conquistaram mais ainda o respeito e admiração por parte de seus superiores. E para todos os lugares para onde foram enviados como representantes de Cristo, bem como da igreja por ele criada.

Eram um casal bem-sucedido financeiramente e isto acabou por conduzi-los a uma situação que lhes levariam a serem perfeito para atuarem como porta vozes do evangelho. Foram evangelizar em pequenos vilarejos, pequenas cidades do interior nordestino. Esforçando-se para convencer seus habitantes sobre um Deus vivo que lhes amou a ponto de dar a vida de seu único filho numa cruz. Para que todos pudessem ter uma chance de se arrepender de seus pecados e serem salvos.

 Recebendo dele a oportunidade de serem chamados de filhos, mediante o arrependimento e reconhecimento de tão sublime sacrifício. Além de um excelente ministro do evangelho, pai e marido exemplar, Otávio se tornou, também, um renomado escritor. Publicando várias obras de cunho bíblico e comentários sobre diversos temas das Sagradas Escrituras. Recebendo o merecido reconhecimento público. Tudo parecia correr naturalmente bem e sem maiores transtornos, mas era mesmo sorte daquela mulher passar por maus momentos na vida insana que o destino havia lhe reservado.  Numa tarde de sexta-feira, enquanto voltava de uma breve viagem feita a uma cidade distante vários quilômetros de onde pastoreava. Local onde teria ido ser o relator num congresso muito importante.

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